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O especialista em Direito Penal e professor da Universidade Católica de Brasília (UCB), Manoel Águimon, explica o que é o benefício da delação premiada
Criada em 2 de agosto de 2013, pela então presidente Dilma Rousseff, a Lei 12.850 institui a famosa delação premiada, utilizada pela primeira vez com o ex-diretor de abastecimento e refino da Petrobras, Paulo Roberto Costa, investigado e preso na Operação Lava Jato da Polícia Federal (PF). A delação premiada, também conhecida por colaboração premiada, é uma forma de benefício em que o Estado oferece ao acusado a redução de um a dois terços do tempo da pena; cumprimento da pena em regime semiaberto, a depender do caso, extinção da pena e até mesmo perdão judicial, fato que até hoje nunca aconteceu no país.
Vista com bons olhos pelos investigadores, a delação premiada deve ser feita de forma justa e sem omissão de fatos, o delator deve falar somente a verdade, visto que se esconder informações ou até mesmo mentir sobre o caso, o sujeito perderá todos os benefícios acordados em lei.
Utilizada não somente no Brasil, a delação premiada surgiu nos Estados Unidos, em 1960, com o intuito de combater a máfia italiana e outros crimes que assombravam o país. Já em 1983, a Itália resolveu utilizar do mecanismo para prender o mafioso Tommaso Buscetta, caso que ficou conhecido em todo o Brasil, pois sua prisão foi feita primeiramente em território brasileiro. Hoje, a delação premiada é usada em muitos países que buscam combater crimes em todas as instâncias, sejam eles hediondos, contra a ordem tributária, entre outros.
Entenda como a delação premiada funciona no Brasil e como se aplica:
1) O que é o benefício da delação premiada?
A delação premiada ou colaboração premiada, denominação que depende da norma a ser analisada, é uma espécie de benefício concedido pelo Estado – Ministério Público (firma o acordo) e Poder Judiciário (homologa o acordo) ao corréu (coautor ou partícipe nas infrações penais) que delatar os demais integrantes que participaram dos fatos delituosos, além da descrição dos delitos perpetrados e da localização dos produtos do crime.
2) Como funciona?
Vigora no Brasil o que nós chamamos de Sistema Acusatório e, por essa razão, o magistrado não pode participar do procedimento de delação ou colaboração premiada. Destarte, o rito das tratativas inicia-se com o Ministério Público, que apresentará ao possível delator ou colaborador – que deverá ser assistido, sempre, por um advogado – os benefícios que poderia obter do Estado em caso de se firmar um acordo. A partir daí, o delator ou colaborador, passa a declinar os fatos criminosos, os nomes das pessoas envolvidas e a localização de produtos ou proveitos dos crimes, bem como de eventuais vítimas, se existir.
A regra é que essas tratativas sejam gravadas (áudio e vídeo) e reduzidas a termos (escritas) e depois assinadas por todos os envolvidos – Ministério Público, delator ou colaborador e seu advogado, para ser posteriormente submetido ao Poder Judiciário para homologação ou não do acordo.
3) Quem tem direito?
Terá direito às benesses, o delator ou colaborador (alguém que também praticou infração penal) que firmar acordo com o Ministério Público no sentido de obter qualquer dos benefícios, desde que apresente qualquer das exigências legais – incisos I, II, III, IV ou V, do art. 4º, da Lei n. 12.850/2013, a saber:
Art. 4º O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:
I – a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;
II – a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;
III – a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;
IV – a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;
V – a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.
4) Quais benefícios o delator recebe ao aceitar participar?
A delação premiada não é um instituto de agora, visto que há no Código Penal, art. 159, §4º, uma disposição, segundo a qual o corréu, “delator”, que prestar esclarecimentos com o fito de possibilitar a libertação da vítima sequestrada seria agraciado com uma redução de um a dois terços da pena.
A Lei n. 9.807/99 prescreve no art. 13 que o juiz poderá conceder ao “delator” o perdão judicial da pena, enquanto que no art. 14 possibilita a redução de um a dois terços da pena.
A Lei n. 12.850/2013, conhecida como Lei de Organização Criminosa, declinou no art. 4º, que o juiz poderá conceder ao “delator” – que é chamado por esta Norma de “Colaborador” -, o perdão judicial ou reduzir a pena em até dois terços.
Outrossim, poderá obter o direito de não ser preso e, caso esteja preso, de sua segregação ser limitada a certo período de tempo e de ter direito à progressão de pena, mesmo sem cumprimento dos prazos fixados em lei, por exemplo.
5) Essa modalidade é legal para qualquer processo judicial?
Na verdade, não existe uma regra matemática ou disposição em lei acerca de quais ações penais poderiam ou não admitir a delação ou colaboração premiada. Assim, como descrito acima, há uma previsão no art. 159, § 4º, do Código Penal, que é específica para o crime de extorsão mediante sequestro, porquanto o objetivo da Norma foi resguardar a integridade física e psíquica da vítima, com sua libertação.
Na Lei n. 9.807/99 (que trata da proteção de vítimas e testemunhas), também há esse instituto, porém, sem descrever quais espécies de crimes, e na Lei n. 12.850/2013, segue a mesma toada.
Não obstante, é de se concluir que a colaboração ou delação premiada pode ser aplicada em qualquer “processo judicial”, desde que o delito investigado ou processado preencha os requisitos fixados pelas Normas.
Parece-me que a intenção do Legislador foi abarcar os crimes mais graves, ou que haja vítimas, ou que o grupo criminoso esteja muito bem organizado (que dificultam ou até impossibilitam as investigações rotineiras das autoridades), ou quando violem bens jurídicos relevantes para a sociedade, como os crimes praticados contra a administração pública (corrupção, por exemplo).
Cármen Lúcia assina acordo contra corrupção com Transparência Internacional
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) celebrou, nesta sexta-feira (2/6), um Termo de Cooperação Técnica com a Transparência Internacional, organização com sede em Berlim (Alemanha) e atuação em mais de 100 países, para implementação de atividades de combate à corrupção e lavagem de dinheiro a partir do aprimoramento do sistema judicial brasileiro. Ao assinar o acordo, a ministra Cármen Lúcia, presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que não há Justiça sem ética.
De acordo com a ministra Cármen Lúcia, o acordo permitirá a execução de programas e providências para aperfeiçoar mecanismos de controle que permitam maior eficácia no julgamento de ações relacionadas à corrupção. “O CNJ trabalha na fixação das metas para o próximo período para que as questões relacionadas ao combate à corrupção submetidas ao Poder Judiciário tenham a prioridade, no sentido de garantir a celeridade de todos os julgamentos”, disse a ministra.
Para ela, estas ações afetam de forma direta o cidadão. “[Os recursos da corrupção] São gastos de maneira ilícita e não naquilo que se precisava. Todo mundo quer ter o direito de não vir a desconfiar de nenhum de nós, servidores públicos, e garantir que nós, agentes públicos, somos pessoas que nos comportamos por um sistema jurídico que tem a ética estabelecida como posto e pressuposto de todas as relações”, disse Cármen Lúcia.
Boas práticas internacionais
O termo de cooperação estabelece iniciativas como a produção de estudos de diagnóstico e identificação das melhores práticas nacionais e internacionais sobre gestão do sistema judicial e a prevenção e sanção da corrupção. Outra frente de trabalho é a capacitação de juízes e funcionários do sistema jurídico em temas anticorrupção e antilavagem de dinheiro, incluindo intercâmbios com outros países. “A Transparência Internacional tem uma experiência que será agora acoplada aos procedimentos adotados pelo CNJ”, disse a ministra Cármen Lúcia.
Também estão previstos a cooperação para a assistência e proteção a vítimas e testemunhas de corrupção, por intermédio do Centro de Apoio e Incidência Anticorrupção da Transparência Internacional, e o desenvolvimento conjunto de campanhas de conscientização e promoção da transparência e do combate à corrupção. “Vamos trabalhar linhas de capacitação, campanhas e investigações que permitam aperfeiçoar a Justiça em benefício de todos”, afirmou o presidente da Transparência Internacional e jurista peruano, José Carlos Ugaz Sánchez Moreno.
No prazo de 60 dias, os dois órgãos – CNJ e Transparência Internacional – deverão apresentar um plano de trabalho com detalhamento das atividades, do orçamento e das metas a serem atingidas. As atividades poderão ser custeadas com recursos orçamentários próprios de cada parte e é vetada o repasse recursos financeiros entre os órgãos.Os conselheiros do CNJ Bruno Ronchetti e Henrique Ávila estiveram presentes na assinatura do acordo.
PF combate desvio superior a R$ 18 milhões na saúde do Maranhão
A Polícia Federal deflagrou na tarde de hoje (2/6) a 4ª fase da Operação Sermão aos Peixes intitulada Operação Rêmora*, que tem como objetivo apurar indícios de desvios de recursos públicos federais do sistema de saúde do Estado do Maranhão. A quantia desviada supera a cifra de R$ 18 milhões.
A ação conjunta contou com a participação do Ministério Público Federal, Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União (CGU) e Receita Federal do Brasil.
Estão sendo cumpridos 19 mandados judiciais, sendo quatro de prisão preventiva, um de prisão temporária e nove de busca e apreensão. Também foi determinado o bloqueio judicial e sequestro de bens num total que supera a cifra de R$ 12 milhões. Os mandados foram expedidos pela 1ª Vara Criminal Federal da Seção Judiciária do Maranhão.
As investigações apontam que o Instituto de Desenvolvimento e Apoio à Cidadania (IDAC), uma organização social sem fins lucrativos, recebia milhões de reais dos cofres públicos, repassados pela Secretaria de Estado de Saúde do Maranhão. Essa verba se destinaria à administração de algumas unidades hospitalares estaduais (Hospital Regional de Carutapera, Hospital Geral de Barreirinhas, Hospital Aquiles Lisboa, Hospital de Paulino Neves, AME Barra do Corda, AME Imperatriz e a Unidade de Pronto Atendimento de Chapadinha/MA).
No entanto, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) detectou uma grande quantidade de saques vultosos e em espécie realizados por um funcionário da organização social. Os saques chegavam a R$ 200 mil.
Após a deflagração da primeira fase da Operação Sermão aos Peixes em novembro de 2015, os investigados passaram a fragmentar essas movimentações financeiras na tentativa de ludibriar o monitoramento pelos órgãos de controle.
Por meio de ação controlada, devidamente autorizada pela Justiça Federal, as transações financeiras realizadas pelos investigados passaram a ser acompanhados em tempo real. A ação, que durou cerca de 70 dias, comprovou que parte dos valores sacados pelo funcionário eram entregues ao presidente do IDAC e seus diretores.
Também foram identificados fortes indícios de distribuição de valores a agentes políticos locais, que facilitavam a obtenção de contratos públicos pela organização.
Hoje, a PF acompanhou mais um dos saques realizados pelo funcionário investigado e flagrou a entrega dos valores aos gestores do IDAC, oportunidade em que a operação foi desencadeada.
Os investigados, na medida de suas participações, poderão responder pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Após os procedimentos legais, os investigados serão encaminhados ao sistema penitenciário estadual, onde permanecerão à disposição da Justiça Federal.
* O nome da operação faz referência a um trecho do famoso “Sermão aos Peixes” proferido por Padre Antônio Vieira em São Luís no ano de 1654. No sermão, as várias espécies de peixe são mencionadas como símbolos dos vícios e corrupção da sociedade.
O peixe rêmora seria pequeno, mas possuiria uma grande força para influenciar os acontecimentos. Na natureza, é uma espécie que costuma se agarrar a tubarões e vive das sobras dos alimentos deixados pelo peixe maior.
Recuperação de impostos como saída da crise para as empresas
*Raul Finochio Ferreira da Rosa
Alguns números nos mostram como a complexa malha tributária do país pode interferir no universo empresarial. Dados do IBGE/Impostômetro divulgados no ano de 2016 revelaram que os brasileiros arrecadaram R$ 2 trilhões em impostos, cerca de R$ 3 milhões por hora no ano. Outro dado curioso aponta que 95% das empresas pagaram impostos indevidamente por desconhecimento e falta de orientação.
Segundo números consolidados declarados à Receita Federal nos ativos das grandes empresas, o valor de tributos a recuperar chegou ao fim de 2016 a R$ 181,7 bilhões, o equivalente a 4,1% do Produto Interno Bruto (PIB) do período e a 3,6% da receita bruta declarada pelas empresas.
Diante dessas informações e do atual cenário de crise, uma verificação da situação fiscal da empresa pode trazer duas relevantes notícias.
A primeira se refere ao caso de a empresa se enquadrar nos 5% que recolheram os impostos corretamente. Empresários que conseguiram tal feito devem parabenizar o seu departamento fiscal, pois o mesmo é fora da curva por conseguir estar atualizado em um país onde diariamente os Diários Oficiais da União, dos Estados e dos Municípios despejam leis, normas, regulamentos, decretos, atos normativos, instruções e outros textos sobre os mais de 80 tributos existentes.
A segunda se destina às demais empresas, ou seja, as 95% que recolheram impostos indevidamente. Para estas, após uma avaliação específica dos tributos que foram recolhidos nos últimos cinco anos com o objetivo de verificar a existência de eventuais créditos, eles podem ser recuperados por pagamento a maior, pagamento indevido, extinção de tributos por inconstitucionalidade ou ainda obtenção de ordem judicial.
Empresas que têm adotado esse expediente têm conseguido valores significativos e que podem ser utilizados na compensação de impostos vencidos ou vincendos.
Levando-se em conta que a empresa pode, em virtude dos créditos apurados e passíveis de compensação, reverter os valores que seriam utilizados do seu faturamento em necessidades do próprio negócio, essa pode ser uma boa saída para que elas vejam aumentar o seu faturamento e reduzir os seus custos em tempos de crise.
*Raul Finochio Ferreira da Rosa é gestor de Novos Negócios da Docs Inteligência Fiscal
Reajuste concedido por decisão judicial a servidor deve ser absorvido
Reajustes obtidos judicialmente por servidores públicos devem ser absorvidos em caso de mudança do regime remuneratório por lei posterior.
Lucas de Oliveira*
Conforme dispõe a Constituição Federal, a remuneração dos servidores públicos só pode ser reajustada, ou fixada, caso seja criado novo cargo, mediante a edição de lei específica. Assim como ocorre com os trabalhadores da iniciativa privada, ao funcionalismo público é assegurada a irredutibilidade de vencimentos. Portanto, falar em reajuste significa, necessariamente, falar em aumento da remuneração.
Todavia, apesar do comando legal, nem sempre tais reajustes são concedidos ou aplicados de maneira correta pela Administração. Seja em decorrência de imprecisões legislativas, seja em virtude de regulamentações internas que acabam por restringir os direitos dos servidores, muitos destes acabam tendo de recorrer ao Judiciário para assegurar a devida aplicação do reajuste.
É importante destacar, entretanto, que o pedido judicial de concessão do reajuste não pode ser pautado exclusivamente no princípio da isonomia, nos termos da Súmula Vinculante nº 37, do Supremo Tribunal Federal. Faz-se necessária, portanto, a existência de uma lei específica que conceda o reajuste, mas que tenha sido aplicada de modo incorreto pela Administração.
Ao fim do processo, havendo decisão judicial favorável, o reajuste passa a integrar a remuneração do servidor. Do mesmo modo, é devido o pagamento retroativo do reajuste, sobre o período em que este deveria ter sido pago, mas não o foi, excluindo-se apenas parcelas eventualmente prescritas.
Mais comumente do que se imagina, a Administração Pública, sempre mediante a edição de lei, reestrutura seus quadros funcionais, com vista a obter maior eficiência na realização de suas tarefas. Assim, criam-se novos cargos, com novos padrões remuneratórios, ou simplesmente alteram-se cargos existentes, também havendo consequências na remuneração do servidor. O que acontece, então, com os reajustes concedidos judicialmente, em face das novas determinações legais?
A resposta para essa questão pode ser encontrada no artigo 6º da Lei nº. 13.317, de 20 de julho de 2016, que estabelece a absorção da Vantagem Pecuniária Individual (VPI) e de parcelas dela decorrentes, concedidas por decisão judicial ou administrativa, para os cargos afetados pelo referido diploma legal.
A VPI foi instituída pela Lei nº 10.698, de 3 de julho de 2003, e resultou no reajuste de R$ 59,87 (cinquenta e nove reais e oitenta e sete centavos), concedido a todos os servidores da União. Contudo, este aumento configurou revisão geral anual, uma vez que concedida a todos os servidores, na mesma data, em lei de iniciativa do presidente da República. Ao contrário do mandamento constitucional, o índice concedido não foi o mesmo para todos os cargos.
Essa violação ao instituto jurídico da revisão geral anual motivou diversas entidades sindicais e inúmeros servidores a irem ao Judiciário para que fosse aplicado índice idêntico, de 13,23% a todos os servidores. Tal pleito, inclusive, vem sendo acolhido pelo Superior Tribunal de Justiça, a partir do julgamento do REsp nº 1.536.597 – DF.
Aplicando-se o citado artigo 6º, portanto, temos a absorção do reajuste concedido aos servidores em âmbito judicial, mesmo com a alteração da estrutura remuneratória promovida pela Lei nº 13.317/16. Trata-se, dessa forma, de reconhecimento e correção de erro cometido pela Administração, mantendo os reajustes concedidos pelo Judiciário aos servidores, após a correta interpretação dos dispositivos legais.
Merece destaque, ainda, o parágrafo único do referido artigo 6º, que estabelece a concessão de parcela complementar de natureza provisória, que será gradativamente absorvida, para servidores que passem a receber vencimentos inferiores aos percebidos antes da edição da Lei nº 13.317/16, em decorrência da reestruturação por esta produzida.
Trata-se de norma jurídica de rara felicidade no Direito Administrativo brasileiro, marcado por diversas confusões e impropriedades técnicas em âmbito legislativo, o que dificulta sobremaneira a correta aplicação de seus institutos jurídicos. A situação trazida pelo artigo 6º, e parágrafo único, da Lei nº 13.317/16, deveria ser tomado como regra geral para casos semelhantes, inclusive com o intuito de trazer certa uniformidade aos órgãos da União.
Tomando por base estes dispositivos, entendemos que os reajustes concedidos em âmbito judicial devem ser absorvidos na hipótese de mudança de regime remuneratório decorrente de lei posterior, inclusive como meio de reconhecer a luta dos servidores para a garantia de seus direitos, bem como para assegurar a irredutibilidade de seus vencimentos — direito constitucionalmente assegurado à categoria.
Lucas de Oliveira, advogado especialista em Direito do Servidor Público, no escritório Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados.
CNJ – Comitê discute aperfeiçoamentos em sistema de bloqueio judicial de contas
Bloquear contas bancárias para garantir o pagamento de dívidas judiciais deve se tornar mais fácil para juízes de todo o país a partir do final de 2017. Esse é o prazo para que os bancos e cooperativas de crédito se adaptem à nova determinação do Banco Central para o Bacenjud, sistema criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pelo Banco Central (Bacen) para tornar mais efetivas as ordens do Poder Judiciário ao Sistema Financeiro Nacional.
Segundo o conselheiro Carlos Eduardo Dias, que representa o CNJ no Comitê Gestor do Bacenjud, o aperfeiçoamento técnico se refere às contas bloqueadas por ordens judiciais que não tenham saldo suficiente no ato do bloqueio para saldar a dívida reconhecida pela Justiça. A mudança foi formalizada em comunicado do Bacen em 21 de outubro e os bancos terão 360 dias para colocá-la em prática.
“Os titulares das contas sem saldo suficiente no momento em que forem bloqueadas pela Justiça permanecerão sem poder realizar saques até o fim do dia, quando uma segunda tentativa de reservar os recursos necessários para saldar a dívida será feita pela Justiça, automaticamente. A conta continuará apta a receber créditos, mas não permitirá débitos até o fim do dia”, afirmou o conselheiro, após reunião do Comitê Gestor do Bacenjud realizada quarta-feira (9/11) na sede do CNJ, em Brasília.
Outra mudança no Bancenjud anunciada na reunião foi o fim de uma funcionalidade do sistema que impedia o bloqueio de contas bancárias vinculadas a determinado CPF ou CNPJ. “O juiz emitia uma ordem judicial no sistema para que o banco bloqueasse uma conta ligada a um CPF, por exemplo. Por causa dessa funcionalidade, tornava-se impossível a qualquer outro magistrado bloquear a conta ligada a esse mesmo CPF. Isso invadia a competência jurisdicional do juiz, que tem de decidir cada caso concreto apresentado”, afirmou Dias. Dessa forma, outros credores ficavam impedidos de serem pagos, mesmo após a sentença judicial favorável.
Novidade – O comitê também decidiu criar uma nova funcionalidade para evitar o risco de bloqueio a contas-salário. Essa modalidade de conta é praticamente impenhorável, de acordo com a legislação – uma exceção é a necessidade de se garantir recursos para pagamento de pensão alimentícia. “O juiz poderá decidir, ao acessar o Bacenjud na tela do computador, se inclui a conta-salário do réu entre as contas a serem rastreadas na busca de recursos que assegurem o pagamento de uma dívida já reconhecida pelo Poder Judiciário”, afirmou.
Eficiência – Segundo levantamento do Banco Central, no ano passado 3,6 milhões de bloqueios de valores foram feitos graças ao BacenJud, no valor total de R$ 29,1 bilhões reservados para a amortização de débitos reconhecidos por decisão judicial. A praticidade do sistema informatizado reduziu o número de ofícios em papel a apenas 53.236 dos casos.
Antes do sistema, criado em 2001, pedidos de bloqueio de valores ou requisição de informações eram feitos em meio físico, o que retardava o cumprimento das ordens judiciais e prejudicava a eficácia da decisão judicial. As ordens de bloqueio que tramitaram pelo sistema afetaram 5,6 milhões de pessoas físicas e jurídicas em 2015.
Justiça do Trabalho faz mutirão para pagamento de dívidas trabalhistas
O Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) fará de 19 a 23 de setembro a sexta edição da Semana Nacional da Execução Trabalhista, que este ano usa o slogan “A justiça só é efetiva quando realizada por inteiro”. O objetivo é articular o comprometimento nacional para solucionar processos em fase de execução – quando há condenação, mas o devedor não cumpre a decisão judicial.
Durante a Semana, magistrados e servidores de 1º e 2º graus, das unidades judiciárias e administrativas, vão se mobilizar, em regime de mutirão, em todas as regiões brasileiras, representadas pelos 24 Tribunais Regionais do Trabalho. Em 2015, na edição anterior da Semana, foram arrecadados mais de R$ 691 milhões para o pagamento de dívidas trabalhistas.
O coordenador da Comissão Nacional de Efetividade da Execução Trabalhista, ministro Cláudio Mascarenhas Brandão destaca a importância da iniciativa. “Queremos que as partes recebam os valores que lhes são devidos em processos já julgados pela Justiça do Trabalho, mas que ainda não foram pagos.”
Desafios
Um dos grandes desafios ao longo da Semana Nacional da Execução Trabalhista é driblar os devedores que tentam burlar a Justiça. Alguns processos não são executados por falta de recursos do devedor. Outros, por conta de situações onde os devedores usam “laranjas” e “testas de ferro” para tentar enganar a Justiça e postergar os pagamentos devidos.
“As ações de execução são voltadas para aquele devedor que não procura a Justiça para quitar seus débitos e insiste em não cumprir o que foi determinado. Nós da Justiça do Trabalho nunca fechamos as portas para aquele empregador que tem dificuldades de cumprir a decisão e procura a Justiça na tentativa de, junto ao credor, chegar a um consenso,” explica o ministro.
A Justiça do Trabalho têm convênios com a Receita Federal e com outros órgãos para acessar bancos de dados e ferramentas eletrônicas variadas para localizar e leiloar bens de devedores, bem como obter as informações necessárias a uma execução efetiva.
Como funciona?
A execução trabalhista é a fase do processo em que se impõe o cumprimento do que foi determinado pela Justiça, o que inclui a cobrança forçada feita a devedores para garantir o pagamento de direitos. A fase de execução só começa se houver condenação ou acordo não cumprido na fase de conhecimento, em que se discutiu ou não a existência de direitos.
A execução trabalhista é considerada um dos grandes gargalos da Justiça. Em muitos casos, mesmo assinado um acordo, algumas empresas deixam de cumpri-lo. Em outras situações, as partes divergem quanto ao valor da dívida e apresentam uma série de recursos para contestar os cálculos, o que atrasa a conclusão dos processos.
Vasp: o maior devedor da Justiça do Trabalho
Há dez anos, o maior devedor trabalhista do país é a companhia aérea Vasp. O processo é tão longo, extenso e complexo que existe uma Vara do Trabalho que cuida apenas de processos deste réu, a chamada Vara Vasp, que fica na jurisdição do TRT-2, em São Paulo. Atualmente, o passivo da companhia é de R$ 2 bilhões.
Os pagamentos estão sendo feitos por fases, de acordo com a disponibilidade financeira. Na primeira fase, foram pagos os processos de trabalhadores vinculados ao TRT da 2ª Região. Foram beneficiados aproximadamente 5 mil trabalhadores, cada um recebendo entre R$ 30 mil e R$ 150 mil, totalizando uma distribuição de R$ 280 milhões.
Na segunda fase, foram pagos os demais trabalhadores – aproximadamente 1.700 – espalhados pelo restante do país, observando os mesmos critérios, dividindo um total de R$ 56 milhões.
Em 2016, a Vara Vasp chega em sua terceira fase, onde serão pagos os retardatários, ou seja, aqueles trabalhadores que não se habilitaram inicialmente. Serão aproximadamente R$ 70 milhões distribuídos para 1.900 pessoas.
A homologação destes pagamentos será feita no dia 19 de setembro, data de abertura da Semana Nacional de Execução Trabalhista e contará com a presença do coordenador da Comissão Nacional de Efetividade da Execução Trabalhista, ministro Cláudio Mascarenhas Brandão.
Planejamento Estratégico
Impulsionar as execuções trabalhistas e fiscais e baixar mais processos do que as execuções iniciadas no período faz parte do Planejamento Estratégico do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT). Em 2015, foram iniciadas 452.123 execuções e baixadas 519.322, o que resultou num saldo positivo de 67.199 processos. A ideia é manter estes índices positivos em 2016, incentivando os TRTs a se engajarem cada vez mais nesta questão.
Em carta encaminhada ao secretário-geral do Itamaraty, Marcos Galvão, o Sindicato Nacional do Ministério das Relações Exteriores (Sinditamaraty) denuncia constrangimentos sofridos por assistentes de chancelaria que solicitaram a emissão do passaporte diplomático e exige que o ministério cumpra determinação judicial e emita o documento para estes servidores e seus familiares.
Segundo o sindicato, mesmo depois de decisão favorável da Justiça, houve registro de tentativas de obstrução do acesso destes servidores ao passaporte diplomático. Dentre as ocorrências estão: recusa em processar e emitir documento, recusa em encaminhar o requerimento às autoridades competentes, recusa em emitir documentos de cunho meramente declaratórios, mas indispensáveis como suporte ao pedido do passaporte.
Ao julgar recurso impetrado pelo Sinditamaraty, no último dia 4 de maio, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região determinou que o Ministério das Relações Exteriores providenciasse a expedição do Passaporte Diplomático em favor dos assistentes de chancelaria nos termos da Lei nº 11.440/06.
Na carta encaminhada ao secretário-geral, o Sinditamaraty lembra ainda que “a decisão consignou, também, que privar os servidores e suas famílias das mesmas garantias e imunidades conferidas aos oficiais de chancelaria e diplomatas portadores do PADIP, constitui medida temerária, injustificável nos tempos atuais e discriminatória”.
O sindicato reclama ainda das práticas adotadas pela Pasta, por meio da Circular Postal nº 101.587, que condicionou a concessão do passaporte diplomático aos dependentes dos assistentes de chancelaria à aprovação da Consultoria Jurídica do MRE.
“É geral a perplexidade e indignação dos integrantes de todas as carreiras com a postura arcaica, caprichosa e antidemocrática adotada pelo Itamaraty de não cumprir a Lei nº 11.440/2006 que estabelece, expressamente, que todos os servidores do Serviço Exterior Brasileiro têm direito ao passaporte diplomático, inclusive, os inativos”, enfatiza o sindicato.
Leia a carta na íntegra
Em meio à disputa judicial pelo comando da operadora, beneficiários têm dúvida sobre que percentual aplicar na mensalidade. 37,55% valem para mais de 505 mil usuários.Apenas servidores de 18 entidades sindicais, que possuem liminar em vigor, pagam menos pelos planos de saúde
Mais grave que a guerra de liminares é a falta de informações precisas sobre os destinos da Geap Autogestão, maior operadora de planos de saúde dos servidores públicos federais. A nebulosa situação financeira da empresa é antiga. A Agência Nacional de Saúde interveio para sanear as finanças e garantir o atendimento. No entanto, desde que começou a queda de braço entre os representantes dos associados e os do governo, em 15 de junho, quem depende do plano sequer sabe qual é o correto percentual de aumento das mensalidades: se 37,55%, como quer o governo, ou 20% de reajuste proposto pelos sindicalistas. Hora uma liminar da Justiça impõe uma realidade, com o objetivo de evitar que a Geap vá à bancarrota. Hora, outra decisão exige exatamente o contrário, para impedir aumento abusivo e excessivo impacto no bolso do consumidor.
Uma hora, quem está no comando do Conselho de Administração (Conad) é Irineu Messias de Araújo, representante dos beneficiário; em outra, Laércio Roberto Lemos de Souza, indicado pelo governo interino de Michel Temer, agora à frente do disputado Conad. As discussões acaloradas e a troca de acusações não deixam espaço para o beneficiário leigo enxergar o que se passa e calcular o real impacto no orçamento. Para sanar de vez as dúvidas, a atual diretoria informou que o percentual de reajuste válido é mesmo os 37,55%, que alcança 505.746 do total de 560.590 pessoas. O custeio de 37,55%, aprovado em 19 de novembro de 2015, teve a legalidade reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e é aplicável a todos.
“Apenas 54.844 beneficiários, ligados a 18 entidades sindicais, que possuem liminar em vigor, estão pagando 20% (cálculo até 27 de junho, podendo variar)”, informou, por meio de nota, a Geap. A diferença entre o que deveria ter entrado no caixa e o que deixou de ser pago por esses cerca de 10% dos assistidos causou um deficit acumulado aproximado R$ 104 milhões na receita mensal da Geap — de cerca de R$ 310 milhões. Para a operadora, é importante que os 37,55% sejam mantidos. O Programa de Saneamento (Prosan), negociado com ANS, foi construído com base nesta alta específica e respaldado por estudo atuarial. Qualquer mudança no contexto significará um rompimento de contrato´com a ANS.
“Conforme Instrução Diretiva nº17/DF/Geap Autogestão em Saúde, emitida pela ANS, em 23 de junho, ‘a aplicação de reajustes correspondentes a pouco mais da metade do percentual previsto resultará no comprometimento do Prosan, em não cumprir seu objetivo de reversão integral das anormalidades econômico-financeiras existentes’”, destacou a Geap. Na semana passada, Laércio de Souza acusou a equipe de Irineu Messias de não ter base científica para justificar os 20%. Messias contestou e garantiu que apresentou estudo técnico assinado pelo atuário da casa, pela Diretoria de Finanças e pela Assessoria Jurídica comprovando que o percentual é factível.
De acordo com Messias, os 37,55% quebrarão a Geap pela evasão de beneficiários. Desde dezembro, quando entrou em vigor, mais de 23 mil pessoas saíram do plano. Segundo ele, dos 560 mil beneficiários, 700 têm mais de 100 anos; 70 mil, mais de 80 anos; e 60% dos restantes, acima de 49 anos. Ganham, em média, R$ 3 mil. Pagam de R$ 600 a R$ 900 por mês. No mercado, terão que desembolsar mais de R$ 2 mil mensais. Ontem, porém, também por meio de nota, a ANS não falou sobre estudos de viabilidade, mas deixou claro que não se envolve com a redução no preço das mensalidades.
“A respeito do percentual de 20%, a ANS ressalta que não houve recomendação por parte da agência reguladora sugerindo tal índice”. Lembrou ainda que, no caso de planos de operadoras de autogestão, “o Conselho Deliberativo, formado por representantes dos beneficiários e dos patrocinadores, tem o poder de participar da decisão do aumento nas mensalidades”. O que significa que os mesmos que hoje reclamam estavam presentes na hora da decisão. Justificativa também rechaçada por Messias. Disse que estavam no momento, mas pouco puderam fazer porque o governo tem o voto de minerva.
As mudanças no percentual de aumento das mensalidades dos assistidos pela Geap, maior plano de saúde dos servidores públicos federais, não param. Ontem, na quarta decisão judicial que trata do assunto, o desembargador federal Souza Prudente voltou a derrubar a alta de 37,55% nas contribuições e determinou que a atual Diretoria do Conselho de Administração (Conad) aplique o reajuste de 20%. A operadora não quis se manifestar sobre a questão.
A ordem foi em resposta a um agravo de instrumento da Associação dos Servidores do Ministério da Ciência e Tecnologia (ASCT). A liminar não trata da situação da atual diretoria, indicada pelo governo do presidente interino, Michel Temer. O processo é da ASCT é anterior a troca no comando da Geap, por mandado de segurança, em 15 de junho. Mas, segundo Souza Prudente, o afastamento desses gestores é uma questão de tempo.
Ele explicou que “um cochilo” do presidente do Tribunal Regional Federal (TRF1), Hilton Queiroz, no plantão do último sábado, permitiu o retorno de Laércio Roberto Lemos de Souza ao Conad, em substituição a Irineu Messias de Araújo. “Aquele mandato de segurança é incabível. O novo Código de Processo Civil (CPC) não permite a cassação da liminar do relator”.
Ao acatar o pedido da ASCT, Prudente destacou que a União defende os 37,55%, mas reajustou sua participação (valor unitário dos servidores) em apenas 23,11%. A prática, disse, contrasta com “a função social do plano de saúde” e configura “conduta abusiva do direito, diante do desrespeito aos princípios da boa-fé objetiva e da equidade”.