Wolmer de Almeida Januário e Maria Regina de Sousa Januário*
Está em discussão no Congresso Nacional a reforma da Previdência Social. Entre todas as polêmicas, desde o anúncio da proposta de alteração do sistema previdenciário brasileiro pela equipe econômica de Michel Temer, está a exclusão dos integrantes das Forças Armadas. Apesar da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287/16 para os trabalhadores privados, rurais e servidores públicos precisar de ajustes, a decisão de não incluir os militares neste primeiro momento foi correta, pois a carreira tem particularidades que são incompatíveis com os regimes englobados na reforma.
A principal característica é que, ao contrário do que ocorre com o trabalhador civil, o militar não se aposenta. Vale ressaltar que, atualmente, ao completar 30 anos de efetivo serviço militar, ele é transferido para a reserva remunerada podendo ser, inclusive, novamente convocado para o trabalho. Importante também esclarecer que os militares das Forças Armadas não têm previdência, pois são custeados pelo Tesouro Nacional. E os militares, mesmo na reserva, contribuem para a pensão militar que é destinada aos seus dependentes legais.
A profissão militar tem características próprias com relação aos direitos trabalhistas, como por exemplo: os militares não fazem jus a remuneração do trabalho noturno superior ao do trabalho diurno; estão disponíveis 24 horas por dia – dedicação exclusiva – isto é, trabalham muito mais que a média dos trabalhadores da iniciativa privada e servidores civis; não têm direito a repouso semanal remunerado; não têm direito ao adicional de periculosidade e hora extra; os militares não recolhem o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS); os militares não podem participar de atividades políticas e os militares não podem se sindicalizar.
Em razão desse regime de dedicação exclusiva, de acordo com estudos realizados pelo Ministério da Defesa, os 30 anos de efetivo serviço militar que é a condição necessária para o militar ser transferido para a reserva remunerada, correspondem na verdade a 44 anos de serviço. Assim, os militares trabalham muito mais que os trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos civis.
Os militares estão também sujeitos a uma grande mobilidade geográfica, as chamadas transferências por necessidade do serviço. Essa característica impõe sacrifícios não só ao militar, mas para toda a família, já que a mudança constante de cidade dificulta a construção de um patrimônio para a família, prejudica a educação dos filhos e impõe restrições ao cônjuge para que exerça atividade remunerada.
E por consequência dessas particularidades é que não se deve impor aos militares das Forças Armadas a mesma regra seguida pelos trabalhadores da iniciativa privada. E qualquer mudança que se pensa em fazer deve ser precedida de um estudo aprofundado para não impor ainda mais sacrifícios aos militares, que atualmente são muito mal remunerados, percebendo soldos bem inferiores aos das Polícias Militares de alguns estados, como por exemplo, da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais e do Distrito Federal.
De acordo com estudos do Ministério da Defesa, o militar contribui em média 62 anos para a pensão militar. Pelas regras atuais, os militares têm uma contribuição mensal de 7,5% de suas remunerações. Este valor não é utilizado para custear uma aposentadoria, mas as pensões as quais os familiares têm direito em caso de morte. E no caso de falecimento do militar existe uma ordem de concessão da pensão militar prevista na Lei nº 3.765/60.
Primeiramente, este direito se transmite ao cônjuge, e seguindo esta ordem temos o companheiro ou companheira designada ou que comprove união estável como entidade familiar; pessoa desquitada, separada judicialmente, divorciada do instituidor ou a ex-convivente, desde que percebam pensão alimentícia. Na sequência desta linha estão os filhos ou enteados até 21 anos de idade ou até 24 anos de idade, se estudantes universitários ou, se inválidos, enquanto durar a invalidez; e menor sob guarda ou tutela até 21 anos de idade ou, se estudante universitário, até 24 anos de idade ou, se inválido, enquanto durar a invalidez.
Seguindo a linha de pensamento do Governo Federal na reforma para os trabalhadores urbanos, rurais e funcionários públicos, a principal mudança a ser realizada seria na criação da idade mínima para ir a reserva. Recentemente, o Ministério da Defesa informou que existe uma proposta para alterar a idade para passar à reserva de 55 a 70 anos. Hoje essas idades variam de 44 anos (soldado e marinheiro) até 66 (general de Exército, almirante de esquadra e tenente-brigadeiro).
Entretanto, quem fala em aumentar para 70 anos o limite de idade para a reserva desconhece as peculiaridades da profissão militar. A vida militar envolve risco de vida diário nos treinamentos, as atividades militares exigem aptidão física do militar, e a Nação precisa contar com um efetivo jovem em condições físicas de ser empregado em caso de necessidade. É impossível exigir de um militar com mais de 50 anos que o mesmo participe das atividades militares que são exaustivas.
Portanto, antes de qualquer mudança, o governo deve respeitar as peculiaridades da carreira militar, pois os militares além do risco de morte não possuem diversos direitos trabalhistas.
*Wolmer de Almeida Januário e Maria Regina de Sousa Januário são especialistas em Direito Militar e sócios do escritório Januário Advocacia