Severino Francisco
Enquanto o mundo explode, folheio o volume 5 da coleção Histórias de Brasília – Mitos e verdades, escrito em parceria pelo publicitário João Carlos Amador e pelo poeta Nicolas Behr. Animados pelo espírito bem-humorado da obra, os dois se autoapresentam de maneira inventiva e divertida nas orelhas do livro. A leitura do livro magro, mas com sustança de informação, é saborosa.
Vamos a alguns aperitivos. As relações entre Renato Russo e o projeto Cabeças, comandado por Néio Lucio, realizado na comercial da 311 Sul, e, em um segundo momento, na Rampa Acústica do Parque da Cidade, são tensas. Tudo começou com uma ocupação dos gramados por atividades culturais. Em algumas entrevistas, Renato reclamou que nunca foi convidado.
De qualquer maneira, existe a versão de que Renato Russo tocou no Cabeças. É mito, esclarecem os autores de Histórias de Brasília. “Não, Renato Russo nunca tocou nos Concertos Cabeças. Mas os outros dois Renatos da cena musical da época, o Vasconcelos, autor de Suite Brasília, e o Matos, de Um telefone é muito pouco, sim. O Russo não tocou no Cabeças, mas tocou nas nossas cabeças”.
E, vamos a uma sobre a Rainha Elisabeth II, que, em 1968, passou por Brasília, acompanhada do príncipe Phillip. É verdade que ela se assustou com as cigarras? Na passagem pela cidade, o casal conheceu a Catedral Metropolitana, o Palácio da Alvorada e o Congresso Nacional. Mas não visitou apenas os monumentos mais famosos. Esteve, também, no Jardim de Infância da 308 Sul, onde os dois apreciaram um espetáculo infantil.
Segundo os autores do livro, de repente, a rainha ficou incomodada com um intenso e contundente barulho: “Que máquinas são essas? Alguém poderia desligá-las?”, interrogou a rainha: “O som, na verdade, vinha das , que já anunciavam a chuva daquele ano”, esclarecem os autores. Sim, é verdade, a rainha ouviu o som hevay metal das cigarras brasilienses.
E, para fechar, escolhi a história dos fantasmas ou supostos fantasmas que rondam o Teatro Nacional Claudio Santoro, a pirâmide de Niemeyer, com relevos de Athos Bulcão e jardins de Burle Marx. Ela está abandonada há muito tempo e se tornou um ambiente propício à visita de seres do outro mundo.
Enquanto a reforma parcial se arrasta e alega-se que não existe dinheiro suficiente para a urgente reforma total, as excelências bancam viadutos inadequados ou propõem um absurdo Museu da Bíblia que custam muitos mil reais ou surreais.
Mas vamos aos fantasmas do Teatro Nacional. Reza a lenda que por aquelas paragens os elevadores funcionam sozinhos. E uma bailarina vestida de branco adeja pelos corredores. Há, também, os que juram ter visto o espectro do maestro Claudio Santoro circulando pelas passagens subterrâneas da pirâmide de Oscar Niemeyer.
O abandono estimula a imaginação. Corre a versão de que um piano toca sozinho durante a madrugada. Certa noite, cinco guardas noturnos se armaram de coragem e resolveram encarar o sobrenatural que ronda aquele espaço. É um suspense de matar o Hitchcock.
E o que encontraram? Um gato flanava, elegantemente, sobre as teclas do piano. “E o fantasma da reforma do teatro?”, indagam os autores. E respondem: “Esse não assusta mais ninguém”. Como se vê, esse é um livro leve, divertido e instrutivo. Brasília vai muito além do que acontece no circuito do poder da Esplanada dos Ministérios.
Não se trata de fake news, notícia falsa para induzir a escolhas fraudulentas. O que está em jogo é a trama de fabulação que constitui a alma de uma cidade, mas sempre sob um crivo que dissolve o mito com a mirada crítica do humor.
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