Severino Francisco
Em decisão histórica, na última sexta-feira, o Tribunal Superior Eleitoral tornou o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível por oito anos,. O ex-presidente não pode reclamar de perseguição política, de ativismo judicial ou de injustiça. A sua condenação é uma questão de honra ao mérito.
Foi ele mesmo que se autocondenou graças às mentiras em série que proferiu durante reunião com embaixadores de vários países, realizada no Palácio da Alvorada, transmitida pela EBC e bombardeada pelas redes sociais, depois de constatar que estava em desvantagem nas pesquisas eleitorais para a disputa à presidência da República.
Durante o encontro, levantou suspeitas infundadas contra as urnas eletrônicas, atacou a honra de ministros do TSE, fez propaganda do seu governo, se jactou de ter realizado uma gestão impecável da crise sanitária na pandemia da covid-19 e se apresentou como mártir perseguido pelo Judiciário. Como disse um dos criadores do projeto Ficha Limpa, o ex-presidente gabaritou todos os requisitos para ser condenado à inelegibilidade.
Durante o voto que selou a inelegibilidade do ex-presidente, a juíza Carmem Lúcia enfatizou que não existe democracia sem judiciário forte. E os golpistas assinaram embaixo. Basta constatar que nas minutas da conspiração encontradas com altas autoridades do governo anterior, o primeiro ponto do roteiro era dissolver o TSE e o STF.
Na tentativa de defender o indefensável, um juiz precisou fazer um malabarismo: afirmou que as urnas eletrônicas brasileiras são as mais confiáveis do mundo e, ao mesmo tempo, que as palavras de suspeita lançadas pelo ex-presidente contra o sistema eleitoral eram “apenas palavras.”
Palavras mentirosas, seria possível acrescentar, palavras falaciosas, replicadas nas faixas de manifestantes antidemocráticos, repetidas nas redes sociais, usadas na depredação aos monumentos da democracia em 8 de janeiro e adotadas por parcela das Forças Armadas.
O ex-taxista Alan Diego dos Santos, que colocou uma bomba perto de um caminhão de querosene nas imediações do Aeroporto de Brasília, no fim do ano passado, afirmou à CPI da Câmara Legislativa do DF sobre a depredação de 8 de Janeiro em Brasília, que participou dos acampamentos golpistas porque duvidava do código-fonte das urnas eletrônicas.
Ao ouvir a informação, o presidente da CPI distrital, deputado Chico Vigilante, perguntou a Alan o que era o código-fonte. Ele respondeu que não sabia. Ora, o código-fonte é apenas um manual de funcionamento das urnas. Quer dizer, Alan Diego dos Santos colocou uma bomba embaixo de um caminhão de querosene e quase provocou uma catástrofe por causa de uma mentira.
Não custa lembrar que, em agosto de 2022, o ex-ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira pediu ao TSE, em documento “urgentíssimo”, acesso ao código-fonte das urnas eletrônicas. Detalhe: o código-fonte estava disponível a todos os interessados desde outubro de 2021. As palavras têm consequências.
Os políticos pretendem ser semideuses inimputáveis. Mas o fato de ser votado por milhões de eleitores não confere a nenhuma excelência o direito de pairar acima das leis e cometer crimes. A soberania do voto é um requisito essencial, mas não absoluto.
Sim, a luta será longa para desfazer o legado destrutivo dos últimos quatro anos, no entanto, a condenação à inelegibilidade do ex-presidente foi uma vitória muito importante para a democracia. Não é preciso ativismo judicial, basta aplicar a lei. A democracia acima de tudo, a Constituição acima de todos. A verdade vos libertará.
De fato, foi uma vitória muito importante para a democracia. Não é preciso ativismo judicial, basta aplicar a lei. A democracia acima de tudo, a Constituição acima de todos. A verdade vos libertará.