O teletrabalho e o servidor público

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Crise, para os chineses, é sinônimo de oportunidade. Respostas antes adequadas tornam-se obsoletas. Impõe-se então a busca de caminhos contemporâneos para fazer frente aos novos desafios. Trata-se de processo natural que, com a pandemia do coronavírus, experimentou notável aceleração. O teletrabalho no serviço público serve de exemplo.

Antes tratado como projeto-piloto em alguns órgãos, o home office tornou-se obrigatório para a maior parte dos servidores. E assim seguirá passada a crise sanitária. Vem, pois, em boa hora a regulamentação da modalidade para os funcionários federais. Com ela abre-se uma janela de oportunidades capaz de promover melhorias na administração do Estado.

Há muito se criou imagem negativa do profissional que trabalha para o governo. Crônicas, obras de ficção e marchinhas de carnaval o apresentam como pessoa despreparada e descomprometida com a função que exerce. Ele virou até objeto de piada. Exemplo sempre lembrado é o paletó na cadeira para burlar a exigência de presença na repartição. Fernando Collor, então candidato à Presidência da República, ressuscitou a palavra marajá para desqualificá-lo.

Burocracia, que significa administração da coisa pública por funcionário sujeito a hierarquia e regulamentos rígidos, virou palavrão. Tornou-se sinônimo de poder usado para emperrar processos, procrastinar soluções, atrapalhar a vida do cidadão a quem deve servir. O Brasil, vale lembrar, teve um Ministério da Desburocratização, que gozou de grande prestígio enquanto teve vez na Esplanada.

Claro que há injustiça na generalização. A pandemia se encarregou de mostrar quão importante é o serviço público e quão bons profissionais o Estado tem em seus quadros. Médicos, enfermeiros, professores desenharam a face mais visível de quem tem o dever de servir ao patrão que lhes paga o salário. Deram mostras de dedicação, compromisso e responsabilidade. Não só fizeram o que sabiam fazer, mas correram atrás de conhecimentos para enfrentar a inédita realidade.

Mas não há fumaça sem fogo. É indiscutível que o serviço público precisa e pode melhorar. A Constituição de 1988 impôs a exigência de concurso para ingresso na carreira. Portanto, a meritocracia impera no acesso. É importante que o aprovado não bata o ponto final na assinatura do contrato.

Ele precisa ser acompanhado, avaliado e sempre treinado. Caso não corresponda às expectativas, a legislação prevê o desligamento. A folha de servidores abocanha 16% de tudo o que é gasto pela União. Trata-se de valor substantivo. A contrapartida deve se traduzir em produtividade, agilidade e qualidade.

(Editorial do Correio Braziliense deste domingo)