Cosette Castro & Simone Lima
Brasília – No Coletivo Filhas da Mãe temos um grupo de WhatsApp que diariamente acolhe pessoas que cuidam familiares com demências.
É desafiador enfrentar todo o dia as mudanças do familiar. No decorrer da doença, elas e eles têm perdas cognitivas, físicas e de linguagem.
Dentre as angústias das pessoas que cuidam familiares, uma demanda frequente é a forma de lidar com os momentos de agitação, ansiedade, delírios e até agressividade. Muitas vezes existe uma expectativa de que um medicamento “resolva” tudo.
Nem sempre os medicamentos prescritos resultam no efeito desejado. Ou ajudam inicialmente, mas deixam de fazer efeito com a evolução da demência. Isso é parte da característica progressiva da doença. É urgente voltar ao especialista, relatar o que está ocorrendo e pedir adaptação dos medicamentos.
Como lembra Simone Lima, professora de Psicologia aposentada da UnB e uma das Coordenadoras do Coletivo Filhas da Mãe, cada pessoa tem um organismo diferente, reage diferentemente das outras e próprio organismo vai mudando.
“Não tem um medicamento único que resolva a agitação, a vontade de ir embora, a agressividade, as compulsões, a insônia. E um medicamento que funciona por um período, de repente não vai funcionar mais.”
Faz parte das características das demências. Segundo Simone, é importante buscar profissionais que proponham a medicação e que acompanhem os efeitos, modificando dosagens ou medicamentos, se necessário. E é preciso seguir as prescrições à risca.
“Quando eu ainda morava nos Estados Unidos e não era a cuidadora, foram administrados a ela antipsicóticos como a quetiapina (fora da dose prescrita) e benzodiazepínicos (não prescritos) para o “manejo” de suas manifestações.
Ela se tornou um espectro dela mesma, sedada, babando, dormindo o dia todo. Era comum que ficasse e foi ficando hipoglicêmica, desidratada. Ela foi aprofundando na demência, sem reconhecer ninguém, sem iniciativa.
Voltei para o Brasil para cuidar da minha mãe e assumi a curatela, junto com outra familiar. Desde então, o medicamento, devidamente usado, é prescrito pela médica dela e ajustado cuidadosamente.
Atualmente é ministrada uma dose mínima como SOS, muito eventualmente. Às vezes passa um mês sem precisar medicar antipsicótico em uma pessoa que diziam “precisar” de medicamento todo o dia, várias vezes ao dia. Com esse e outros cuidados, a despeito do avanço de dois anos da demência, ela está mais tranquila, ativa e interativa.
O que fazemos nas crises de ansiedade ou de agitação é acolher a ansiedade, o medo, a raiva.
Ao invés de dizer “não, você não perdeu uma criança no trem, cê tá doida? “, digo: “nossa, mãe, que susto! a criança se perdeu em um minutinho, mas já tá com a mãe dela.”
Nas horas que ela quer “ir pra casa”, uma boa alternativa é concordar. E dizer: “OK, mas eu vou mandar o menino ali no condutor do trem/ no piloto do avião pra saber que horas sai o próximo. Enquanto a gente espera, vamos olhar umas fotos?”
Apesar da mudança de temperatura, é importante levar o familiar para se expor ao sol todos os dias. Mesmo nos dias que as cuidadoras profissionais acham “frio”. Lembro que minha mãe morou em clima frio e saía na rua. É só agasalhar bem.
Oferecer exercício físico e troca de ambiente ajuda a mudar a atenção da pessoa com demência. Muda o foco. Às vezes, só sair de um cômodo para o outro, olhando novos objetos, fotos e vistas, já ajuda.
Outra atividade que é feita em casa é ocupar as mãos da minhã mãe com objetos sensoriais. Ou com atividades como dobrar toalhas, cortar uma verduras da salada (rasgando as folhas com as mãos se com a faca for problemático), catar florzinha seca do pote de plantas, etc.
Para tranquilizá-la, costumo oferecer óleo essencial de lavanda pra cheirar e colocar músicas calmas que ela gosta. Ou conduzir meditação simples, se ela não estiver muito agitada.
Convidar pra dançar, de pé, ou sentada, se ela estiver cansada, também é uma distração divertida e relaxante. Ou ainda dançar só com as mãos ou só com os pés.
O estabelecimento de rotinas, a higiene do sono, a alimentação saudável e a hidratação adequada também impactam muito na redução de crises.
Sobre a violência de nossos parentes em processos demenciais, é preciso ter espaços para falar sobre a dificuldade de ser chamada a cuidar de alguém que era ou se torna violento ou agressivo.
São situações muito complexas. É preciso autocuidado e levar em conta que o nosso amor tem limites. Mesmo no cuidado de nossos parentes.
No caso da minha mãe, ela é uma pessoa amorosa e sempre foi depois da demência. Mas essa não é a realidade de todas as pessoas.
Quem envelhece e entra em demência, adoece após toda uma vida relacional que precisa ser vista e levada em consideração.”
Por isso, além de oferecer informações sobre demências, nós, do Coletivo Filhas da Mãe consideramos tão importante cuidar de quem cuida.
Em nossos espaços, acolhemos a diversidade de experiências em cuidar da outra e do autocuidado. E, coletivamente, aprendemos a fazer as coisas de maneira diferente.
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