Fake news explicam

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AFP / Denis Charlet. As redes sociais permanecem uma terra sem lei, que ameaça da democracia.

Severino Francisco

Por quê políticos populistas conseguem sustentar, no Brasil e em outros lugares do mundo, uma agenda explícita de destruição das florestas, da educação, da ciência, do sistema de saúde pública, das instituições democráticas e da vida? E, mais do que isso, por quê conseguem a servidão voluntária de muitos?

Goebbels, o ministro da Propaganda nazista, dizia que uma mentira repetida mil vezes se torna verdade. As redes sociais tornaram a afirmação de Goebbels uma realidade, com a velocidade estonteante de suas milícias e robôs digitais. A burrice que impera não é apenas uma força da natureza; ela é inseminada artificialmente.

Durante o Brexit, circulou nas redes a informação falsa de que a permanência da Grã-Bretanha na União Europeia “custaria 350 milhões de libras por semana” ao erário e que, se saísse do bloco, o dinheiro poderia ser investido no sistema público de saúde.

Com o apoio dos bilionários americanos Robert e Rebeka Mercer, a campanha concebida por Steve Bannon, um gênio do mal, levou ao desligamento do Reino Unido da União Europeia. Há muita grana envolvida no projeto dos grupos extremistas de direita.

Não quero atulhar o leitor com números, mas alguns são inevitáveis. Segundo pesquisa do Instituto Massachussetts (MIT), uma notícia falsa tem 70% mais de chance de ser compartilhada do que uma verdadeira. É algo estarrecedor.

E outra sondagem do instituto inglês Ipsos Mori, realizada em 2018, em 27 países, aponta que o Brasil é a nação que mais acredita em fake news. A média mundial é de 48%. Quando perguntados sobre a causa, 49% responsabilizaram os políticos. Outros 37% colocam a culpa na “visão torta das pessoas”.

Mais 37% apontam as redes sociais como fonte das notícias falsas. Existem os que argumentam que o problema são “as pessoas ruins”. E, ainda, houve 14% afirmando que o que está errado são os números e não as opiniões das pessoas.

Se eu escrevo uma coluna no jornal não posso falar como se estivesse em um boteco, por mais indignado que esteja com um personagem da política ou com uma situação. Além da minha consciência, existem leis que regulam a opinião no espaço público. Sou responsável por minhas palavras.

Enquanto isso, nas redes sociais, os delitos permanecem impunes. Os indivíduos e as corporações precisam ser responsabilizadas pelas mensagens que veiculam, da mesma maneira do que os jornalistas e as empresas de comunicação das mídias tradicionais. Eles já provocaram muitos estragos na democracia. O deputado Daniel Silveira tem de ser cassado. Mas isso não é o suficiente.

Sem botar a lei na selva selvagem das redes sociais, estamos condenados a uma guerra desigual entre o estilingue e o canhão. Estamos condenados a correr sempre atrás para provar que a vacina não faz ninguém se transformar em jacaré, que o voto eletrônico não é fraudulento, que as instituições democráticas não impedem os incompetentes de governar, que a covid-19 não é uma gripezinha e que ameaçar de morte uma autoridade ou fazer apologia da ditadura não é liberdade de expressão.

São crimes sem castigo que, algumas vezes, provocam doenças e até a morte de pessoas. A regulação das mídias sociais é um tema urgente para a agenda política. É um debate que transcende esquerda ou direita. Não é possível constituir uma república fundada na mentira, na fraude e nas fake news. Como diria o poeta TT Catalão, fraude explica.

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