Uma onda de greves toma conta da Esplanada. A demora do Senado em aprovar aumento salarial de uma parcela de servidores e a recusa do Palácio do Planalto a enviar projetos de lei para corrigir os vencimentos de nove carreiras que assinaram acordos no apagar das luzes da antiga gestão criaram um barril de pólvora. Era exatamente o que o presidente interino, Michel Temer, queria evitar ao ir pessoalmente ao Congresso, no início do mês e dar aval aos reajustes. Porém, com a reação negativa do mercado à expansão dos gastos públicos, o processo empacou.
Os auditores-fiscais da Receita Federal, uma das carreiras que não tiveram projeto encaminhado, decidiram cruzar os braços dois dias por semana a partir de quinta-feira. “Foi aprovada paralisação total às terças e quintas. Nos outros dias, faremos operação padrão (fiscalização mais rigorosa na liberação de cargas e bagagens nas aduanas)”, contou Cláudio Damasceno, presidente do sindicato nacional da categoria, o Sindifisco. Segundo ele, o movimento será mantido até que o governo cumpra os acordos salariais. Nos cálculos da entidade, o prejuízo à sociedade é de R$ 1,5 bilhão por dia de paralisação.
O ímpeto grevista ganhou impulso depois de o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, ter informado, em reunião com representantes dos auditores, na quarta-feira da semana passada, que não há prazo determinado para o envio do projeto de reajuste da categoria ao Legislativo, devido a “dificuldades técnicas e jurídicas” em relação à concessão de bônus de eficiência aos profissionais.
Damasceno reclama, no entanto, que, no dia seguinte, foi editada uma medida provisória instituindo um bônus especial de desempenho para os médicos peritos do INSS. “Os auditores não aceitam esse rebaixamento. A atitude do governo uniu o Fisco na busca pela sua valorização. Há até mesmo a adesão de auditores-administradores de todo o país”, ressaltou o presidente do Sindifisco. A Receita corre o risco de parar totalmente. Os analistas tributários também estão mobilizados e, nas terças e quintas, só usam os computadores para discutir questões internas.
Às vésperas do recesso parlamentar, o envio de um projeto de lei se tornou inócuo. Para que o dinheiro do reajuste entre nos contracheques em agosto, conforme prometido em março, o Palácio do Planalto tem como única saída editar uma medida provisória, que passa a valer no dia da publicação. De acordo com Pedro Delarue, diretor de Comunicação do Sindifisco, não está descartada a ampliação da greve para até uma semana seguida. “Hoje (ontem), o pessoal dos aeroportos de Viracopos (SP) e Foz do Iguaçu (PR) se anteciparam e pararam”, disse. No dia 14, devem aderir os servidores que atuam nos portos de Santos (SP), Manaus e Paranaguá (PR), e nos terminais aéreos de Cumbica (SP), Guarulhos (SP) e Galeão (SJ), além da unidade de Uruguaiana (RS) — maior porto seco da América Latina.
Protesto
Os técnicos do Banco Central entraram em greve, por 48 horas, desde ontem. Hoje, receberam o apoio dos analistas e fizeram um ato conjunto de protesto em frente às sedes do órgão, às 9h30, em todo o país. Em Brasília, eles seguiram até o Senado para tentar barrar emendas ao Projeto de Lei da Câmara (PLC) 36/2016, que, além do reajuste salarial, modifica o critério de acesso ao cargo de técnico, de nível médio para nível superior — item considerado o mais importante para a modernização da carreira. A previsão é de que o PLC seja votado, hoje, na Comissão de Assunto Econômicos (CAE).
“O Banco Central já emitiu três notas técnicas garantindo que a modernização é o melhor caminho, devido ao aumento da complexidade das funções da instituição ao longo dos anos. Isso, inclusive, vai baratear o custo para o governo. Dos 3 mil servidores do BC, apenas 14% são técnicos. Faltam analistas, porque eles são deslocados”, disse Willekens Brasil Nascimento, presidente do Sindicato Nacional dos Técnicos do Banco Central (SinTBacen).
Advogados se mobilizam
Na próxima quinta feira, serão votados no Congresso todos os projetos de reajuste enviados no fim de 2015. Várias entidades representativas de advogados federais estão em alerta. Não querem correr o risco de ver mudanças em pontos exaustivamente discutidos com o Executivo. “É hora de intensificarmos a mobilização, comparecendo em peso ao Senado para a aprovação do projeto”, afirmou Marcelino Rodrigues, presidente da Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais (Anafe) .