Isso é o Brasil

Publicado em ÍNTEGRA

DESDE 1960 »

aricunha@dabr.com.br

com Circe Cunha com MAMFIL

Se é difícil para os estrangeiros entenderem o Brasil, para a população que aqui vive, majoritariamente, composta por trabalhadores de baixa renda, é perda de tempo buscar sentido racional para o que acontece no dia a dia, principalmente com relação à escalada dos preços. Mesmo para os padrões americanos e europeus, os valores cobrados por diárias de hotéis e restaurantes de padrão médio no Brasil são extremamente mais elevados do que os preços desses mesmos serviços no exterior. São inúmeros os impostos e tributos que incidem sobre todos os bens de consumo. No ciclo fechado dos impostos, o único beneficiário direto é o governo, ou, mais precisamente, a gigantesca máquina administrativa do país que absorve o grosso da renda.

Além disso, o povo brasileiro não exerce a cidadania como outros povos. Associações, institutos, até agora, ninguém foi capaz de unir a população para cobrar do Estado o cumprimento de suas obrigações. Na década de 1960, sem Twitter, Facebook ou WhatsApp, as donas de casa conseguiam se mobilizar propondo boicote instantâneo aos produtos com preços abusivos ou a estabelecimentos com atendimento a desejar. Hoje, curiosamente, com todo esse aparato tecnológico, o máximo que se vê são piadas engraçadíssimas, mas sem efeito prático algum.

Difícil explicar em qualquer língua que apesar de possuirmos enormes jazidas de petróleo e contarmos com uma empresa com grande expertise na exploração, refino e distribuição desse mineral, temos o combustível mais caro e misturado do planeta. Como fazer entenderem outros povos quando afirmamos ter o maior rebanho de bovinos e frangos do planeta, se, nos supermercados, esses são artigos que só podem ser comprados por uma minoria?

Impossível que os estrangeiros entendam que somos o celeiro do mundo e temos milhões de quilômetros quadrados de terra perfeitamente agricultáveis, exportando grãos diversos para todos os cantos do planeta e nas gôndolas dos supermercados e nas feiras de rua o quilo do feijão, que é o alimento básico da população, chega a custar mais de US$ 6?

Qual a explicação para o fato de possuirmos 7.491 quilômetros de extensão de litoral e 200 milhas náuticas de mar territorial e termos uma produção e um consumo irrisório de pescado e derivados do mar? Como explicar os preços exorbitantes desses produtos para o consumidor? Como pode encontrarmos no mercado peixes vindos da China? Pior. Como um povo que vê na Constituição artigos que lhe garante saúde, transporte e educação e apesar disso ter que buscar plano de saúde, escolas particulares e usar o próprio carro por falta da mobilidade e esse mesmo povo reage com samba e futebol?

Nossos cientistas precisam deixar o Brasil para poder trabalhar e desenvolver projetos. Quem entende isso? Somos a Pátria Educadora que não educa; e que permite campanhas, comerciais, novelas e programas totalmente deseducativos. Nada foi feito efetivamente contra as baixarias na televisão. Talvez porque baixaria já não seja a mesma coisa. Valores e preços são substantivos que se misturam.

As mesmas interrogações se repetem para tudo o que produzimos e consumimos. Se repetem também para a complacência ao saber que há corrupção no samba, no futebol, na educação, na saúde, no transporte e, mesmo assim, a troca de informações nos meios eletrônicos se resumem em piadas ou, no máximo, colheres batendo em panelas. Melhor resumir essas questões com a frase enigmática: Isso é o Brasil.

A frase que foi pronunciada

“Os estrangeiros, eu sei que eles vão gostar, tem o Atlântico, tem vista pro mar. A Amazônia é o jardim do quintal e o dólar deles paga o nosso mingau.”

Raul Seixas

Até quando?
Por falar nisso tudo, a Secretaria de Educação do DF ainda não adotou nas escolas o livro de Marcelo Capucci e Marcos Linhares, Faço, separo, transformo. Tem gente em Londres que já se interessou. Precisa ser assim? Nunca vamos valorizar os nossos escritores, atores, músicos, cientistas, pintores, escultores…

História de Brasília

Estão falando muito em moratória para o comércio em Brasília. Será um descalabro. Basta que a Novacap pague suas dívidas, e o comércio de Brasília funcionará que é uma beleza (Publicado em 12/9/1961)

* Expecionalmente, republicamos a coluna de 9 de agosto de 2016

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