Justiça legitima extermínio de negros e pobres

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“É imperioso que a indignação da população, tanto a americana quanto a brasileira, se volte também contra a atuação complacente do Judiciário, uma vez que o altíssimo número de cidadãos negros violentados e mortos pela força policial aponta claramente a existência de uma política de Estado (e não de governo, frise-se) que elege os seus “matáveis” e faz dos homens de farda — na maioria das vezes também negros e pobres — meros instrumentos; a ponta da lança empunhada pelos homens diplomados que ocupam a posição respeitável de “fiscais da lei””

No artigo, os autores destacam que o Judiciário no papel de legitimador da violência não chega a ser novidade no Brasil. Em 1996, o desembargador Sérgio Verani (TJ-RJ) escreveu em seu livro Assassinatos em nome da lei que: “O aparelho repressivo-policial e o aparelho ideológico-jurídico integram-se harmoniosamente. A ação violenta e criminosa do policial encontra legitimação por meio do discurso do Delegado, por meio do discurso do Promotor, por meio do discurso do Juiz. Se as tarefas não estivessem divididas e delimitadas pela atividade funcional, não se saberia qual é a fala de um e qual é a fala de outro – porque todos têm a mesma fala, contínua e permanente”.

André Damiani*

Diego Henrique**

“Canalizamos a violência vingativa no sistema penal, mas nos silenciamos quando o poder punitivo rompe os diques de contenção jurídica do direito penal e eclode em massacres, cujos autores são precisamente os que, segundo o discurso, têm a função de preveni-los”. (Eugênio Raúl Zaffaroni, jurista argentino)

Os últimos dias têm sido marcados por uma onda crescente de protestos nos EUA em face do brutal assassinato de um homem afrodescendente – George Floyd – cometido por um policial. Outra face da moeda, no Brasil ganharam força protestos contra a violência policial rotineiramente praticada contra o povo negro, nos guetos e morros tupiniquins.

Respeitadas as diferenças históricas entre as duas nações, fato é que o racismo estrutural permeia ambas as sociedades cuja face mais cruel se mostra nos assassinatos cometidos pela polícia, demonstrando que essa população acabou excluída da esfera de proteção do Estado. Para muito além da ideia simplista de que todo policial é racista, cumpre destacar que a corporação (militar ou civil) não se obriga a mudar; afinal, veste couraça jurídica invencível.

Nos Estados Unidos, a doutrina da qualified immunity (imunidade qualificada) estabelecida pela Suprema Corte funciona como escudo à responsabilização penal da violência policial. Trata-se de um verdadeiro passe-livre para toda sorte de abusos.

A referida doutrina surgiu em 1967, num contexto de aplicação excepcional: resguardar os agentes públicos que cometerem abusos no cumprimento da lei, porém agindo de “boa-fé e com causa provável”, acreditando eles, agentes, que suas ações estivessem respaldadas pela lei. No entanto, nos mais de 50 anos que se passaram, a doutrina se expandiu pelos tribunais norte-americanos e se tornou regra, de tal sorte que a boa-fé do agente público no exercício de sua função é sempre presumida, mesmo diante de abusos repugnantes e, quase sempre, intencionais (dolosos).

Isso acontece porque no sistema de justiça americano, para que seja permitido à vítima processar seu agressor (oficial da lei), caberá àquela demonstrar que seu algoz violou leis federais ou direitos constitucionais “claramente estabelecidos” (clearly established). Aqui está o pulo do gato.

Só é possível demonstrar a violação de um “direito claramente estabelecido” mediante remissão a um precedente legal cujo contexto fático e circunstâncias sejam semelhantes ao caso presente e o réu (agente público) não tenha sido considerado imune (qualified immunity). O diabo é que não existem precedentes em favor das vítimas, uma vez que prevalece uma espécie de círculo vicioso inaugurado pela doutrina em 1967! Nas palavras de um juiz texano: “cara: o réu ganha, coroa: a vítima perde”.

Nas cortes de Pindorama nunca se cunhou doutrina sofisticada. A coisa é feita mais, vamos dizer… na unha mesmo. A legitimação jurídica do extermínio do negro pobre no Brasil se materializa no arquivamento da maioria esmagadora dos “autos de resistência”, mediante promoção do Ministério Público e chancela do Judiciário.

Necessário esclarecer ao leitor que os autos de resistência contemplam uma narrativa padrão construída para demonstrar que a ação policial se deu em legítima defesa, na qual o morto é sempre suspeito. Essa narrativa prevalece mesmo quando as declarações dos policiais envolvidos são desmascaradas por laudos periciais que atestam disparos pelas costas, na nuca, à queima-roupa ou nas mãos — comprobatórios de que a vítima estava em posição de defesa ante os disparos.

Aliás, afirmou João Batista Damasceno, juiz de Direito no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e doutor em Ciência Política, que os autos de resistência convertem os cidadãos em inimigo a ser combatido, os quais têm sua dignidade vilipendiada a fim de justificar sua execução.

Neste cenário, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo realizou pesquisa na qual concluiu que 90% dos autos de resistência são arquivados no Estado sem que haja investigação. No Rio, o número chega a 96%.

O Judiciário no papel de legitimador da violência não chega a ser novidade no Brasil. Em 1996, o desembargador Sérgio Verani (TJ-RJ) escreveu em seu livro Assassinatos em nome da lei que: “O aparelho repressivo-policial e o aparelho ideológico-jurídico integram-se harmoniosamente. A ação violenta e criminosa do policial encontra legitimação por meio do discurso do Delegado, por meio do discurso do Promotor, por meio do discurso do Juiz. Se as tarefas não estivessem divididas e delimitadas pela atividade funcional, não se saberia qual é a fala de um e qual é a fala de outro – porque todos têm a mesma fala, contínua e permanente”.

Mais recentemente o delegado da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, Orlando Zaccone, ao analisar mais de 300 autos de resistência para sua tese de doutorado concluiu não haver dúvidas de que “estamos diante de uma política criminal com derramamento de sangue a conta-gotas. O massacre presente nos homicídios provenientes de ‘autos de resistência’, na cidade do Rio de Janeiro, assim como outros massacres na história, ganha ares civilizatórios a partir de uma forma jurídica ao construir a figura do inimigo matável, substancializada como um ‘outro diferente’ , ‘parte de um todo maligno’, ao qual se nega o tratamento como pessoa. Essa construção, feita no ambiente social, revela todo o seu esplendor nas palavras mortíferas dos promotores de justiça criminal, estabelecendo assim o vínculo oculto entre o direito e a violência.”

Dessa forma, é imperioso que a indignação da população, tanto a americana quanto a brasileira, se volte também contra a atuação complacente do Judiciário, uma vez que o altíssimo número de cidadãos negros violentados e mortos pela força policial aponta claramente a existência de uma política de Estado (e não de governo, frise-se) que elege os seus “matáveis” e faz dos homens de farda — na maioria das vezes também negros e pobres — meros instrumentos; a ponta da lança empunhada pelos homens diplomados que ocupam a posição respeitável de “fiscais da lei”.

*André Damiani – Sócio fundador do escritório Damiani Sociedade de Advogados, é especialista em Direito Penal Econômico.

**Diego Henrique – Advogado associado no escritório Damiani Sociedade de Advogados, é especialista em Compliance.

Ministro do Planejamento é autoridade legítima em mandado de segurança envolvendo nomeação em concurso público

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Tendo por base recurso mediado pelo escritório Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) declarou a legitimidade do ministro do Planejamento como autoridade para determinar nomeação em cargo público.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu os argumentos do escritório Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados em recurso contra a extinção de mandado de segurança para  nomeação de aprovados em cadastro reserva no concurso do Banco Central (Bacent).

Em primeira decisão, o tribunal, de acordo com os advogados, equivocadamente, afirmou que o ministro do Planejamento não tinha legitimidade, uma vez que não seria sua atribuição efetivar as nomeações dos candidatos. Dessa forma, o pedido deveria ser remetido à Justiça Federal de 1ª instância.

Ocorre que o edital do concurso prevê a convocação dos candidatos aprovados para as vagas definidas e outras que vierem a ser autorizadas pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MP) durante o prazo de validade do certame.

Conforme ressalta o advogado Marcos Joel dos Santos, “é impossível qualquer nomeação sem que haja a autorização do ministro do Planejamento criando a respectiva vaga. Tendo em vista a omissão deste em autorizar novas nomeações, mesmo diante das diversas vacâncias ocorridas dentro da validade do concurso, além da incontroversa necessidade de convocação dos aprovados como indica o Bacen, plenamente possível a impetração de mandado de segurança contra essa autoridade”.

Dessa forma, como defendido pelo escritório de advocacia desde o início, plenamente possível a impetração de mandado de segurança no Superior Tribunal de Justiça com a indicação do ministro do Planejamento como autoridade em casos onde se discute a falta de autorização para nomeações solicitadas por órgão federal.

Processo MS 22.100

TRT10 nega liminar e mantém greve de ônibus no DF nesta sexta-feira (28)

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O presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT10), desembargador Pedro Luís Vicentin Foltran, negou na tarde desta quinta-feira (27) um pedido liminar ajuizado por empresas de ônibus do Distrito Federal para impedir a greve de rodoviários marcada para esta sexta-feira (28). Segundo o magistrado, a paralisação faz parte de um movimento peculiar, que é uma greve geral, a qual não tem foco exclusivo nas demandas de apenas uma determinada categoria profissional. Para ele, essa convocação é legítima e faz parte da realidade de um Estado Democrático de Direito.
“Diante do cenário histórico atual, em que profundas alterações na legislação trabalhista e previdenciária, capazes de afetar drasticamente as relações de emprego em curso e vindouras, estão sendo propostas pelos Poderes Executivo e Legislativo, os sindicatos, as federações, as confederações e as centrais sindicais, estão conclamando todos os trabalhadores, celetistas, estatutários e de carreira de Estado, a expressar sua discordância com boa parte das alterações sugeridas por meio de uma paralisação geral”, afirmou na decisão.
Ainda de acordo com o presidente do Tribunal, não seria razoável, diante desse cenário, impedir que determinada parcela de trabalhadores de aderir ao movimento, mesmo porque se trata de um dia em que, inclusive, se anuncia o fechamento do comércio e das demais atividades no Distrito Federal. “O próprio TRT10, prevendo a intensidade do movimento, acabou por suspender suas atividades no dia 28 de abril, pautado na dificuldade que ocorrerá na mobilidade dos seus servidores e na preservação da integridade física de cada um, bem como do seu patrimônio”, salientou.
Na liminar, o desembargador esclareceu que não há dúvida de que o direito de livre manifestação deve ser exercido com a observância aos limites legais, como por exemplo, o respeito ao patrimônio público e privado. “Assim, eventuais ilícitos praticados por empregados ou empregadores no curso do movimento paredista serão apurados por meio dos remédios processuais próprios. Tal se aplica, inclusive, quanto aos eventuais desdobramentos do movimento, quer no que se refere ao corte do ponto, desconto salarial ou mesmo reposição do dia não trabalhado”, observou.
Uma audiência de conciliação sobre o dissídio coletivo de greve foi designada para acontecer no dia 3 de maio, às 16h30, na sala de sessões do Tribunal Pleno, no edifício-sede do TRT10. Na ocasião, o sindicato dos rodoviários deverá apresentar sua defesa.
Processo nº 0000206-20.2017.5.10.0000 (PJe-JT)
Fonte: Núcleo de Comunicação Social – Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região – Distrito Federal e Tocantins