STJ julgará presos políticos

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Vigília nos fóruns de justiça de Goiás acompanhará julgamento do habeas corpus dos presos políticos do MST

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) julgará, em 18 de outubro (amanhã), às 14 horas, em Brasília, o habeas corpus dos presos políticos goianos do Movimento dos Sem Terra (MST), militantes da reforma agrária, o geógrafo Valdir Misnerovicz, e o agricultor Luiz Batista Borges, presos há quase seis meses; e Natalino de Jesus e Diessyka Lorena, exilados. O julgamento será feito pelos juízes da sexta turma, Maria Thereza de Assis Moura, Sebastião Reis Júnior, Rogério Schieti Cruz, Nefi Cordeiro e Ericson Maranho.

Militantes do MST e ativistas de diversas entidades do movimento social e pastorais farão uma vigília pacífica nos fóruns de justiça em Goiânia e no interior do estado, a partir das 14 horas, para denunciar a criminalização dos movimentos sociais e exigir a imediata liberdade dos presos políticos. Serão montadas barracas de lona preta, símbolos da luta pela reforma agrária, em frente aos prédios enquanto durar o julgamento no STJ no dia 18 de outubro.

Em Goiânia, a vigília ocorrerá em frente ao Tribunal de Justiça de Goiás (Avenida Assis Chateaubriand, 195, Setor Oeste) a partir das 13h30.

Diversos acampamentos e assentamentos do MST em Goianésia, Rio Verde, Jataí, Corumbá, Cidade de Goiás, Catalão, Crixás, Formosa, Bom Jardim, Ipameri, também estarão mobilizados à espera da decisão judicial.

Defesa

A defesa será feita pelo advogado Aton Fon Filho, especializado em conflitos agrários e direitos de populações tradicionais. Membro da Rede de Advogados Populares, também atua na defesa de militantes e presos políticos. Por ter se engajado na resistência contra a ditadura, Aton passou dez anos preso e foi torturado. Mesmo libertado ainda durante o período militar, só foi legalmente anistiado em outubro de 2013, pela Caravana da Anistia.

Segundo a argumentação, não se tem nos autos da Representação de Prisão Preventiva, nem tampouco no Processo Crime principal, nenhuma prova contundente capaz de comprovar sem sombra de dúvida que os acusados são autores de crimes, nem prova que tenha qualquer um deles “ordenado” o cometimento de qualquer crime.

O ex-presidente da OAB nacional, Marcelo Lavenère, que também atua no caso, já manifestou sua preocupação com o fato de que a postura do Judiciário possa abrir precedentes a novos casos de perseguição e prisão política no restante do país, explicaram os movimentos sociais.

“Está havendo uma movimentação no Brasil com os olhos voltados para o estado de Goiás. Pela primeira vez, está sendo criminalizado, concretamente, um movimento social, comparando o MST a uma organização criminosa. O despacho é movido por um princípio ideológico e não se sustenta tecnicamente. Nossos clientes não têm nenhuma conduta típica a justificar sua prisão. Não se pode confundir movimento social com organização criminosa. É retrocesso incompatível com os cânones da Constituição Federal”, tem afirmado Marcelo Lavenère.

Segundo o Comitê Dom Tomás Balduíno de Direitos Humanos, que coordena uma ampla campanha para libertação dos presos políticos, trata-se de “a tentativa absurda de colocar na ilegalidade um movimento democrático, que luta pela reforma agrária no Brasil. Toda essa ofensiva é fruto de um avanço das forças conservadoras no âmbito estadual e nacional. Seus integrantes alertam que “a iniciativa de enquadrar o MST como organização criminosa, apesar de ter iniciado em Goiás, já é defendida pela Bancada Ruralista do Congresso Federal e por figuras políticas que estão à frente do golpe.”

Entenda o caso

Nos últimos três anos, houve uma intensificação da luta pela terra, e o número de famílias acampadas aumentou de 600 (em 2013) para mais de 2.000 (2016). Nesse período, ocorreram ocupações na Agropecuária Santa Mônica, latifúndio com mais de 21 mil hectares de terras declaradamente improdutivas registradas em nome do senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), localizado entre os municípios de Alexânia, Abadiânia e Corumbá (GO); e na Usina Santa Helena, latifúndio canavieiro de 22 mil hectares do Grupo Naoum, que deve cerca de 1,1 bilhão de reais a trabalhadores e à União e foi várias vezes denunciado por crimes ambientais. O MST luta para que as terras sejam desapropriadas e entregues à Reforma Agrária para assentamento das 6.500 famílias acampadas no estado, explicou o movimento.

No dia 12 de abril desse ano, os juízes Thiago Brandão Boghi, Rui Carlos de Faria e Vitor Umbelino, das comarcas de Santa Helena, Mineiros e Rio Verde, respectivamente, decretaram a prisão preventiva dos quatro militantes do MST, sob a acusação de fazerem parte de uma “organização criminosa”.

O agricultor Luiz Batista Borges, integrante do acampamento Padre Josimo, foi preso ao se apresentar na delegacia de Rio Verde (Goiás), no dia 14 de abril, ao ser chamado para para prestar esclarecimentos.

No dia 31 de maio, o militante José Valdir Misnerovicz, reconhecido nacional e internacionalmente como ativista pela reforma agrária, foi preso em uma ação articulada entre as polícias de Goiás e do Rio Grande do Sul, onde se encontrava. Valdir, que é geógrafo e tem formação em pós-graduação, dava aula para jovens estudantes de cooperativismo agrícola quando foi surpreendido pela operação da polícia civil dos dois estados. Com militância de mais de 30 anos no MST, ele está preso no Núcleo de Custódia do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia.

Os militantes Natalino de Jesus e Diessyka Lorena estão exilados.

Esta é a primeira vez no Brasil que o MST é criminalizado com base na lei 12.850/2013, que diz respeito às organizações criminosas, informam os movimentos sociais. Esta lei,supostamente criada para atuar contra lavagem de dinheiro e tráfico, pode ser considerada a legitimação de um verdadeiro Estado de Exceção. Com base nela, os inquéritos correm de forma sigilosa e podem automaticamente contar com delação premiada, infiltração de agentes, quebra de sigilo fiscal, bancário e telefônico, escuta ambiente e outras arbitrariedades, apontou o MST.

Diferente do enquadramento por formação de quadrilha, acusação que historicamente os juízes tentavam imputar ao MST e que nunca foi acatada pelos tribunais superiores, a lei de organização criminosa pressupõe a teoria do Domínio dos Fatos. Ou seja, a rigor, entendendo o MST como organização criminosa, qualquer militante pode ser acusado em qualquer inquérito que seja iniciado, disse o MST.