A flexibilização das armas

Compartilhe

Severino Francisco

Os taguatinguenses foram surpreendidos por uma cena surreal na semana passada com o desfile de uma misteriosa dama de vermelho, acompanhada de um séquito de homens armados de fuzis, escopetas e pistolas na avenida Samdu. As imagens circularam pelas redes sociais. Pode ser somente exibicionismo proporcionado pela internet.

Mesmo assim, ele é perigoso e pode ameaçar a vida. O noticiário está inundado de uma avalance de notícias de violência. O culto e a liberação de armas só intensificará e agravará o problema. Alega-se que o faroeste cafona de Taguatinga é uma cena inocente, que realiza um desejo de uma consultora de vendas, a pretexto de fazer um ensaio fotográfico de pré-casamento.

No entanto, ela é reveladora do glamour que as armas de fogo adquiriram. Não se trata apenas de mau-gosto. O culto às armas é uma política em que só os fabricantes, os políticos irresponsáveis e os delinquentes são beneficiados. Ela está sendo estimulada em nome da defesa da liberdade. Mas basta percorrer o noticiário para perceber a relação entre a escalada da violência e o acesso às armas.

Questiúnculas afetivas, de trânsito, de desavenças em casas noturnas ou nas imediações de estádios se transformam em tragédias pelo uso de armas. Não é verdadeiro o argumento de que a arma garante a segurança do cidadão. O histórico de reação dos cidadãos comuns a assaltos é amplamente desfavorável. Baseadas nas estatísticas, as autoridades policiais não recomendam essa atitude.

E não podemos nos esquecer que, ao ser abordado por dois meliantes, na parada de um semáforo, no bairro de Vila Isabel, em 4 de julho de 1995, no Rio de Janeiro, o presidente da República, que tanto alardeia o culto às armas, entregou a moto Honda Shara e a pistola Glock Calibre 380 aos bandidos, sem esboçar a mínima reação. No dia seguinte, Bolsonaro declarou que se sentiu indefeso no momento do assalto.

O Senado debaterá projeto de lei para votar novas regras para o uso de armas de fogo. A flexibilização do uso de armas proposta pela Câmara dos Deputados é algo de uma irresponsabilidade inominável, que terá graves consequências. Em um cenário aceleração das desigualdades sociais, desestruturação das famílias e glamourização da violência, a flexibilização das armas é uma tragédia anunciada.

Existe uma clara e quantificada relação entre a violência e o uso de armas de fogo. Ela é o principal instrumento utilizado para matar mulheres da maneira mais covarde, segundo dados do Instituto Sou da Paz. A política de flexibilização é um atestado da incompetência do Estado para cuidar da segurança pública. Segurança pública não é sinônimo de violência de todos contra todos; é uma questão e um direito de cidadania.

Espero que o Senado barre mais essa insensatez aprovada por uma Câmara dos Deputados encerrada dentro da bolha do orçamento secreto, completamente omissa em relação aos problemas reais do país e servil aos interesses políticos mais insanos. É preciso que os eleitores registrem, com muito carinho, os nomes dos que apoiam essa proposta destrambelhada, visando as próximas eleições. Quem é verdadeiramente cristão não pode votar a favor de um projeto aumentará, ainda mais, a escalada da violência.

Severino

Publicado por
Severino

Posts recentes

As músicas de Vladimir

Severino Francisco Recebi um precioso presente, que vou dividir com vocês no papel impresso: o…

2 semanas atrás

Deus on-line

Severino Francisco Estava assistindo a um excelente documentário que um diretor francês realizou sobre Maria…

2 semanas atrás

Aventura e rotina

Severino Francisco Nos tempos de adolescente, eu tinha horror à rotina. Para mim, era sinônimo…

2 semanas atrás

Calendário de Athos Bulcão

  Severino Francisco   Estava pensando em um tema para crônica quando ele chegou fulminante…

3 semanas atrás

Ailema Bianchetti

Severino Francisco A quinta-feira amanheceu com outra notícia dramática: a arte-educadora Ailema Bianchetti morreu aos…

3 semanas atrás

O clima da política

Severino Francisco As eleições para prefeitos em várias capitais despertam o espanto. São muitos os…

3 semanas atrás