A novela Segundo sol chegou e, como anuncia a música de Nando Reis, realinhou a órbita do horário nobre na Globo. Depois do fiasco de O outro lado do paraíso, Segundo sol teve uma primeira semana longe da perfeição, mas bem superior à antecessora.
O autor João Emanuel Carneiro prometeu desde o início o que chamamos de “novelão”, aquela fórmula com triângulos amorosos, vilões bem definidos e um núcleo cômico que dá certo desde outros carnavais. E foi exatamente isso que acompanhamos até agora. A trama principal do cantor que se finge de morto e assume outra personalidade não é das mais originais. Ainda mais se incluirmos a vilã que forja uma gravidez e rouba o bebê da amada do marido.
Mas então, por que motivo Segundo sol chama tanto a atenção? Porque o simples bem feito é bem melhor do que o mirabolante mal executado. O texto de João Emanuel Carneiro flui na fala dos personagens. O autor nos brinda, por exemplo, com um belo diálogo sobre traição entre Zefa (Cláudia di Moura) e Claudine (Cássia Kis) ou com tiradas como “tchau, Beto. Estou indo para o seu funeral” e “e se o joelho acorda e começa a chorar, Karola?”, ditas, respectivamente por Karola (Deborah Secco) e Laureta (Adriana Esteves).
Claro que há deslizes como as expressões “golpistas” e “quem nunca?” em 1999, ano que se passa a primeira fase da novela. Ou a gravidez-expresso de Luzia (Giovanna Antonelli). Também é estranho achar que ninguém ー nenhum morador ou turista ー reconheceu o astro Beto Falcão na ilha de Boiporã.
Como uma grande trama se faz por detalhes também vale a pena lembrar a boa passagem de Daniela Mercury nos funerais de Beto Falcão, com direito a voz embargada e tudo. Vilão de nove entre 10 novelas que se passam no nordeste, o sotaque baiano aparece natural em Segundo sol.
Outro bom motivo para se assistir a Segundo sol é o elenco, afiadíssimo. Deborah Secco na primeira grande vilã da carreira parece ter sido a escolha perfeita para Karola, definida por Laureta como “pistoleira, ex-combatente e bandida”. Escolada em maldades, Adriana Esteves não fica de fora e dá aula como Laureta. Esperta, Adriana deixa para trás o tom histriônico e agudo da Carminha de Avenida Brasil ー outra trama de João Emanuel Carneiro ー e nos brinda com uma vilã muito mais sóbria e contida, o que não deixa espaço para comparações ou confusões.
Entre os homens, Emílio Dantas é destaque absoluto como Beto Falcão, o cantor que se finge de morto e assume a identidade de Miguel. Além de Emílio, Vladimir Brichta como Remy e Fabrício Boliveira como Roberval chamaram a atenção.
Falando dos protagonistas, apenas Giovanna Antonelli, a marisqueira Luzia, parece ter caído na armadilha da novela de duas fases. Explica-se: Segundo sol dará, no início desta semana, um salto de 19 anos, mas pouquíssimas peças do elenco serão trocadas ー economia, Rede Globo? Giovanna compôs uma Luzia que parece ter saído das páginas de Gabriela Cravo e Canela. Brejeira que só ela, a mulher tira forças não se sabe de onde para matar, escapar da prisão e fugir do país. A reviravolta de Luzia, que volta ao Brasil como a DJ internacional Ariella, deve dar mais oportunidades à atriz.
Uma novela que tem como protagonistas um cantor de sucesso e uma cantora de barzinho que vira DJ internacional não poderia dar pouco destaque à trilha sonora. O público pode matar as saudades de O canto da cidade na voz de Daniela Mercury, se deliciar com a arrebatadora versão de Alcione para O mais belo dos belos e ainda ver novos nomes da MPB deitando e rolando em Me abraça e Beija-flor, recriados, respectivamente, por Anavitoria e Johnny Hooker.
Isso sem falar na curiosa Swing all the colors, com DJ I Koko. Confesso que ainda não me acostumei com “No, don’t leave me waiting/Don’t you make me crying / Because I don’t wanna stay by myself” no lugar de “Não, não me abandone/ Não me desespere/ Porque eu não posso ficar sem você”.
Mas já estou completamente acostumado com Beto Falcão, Luzia, Edgar (Caco Ciocler), Cacau (Fabíola Nascimento), Roberval e, claro, Laureta e Karola. Segundo sol chegou para ficar!
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