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Defensoria Pública garante concurso para saúde no sistema penitenciário do estado
O Estado do Rio de Janeiro deverá concluir, nos próximos meses, concurso público para efetivo de 88 cargos para o quadro especial complementar da área da Saúde da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (SEAP), em substituição a procedimento de contratação temporária que estava previsto
O concurso deverá prover 8 vagas para o cargo de médico clínico geral e 10 para o de enfermeiro, além de 20 vagas para cargo de psicólogo, 9 para psiquiatra, 37 para assistente social, 2 para nutricionista e 2 para cargo de farmacêutico. A decisão que determina a realização do concurso, em caráter liminar, é da 14ª Vara de Fazenda Pública e foi proferida em dezembro, em ação civil pública proposta pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro.
A ação tem o objetivo de assegurar o direito à saúde dos presos e reduzir o índice de mortalidade registados nos últimos anos no sistema carcerário fluminense. O último concurso para seleção de profissionais de saúde para atender a população carcerária aconteceu em 1998. De acordo com levantamento da Defensoria Pública, naquele ano foram registrados 26 óbitos, em razão de doença, de pessoas presas. Esse número saltou para 266, em 2017. No ano passado, um total de 229 presos faleceram por motivo de doença.
Embora a população carcerária também tenha crescido, passando de 9 mil para 51 mil nos últimos 20 anos, o coordenador do Núcleo do Sistema Penitenciário (Nuspen) da DPRJ, Marlon Barcellos, observa que o número de mortes cresceu de forma desproporcional ao aumento do número de pessoas presas. “Além disso, há pesquisas que indicam que a faixa etária alvo das mortes é de pessoas com menos de 40 anos, vítimas de doenças que aqui fora não matam pessoas da mesma idade”, contou Barcellos.
Mortes
As principais causas de morte de pessoas presas, apontadas por levantamentos já realizados pela instituição, são as doenças decorrentes de infecções pulmonares, como pneumonia e tuberculose; e também diabetes e hipertensão. Para Barcellos, a decisão que obriga a realização de concurso para a área de saúde da SEAP vai impactar positivamente a prestação de assistência de saúde nos presídios do Rio.
“A decisão ajuda a garantir que tratamentos de saúde sejam realizados de forma mais efetiva no sistema penitenciário fluminense e, para isso, é importante que haja pessoal capacitado para prestar atendimento médico de forma eficaz, regular e continuada”, afirma.
A decisão evita que o Estado realize novo processo seletivo simplificado para contratação de profissionais por prazo determinado, como ocorreu nos anos de 2007 e 2013, e que se repetiria com a aprovação do Decreto nº24/18 e a instauração de processo administrativo para conduzir nova seleção simplificada. Com base na previsão constitucional de realização de concurso, a decisão judicial determina que este último procedimento de contratação temporária seja substituído por concurso público.
Segundo o defensor, as contratações simplificadas geram instabilidade à prestação de assistência de saúde aos presos, além de ser uma medida inconstitucional.
“A contratação temporária é permitida constitucionalmente para atender apenas necessidades temporárias e excepcionais da sociedade. O que não é o caso da prestação de serviços de saúde no sistema penitenciário do estado. A população carcerária fluminense é grande e enfrenta índices elevados de mortalidade, principalmente, em decorrência de uma assistência de saúde precária e ineficaz”, ressalta Barcellos. “A última contratação temporária expirou no final de 2017 e, desde então, há poucos profissionais para prestar assistência de saúde nas prisões. A vantagem dos cargos efetivos é justamente garantir a presença desses profissionais nas unidades prisionais de forma regular e continuada”, enfatiza.
Denúncias apontam que três presos sofrem tortura a cada dia no Rio
Número representa a média de 931 relatos de agressões físicas e psicológicas recebidos pela Defensoria Pública do Estado (DPRJ), no período de 10 meses. Relatório sobre os casos foi lançado nesta sexta-feira (2). Segundo os registros, os agentes de segurança pública seriam os principais autores das violações. O levantamento da DPRJ resulta do Protocolo de Prevenção e Combate à Tortura da Defensoria Pública, o primeiro do Brasil. As vítimas têm perfil comum no sistema penitenciário brasileiro: do total de denúncias, 895 foram feitas por homens, 590 por pessoas que não completaram o ensino fundamental e 659 por pretos e pardos
A Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ) recebeu 931 denúncias de tratamentos desumanos contra pessoas presas ao longo de 10 meses. O total de relatos resulta em uma média de três presos agredidos de forma física ou psicológica por dia durante o período pesquisado – ou seja, de agosto de 2018 a maio deste ano. Os dados foram divulgados nesta sexta-feira (2/8), durante o Seminário Pelo Fim da Tortura, que a instituição realiza em sua sede, no Centro da Cidade do Rio de Janeiro. Segundo os registros, os agentes de segurança pública seriam os principais autores das violações.
Do total de denúncias, 903 (ou seja, 98%) foram feitas pelas próprias vítimas – sendo a maioria (96%) durante a audiência de custódia, na qual a pessoa detida em flagrante é apresentada a um juiz responsável por avaliar a necessidade ou não de manter a prisão. Desse total, 869 afirmaram ter sofrido agressões físicas. Deste universo, 412 (57%) disseram que a lesão ainda estava aparente. Agressões psicológicas foram relatadas por 311 presos.
O levantamento produzido pela DPRJ resulta do Protocolo de Prevenção e Combate à Tortura da Defensoria Pública, que completou um ano no último dia 26 de junho. Criado pela Resolução 932/2019, o protocolo estabeleceu um fluxo para os casos de tortura que chegam à instituição por meio de seus órgãos de atuação presentes em todo o estado do Rio. Cada denúncia é encaminhada para o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (Nudedh), que assume o monitoramento e adota as medidas judiciais e extrajudiciais necessárias para a devida responsabilização. A compilação das denúncias recebidas é feita pela Diretoria de Estudos e Pesquisas de Acesso à Justiça da Defensoria.
Segundo aponta o levantamento, as vítimas têm um perfil comum no sistema penitenciário brasileiro. Do total de denúncias, 895 foram feitas por homens, 590 por pessoas que não chegaram a completar o ensino fundamental e 659 por pretos e pardos.
O defensor público Fábio Amado, que coordena o Nudedh, explicou que a produção de estatísticas sobre abordagens violentas por parte de agentes do Estado tem o objetivo de contribuir nas ações estratégicas para coibir práticas desta natureza. De acordo com ele, o protocolo da Defensoria também reforça a missão constitucional da instituição de defender os direitos humanos. Apesar de o combate a esse tipo de violação ser também responsabilidade do Estado, o defensor ressalta que tratamentos desumanos ou degradantes ainda são um problema sistemático e generalizado no país.
“As denúncias de tortura no Rio de Janeiro refletem a perpetuação dessa prática, principalmente no momento da detenção. Existe, infelizmente, uma naturalização dessa prática tão grave que é a tortura. Por esse motivo, criamos o Protocolo de Prevenção e Combate à Tortura da Defensoria Pública do Rio: o primeiro do Brasil, até onde temos notícia, feito por uma instituição do sistema de Justiça. O objetivo é coletar e organizar dados que efetivamente possam ajudar a pôr fim a essa prática odiosa”, destaca.
A defensora pública Mariana Castro, que integra o Nudedh, completa destacando que a produção de estatísticas contribui para o debate sobre o tema, assim como para a implementação de políticas públicas contra a tortura.
“Os dados ajudam a conscientizar a população e os governantes sobre a magnitude do problema, para que assim possam defender medidas legislativas ou administrativas que combatam essas práticas de forma mais efetiva”, afirma.
A tortura
Do total de presos que relataram ter sofrido agressão física, 824 indicaram o local. Os lugares mais apontados foram “aonde ocorreu a prisão” (760 relatos), a “delegacia” (36), a “unidade prisional” (19) e a “viatura da Polícia” (13). Com relação ao agressor, policiais militares figuram em primeiro lugar, com 687 denúncias. Populares e agentes penitenciários, da Polícia Civil e segurança privada também aparecem como autores, de acordo com 104 casos registrados.
O protocolo também identificou o perfil das decisões judiciais proferidas nos casos com denúncia de agressão. Ao todo, a Defensoria Pública analisou 574 determinações proferidas nas audiências de custódia do Rio. Em 85% delas, o juiz se manifestou sobre as violações alegadas pelo réu, ainda que para dizer que o caso deve ser apreciado pelo juiz natural ou para indeferir algum pedido relacionado à apuração das agressões.
A tortura não foi levada em consideração para a concessão da liberdade ou do relaxamento da prisão. Do total analisado, 84% tiveram a prisão em flagrante convertida em preventiva nas audiências de custódia.
Origem das denúncias
Ainda segundo o relatório, 98% das denúncias de tortura (ou seja, 911) foram encaminhadas ao Nudedh por órgãos de atuação da própria Defensoria Pública. O restante dos relatos foi enviado por instituições como o Disque Direitos Humanos. Para Fábio Amado, falta uma conscientização sobre o problema.
“A Defensoria Pública pretende se reunir com os secretários das Polícias Militar, Civil e de Administração Penitenciária para apresentar os dados de forma minuciosa e cooperar na construção de fluxos eficientes para prevenir e combater esses desvios dentro do sistema de segurança e de Justiça”, destaca o defensor.
Leia aqui o levantamento na íntegra.