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VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)
Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade
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Crises, como já apontavam os antigos, abrem oportunidades para a criação de novas soluções e de novos caminhos. Essa situação vale, sobretudo, para aqueles que possuem imaginação e não se deixam guiar por pessimismos. Sun Tzu, autor da celebre “A Arte da Guerra”, já ensinava, no século V a.C., que a guerra é, além de um caminho para a sobrevivência, um meio de conhecer não só a si mesmo, como ao próprio inimigo, derrotando-o sem sequer lutar. Mas antes é preciso saber quando lutar e quando esperar. Sobretudo, é preciso não blefar, desafiando um oponente reconhecidamente superior e mais forte.
Guerras não são jogos de cartas. Há sangue e humilhações. Para um bom estrategista, a maneira mais correta para avaliar os prós e contra de uma guerra é saber como outras nações trataram o mesmo assunto, a fim de evitar o pior. O problema é quando o comandante passa a ignorar os conselhos e o bom senso, deixando-se guiar pelo fígado e, pior, por uma questão que mistura bravatas e crenças políticas. Igualmente danoso é quando um líder resolve colocar sua salvação pessoal e política à frente dos legítimos interesses da nação.
É preciso entender que guerra, do tipo tarifária, pode ser tão mortal como guerras do tipo convencional. É preciso que se entenda ainda que, no nosso caso particular, com a taxação dos produtos brasileiros decretado pelo governo americano, a aceleração da derrocada economia nacional, produzida por essa decisão externa, vem a se juntar à crise econômica gerada por ação interna e exclusiva do próprio governo. Para um país como o nosso, manietado por uma severa crise econômica, resultado de anos de políticas desastrosas, a entrada de um fator externo deveria ser encarado com cuidados redobrados. O mais preocupante, contudo, é saber que, por interesses pessoais e estratégias mal formuladas, o governo brasileiro pensa em colher frutos em forma de votos, opondo-se frontalmente aos Estados Unidos, numa reedição transloucada dos tempos da guerra fria.
Para quem não entende o que está posto nesse momento, soberania e, antes de tudo, fartura de comida no prato, educação de qualidade e segurança pública eficiente, tudo o que não temos e que a cada tempo se mostra mais distante. O governo brasileiro parece ignorar completamente os princípios milenares de prudência e inteligência estratégica. Ao invés de buscar caminhos diplomáticos e negociar a partir de uma leitura realista das correlações de força, tanto econômicas quanto políticas, prefere confrontar os Estados Unidos, como se estivesse em um tabuleiro de bravatas ideológicas, e não em um cenário geopolítico real, de consequências concretas para milhões de brasileiros. A lucidez, que deveria nortear qualquer liderança em tempos de crise, tem sido substituída por uma retórica marcada por ressentimentos históricos e delírios de soberania, que não se sustentam diante da fragilidade econômica brasileira.
O país amarga estagnação, baixo crescimento, desemprego estrutural e perda de competitividade industrial. Em vez de concentrar esforços na reconstrução da economia interna e na ampliação de mercados externos, o governo acena com discursos de enfrentamento, como se isso, por si só, fosse suficiente para garantir prestígio ou votos. Mais grave ainda é o fato de que a crise econômica interna, já instalada por anos de erros sucessivos em políticas públicas, fiscais e de investimento, é agora potencializada por essa confrontação com a maior economia do mundo. O resultado? Uma tempestade perfeita: retração de investimentos, aumento da desconfiança internacional e, inevitavelmente, mais dificuldades para o setor produtivo brasileiro,especialmente o agroexportador, que depende diretamente do acesso a mercados estrangeiros.
A tentativa vã de “colher frutos em forma de votos”, atinge o cerne do problema e mostra um governo perdido em suas alucinações. A manipulação de crises internacionais como instrumento de fortalecimento político interno , algo típico de regimes autoritários ou de governos em desgaste, revela não apenas imprudência, mas também falta de compromisso com o bem-estar nacional. Colocar interesses eleitorais acima da estabilidade econômica é uma forma disfarçada de traição ao país. A guerra tarifária pode ter efeitos tão letais: fábricas fechadas, produtos encalhados, desemprego crescente e carestia nas prateleiras. E, em última instância, ela contribui para o desmonte silencioso da soberania real, que começa com a fome, passa pela desinformação e termina na apatia de uma população que não vê saída. Diante disso, o que se exige de um governo não é orgulho ferido, mas racionalidade estratégica, diálogo com os pares internacionais, como foi feito por vários países e, sobretudo, humildade para reconhecer os próprios limites. A crise pode, sim, abrir oportunidades. No caso do Brasil, em duas frentes: para aqueles que têm imaginação e coragem de governar para um povo ou para os que já tem um plano para confrontar a nação.
A frase que foi pronunciada:
“Os mercados em rápido crescimento – os BRICS e os Next Eleven – são a chave. O próximo bilhão de consumidores não virá dos EUA ou da Europa Ocidental – eles virão da Ásia, América Latina e África.”
Martin Sorrell

História de Brasília
5Sobre essas de travessia, há uma observação. Se as linhas fossem em diagonal seriam vistas a maior distância. (Publicada em 08.05.1962)
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É possível ao Estado tornar-se mais forte do que a sociedade e ainda assim conservar a democracia em toda a sua plenitude? Eis, aqui, uma questão que muitos têm feito, na busca de entender o Estado contemporâneo e suas vertentes atuais. De cara, é preciso notar que, nessa nova situação, o governo vive em função do próprio governo e não em função do cidadão.
Miguel Reale (1910-2006) considerava que, no Brasil, o direito civil começou a morrer com o surgimento do direito administrativo, ao regular a dependência das pessoas em função do Estado e, mais modernamente, em função do governo. Essa questão toda atrai para si outra de igual importância para o entendimento da liberdade cidadã: o fenômeno do estatismo. Esse, por sua vez, é cria direta de outro fenômeno que veio para antepor mais dificuldades à liberdade e que, nesse caso, é representado pela burocracia estatal, exercida por indivíduos com laços estreitos com o governo. A burocracia tolhe nacos da liberdade, tornando o cidadão refém ou dependente do Estado e das vontades do governo.
Os estados atuais tornaram-se instituições sofisticadas e complexas, nas quais a liberdade passou a ser um simples detalhe, dependente de uma infinidade de regras que, ao fim e ao cabo, colocam a liberdade no fim de uma fila de exigências. A situação é simples quando se pensa que, quanto maior o Estado, menor é o cidadão, e pequena a sua chance de encontrar a liberdade. A verdade é que a união do Estado com o governo cria um outro elemento, representado por um retorno saudoso e nada saudável do despotismo ilustrado, em que as autoridades se sentem imbuídas da missão de recivilizar a sociedade, tornando-a palatável aos novos tempos.
Por outro ângulo, nesse caso, a liberdade induz os indivíduos a fugirem da dependência. Antigamente se dizia que “quem aluga seu traseiro, não senta onde quer”. A dependência, induzida por políticas do tipo paternalistas, é um dos entraves à liberdade e um indutor do despotismo. A liberdade é o que é, e não pode ser amenizada apenas por conquistas materiais. A liberdade, em si, é um ato de independência. Há casos, porém, nos quais a liberdade é fomentada apenas pelo medo da servidão, e isso, convenhamos, não é liberdade. Não há dúvidas de que essa é uma questão central e profundamente atual: é possível manter a democracia plena quando o Estado se sobrepõe à sociedade, tornando-se mais forte que ela?
Em A Democracia na América, Tocqueville alertava para o risco do que chamou de “despotismo suave”: um Estado que, em vez de oprimir de forma brutal, cuida dos cidadãos como um pai benevolente, mas infantiliza-os ao ponto de retirar-lhes a autonomia. “O soberano estende seus braços sobre a sociedade como uma rede de regras sutis e complicadas… Ele não quebra as vontades, mas as amolece, dobra e dirige; raramente força a agir, mas, constantemente, opõe-se a agir.” Para Friedrich Hayek, em O Caminho da Servidão, o crescimento do Estado intervencionista leva, inevitavelmente, à perda das liberdades individuais. Ele via no planejamento centralizado uma ameaça à ordem espontânea da sociedade. Dizia ele: “Quanto mais o Estado planeja, mais difícil se torna para o indivíduo planejar”.
A crítica de Hayek ao estatismo ecoa na observação de que o cidadão se torna aos poucos refém do próprio Estado. Isaiah Berlin, em sua clássica distinção entre liberdade positiva e liberdade negativa, alertou para o risco de regimes que, em nome de uma liberdade “superior” (positiva), justificam a coação. Essa liberdade positiva, quando apropriada pelo Estado, pode levar ao autoritarismo. Ou seja: “A liberdade para o lobo é a morte para o cordeiro”. Essa frase ilustra como o poder estatal, ao tentar moldar a sociedade, pode sacrificar a liberdade de alguns sob o pretexto de proteger ou educar o coletivo, algo próximo do arcaico despotismo ilustrado.
Benjamin Constant, por sua vez, diferenciava a liberdade dos antigos (participação direta na política) da dos modernos (autonomia individual frente ao Estado). Para ele, “a liberdade é o direito de não ser submetido senão às leis, de não ser preso, nem detido, nem morto, nem maltratado de nenhum modo pela vontade arbitrária de um ou vários indivíduos”. Essa ideia reforça o ponto de que a liberdade é um valor em si, não uma concessão do Estado nem um subproduto do bem-estar material.
Hannah Arendt, em Origens do totalitarismo, lembra que a perda da liberdade começa quando o cidadão troca sua autonomia por segurança ou conforto, e que a burocracia é uma das formas mais sutis e eficientes de dominação. “A burocracia é o governo de ninguém, e, portanto, talvez o mais tirânico de todos.” A verdadeira liberdade, como ato de independência e não como simples ausência de grilhões, não pode ser administrada, muito menos concedida, por políticas paternalistas ou por um Estado tutor. A democracia plena exige um Estado limitado, transparente e controlado pela sociedade civil, e não o contrário. Quando o Estado cresce demais e passa a ditar os termos da liberdade, resta ao cidadão lembrar a lição de Étienne de La Boétie, em seu Discurso da Servidão Voluntária: “Resolvi apenas fazer-vos compreender que, para que deixeis de ser escravos, basta que não queirais mais sê-lo.”.
A frase que foi pronunciada:
“O país estava em perigo; ele estava colocando em risco seus direitos tradicionais de liberdade e independência ao ousar exercê-los.”
Joseph Heller, no livro Catch-22

História de Brasília
A 22 de novembro do ano passado, o sr. Raniere Mazzilli promulgou a resolução 63, que altera o regimento interno da Câmara dos Deputados em diversas partes, e criou, nessa oportunidade, a Comissão Permanente do Distrito Federal. (Publicada em 8/5/1962)
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Sendo o único animal que se move por interesses, o homem é, por conseguinte, um ser negociador. A política é, em si, a arte de negociar acordos, estabelecendo pontes. O impasse enfrentado, agora, pelo Brasil com a taxação imposta pelos americanos aos produtos de nosso país, é a prova inequívoca de que negociar é tão importante quanto respirar. É, nesse ponto, quando a maré baixa, que vemos quem de fato estava nadando nu.
Fosse colocado como pré-requisito aos candidatos ao governo o notório saber nas artes de negociar, em todas as suas vertentes, quer seja na política, nos tratados econômicos, nos mercantis poucos ou quase nenhum de nossos candidatos às eleições atenderiam essa exigência. O fato é que o bem-estar da população vem do direcionamento correto nas negociações. No caso do Estado, as negociações são feitas para atender as necessidades reais de sua população, e não para as pretensões dos governos. Não por outra razão, os países que mais se destacam na qualidade de vida dos seus cidadãos são, justamente, aqueles que têm sob seu comando pessoas dotadas da habilidade da negociação. Países que não têm em seus governos dirigentes que saibam negociar, ou nada entendem desse mister, são justamente aqueles em que as populações são as mais atingidas por crises cíclicas e profundas.
Negociar, antes de ser uma ciência humana, é uma arte delicada, em que é possível encontrar o ponto de equilíbrio entre interesses diversos e diferentes. Só a boa negociação torna o negócio rentável, embora se saiba que, na verdadeira negociação, todos acabam ganhando. O que fez do Itamaraty o que ele era nas relações internacionais foi, justamente, essa capacidade que os representantes do Brasil tinham de bem negociar. Hoje, essa fama ficou no passado, substituída por variantes outras, como conceitos moldados em argamassa, o que não propicia riqueza e, sim, dependência.
À luz de fatos concretos recentes, divulgados pela imprensa econômica e por agências de comércio internacional, é notório que, nos últimos meses, os Estados Unidos anunciaram, oficialmente, novas tarifas sobre produtos importados do Brasil, com destaque para o aço e o alumínio, setores historicamente sensíveis. A justificativa americana, como de praxe, é de “segurança nacional e protecionismo econômico”, mas há claros elementos geopolíticos e de pressão comercial em jogo. Em alguns casos, o Brasil foi equiparado a países como China e Rússia, no que diz respeito a barreiras tarifárias, o que é um indicativo preocupante de perda de prestígio diplomático.
Segundo dados da ComexStat e do Ministério da Indústria e Comércio, em 2024, o Brasil exportou mais de US$ 4 bilhões em produtos metálicos aos EUA. Com as novas taxações, parte significativa desse comércio se tornará inviável, o que pode levar à perda de milhares de empregos na cadeia industrial brasileira e à retração em polos siderúrgicos importantes, como Minas Gerais e Espírito Santo. Enquanto alguns países, como México, Canadá e Coreia do Sul, conseguiram renegociar, ou pelo menos adiar a aplicação de tarifas unilaterais por parte dos EUA, o Brasil tem se mostrado desinteressado em buscar soluções diplomáticas reais. O Ministério das Relações Exteriores emitiu apenas notas protocolares, e não há registros de ações contundentes de pressão junto à Organização Mundial do Comércio (OMC) ou tentativas de construir coalizões diplomáticas multilaterais, como seria esperado em uma situação com tamanho impacto.
A condução da política externa brasileira tem sido reiteradamente eivada de desprezo. Isso transforma negociações comerciais em palco de confronto simbólico, e não em arenas de construção de consenso que dê segurança à população e aos investidores. Em vez de usar as instituições multilaterais, a diplomacia técnica e o pragmatismo, o Brasil tem optado por respostas retóricas e, até agora, ineficazes. As consequências para a população brasileira serão severas.
A médio e longo prazo, os impactos de uma diplomacia ineficiente recaem diretamente sobre a sociedade brasileira, na forma de desemprego em setores exportadores sensíveis; aumento da informalidade, especialmente, em regiões industriais; inflação decorrente da instabilidade cambial e perda de competitividade; isolamento comercial, dificultando a entrada do Brasil em cadeias globais de valor; além de uma diminuição de investimentos estrangeiros diretos, dado o risco percebido pelos investidores sobre a previsibilidade política e econômica do país.
Estudo recente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) estima que o Brasil perde até R$ 40 bilhões ao ano por não integrar acordos comerciais relevantes com países desenvolvidos, muitos dos quais são parceiros históricos dos EUA. Negociar nesse mundo globalizado é governar. Resta saber que interesses o atual governo tem para tirar o Brasil da roda. O país enfrenta o mundo com discursos, enquanto os demais países negociam com cláusulas, garantias, acordos e assinaturas.
Negociar não é sinal de fraqueza, é expressão de inteligência estratégica. O Itamaraty já foi referência global em diplomacia técnica, tendo desempenhado papel central em fóruns como a Rodada de Doha, da Organização Mundial do Comércio (OMC) ou nas negociações do Acordo de Paris. Hoje, essa herança foi desperdiçada. Se quisermos garantir prosperidade interna e relevância internacional, é urgente resgatar a arte da boa negociação, entendendo que, em um mundo interdependente, a soberania real é exercida com inteligência e diálogo, e não com trincheiras ideológicas e outras opções nada práticas. A questão é: há interesse em garantir a prosperidade do povo desta nação?
A frase que foi pronunciada:
“A ciência é inerentemente antiautoritária tal como a democracia. Ao contrário do que por vezes se julga, em ciência não existem autoridades, mas sim especialistas, pois apenas à realidade se reconhece autoridade para escolher entre hipóteses rivais.”
Timothy Ferris

História de Brasília
Um dos graves problemas do ex-Distrito Federal é o do trânsito. A cápsula que conduziu Glen Jr. Ao kosmos levou, do Galeão para a Cinelândia, um terço do tempo que gastou para uma volta em tôrno da Terra. (Publicada em 6/5/1962)
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Dizem, com propriedade, que a arte imita a vida. No caso da arte da cartografia, surgida por volta do ano 2.500 a.C. com os Sumérios e aperfeiçoada nas escolas de Alexandria e Atenas, essa arte foi talvez a mais importante desenvolvida pelo gênio humano para entender o mundo à volta, tornando possível sua exploração com mais segurança e objetivo.
Hoje tornou-se comum aceitar o fato de que a cartografia serve também para ilustrar não só a realidade física e topográfica do lugar, mas também sua realidade social, econômica, histórica e cultural, portanto trata-se de um campo complexo em constantes mudanças e que exige elaborada e rigorosa investigação científica.
Trata-se aqui de um retrato fiel ou fotografia do mundo como ele é, e não como querem alguns, para quem o mundo deve ser retratado como desejam governos e conceitos de plantão. No caso daqueles países virados de cabeça para baixo, não por ação da inversão dos polos magnéticos, mas pela inversão de valores, a cartografia pode servir também para tentar conferir uma nova e fantasiosa realidade bem ao gosto dos novos mandatários, para os quais a realidade é o que eles querem que seja. Deste ponto, chegamos ao Mapa do Brasil e do globo virados de cabeça para baixo e apresentados ao público pelo presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Marcio Pochmann, e a ex-presidente Dilma Rousseff.
Como resultado dessa empreitada geográfica, o Brasil ficou situado no centro do mundo, como o hemisfério Sul indo parar no topo. Para seu idealizador, a novidade visava ressaltar a atual liderança de nosso país em fóruns como os Brics e a COP 30 nesse ano. É tal da importância crescente do chamado Sul Global, que a novilíngua na atualidade significa destruir a hegemonia do dólar e dos Estados Unidos, substituído agora por outros players como a Rússia, China e outros parceiros dessa empreitada ideológica.
Para um país como o nosso, que está sendo virado pelo avesso, normalizando absurdos e indo de encontro ao que hoje é Cuba, Venezuela, Nicarágua e outros países do nosso continente, a reviravolta geográfica faz todo o sentido. Num país virado e cabeça para baixo, o povo é triste, as perspectivas são nulas e fazer oposição é risco de vida. Nada mais natural então do que apresentar o Brasil de cabeça para baixo.
Pochmann, com sua inteligência aguçada conseguiu o que muitos cartunistas nem pensavam: ilustrar um país na sua condição real de momento. O episódio do “mapa de cabeça para baixo” é um símbolo perfeito de uma era em que a percepção da realidade é disputada como nunca. A cartografia, que sempre foi uma ferramenta objetiva para representar o mundo, agora é usada como palco de convicções particulares e políticas. A inversão do mapa é um gesto que vai muito além do design gráfico: ele traduz uma tentativa de reescrever o papel do país no tabuleiro global, ainda que de forma simbólica. Ao ser apresentada como um ato de afirmação política, ela escancara uma tendência: a de usar símbolos e discursos para criar uma sensação de grandeza que não necessariamente corresponde à realidade socioeconômica do país.
Enquanto se fala em “liderança global” e na força do chamado “Sul Global”, o Brasil enfrenta algumas crises internas na área econômica, de segurança e de relações internacionais. A cartografia, nesse contexto, vira metáfora: ao colocar o Brasil no “alto do mapa”, tenta-se transmitir uma ideia de protagonismo que o cotidiano do cidadão comum não sente. Essa crítica faz sentido ao lembrar que, em um país onde valores estão sendo “invertidos”, no sentido de normalizar o absurdo, ver o mapa de cabeça para baixo soa como uma imagem fiel de um momento de distorções.
Talvez, o maior mérito dessa polêmica seja justamente o de escancarar, por meio de um símbolo simples, o quanto a realidade está sendo “desenhada” de acordo com certas conveniências. O Brasil, ao que parece, não está apenas no centro do mapa, mas no centro de uma inversão de valores, normalizando absurdos em suas tentativas de reescrever nossa história com tintas carregadas de tons cinzentos e vermelhos. Como já diziam alguns seres maléficos, a propaganda é a arte de fazer com que as pessoas esqueçam a realidade, acreditando numa mentira do tamanho do mundo, tornado palatável a revolução que os leve, sem protestos, a um governo autocrático capaz de enganar a tantos com tão pouco.
A frase que foi pronunciada:
“Não devo a ninguém minhas eleições, a não ser ao povo desse país”.
Lula em discurso ontem no Vale do Jequitinhonha
História de Brasília
O comércio de Brasília está atormentado com o numero de publicações clandestinas que vem circulando nesta capital. Como não poderia deixar de ser, a imprensa marrom está nestes casos, extorquinto dinheiro e impondo-se através de chantagens. (Publicado em 06.05.1962)
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Com a aprovação pelo Congresso do projeto de lei que flexibiliza o licenciamento ambiental, a delicada questão do meio ambiente no Brasil ganha novos e perigosos elementos, podendo colocar o Brasil, mais uma vez, sob os olhares do mundo civilizado e, com isso, gerar mais empecilhos à aceitação dos produtos nacionais nos mercados externos, sobretudo, naqueles países da Europa que exigem certificado de que esses alimentos são produzidos sem ameaças ao ecossistema.
Para a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, a aprovação dessa flexibilização “decepou a legislação sobre o assunto no Brasil”. Para ela, essas novas permissões não vieram para aperfeiçoar as leis que levem a ganhos ambientais. Os deputados simplesmente ignoraram as propostas de alterações feitas pela ministra, preferindo atender a bancadas dos ruralistas e a interesses do próprio governo, como são os casos dos ministros da Agricultura, Portos e Aeroportos e o ministro dos Transportes. O próprio governo preferiu não apresentar defesa dos pontos de vista da sua ministra, esquivando-se de uma posição em favor da defesa do meio ambiente.
Marina, como em outras oportunidades, ficou sem apoio do próprio governo que faz parte. A ministra é hoje, literalmente, uma voz solitária a clamar no deserto contra o avanço de um progresso que não olha ao redor, passando por cima de florestas e animais. Mas, devido à grande celeuma causada, é possível que essa aprovação vá também ser encaminhada à apreciação do Supremo Tribunal Federal. Há pouco menos de quatro meses para a realização da COP30, conferência de clima da ONU em Belém, essa flexibilização ou liberação geral surge quase como um deboche. Meses atrás, a ministra já se viu abandonada na questão da exploração de petróleo na Margem Equatorial, onde os riscos ambientais são imensos. A liberação de projetos estratégicos, como define o governo, parece ser o caminho escolhido pelos políticos em detrimento da defesa do nosso bioma.
Os sinais de desprestígio de Marina Silva não são novos, mas se tornaram mais evidentes nas últimas semanas. No episódio da flexibilização do licenciamento, ela foi completamente ignorada pelo Congresso e deixada de lado pelo próprio Palácio do Planalto. Nenhum ministro relevante, tampouco o presidente, saiu em sua defesa. Pelo contrário, setores do governo, como os ministérios da Agricultura (Carlos Fávaro), Transportes (Renan Filho) e Portos e Aeroportos (Silvio Costa Filho), atuaram ativamente em prol da aprovação do projeto, revelando uma escolha clara: entre desenvolvimento imediato e sustentabilidade, optou-se pelo primeiro. Esse desprezo já havia se mostrado antes, como no caso da tentativa de exploração de petróleo na Margem Equatorial. Mesmo diante de pareceres técnicos e científicos apontando os enormes riscos ecológicos de perfuração naquela área sensível, a pressão política e econômica falou mais alto. Marina, mais uma vez, ficou sozinha, como se sua presença no governo servisse mais a fins simbólicos do que operacionais. É o que se poderia chamar de “ambientalismo decorativo”.
O paradoxo é evidente: faltando menos de quatro meses para a realização da COP30, em Belém do Pará, o governo brasileiro se vê promovendo medidas que esvaziam completamente seu discurso ambiental no plano internacional. A conferência é uma das maiores vitrines diplomáticas do país, uma chance de mostrar liderança e comprometimento com as metas de descarbonização, conservação de biomas e justiça climática. No entanto, a liberação desmedida de obras classificadas como “estratégicas”, sem o devido rigor ambiental, enfraquece qualquer tentativa de credibilidade externa. Para países europeus que exigem rastreabilidade e responsabilidade ecológica na cadeia produtiva de alimentos como Alemanha, França e Holanda, a nova legislação brasileira é um sinal vermelho. Já há movimentos no Parlamento Europeu que discutem barreiras técnicas para produtos oriundos de países que desrespeitam princípios básicos de sustentabilidade. O Brasil, que já teve sua carne e soja embargadas por questões ambientais, pode voltar à lista de vilões do clima se continuar nessa direção.
A entrada da China como ator dominante na exploração mineral brasileira é outro ponto que expõe a fraqueza do Estado na defesa do meio ambiente. Diversas empresas chinesas, principalmente ligadas ao setor de mineração, têm intensificado sua atuação na Amazônia e no Cerrado, abrindo crateras e deixando rastros de destruição. Em estados como Pará, Maranhão e Mato Grosso, comunidades indígenas e quilombolas denunciam a atuação predatória de mineradoras que, com aval ou omissão do Estado brasileiro, atuam sem qualquer compromisso com a regeneração ambiental ou o bem-estar social. A busca por lítio, nióbio, ouro e terras raras, transforma o subsolo brasileiro em um novo “eldorado” para interesses estrangeiros, reproduzindo uma lógica colonial: extrai-se tudo, o lucro vai embora, e o que resta é a contaminação de rios, aumento de conflitos sociais e destruição irreversível da biodiversidade. Em nome do crescimento e da “soberania energética”, entrega-se o território ao saque legalizado.
O caso Marina Silva simboliza a crise da razão ambiental no Brasil. Enquanto os olhos internacionais voltam-se para nós com desconfiança, o governo se mostra incapaz de articular uma política ambiental coesa. Preferiu calar sua ministra em vez de ouvir a voz da prudência. Preferiu agradar aliados do agronegócio, do petróleo e da mineração a buscar equilíbrio entre progresso e preservação. Se o Brasil seguir nesse caminho, corre o risco de chegar à COP30 não como anfitrião de uma agenda verde, mas como réu no tribunal da história ambiental mundial. E Marina, por mais combativa que seja, não poderá evitar isso sozinha.
A frase que foi pronunciada:
“O patrimônio natural é a base da nossa economia.”
Marina Silva

História de Brasília
A indústria nacional deve ter mais zelo na apresentação de suas publicações. No catálogo da Volkwagen brasileira há um clichê de cabeça para baixo. (Publicada em 06.05.1962)
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O IOF é mais um imposto colocado nas costas dos cidadãos brasileiros. O governo conseguiu mais essa vitória ao recorrer ao STF para fazer valer o aumento nesse imposto, que é regulatório e não arrecadatório, como quer o Planalto. Em muitos países, esse tipo de imposto sequer existe, porque onera a produção como um todo e inibe investimentos. Esse é um ponto crucial da política tributária brasileira e levanta uma crítica legítima indiscutível: o uso indevido do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) como ferramenta arrecadatória, contrariando sua natureza original de instrumento regulatório.
Criado com a finalidade de regular a economia, o IOF atinge especialmente o mercado de crédito, câmbio, seguros e títulos. Em teoria, sua função é atuar como uma alavanca de política monetária, aumentando ou reduzindo custos de determinadas operações financeiras para conter ou estimular a atividade econômica, controlar a inflação, ou desincentivar a especulação. Não é, portanto, um imposto estruturalmente arrecadatório, como o IR ou o ICMS.
Nos últimos anos, porém, o IOF tem sido manipulado como uma válvula de escape fiscal, usada para elevar rapidamente a arrecadação diante de déficits públicos ou para cobrir rombos momentâneos no orçamento. Isso desvirtua sua essência e imputa um custo adicional injusto à população e às empresas, sobretudo as pequenas e médias, que dependem de crédito rotativo ou empréstimos para operar. Não se iludam: o aumento do IOF afeta diretamente o crédito pessoal e empresarial, elevando o custo final de financiamentos, empréstimos e operações de leasing; os cartões de crédito internacionais, que já têm taxas altíssimas de juros; o câmbio e investimentos estrangeiros, desestimulando a entrada de capital externo no país e os seguros, que encarecem custos logísticos e operacionais em vários setores.
Esses efeitos criam um ambiente hostil para o empreendedorismo e a inovação, e penalizam o consumo das famílias, que já convivem com carga tributária altíssima — mais de 33% do PIB. Em muitos países desenvolvidos, não há equivalente ao IOF. Ou, quando existe, não se presta ao papel de arrecadação, mas sim a regulações pontuais e temporárias. É o caso de países da OCDE, onde tributos são mais transparentes e previsíveis.
No Brasil, ao contrário, o IOF pode ser alterado por mera canetada do Executivo, o que causa insegurança jurídica. Acabar com o IOF tem sido uma das condições impostas pela OCDE para a entrada do país nesse bloco. Ao recorrer ao STF para manter o aumento do IOF, como tem feito seguidamente e com êxito, o governo desrespeita o espírito do imposto e contorna o debate legislativo, ferindo o princípio da legalidade tributária. É uma “vitória” institucional que, na prática, aumenta o peso sobre o cidadão comum e sufoca, mais uma vez, o setor produtivo, já tão penalizado nesse governo.
Como vem sendo usado e abusado, o IOF se tornou mais um imposto disfarçado, em uma estrutura já sobrecarregada de tributos. Seu uso indiscriminado demonstra o despreparo do governo em buscar soluções estruturais para o equilíbrio fiscal e reafirma a urgência de uma reforma tributária profunda, transparente e voltada à simplificação e à justiça fiscal.
Nesse sentido a tão esperada reforma tributária real, capaz de livrar o cidadão de uma das maiores cargas tributárias do planeta fica empurrada para um futuro distante e incerto. Especialistas em Direito Tributário como Luiz Bichara e Vanessa Canado (Insper) destacam que o IOF é um tributo extrafiscal, com natureza regulatória, mas que claramente foi usado para aumentar arrecadação e cobrir frustrações orçamentárias, o que configuraria desvio de finalidade e abuso do poder executivo.
Também os economistas Julio César Soares, Paula Pires e Bruna Fagundes ressaltam que o decreto ultrapassou a finalidade autorizada pela lei e pela Constituição, já que não houve justificativa regulatória, tornando-se uma manobra puramente arrecadatória. Economistas de mercado e acadêmicos, como é o caso de Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, afirma que usar o IOF para arrecadar “é um abuso de poder” que penaliza o crédito, especialmente de pequenas e médias empresas, e amplia desigualdades.
Também Felipe Salto (Warren Investimentos) aponta que o uso do IOF para arrecadar desvirtua sua função e deveria ser questionado judicialmente. Salto também destaca que a projeção de arrecadação crescente evidencia a mudança de propósito do imposto. Além disso, o BTG Pactual alerta que o aumento do IOF tende a frear a economia ao elevar ainda mais o custo do crédito em um contexto de Selic alta (14,75%), ampliando os efeitos negativos sobre investimento e consumo.
O consenso geral aponta para a necessidade de ajustes estruturais através de reformas e racionalização dos gastos públicos, em vez de medidas transitórias que sobrecarregam o cidadão comum e, impreterivelmente acabam nos tribunais.
A frase que foi pronunciada:
“Neste mundo nada pode ser considerado certo, exceto a morte e os impostos.”
Benjamin Franklin

História de Brasília
Concluídos os prédios dos supermercados, é preciso não esquecer de que êles devem ser entregues ao público em pleno funcionamento, e que já estão fazendo falta. (Publicado em 06.05.1962)
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A frase que foi pronunciada:
“Alternativas precisam ser apresentadas porque o governo não quer e não vai mudar a meta”.
Simone Tebet
História de Brasília
O panorama napolitano de roupas ao vento nas janelas e nos corredores, outrora privilégio das quadras 409-10 já se estendeu à Asa Norte. O Bloco 42 comanda o espetáculo. (Publicada em 06.05.1962)
VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)
Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade
jornalistacircecunha@gmail.com
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Analistas do cenário econômico, das mais diversas tendências políticas, concordam que, em 2027, o Brasil poderá reviver uma crise financeira e fiscal sem precedentes, por causa do desequilíbrio nas contas do governo. Num cenário dessa magnitude, a posição do presidente do Banco Central, Galípolo, passa a ser o alvo da atenção geral. Nesse ponto, ele pode oscilar entre o que quer um governo, às vésperas das eleições de 2026, o que deseja o mercado e o que anseia a sociedade. Caso abandone a realidade em benefício da ficção, o estrago pode ser ainda maior.
Galípolo sabe disso. O nome dele está no jogo, é bom lembrar. Talvez, nada disso o abale e tire o seu sono. Galípolo, por inércia política, é a figura do xeque-mate de uma crise já precificada. É também um profissional que, com afinco, conhece a matemática financeira, uma ciência exata, onde os desaforos aos números não são permitidos. Na posição de presidente do BC, Galípolo sabe que escalou o topo da carreira nessa área. E como tal é o comandante em chefe dessa nau Brasil desgovernada. Temos assim o script completo de um país à deriva em sua governança econômica, mas que, no leme, está agora o presidente do Banco Central.
Muitos o veem como uma figura-chave diante dos riscos de um colapso fiscal e financeiro de grande monta. Oscilar entre o que deseja o governo, o que exige o mercado e o que espera a sociedade, não é novidade, mas adquire uma dimensão crítica em períodos de instabilidade. Nessa encruzilhada, torna-se ainda mais evidente a necessidade de um Banco Central plenamente independente, blindado contra pressões políticas de curto prazo, especialmente em anos eleitorais como o de 2026.
A Lei Complementar nº 179, de 2021, que conferiu, ao Banco Central do Brasil, autonomia formal, foi um passo importante na institucionalização dessa independência. Porém, como indica o texto, na prática, essa autonomia é sempre desafiada quando o presidente da instituição se vê entre as engrenagens de interesses contraditórios. Galípolo, com formação sólida em economia e perfil técnico, representa a racionalidade diante da política fiscal, muitas vezes guiada por conveniências eleitorais. O risco de “abandonar a realidade em benefício da ficção” é um aviso contundente: o populismo econômico, disfarçado de programa político, tende a produzir distorções que não resistem à matemática dos juros, da dívida e do déficit. E aqui reside o valor estratégico da independência do BC: proteger a política monetária de aventuras irresponsáveis, sustentando credibilidade, combatendo a inflação e defendendo o real.
Quando se diz que Galípolo “é o xeque-mate de uma crise já precificada”, é possível entender também que, diante da iminência de desequilíbrios fiscais, a autoridade monetária é o último bastião da confiança. Se essa barreira for rompida por interferências políticas, os danos não serão apenas econômicos, mas institucionais. O país voltaria a um ciclo vicioso de descrença, fuga de capitais e deterioração macroeconômica. Por isso torna-se crucial reafirmar e preservar a independência do Banco Central.
Num Brasil onde os ciclos políticos são voláteis e a tentação de manipular variáveis econômicas para fins eleitorais é permanente, manter essa instituição técnica blindada é uma salvaguarda da própria democracia e da estabilidade econômica futura. No Brasil, entre os anos 80 e início dos 90, a coisa era mais preocupante. Antes da autonomia formal do Banco Central, o Brasil enfrentava hiperinflação, com picos como 84% ao mês em 1990. Governos usavam emissão de moeda e manipulação de juros para cobrir déficits públicos, uma prática desastrosa que corroía os salários e a confiança institucional. A estabilização só começou com o Plano Real (1994), quando o Banco Central passou a adotar uma postura mais técnica e coordenada com metas de inflação.
Aprovada em fevereiro de 2021, a Lei Complementar nº 179 conferiu ao Banco Central do Brasil autonomia formal, com os seguintes pilares de mandato fixo e não coincidente com o presidente da República (4 anos, renovável uma vez). Blindagem contra demissão sem justa causa; estabelecimento legal de metas de inflação como principal objetivo da política monetária e autonomia operacional para tomar decisões sobre taxa de juros (Selic), controle de liquidez e supervisão do sistema financeiro. Desde a autonomia, o Brasil tem conseguido manter a inflação dentro da meta em 2023-2024 (mesmo com pressões externas), e a política monetária tem sido mais previsível aos olhos dos investidores.
A frase que foi pronunciada:
“A economia de mercado é mais eficiente na seleção natural dos indivíduos do que a política ou a natureza.”
Ludwig Von Mises

História de Brasília
O belo trabalho do sr. Geraldo Carneiro: o Banco do Brasil autorizou a instalação de uma agência em Taguatinga. (Publicada em 05.05.1962)
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Diz-se que certas plantações prosperam mesmo em solos áridos, desde que bem irrigadas — mas há de se observar quem recebe a água. Em tempos de escassez, enquanto lavouras inteiras secam sob o sol impiedoso, há sempre um espantalho no meio do campo, robusto e muito bem alimentado. Dizem que ele serve para proteger, mas há quem suspeite que sua fome é insaciável.
Setembro passou e, com ele, veio a notícia de mais um recorde de “colheita”. Os celeiros estatais encheram como nunca, e houve quem comemorasse o feito como uma epopeia fiscal. Foi dito que jamais se viu tanto grão arrecadado em tão curto tempo. Mas o agricultor comum, aquele que planta no braço e colhe no suor, não parece ter participado da festa.
Num campo onde a responsabilidade pela terra foi trocada por planos mirabolantes de fertilização ideológica, o que se planta hoje são ilusões e o que se colhe amanhã são déficits. A abundância nas mãos do espantalho não reflete, infelizmente, a fartura no prato do povo. E quando a balança pesa para um lado só, a própria terra geme.
O curioso é que, mesmo com as cestas cheias de tributos, os armazéns nacionais continuam no vermelho. A explicação, segundo os que tudo sabem e nada explicam, seria o custo inevitável de manter o campo em “progresso”. O detalhe incômodo é que o progresso insiste em não chegar. Pelo contrário: o vento sopra mais frio, os insumos encarecem, e o povo recorre a velhas técnicas de sobrevivência — como plantar em silêncio, negociar sem recibo, e manter distância dos fiscais do espantalho. Números bem projetados nunca mentem. Mas podem ser ignorados, distorcidos, ou simplesmente ridicularizados. Afinal, já se tornou moda ajustar a lógica às crenças, e não o contrário. Por isso, quando o relógio econômico atrasa, dizem que é o tempo que está errado.
Enquanto isso, milhões de pequenos lavradores estão em dívida com o mercado, com o banco, com o vizinho — e até com o próprio guarda-roupa. A inadimplência atinge patamares tão vastos que, se fosse terra, seria um país. Sem crédito e sem chão firme, o consumo mingua, a produção trava, e o país parece girar num moinho vazio.
Há rumores de que o próximo ciclo será ainda mais severo. Mas os homens da enxada, que há muito deixaram de acreditar em promessas de safra farta, já tratam de construir abrigo com o que têm. E cada vez mais gente prefere plantar fora do campo oficial, longe dos olhos sempre atentos e da mão sempre estendida do espantalho.
É verdade que todo sistema de cultivo precisa de regras. Mas quando o imposto sobre a semente é maior do que o valor da colheita, não é difícil entender por que tanta gente larga a terra. A competitividade evapora como orvalho ao meio-dia, e os frutos que sobram não encontram mercado que os valorize. O Brasil, um pomar de riquezas naturais, torna-se pálido diante da concorrência estrangeira — sufocado, não por pragas, mas por sua própria condução.
No fim dessa estrada poeirenta, a desigualdade brota como erva daninha. E onde há fome e desesperança, a violência cresce como mato entre os paralelepípedos. Não é magia, nem surpresa: é só a velha e previsível consequência do descuido com a terra, da ganância do espantalho e da crença cega de que números são ideológicos. A colheita foi farta — para alguns. Para os demais, restam as migalhas e o silêncio.
A frase que foi pronunciada:
“A política é a arte de procurar problemas, encontrá-los em todo lugar, diagnosticá-los incorretamente e aplicar os remédios errados.”
Groucho Marx

ID
Dessa vez, os parlamentares estavam discutindo a lei que estende, para todas as pessoas com deficiência, a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados incidente sobre a aquisição de automóveis. Autoria do senador Romário e relatoria do senador Esperidião Amin. Enquanto isso, o senador Marcos Rogério indagou a razão de seu voto não ter sido contabilizado. O senador Omar Aziz apontou que era a digital, o problema. Deve ter desgastado um pouco, disse o senador Marcos Rogério olhando para o dedo.

Delegados
Antes da leitura de uma PEC, a então senadora Simone Tebet prometeu não tocar mais a campainha que interrompia os oradores. Havia muita gente desrespeitosa na sessão. Prontamente, o senador Esperidião Amin apontou para o Major Olimpio e o Senador Alessandro. “Eles são delegados! Podem resolver!” O senador Alessandro buscou mais um. “Contarato também.” Delegado é o que não falta por aqui. Arrancaram risadas de um ambiente pesado.
História de Brasília
O DAC cortou uma frequência da saída para São Paulo. É a linha mais barata (45% de desconto), que passará a ter somente três voos por semana. A Real, entretanto, com o mesmo equipamento, tem sete voos semanais. (Publicada em 05.05.1962)
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Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade
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Há países onde a política se parece menos com um pacto social e mais com um teatro repetido: os atores não mudam, os cenários se deterioram e a plateia já nem aplaude. Em uma dessas nações vizinhas, marcada por décadas de improviso institucional, surgiu, recentemente, uma voz dissonante. Um personagem que não saiu do camarim habitual da política, mas dos bastidores da crítica radical. Sua retórica era direta, sua proposta, disruptiva: o palco precisava ruir para que se pudesse construir um novo espaço de representação.
Ele começou sua reforma por onde poucos ousam: pela simbologia do poder. Disse, com franqueza desconcertante, que ninguém representa mais do que aquele a quem representa. Como num mercado, o derivativo não pode valer mais do que o ativo. Ou seja, o político não pode custar mais caro do que o povo que o sustenta. Essa máxima — simples, porém subversiva para certos círculos — tornou-se eixo de sua proposta. Redefiniu a lógica do serviço público como um espaço de responsabilidade, e não como um pedestal.
Ao observarmos o que se passa por lá, é difícil não notar o abismo entre aquele movimento de enxugamento institucional e outras realidades onde o Estado se agiganta não para amparar, mas para dominar. O novo dirigente iniciou cortes drásticos: ministérios fundidos ou extintos, contratos revistos, subsídios revogados. A máquina pública deixou de ser monumento de privilégios para ser submetida à regra do equilíbrio. Um ajuste fiscal profundo foi aplicado, com cortes em obras, cargos e repasses que, por anos, serviram a interesses cruzados.
Não se trata de um simples programa de contenção de gastos, mas de uma tentativa de refundar o edifício institucional sobre bases menos clientelistas. E, curiosamente, é justamente isso que tem causado escândalo. Porque, onde se havia normalizado o excesso, a austeridade soa quase como heresia. O desconforto que essas mudanças têm provocado é, em si, revelador: expõe a dependência de muitos grupos à gordura do Estado.
Entre os alvos, estão estruturas sindicais que, por muito tempo, funcionaram como satélites de poder, mais interessados na perpetuação de sua influência do que na defesa do trabalho real. Há quem veja, nesse embate, ecos de outras geografias: sistemas onde o sindicalismo se tornou braço de partidos, e os partidos, extensões de projetos pessoais. O paralelo não é forçado. O líder vizinho reconheceu essas estruturas como parte da engrenagem que emperrou seu país e propôs reformas para flexibilizar, modernizar e desburocratizar relações de trabalho.
No plano simbólico, cortou também regalias históricas: pensões especiais, carros oficiais, gabinetes inchados. Propôs que o erro político deixasse de ser custo social e passasse a ser ônus individual. Ou seja: quem erra, paga. Como em qualquer outra profissão. Isso, claro, desafia o pacto informal da impunidade, que vigora em muitas democracias capturadas por seus representantes. Afinal, exigir do político o mesmo sacrifício que se exige do cidadão comum é, para muitos, uma afronta.
O mais curioso, porém, é que essa nova liderança não se vende como herói. Seu discurso é o do sacrifício, não da redenção. Seu projeto não é a conciliação de forças, mas o enfrentamento direto das distorções. Isso lhe rendeu inimigos poderosos, resistência parlamentar e uma tempestade midiática. Mas também lhe garantiu apoio popular entre aqueles que, cansados da linguagem pasteurizada da política tradicional, encontraram nele um eco de suas próprias frustrações.
Há muito a ser provado, e o caminho está longe de ser pacífico. As medidas são duras, e os efeitos sociais podem ser profundos. Mas ignorar o diagnóstico seria perpetuar o colapso. A crise daquele país não começou com esse governo; ela foi gestada por décadas de populismo fiscal, aparelhamento institucional e desprezo pela responsabilidade. O novo dirigente apenas decidiu não fingir mais que não vê.
Enquanto isso, em outros cantos, a lógica se mantém invertida. O Estado continua a crescer enquanto os serviços públicos encolhem. Os representantes se isolam em suas fortalezas burocráticas, enquanto a população se debate com a ineficiência. E as reformas estruturais continuam sempre “para depois”, como se houvesse tempo eterno para resolver o insustentável.
O que acontece ali — nesse vizinho barulhento e em convulsão — é, talvez, o prenúncio do que outros também terão de enfrentar. Porque o modelo da abundância política em tempos de escassez social chegou ao seu limite histórico. E quando o leão já não defende o rebanho, mas o devora, os cordeiros — mais cedo ou mais tarde — deixam de confiar no cercado.
A frase que foi pronunciada:
“Três coisas devem ser feitas por um juiz: ouvir atentamente, considerar sobriamente e decidir imparcialmente.”
Sócrates

História de Brasília
A Universidade de Brasília solicitou ao IAPI e êste à Novacap para que sejam abertas fossas “provisórias” para os blocos 4 e 7 da superquadra 305. Nada mais absurdo. Ou muda tudo ou não deve haver privilégio em detrimento de outros. (Publicada em 05.05.2025)



