Severino Francisco
Os músicos estão assanhados com o reconhecimento do choro como patrimônio cultural material e imaterial do Brasil, promulgado na semana passada. Beth Ernest Dias prepara a segunda edição revista e ampliada de Avena de Castro, a cítara e o choro em Brasília, livro que reconstitui a pré-história do gênero na cidade, a partir dos encontros no apartamento do jornalista Raimundo Brito.
Guardadas as devidas proporções, o apartamento de Raimundo Brito tem a importância para a história do choro em Brasília que a casa da Tia Ciata teve para o samba. Lá, se reuniram os primeiro grupos de chorões brasilienses. Para a surpresa de todos, Jacob do Bandolim, que estabeleceu conexões com músicos de Brasília, afirmou que Avena de Castro era o seu melhor intérprete.
Enquanto isso, o Clube do Choro e a Escola Raphael Rabello anunciam a criação do Choro Popular Orquestra de Brasília, que abrirá um mercado para a profissionalização de instrumentistas. E tem mais: assisti vídeos do Rio de Janeiro, de Minas Gerais e do Pará, com músicos celebrando o reconhecimento simbólico da melhor maneira: tocando Pixinguinha, Ernesto Nazareth, Jacob do Bandolim ou Waldir Azevedo.
O reconhecimento do choro como patrimônio cultural brasileiro foi pedido pelo Clube do Choro de Brasília e, em seguida, pela Casa do Choro do Rio de Janeiro e o Clube do Choro de Santos. O choro é uma legítima invenção do povo brasileiro, numa mistura de traços da cultura europeia, africana e indígena, que construíram e constroem o Brasil.
Reco do Bandolim, o presidente do Clube do Choro, ressalta que o chorinho tem o dom de conectar as pessoas. Além disso, é um bem que inspira a criação de direitos de cidadania e de relações de pertencimento. A celebração é de todos os músicos que tocam chorinho nos mais diversos pontos do país.
Em matéria de choro, nós somos privilegiados porque, com a mudança da capital, muitos instrumentistas de primeira linha, que eram funcionários públicos vieram para Brasília. Ao se mudar do Rio para a capital modernista, Bide da Flauta, o instrumentista preferido de Pixinguinha, resolveu comprar uma espingarda, pois os jornais cariocas diziam que havia muita onça em Brasília.
Mas ele não encontrou nenhuma onça; topou com Pernambuco do Pandeiro, que logo o convidou para animar as rodas de choro com Waldir Azevedo, Tio Nilo do Trombone e Alencar Sete Cordas, entre outras feras. Antes, Jacob do Bandolim tinha passado e deixado sua marca em Brasília. Só faltou Pixinguinha se mudar para Brasília. Como bem dizia Darcy Ribeiro, só se fazem mestres com mestres.
No entanto, todo esse talento poderia se perder se não fosse a profissionalização do Clube do Choro e da Escola de Choro Raphael Rabello. Antes da escola, choro era considerado “música de velhos”; mas, depois, tornou-se música dos jovens e de pessoas com todas as idades.
Para além do reconhecimento simbólico, a perspectiva mais importante que se abre é a da introdução do choro nas escolas da rede pública para crianças e adolescentes. É parte de uma educação para ser mais brasileiro. O choro pode ser a música do futuro. É fascinante e agregadora. Chorinho parece drible de Mané Garrincha ou voo de beija-flor, com seus volteios caprichosos, velozes, leves, elétricos e ziguezagueantes.
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