As manchetes do Correio

Publicado em Crônicas

 

Severino Francisco

 

Quando realizei pesquisas para escrever o livro Da poeira à eletricidade – História da música em Brasília me dei conta da importância de contar a história a partir de um ponto de vista da cidade. As menções a passagem de Tom Jobim e Vinicius de Moraes por Brasília em livros para compor a Sinfonia da Alvorada eram bastante depreciativas.

 

Diziam que encontraram um cenário desolador, povoado de cascavéis. Como se Tom, que se embrenhava na Mata Atlântica, para conversar com passarinhos, tivesse medo de bichos.

 

Ao mergulhar no arquivo do Instituto Tom Jobim encontrei inúmeras declarações de Tom e de Vinicius a jornais e revistas enfatizando o impacto de brasilidade daquela viagem em suas vidas. Eles só passaram 10 dias no Catetinho, mas interagiram intensamente com a cidade nascente e captaram sinais com radares de grandes artistas. Vinicius disse que esse planalto tinha uma proximidade com o infinito. Tom escreveu que essa era a região mais antiga da Terra.

 

Evoco o caso apenas para ilustrar a importância de que se contar uma história a partir do ponto de vista de Brasília. E é precisamente isso que encontramos na exposição 62 anos de capas do Correio Braziliense, em cartaz no CCBB. A cidade e o jornal nasceram juntos em 21 de janeiro de 1960, mas o que poderia ser um mero acaso se desdobrou em história entrelaçada.

 

O fato é que, apesar de todas as circunstâncias, com maior ou menor ênfase, o jornal sempre assumiu um compromisso de defesa e afirmação da cidade. Ao longo de 62 anos, pulsou no ritmo dos acontecimentos. Ensinou e aprendeu com os brasilienses a viver e a amar Brasília. Contribuiu para criar uma consciência de pertencimento à cidade.

 

As manchetes falam por si. Desmontam muitas ideias prontas sobre a cidade e revelam uma outra Brasília, desconhecida por muitos brasileiros. Vamos a algumas delas.

“Diplomatas vêm do Rio e aplaudem as obras do Itamaraty em Brasília. A capital se consolida no 11 ano. Brasília é muito mais que linhas e formas arrojadas de concreto. Pode uma cidade nascida de um solitário cerrado amanhecer tão límpida e monumental? Pode sim, foi feita por um homem determinado, dois artistas e milhares de brasileiros que acreditaram nos sonhos.

 

O sonho que virou cidade. A minha, a sua, a nossa Brasília. Todas as faces de Brasília. A capital das 18.993 noites. Celebramos as noites na capital. Cada vez mais movimentadas. Noites que muita gente não sabe tem a vem a ver com a genialidade de Lucio Costa. Limitou os prédios para permitir aos brasilienses um deslumbrante espetáculo. Uma cidade que fica no céu. Capital que é pura música.

 

Só cliquei para dizer te amo. Brasília é uma festa. DNA feminino faz a diferença na capital. Uma cidade que fica no céu. Quarenta razões para amar Brasília. Eles vieram, viram, gostarm e trouxeram para cá um pedaço da sua cultura natal. Nascidos para amar Brasília. Bebês que nasceram em Brasília. Todos os tons da solidariedade. Bom mesmo é morar em Brasília.”

 

Mas amar uma cidade não se confunde com ufanismo. É possível e desejável amar de maneira crítica. Brasília não é uma ilha da fantasia, tem todas as grandezas e misérias do Brasil. A manchete da capa de 2011, distinguida com o Prêmio Esso, estampa dois títulos complementares: “Eles nos envergonham… Ela (Brasília) nos orgulha.” A capa permanece atual. O compromisso do Correio foi muito importante para a consolidação de Brasília e será ainda mais para o delineamento do futuro da cidade.

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