O sonho mesmo era ser jogador de futebol; craque da pelota, chegou a jogar em equipes do interior paulista e impressionava pela habilidade; os treinadores pressagiavam um belo futuro, quem sabe até a amarelinha da seleção colada no corpo.
Mas a família tinha outros planos e no início da década de 1970 foi mandado para Brasília. Aqui não haveria a tentação do futebol – ainda não havia nem o efêmero time do Ceub – e ele poderia estudar para se tornar médico, o que realmente aconteceu. E revelou-se também um craque na dermatologia, especialização que escolheu.
Não abandonou o futebol, mas limitou-se a jogar com amigos, principalmente depois que consegui comprar a primeira casa, de terreno amplo, onde fez um campo. A casa foi vendida, mas a influência continua tão grande que, aonde for, a pelada ainda leva seu nome.
Anda interno esperando para fazer resistência, foi chamado pelo diretor do hospital. Achou estranho, afinal estava ainda engatinhando em cueiros na profissão; mais estranho ainda foi ouvir o veterano e respeitado professor-doutor pedir que ele fosse atender a uma importante cliente em seu lugar.
Baiacu fora d’água incha. “Certamente que sim”, respondeu prontamente ao diretor sem disfarçar o orgulho de representar um médico tão renomado, principalmente diante de uma de suas mais importantes clientes. Esticou o jaleco, pegou uma malinha para eventuais primeiros-socorros e se dirigiu à casa da senhora.
A cliente era realmente importante; na sociedade que se formava em Brasília era, além de muito rica, influente. Fina e elegante, dava festas memoráveis, com a presença de grandes artistas brasileiros; era presença constante nas colunas sociais, admirada pela inteligência e pelo tratamento sempre cordial. Enfim, se havia fina-flor, era ela.
O jovem médico nunca havia visto uma casa como aquela. Deslumbrado, passou pelos salões, viu quadros de grandes pintores, luxos que nunca havia experimentado. Estava acompanhado pelo mordomo – sim, havia um deles, na linha britânica, de gestos contidos e fala empolada – que se dirigiu ao quintal, na direção de uma construção no fundo do terreno.
Era um canil. Em pé, estava a socialite; cabelos, vestido e sapatos impecáveis, mas demonstrando uma sincera preocupação. Cumprimentou o jovem médico e disse que o Junior – era o nome do cão – estava com “problemas de pele”.
Os dribles do futebol ensinam muita coisa. Refeito do susto, pôs-se a examinar o Junior, fingiu que o couro era pele, e puxou o bloquinho de receitas para a prescrição. Mas evitou botar o carimbinho – não sabe onde o documento poderia parar. E voltou para o hospital.
Bom cabrito, não passou recibo nem reclamou da brincadeira do diretor – e se ele também achasse que o Junior era gente? – e dias depois foi surpreendido com um bilhete da socialite dizendo que o Junior havia se recuperado inteiramente. E um presente: uma garrafa de cinco litros de legitimo Red Label, uma raridade naqueles tempos. Na mesma hora fez um cartaz e pôs na sala dos médicos: “festa, hoje”. E brindaram à saúde do Junior até o sol raiar.
P.S. – O Dr. Sérgio Chamas continua um craque.
Há poucos lugares mais opressivos que sala de espera de médico. Com essas clínicas coletivas,…
Pinheirinhos de plástico com algodão imitando neve, um velhinho barbudo de roupa vermelha, renas do…
A cidade está colorida de novo. Agora são as árvores de cambuís, que vestem as…
Rir é o melhor remédio, diz o bordão popular. Mas certamente isso não se aplica…
Chegara a vez do homem de chapéu. A pele clara e castigada pelo sol tinha…
E agora descobrimos que guardar segredos faz bem à saúde. As tais reservas – desde…