Danilo Leonardi queria ler um livro para jovens e sobre jovens que falasse dos dramas da adolescência de maneira mais real e menos maquiada. O blogueiro achava os personagens desse tipo de literatura muito infantilizados, bobos e um tanto distantes do que realmente sentiam e pensavam os jovens leitores. Com essa ideia na cabeça, foi construindo a narrativa de Coisas inatingíveis.
“Geralmente, quando a gente fala de literatura para adolescentes a gente está falando de algo muito leve, com personagens com algumas imaturidades que encontramos mais em crianças, um apetite sexual geralmente, muito diminuído em comparação com o real”, explica Leonardi. “São adolescentes perfeitos e idealizados que nunca beberam, fumaram e nunca fizeram uma série de coisas que a maioria das pessoas fazem na adolescência.”
Para se aproximar de um universo menos ingênuo e idealizado, Leonardi fez uma grande mistura e juntou referências como o seriado norueguês Skam e os livros do norte-americano Andrew Smith, autor de narrativas nas quais os personagens precisam sempre enfrentar os próprios medos. A ideia era escrever um livro no qual os leitores pudessem reencontrar um pouco desse universo sombrio, perverso e um tanto selvagem que a literatura para adolescentes muitas vezes evita.
Criador do Gayrotos, canal no YouTube sobre relacionamento homoafetivo entre jovens e adolescentes e com mais de 240 mil inscritos, e do Cabine literária, videoblog dedicado a livros, Leonardi sabia que o tipo de literatura de Coisas inatingíveis podia encontrar barreiras no mercado editorial. Seu livro de estreia, Por que Indiana, João?, trouxe uma história de bullying superado com um vídeo que viraliza na internet. Coisas inatingíveis tem mais tabus e aborda temas como suicídio e drogas. “Quando escrevi o livro, sabia que qualquer editora que aceitasse estaria correndo um risco porque quando você tem um livro com sexo, palavrões e drogas, fica muito difícil, por exemplo, trabalhar esse livro em escolas. Então você precisa de um apelo comercial bem grande para convencer o editor de que vale a pena investir nesse tipo de literatura também. Eu acredito que vale mas, mesmo assim, é um risco”, conta.
Os quatro protagonistas de Coisas inatingíveis vivem a vida intensamente e não se preocupam com o amanhã. Para Bianca, Raí, Bernardo e Cris, todo dia pode ser o último, então é preciso aproveitar. Um pouco de inconsequência conduz a vida dos meninos, mas também uma vontade natural de descobrir por si mesmos o que é bom ou ruim. “Eu gosto muito de um tipo de literatura como essa que considero, na verdade, amoral. Não existem reflexões prontas, mastigadas para o leitor dizendo o que é bom e o que é ruim. Até porque, acredito que tudo é muito relativo”, avisa o autor. “No meu livro, os personagens sofrem as consequências por todas as coisas que fazem e cabe ao leitor construir a própria moral da narrativa.”
Muitos diálogos e uma narrativa bem direta marcam a escrita de Leonardi, que agora quer falar também de preconceitos e poliamor. “Estou escrevendo um conto sobre o preconceito que existe dentro da comunidade LGBT em relação a pessoas trans, ou afeminadas”, avisa o autor, que assume buscar as temáticas na sua própria experiência de vida. O poliamor, por exemplo, é algo que Leonardi está vivendo este ano, depois que ele e o namorado se apaixonaram por uma terceira pessoa e passaram a encarar um relacionamento a três. “Cada vez que entro em uma experiência nova tenho vontade de falar e escrever sobre isso. É uma das partes mais gostosas de ser escritor”, garante.
Coisas inatingíveis
De Danilo Leonardi. Planeta, 224 páginas. R$ 32,90