Tag: Brasil
VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)
Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade
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Na equação matemática que analisa a variação nos números da riqueza de um indivíduo ou empresa, não há lugar para variantes que representem perdas ou diminuição de patrimônio. Ao primeiro sinal de que essa variação na riqueza tende a decrescer, soa o alarme e as luzes vermelhas, indicando que é hora de proteger o capital. Em toda a parte e em todo o tempo da história humana, o senso de proteção dos bens é uma atitude natural. A questão é simples: se você não cuida de proteger o que é seu por direito, não espere que outros venham a fazê-lo em seu lugar.
Na atual situação de penúria econômica em que vive o Brasil, resultado, como sabemos, da ação perdulária da atual gestão do país, não chega a ser estranho que parte da população mais rica tenha escolhido o caminho do aeroporto para salvaguardar a si e a seus bens. Não tendo a quem mais culpar pelos descaminhos das finanças, o governo, movido por ideais de matizes socialistas, passou a mirar nos mais ricos, acusando-os primeiro de serem insensíveis à evidente bancarrota nacional, para depois justificar um conjunto de medidas draconianas, visando dilapidar também todo e qualquer patrimônio privado, na forma de novos e escorchantes impostos.
Pelo o que foi divulgado, a intenção é impor uma tributação progressiva para aqueles que o governo chama de super-ricos. Ora, ora, ora, se fosse para tributar, com essa sede, os muitos super-ricos que compõem o atual governo, a medida ficaria de bom tamanho. Mas nesse lado do muro não se mexe em nada. A questão está do outro lado e recai, principalmente, sobre os empresários que nada devem ao governo e estão fora do clube dos campeões eleitos. Como aqueles que geram riquezas não padecem do mal da burrice, a solução é colocar o dinheiro nas malas e sair o mais rapidamente do país. Quem entende minimamente da aritmética das finanças, e percebe a ladeira abaixo em que vai rolando o país, sabe que nem com todo o dinheiro arrancado dos super-ricos seria possível salvar o Brasil. Também nesse ponto, a questão é simples: não é o dinheiro que falta ao país, e sim a boa gestão dos recursos que já possui e que nos tornaram o país com a maior carga tributária do planeta. É como repetia o filósofo de Mondubim: quem não respeita os centavos, não respeita os milhões, pois dinheiro não aceita desaforo e por ele não se deve nem brigar, nem brincar.
No Febeapá que assola o Ministério da Economia, ninguém está livre de ser tungado, até que mostre os bolsos vazios virados ao avesso. É claro que a culpa pela falência anunciada não é dos super-ricos, mas tão só e exclusivamente da atual desastrosa gestão do país. Mas isso não se diz. Êxodo de milionários: Para se ter uma ideia do desastre que é mirar nos super-ricos, acusando-os de serem os responsáveis por mais essa crise, temos que em 2025, o Brasil deve registrar a saída líquida de cerca de 1.200 milionários (pessoas com patrimônio superior a US$ 1 milhão), um recorde para a América Latina, o que representa uma perda estimada de US$ 8,4 bilhões em riqueza transferida para o exterior. Isso também marca um aumento expressivo de 50% em relação a 2024, quando apenas cerca de 800 milionários deixaram o país.
Esse movimento para fora, coloca o Brasil como o 6º maior país no êxodo global de milionários em 2025, atrás apenas do Reino Unido, China, Índia, Coreia do Sul e Rússia. Entre os principais destinos desse pessoal incluem EUA (notadamente a Flórida), Portugal, Ilhas Cayman, Costa Rica e Panamá, ou seja. onde seu dinheiro é respeitado. Essa migração certamente valida a impressão de que os mais ricos, alertados por instabilidade política, carga tributária elevada, insegurança e gestão econômica problemática, estão realmente buscando proteção para seus bens (e suas famílias) em outros lugares bem longe do Brasil e do seu governo. Outros dados também influenciam nesse êxodo como a percepção de que a corrupção continua altíssima: 59,1% dos brasileiros relatam ter “pouca ou nenhuma” confiança na imparcialidade do sistema judiciário.
Além disso, 90,1% acham que políticos são raramente ou nunca punidos, número que sinaliza descrédito institucional profundo. Talvez, não seja surpresa nesse momento que a apropriação de gestão econômica também está sob fogo: pesquisas entre janeiro e fevereiro de 2025 mostram desaprovação da gestão presidencial muito superior à aprovação, chegando a 51% de reprovação e apenas 24% de aprovação. Por outro lado, as preocupações com inflação, carga tributária, economia e reforma tributária são predominantes entre os brasileiros, sobretudo, a inflação foi apontada por 75% como o maior problema econômico do nosso país hoje.
O sistema tributário brasileiro e a burocracia são reconhecidos como um dos principais entraves às empresas: o chamado “Custo Brasil” inclui infraestrutura deficiente, carga tributária alta e complexa, o que torna a indústria menos competitiva, segundo levantamento recente. A política de taxação agressiva contra os mais ricos, em especial propostas como maior tributação sobre patrimônio, herança e dividendos, parece uma contradição flagrante: em vez de aumentar a arrecadação, pode acelerar a fuga de pessoas e recursos, diminuindo a base tributável efetiva e fragilizando ainda mais o país. É o tiro no pé que faltava. Além disso, a saída anual de 1.200 milionários representa não só uma perda imediata de capital, mas também de poder influente, investimentos, empregos e inovação, fatores críticos para recuperação econômica. Ignorar falhas de gestão, corrupção e baixa confiança pública, ao atribuir a “falta de respeito por centavos” apenas a um grupo econômico, desvia o foco do núcleo do problema: a derrocada estrutural vem da má administração, e não da concentração de riqueza per si.
A frase que foi pronunciada:
“Sell in may and ago away”. (Venda em maio e vá embora)
Provérbio do Mercado Financeiro

História de Brasília
O senhor Martins Rodrigues, que reside em Brasília, e que daqui a pouco arrasta o pé , bem poderia patrocinar essa causa em benefício do Distrito Federal, com a autoridade de líder da maioria. (Publicado em 08.05.1962)
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Com a ascensão de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos, um rompimento explícito com a ordem econômica global estabelecida a partir da década de 1990 foi deflagrado, contra a então predominância do globalismo. Com isso, houve um rompimento nos mercados abertos, nas cadeias produtivas transnacionais, na livre circulação de capitais e a busca de organismos multilaterais como a OMC, o FMI e o Banco Mundial como instâncias reguladoras. O que estamos assistindo é uma revolução não só nos Estados Unidos, como no restante do mundo. Trump, desde a campanha de 2016, apostou em uma visão de geoeconomia soberanista, baseada na lógica do “America First”. Essa linha, como não podia deixar de acontecer, rompeu com a ortodoxia liberal internacionalista dos próprios republicanos e democratas tradicionais, produzindo impactos profundos em todo o sistema então vigente.
A começar pela guerra comercial com a China, com as tarifas impostas por Trump em 2018, abrindo uma nova fase de rivalidade econômica, onde a interdependência passou a ser vista não como segurança, mas como vulnerabilidade estratégica. Esse movimento levou a uma fragmentação nas cadeias globais de suprimentos, acelerando a busca pelos chamados reshoring (trazer indústrias de volta ao território nacional) e nearshoring (aproximação da produção em países vizinhos, como o México).
A administração Trump provocou também uma erosão do multilateralismo, enfraquecendo, por tabela, o papel da OMC, ao bloquear indicações para seu órgão de apelação, pressionando, ainda, aliados europeus a aumentarem gastos militares sob ameaça de sanções comerciais, além de questionar abertamente as alianças como a Otan sob a ótica custo-benefício. Com essas medidas, a economia mundial deixou de ter os EUA como líder previsível do “consenso globalista” e passou a lidar com uma potência mais transacional e pragmática. Afinal, já era tempo.
O resultado foi a elaboração de uma nova lógica de alianças. Em vez de defender a universalidade do livre comércio, os EUA passaram a firmar acordos bilaterais vantajosos, como renegociações com o México e o Canadá (USMCA, substituto do Nafta), em que garantiram melhores condições para a indústria americana. Isso, obviamente, mudou a lógica do comércio internacional, estimulando outros países a pensarem em termos de blocos fechados ou pactos estratégicos seletivos.
É o mundo se reciclando. O impacto sobre a antiga ordem globalista foi e está sendo fatal. O globalismo, baseado na ideia de um mercado único e interdependente, perdeu vigor. A pandemia de covid-19 e, depois, a guerra na Ucrânia apenas reforçaram essa tendência de desconfiar das cadeias longas de suprimento e buscar autonomia estratégica. Hoje, governos em várias partes do mundo começam a aplicar as políticas protecionistas propostas por Trump, sobretudo no setor tecnológico e energético. A rearrumação da economia em escala global, segue a todo o vapor dentro agora dos princípios da geoeconomia — ou seja, abarcando não só os aspectos espaciais da economia, mas também os aspectos temporais e políticos, sempre de olho nos recursos.
O que estamos assistindo é a uma inter-relação entre economia, geografia e política. Fosse lida nas entrelinhas, a carta endereçada por Trump ao governo brasileiro já seria necessária para uma mudança de rumos no cenário nacional, evitando, ao máximo, a geração de conflitos de ordem ideológica com o governo americano. O Brasil, ao longo das últimas décadas, oscilou entre o entusiasmo globalista e a retórica ideológica. O problema é que, ao permanecer preso a narrativas antiquadas de um comunismo ultrapassado e a disputas políticas internas, perdeu capacidade de reposicionamento no cenário internacional. Com isso, as consequências não poderiam ser outras daquelas que agora vemos. A começar pela perda de protagonismo comercial: enquanto México e países do Sudeste Asiático se beneficiam do “desvio de comércio” provocado pela guerra EUA-China, o Brasil segue grudado em debates ideológicos e a uma excessiva dependência da exportação de commodities.
O próprio Brics se constitui neste momento como uma espécie de amarras para nosso país. O que se vê, logo de saída, é a dificuldade de integração a novas cadeias produtivas: a indústria brasileira não conseguiu atrair investimentos estratégicos em semicondutores, baterias, inteligência artificial e biotecnologia, setores centrais da nova geoeconomia. Também se vê apego a modelos ultrapassados: parte da elite política e intelectual insiste em discursos de luta de classes e narrativas anti-imperialistas do século 20, enquanto o mundo caminha para um realismo geoeconômico pragmático, em que países buscam soberania produtiva e alianças flexíveis.
Dessa forma, o risco de irrelevância estratégica desponta no horizonte. Sem uma política externa clara que saiba negociar com EUA, China e Europa ao mesmo tempo, o Brasil corre o risco de permanecer apenas como fornecedor de produtos primários, sem influência real nos novos arranjos globais. É o prolongamento de um subdesenvolvimento crônico, atado a políticas anacrônicas. Em vez de se adaptar a essa nova lógica de pragmatismo econômico, o Brasil ignora a oportunidade de sua inserção soberana e competitiva nessa nova ordem que parece ter vindo para ficar. É uma pena.
A frase que foi pronunciada:
“A América não tem amigos permanentes ou inimigos, apenas interesses.”
Henry Kissinger

História de Brasília
A Universidade de Brasília solicitou ao Iapi e êste à Novacap para que sejam abertas fossas “provisórias” para os blocos 4 e 7 da superquadra 305. Nada mais absurdo. Ou muda tudo ou não deve haver privilégio em detrimento de outros.
(Publicada em 5/5/1962)
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Justiça das justiças seria, em tempos menos enevoados, acabar para sempre com a confusão feita hoje entre o papel específico da Justiça Eleitoral, com seu ordenamento próprio, muitos deles aplicáveis especificamente apenas em período eleitoral de campanhas, e o que entende o Supremo, em nome daquilo que acredita como defesa da democracia. Eis aqui o que resume o texto do advogado Nicolau da Rocha Cavalcanti, publica no Estadão (27 de agosto) sob o título “A confusão feita pelo STF”. Talvez, esse seja o grande tema a ser levado em consideração nesses dias de judicialização geral do país e num momento em que o atual governo lança e anuncia, publicamente, a abertura da temporada de campanha política rumo a 2026 com o lema: “O Brasil é dos brasileiros”.
A confusão entre a jurisdição eleitoral e a jurisdição constitucional não é apenas técnica; é sintoma de um país vivendo uma “campanha permanente”, onde tudo vira disputa, inclusive, o sentido da lei. A Justiça Eleitoral nasceu para garantir igualdade de condições no jogo, não para arbitrar o jogo inteiro.
O Supremo foi concebido para a guarda da Constituição, e sua intervenção é excepcional, quando há questão constitucional relevante. Entre ambas, a Constituição esculpiu um encaixe delicado: o TSE decide, em última instância, salvo matéria constitucional, quando então cabe extraordinário ao STF. Quando esse encaixe se rompe, a política escorre para os tribunais e os tribunais reagem politizando-se, mesmo sem querer. O resultado é uma dupla erosão: a confiança pública e a previsibilidade das regras.
No ambiente de 2026 à vista, cada ato de governo ou oposição é lido à luz do pleito, e o contencioso vira arma retórica. A Justiça Eleitoral possui poder regulamentar para dar execução fiel às leis, por resoluções, desde que não inove o ordenamento. Isso é crucial: “regulamentar” não é “legislar”.
Quando resoluções parecem criar obrigações novas, o sistema range e o debate migra ao STF. É nesse vaivém que nascem acusações de “ativismo” de parte a parte. Mas ativismo e judicialização não são sinônimos: judicialização decorre da Constituição generosa em direitos e do déficit de resposta política; ativismo é escolha interpretativa de maior intensidade.
No Brasil, a judicialização aumentou porque a política terceirizou decisões impopulares e porque a sociedade recorreu aos tribunais para concretizar direitos. O problema é quando a exceção vira regra e o rito eleitoral se confunde com a tutela da democracia como um todo. A tutela da democracia não é um cheque em branco; ela precisa de base normativa clara, motivação estrita e proporcionalidade.
O TSE guarda o processo eleitoral; o STF guarda as cláusulas constitucionais que lhe dão sentido. Quando o debate é sobre “como fazer campanha”, estamos no campo do TSE; quando é sobre “quais liberdades limitam o como”, toca-se o STF. No regime brasileiro, propaganda eleitoral tem janela legal definida e limites materiais.
A pré-campanha admite manifestações sem pedido explícito de voto, mas não autoriza abuso de meios ou confusão entre Estado e candidatura. Nessa fronteira, o “poder de polícia” eleitoral precisa ser acertivo, e não difuso. A anualidade eleitoral exige que mudanças de regras não valham às vésperas, protegendo segurança jurídica. Quando a política opera como se a campanha já estivesse em curso, cresce o incentivo a “resolver no tribunal” o que deveria ser resolvido no debate público. E os tribunais, pressionados por desinformação e hostilidade, tendem a ampliar autodefesas institucionais.
Exemplo eloquente foi a validação do inquérito sobre ataques ao STF, em meio a agressões coordenadas: um remédio duro, que seguiu vivo por emergência institucional. Na esfera eleitoral, decisões de alta repercussão como a inelegibilidade do ex-presidente por abuso de poder e uso indevido de meios de comunicação demonstram a potência e o custo dessas respostas. O custo é político: cada sanção vira narrativa de perseguição para uns, de higiene democrática para outros. O ganho é normativo: o sistema reafirma que há linha divisória entre Estado e projeto eleitoral.
O desafio é calibrar.Calibrar é aplicar regra com proporcionalidade, transparência e deferência democrática. Deferência democrática significa respeitar escolhas políticas legítimas, sem abdicar do controle de constitucionalidade. Proporcionalidade ao escolher a medida menos intrusiva para proteger a igualdade do pleito. Transparência para fundamentar decisões com critérios replicáveis, acessíveis e previamente conhecidos. A confusão atual nasce também da arquitetura da comunicação em redes, que tensiona o tempo do Judiciário. A Justiça decide em meses; a opinião pública move-se em horas.
A frase que foi pronunciada:
“Não basta que todos sejam iguais perante a lei. É preciso que a lei seja igual perante todos.”
Salvador Allende

História de Brasília
Atitude de lucidez e honorabilidade, a das professôras primárias. Suspenderam a greve, porque entenderam que o professor não é profissional para regime de fôrça ou de imposição. Resolveram aguardar as providencias do govêrno com a construção de novas residências. (Publicada em 09.05.1962)
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Alarmante é o estudo apresentado pela Cambridge University Press mostrando que 61,6 milhões de brasileiros, ou algo como 26% da população, vivem sob regras impostas por facções criminosas espalhadas por todo o país. São cidadãos que, por ausência do Estado, estão colocados sob o jugo da chamada governança criminal, que, com leis e punições próprias, controlam imensos territórios.
Mostra ainda, o estudo, que a vida comunitária nesses locais está sujeita a estreitas regras impostas por essas organizações, afetando do acesso a serviços públicos a até mesmo as eleições, onde, sob grande pressão, essas comunidades acabam votando em candidatos ligados aos criminosos e aos seus projetos.
Dinheiro para esse país controlado pelo crime não falta. Apenas em 2024, as organizações criminosas movimentaram mais de R$ 150 bilhões em recursos vindos de uma multiplicidade de fontes ilegais que, depois, são branqueadas por empresas de fachadas, também espalhadas por todo o país. A área de compra e venda e distribuição de petróleo e derivados tem sido a predileta desses grupos, por serem produtos onde a falsificação e a sonegação são mais facilitadas. O fato é que o crime organizado não depende do governo para se estabelecer e crescer. Tem renda própria, maior que muitos municípios juntos.
Seu poderio tem crescido e se expandido enormemente nos últimos anos. As forças de segurança, com recursos econômicos cada vez mais minguados, conhecem bem o poderio de fogo desses criminosos, cada vez mais bem armados e treinados em táticas de guerra.
São, de fato, organizações com atuação sofisticada e que chegam a operar até de dentro da própria máquina do Estado. Levantamento feito pela Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen) mostra que o Brasil tem, aproximadamente, 100 grandes e pequenas organizações criminosas. Entre 2022 e 2024, facções do crime foram identificadas dentro de 1.760 pavilhões prisionais por todo o país. É um mundo à parte, ou submundo paralelo, ao qual os brasileiros fingem não conhecer por medo e as autoridades, por questões diversas, fazem questão de deixar em paz.
Algumas entidades que estudam esse caso escabroso chegam a afirmar que hoje quase um terço da população brasileira se encontra direta ou indiretamente subjugada por organizações criminosas de toda a espécie. Os Estados Unidos, por exemplo, já manifestaram diversas vezes sua preocupação com a expansão das facções brasileiras, especialmente pela conexão dessas organizações com cartéis internacionais e com redes de lavagem de dinheiro que atravessam fronteiras. O Comando Vermelho e o PCC são frequentemente citados em relatórios do Departamento de Estado e da DEA (Drug Enforcement Administration), devido ao envolvimento não só no tráfico de drogas, mas também no fornecimento de armas e na articulação de redes ilícitas que chegam a países vizinhos.
Nesse ponto, surge a tênue linha que separa o crime organizado dos grupos classificados como terroristas. Ao controlar territórios, impor regras, financiar campanhas políticas e transnacionalizar suas operações, essas facções já não atuam apenas como máfias locais, mas assumem características de organizações insurgentes. O risco, apontado por especialistas, é de que a América Latina se torne um grande corredor de instabilidade, onde o narcotráfico e o crime organizado se transformem em ameaças diretas à segurança nacional de vários países.
Não se trata mais de uma guerra localizada nas periferias brasileiras, mas de uma expansão continental. Países vizinhos, como Paraguai, Bolívia e Colômbia, sofrem com a presença desses grupos, seja pela penetração financeira, seja pela utilização de seus territórios como rotas de tráfico. Em consequência, cresce a possibilidade de cooperação internacional em operações de inteligência e segurança, com os EUA exercendo um papel central.
O que o estudo revela, portanto, é que o Brasil corre o risco de se tornar um epicentro do crime organizado transnacional, com ramificações que fragilizam democracias inteiras. Se nada for feito em termos de coordenação internacional, políticas públicas efetivas e fortalecimento do Estado, a tendência é de que essas organizações não apenas se consolidem, mas avancem para um patamar ainda mais perigoso, assumindo funções tipicamente políticas e desestabilizando o continente como um todo.
A frase que foi pronunciada:
“Nossa geração não lamenta tanto os crimes dos perversos quanto o estarrecedor silêncio dos bondosos!”
Martin Luther King

História de Brasília
Entrando ou saindo de uma superquadra, ponha seu carro em segunda. Respeite o pedestre que está atravessando na faixa de segurança. Êle tem direito, mesmo que não haja guarda orientando o tráfego. (Publicada em 8/5/1962)
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Em matéria tributária, o paradoxo brasileiro é tão evidente que quase já não causa estranhamento. A recente atualização da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física, apresentada como medida de alívio às camadas de menor renda, repete um enredo conhecido: na prática, mantém privilégios para os mais ricos e pouco altera a desigualdade estrutural.
Em 2024, a carga tributária bruta brasileira alcançou 32,32% do Produto Interno Bruto, segundo dados do Tesouro Nacional. O número coloca o país entre os que mais tributam no mundo, em patamar semelhante ao de economias desenvolvidas, mas sem a correspondente qualidade nos serviços públicos. O paradoxo se agrava quando se observa que, apesar da pesada arrecadação, o Brasil ocupa a pior posição no ranking do Estudo IRBES 2023 — que avaliou o retorno social dos tributos entre os 30 países com maior carga tributária. Na prática, cobra-se como país rico e devolve-se como nação pobre.
Cotidianamente a percepção dessa contradição explica a disseminação da chamada cultura do escapismo fiscal. O contribuinte médio, consciente de seu esforço, sabe que não terá acesso a hospitais adequados, escolas dignas ou transporte decente, e a partir daí o problema não se resume apenas à evasão. A maior distorção está no próprio desenho da tributação, que isenta lucros e dividendos e concentra o peso sobre salários. De acordo com estudos oficiais, para cada real pago em imposto pelos mais ricos, outros dois reais permanecem intocados em rendimentos não tributáveis.
Em contrapartida, trabalhadores que recebem entre um e dois salários mínimos veem, para cada real isento, outros R$ 7,60 confiscados na fonte ou na declaração. Nesse contexto, as promessas de campanha que ampliam gastos públicos apenas reforçam a engrenagem do desequilíbrio. A multiplicação de ministérios, a manutenção de programas sem fonte de custeio e a ampliação de benefícios sociais sem a correspondente base arrecadatória aumentam a pressão sobre o orçamento. O Tesouro Nacional informou que a dívida bruta já supera 75% do PIB, percentual elevado para uma economia emergente. Alguém inevitavelmente terá de pagar essa conta, e a história mostra que a fatura recai quase sempre sobre a classe média e os trabalhadores formais.
Há, ademais, o problema da opacidade fiscal. Apesar das normas de transparência, a execução orçamentária continua marcada por manobras, apelidadas de “pedaladas” quando ganharam notoriedade política. O mecanismo de mascarar resultados, embora duramente criticado, ainda resiste sob novas roupagens. Segundo a Confederação Nacional da Indústria, a própria complexidade do sistema custa às empresas cerca de R$ 60 bilhões anuais apenas em horas destinadas ao cumprimento de obrigações acessórias. É um peso que desestimula investimentos e corrói a competitividade.
O Projeto de Lei nº 1.087/2025, atualmente em tramitação no Congresso, tenta alterar esse quadro. A proposta prevê isenção para quem recebe até R$ 5 mil por mês, redução de alíquotas até R$ 7 mil e, sobretudo, a criação de um imposto mínimo sobre super-ricos. Estudo do Ministério da Fazenda indica que a medida poderia elevar em até 45% a tributação sobre o 0,01% mais rico da população, corrigindo uma distorção histórica. Além disso, a desigualdade medida pelo Índice de Gini cairia de 0,6185 para 0,6178, e a progressividade do sistema aumentaria em 30%. Ainda que modestos, são efeitos concretos na busca por maior justiça fiscal.
Na tabela já definida para 2025/2026, a faixa de isenção foi ampliada para R$ 27.110,40 anuais, com alíquotas progressivas que chegam a 27,5% para rendimentos acima de R$ 55.976,16. Embora o avanço represente alívio pontual, não enfrenta a raiz da desigualdade: a ausência de tributação sobre grandes fortunas, lucros e dividendos. Sem essa correção, o discurso de justiça tributária permanece mais retórico do que efetivo.
Imposto, em qualquer tempo histórico, foi percebido como imposição. A diferença está no que o Estado devolve à sociedade. Países que alcançaram equilíbrio social transformaram tributos em serviços públicos de qualidade, entendendo a arrecadação como pacto coletivo. No Brasil, o pacto está rompido. Cidadãos pagam muito, recebem pouco e ainda convivem com o espetáculo de desperdícios e privilégios. O contribuinte comum não se recusa a colaborar, mas cobra transparência, eficiência e retorno, no mínimo.
A cada nova eleição, renova-se a promessa de alívio. Contudo, o que se observa é a repetição de práticas que oneram quem menos pode e preservam quem mais acumula. Sem coragem política para rever isenções, simplificar o sistema e combater o desperdício, o país continuará condenado a viver sob o signo do paradoxo: tributa como nação rica, devolve como sociedade pobre, e perpetua a desigualdade que promete combater.
A frase que foi pronunciada:
“O desafio da esquerda é maior do que nunca. A gente nunca conviveu com uma situação tão adversa.”
Fernando Haddad

História de Brasília
O que há é falso sensacionalismo. Pura e simplesmente. O rapaz está há um ano esperando julgamento e já foi adiado duas vêzes. (Publicado em 08.05.1961)
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Ignorar as relações estreitas entre economia e política pode ser a mais imprudente atitude de um governante. Embora a população possa não perceber essa relação de imediato, é certo que, em algum momento, todos, invariavelmente, irão sentir que a adoção de políticas erradas e mal adotadas trarão malefícios para todos. Política, nesse caso, é a arte de perceber a realidade e não se deixar levar por projetos e ideias fora dela.
Desde abril de 2025, uma escalada de tensões transformou o relacionamento entre Brasil e Estados Unidos em uma crise diplomática profunda e jamais vista nesses últimos dois séculos de relações com o irmão do Norte. A imposição inicial de 10% de tarifas em abril evoluiu para uma alíquota monumental de 50% em julho, com vigor a partir de 1º de agosto. Os impactos diretos sobre as exportações brasileiras de café, carne, suco, produtos aeroespaciais e outros setores estratégicos foram duramente sentidos. Estima-se perda de mais de 100 mil empregos, redução das exportações à metade e queda de 0,2 ponto percentual no PIB já imediatamente. O governo estuda essas consequências e segue realizando uma sequência de promessas quando afirma que o Brasil vai sair desse impasse sem prejuízos. O fato é que, se fosse pelo gosto da população, as relações entre Brasil e Estados Unidos não seriam abaladas de modo algum. O aumento do risco-país e da dívida pública prevista para superar os 82% do PIB, pressionando a economia com juros em patamares elevados é o próximo evento negativo a chegar. Também o setor financeiro e empresarial pressionam por uma saída negociada, mas o tom dos discursos oficiais ainda mantém forte componente ideológico, o que é ruim para o país. O custo da retórica ideológica será maior do que o previsto pelo governo. Mas isso não parece incomodar nossos líderes. A população assiste a tudo com um misto de medo e de maus presságios.
Analistas afirmam que a política externa do governo Lula tem sido movida por um claro alinhamento com regimes antagonistas ao Ocidente (como Irã, Rússia, China), reforçando uma diplomacia muito menos pragmática e mais simbólica. Esse posicionamento teria agravado a retaliação americana e ainda pode piorar a situação. A oposição acusa o governo de usar o “inimigo externo” como cortina de fumaça para problemas internos, apontando que o confronto com os EUA desvia a atenção do agravamento econômico e da queda acentuada da popularidade presidencial. Pesquisa recente feita pela Ipsos revela que 69% dos brasileiros percebem uma deterioração social, um aumento de 7 pontos em relação a 2023. Além disso, 62% sentem que o país está em franco declínio. Somado a isso, 76% acreditam que a economia favorece os mais poderosos, e 73% sentem que os representantes políticos não se importam com a população nem com o delicado momento que atravessamos.
Dados do Datafolha apontam aprovação de apenas 28% para o atual comandante do país, com desaprovação em 40%, patamar mais baixo de seu terceiro mandato até agora. Isso alimenta uma polarização que bloqueia o diálogo e diminui a capacidade de resposta do governo a crises reais. Quando políticas são conduzidas com base em ideais descolados da realidade prática, os prejuízos podem se espalhar, ainda que tardiamente, por toda a população. A atual crise Brasil–EUA é exemplo emblemático disso. Temos que admitir que a retaliação econômica americana não foi motivada por desequilíbrio comercial, mas, unicamente, por uma retórica política exaustivamente levada a público, especialmente no que diz respeito ao apoio declarado a Bolsonaro por Trump, e por decisões intempestivas da Justiça brasileira.
Os jornais americanos, mesmo aqueles que são contra Trump, falam dessa situação a todo o momento, comparando a situação do Brasil a de outros países como a Venezuela ou Cuba. O governo brasileiro respondeu com cortes diplomáticos e discurso soberanista, mas faltou uma agenda clara de contenção de perdas ou negociação técnica. Enquanto isso, a população sente o peso: menor crescimento, inflação, empregos ameaçados, sentimento de insegurança social e institucional. Quando governantes se apegam mais a uma ideologia do que ao interesse nacional que aflige diretamente as pessoas, o resultado pode ser devastador e a população acaba pagando o preço. O distanciamento entre o que quer o governo e o que quer a população tem, efetivamente, custado caro ao Brasil tanto na economia exportadora, nos empregos, no bem-estar social como até na estabilidade institucional. Quando um governo levanta a bandeira da “soberania” mas, na prática, essa defesa serve apenas como retórica eleitoral, entramos no terreno da política performática, aquela que prioriza a imagem e o discurso em detrimento de resultados concretos. No caso atual, o apelo à soberania frente aos EUA poderia ser legítimo se viesse acompanhado de uma estratégia econômica robusta, negociações discretas e alternativas reais para compensar as perdas comerciais. Mas o que se vê é quase o oposto.
A frase que foi pronunciada:
“Estamos em uma situação muito inusitada, presidente. O Brasil é um país que está sendo sancionado por ser mais democrático do que seu agressor.”
Ministro Haddad

História de Brasília
O que há de falso sensacionalismo. Pura e simplesmente. P rapaz está há um ano esperando julgamento e já foi adiado duas vêzes. (Publicada em 08.05.1962)
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A história não perdoa os que dormem enquanto o tempo corre. O Brasil, em suas últimas quatro décadas, parece ter cochilado no banco do passageiro enquanto outras nações aceleravam na estrada do desenvolvimento. Enquanto o mundo engatava marcha rumo ao crescimento com médias globais beirando os 117%, o Brasil avançava um tímido 45%, como quem tem pressa, mas tropeça nos próprios sapatos. Países como o Chile, por exemplo, avançaram quase 200% no mesmo período. Não se trata apenas de perder velocidade, mas de perder o rumo.
Tornamo-nos espectadores da própria estagnação. Em 1980, ocupávamos a 48ª posição no ranking de PIB per capita (em paridade de poder de compra) do FMI. Quarenta e cinco anos depois, caímos para a 87ª colocação. Um declínio silencioso, quase imperceptível no dia a dia da população, mas gritante, quando se observam os números. Em 1985, nosso PIB per capita (PPP) era de cerca de US$ 5.890. Em 2019, alcançamos US$ 25.150. Um aumento que parece expressivo à primeira vista, mas que empalidece diante da performance dos países da OCDE.
Enquanto isso, o Chile, que nos seguia de longe no século passado, ultrapassou-nos com folga. Seu PIB per capita (PPP), que era de US$ 3.412 em 1980, saltou para quase US$ 15 mil. Um crescimento de 339%, ante 327% do Brasil. A diferença? Menos retórica, mais ação. Menos Estado interventor, mais liberdade econômica. A Venezuela, por outro lado, serve como espelho sombrio: uma queda de mais de 68% no mesmo indicador, lembrando-nos de que o retrocesso não é apenas possível, é provável quando se insiste em fórmulas falidas.
No Brasil, o Estado continua crescendo em peso, mas não em eficiência. Nossa dívida pública, entre 2024 e 2025, oscilou entre 76% e 83% do PIB, uma das maiores da América Latina, cuja média ronda os 54%. A isso se soma a carga tributária elevada para quem paga, ineficaz para quem administra. Embora o índice geral tenha ficado em torno de 14,7% em 2022, a informalidade distorce a realidade. Para a classe média formalizada, o peso é sufocante. Os juros, por sua vez, orbitam em torno de 15%, consumindo 7 a 8% do PIB apenas com o serviço da dívida. Essa engrenagem emperrada transforma o Brasil em um país que trabalha muito para entregar pouco.
Ainda assim, insiste-se em políticas que acentuam o controle estatal, inibem a produtividade e desestimulam o investimento privado. A abertura comercial segue tímida, quase envergonhada, enquanto as reformas estruturais, tributária, previdenciária, administrativa, parecem eternamente proteladas. A hesitação custa caro: o capital foge, o emprego esmorece, a confiança desaba. E o país? Este continua correndo no mesmo lugar, como hamster em roda enferrujada.
A retórica de que “o Estado deve cuidar de tudo” perdeu fôlego até mesmo entre os países que a inventaram. Mas aqui, ressurge com sotaque populista, embalado por promessas que desconsideram a matemática e o tempo. O resultado é um ciclo vicioso: mais impostos para cobrir mais gastos, menos crescimento, mais dívida, menos liberdade econômica. Um país sufocado sob o peso de sua própria estrutura.
A projeção para 2025 é desalentadora. Com PIB per capita nominal estimado em US$ 11.200, estamos abaixo da média mundial (US$ 14.200). Não é apenas uma questão de número — é uma questão de destino. Não crescemos o suficiente sequer para manter nossa posição relativa no mundo. O risco não está apenas na estagnação, mas no retrocesso, como alertam os economistas e como ilustram nossos vizinhos bolivarianos.
Repetem-se discursos sobre “desigualdade”, “justiça social” e “redistribuição de renda”. Mas sem crescimento, não há o que redistribuir. Sem produtividade, não há riqueza a ser compartilhada. Sem eficiência, o Estado torna-se um buraco negro que suga recursos, esperança e tempo. A equação não fecha.
Há saídas, sim. Mas elas exigem coragem, visão de longo prazo e compromisso com o futuro, não só com a próxima eleição. Reverter essa trajetória exige reformas estruturais, responsabilidade fiscal, estímulo à competitividade e desburocratização real da economia. Não é ideologia. É sobrevivência.
O país que quer ser protagonista no século XXI precisa abandonar os vícios do século XX. Não há como construir o futuro com ferramentas do passado. O bonde do desenvolvimento pode até ter partido, mas ainda é possível correr atrás dele, desde que paremos de discutir quem puxa o freio.
A frase que foi pronunciada:
”O erro dos Países emergentes é pensarem que o seu desenvolvimento reside nos programas dos seus Governos, quando na verdade o progresso comunitário e a educação cívica coletiva são determinantes para o progresso social, político e econômico de uma Nação.”
Edgar Fonseca

História de Brasília
A Universidade de Brasília solicitou ao IAPI e êste à Novacap para que sejam abertas fossas “provisórias” para os blocos 4 e 7 da superquadra 305. Nada mais absurdo. Ou muda tudo ou não deve haver privilégio em detrimento de outros. (Publicada em 08.05.1962)
VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)
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Dizem, com propriedade, que a arte imita a vida. No caso da arte da cartografia, surgida por volta do ano 2.500 a.C. com os Sumérios e aperfeiçoada nas escolas de Alexandria e Atenas, essa arte foi talvez a mais importante desenvolvida pelo gênio humano para entender o mundo à volta, tornando possível sua exploração com mais segurança e objetivo.
Hoje tornou-se comum aceitar o fato de que a cartografia serve também para ilustrar não só a realidade física e topográfica do lugar, mas também sua realidade social, econômica, histórica e cultural, portanto trata-se de um campo complexo em constantes mudanças e que exige elaborada e rigorosa investigação científica.
Trata-se aqui de um retrato fiel ou fotografia do mundo como ele é, e não como querem alguns, para quem o mundo deve ser retratado como desejam governos e conceitos de plantão. No caso daqueles países virados de cabeça para baixo, não por ação da inversão dos polos magnéticos, mas pela inversão de valores, a cartografia pode servir também para tentar conferir uma nova e fantasiosa realidade bem ao gosto dos novos mandatários, para os quais a realidade é o que eles querem que seja. Deste ponto, chegamos ao Mapa do Brasil e do globo virados de cabeça para baixo e apresentados ao público pelo presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Marcio Pochmann, e a ex-presidente Dilma Rousseff.
Como resultado dessa empreitada geográfica, o Brasil ficou situado no centro do mundo, como o hemisfério Sul indo parar no topo. Para seu idealizador, a novidade visava ressaltar a atual liderança de nosso país em fóruns como os Brics e a COP 30 nesse ano. É tal da importância crescente do chamado Sul Global, que a novilíngua na atualidade significa destruir a hegemonia do dólar e dos Estados Unidos, substituído agora por outros players como a Rússia, China e outros parceiros dessa empreitada ideológica.
Para um país como o nosso, que está sendo virado pelo avesso, normalizando absurdos e indo de encontro ao que hoje é Cuba, Venezuela, Nicarágua e outros países do nosso continente, a reviravolta geográfica faz todo o sentido. Num país virado e cabeça para baixo, o povo é triste, as perspectivas são nulas e fazer oposição é risco de vida. Nada mais natural então do que apresentar o Brasil de cabeça para baixo.
Pochmann, com sua inteligência aguçada conseguiu o que muitos cartunistas nem pensavam: ilustrar um país na sua condição real de momento. O episódio do “mapa de cabeça para baixo” é um símbolo perfeito de uma era em que a percepção da realidade é disputada como nunca. A cartografia, que sempre foi uma ferramenta objetiva para representar o mundo, agora é usada como palco de convicções particulares e políticas. A inversão do mapa é um gesto que vai muito além do design gráfico: ele traduz uma tentativa de reescrever o papel do país no tabuleiro global, ainda que de forma simbólica. Ao ser apresentada como um ato de afirmação política, ela escancara uma tendência: a de usar símbolos e discursos para criar uma sensação de grandeza que não necessariamente corresponde à realidade socioeconômica do país.
Enquanto se fala em “liderança global” e na força do chamado “Sul Global”, o Brasil enfrenta algumas crises internas na área econômica, de segurança e de relações internacionais. A cartografia, nesse contexto, vira metáfora: ao colocar o Brasil no “alto do mapa”, tenta-se transmitir uma ideia de protagonismo que o cotidiano do cidadão comum não sente. Essa crítica faz sentido ao lembrar que, em um país onde valores estão sendo “invertidos”, no sentido de normalizar o absurdo, ver o mapa de cabeça para baixo soa como uma imagem fiel de um momento de distorções.
Talvez, o maior mérito dessa polêmica seja justamente o de escancarar, por meio de um símbolo simples, o quanto a realidade está sendo “desenhada” de acordo com certas conveniências. O Brasil, ao que parece, não está apenas no centro do mapa, mas no centro de uma inversão de valores, normalizando absurdos em suas tentativas de reescrever nossa história com tintas carregadas de tons cinzentos e vermelhos. Como já diziam alguns seres maléficos, a propaganda é a arte de fazer com que as pessoas esqueçam a realidade, acreditando numa mentira do tamanho do mundo, tornado palatável a revolução que os leve, sem protestos, a um governo autocrático capaz de enganar a tantos com tão pouco.
A frase que foi pronunciada:
“Não devo a ninguém minhas eleições, a não ser ao povo desse país”.
Lula em discurso ontem no Vale do Jequitinhonha
História de Brasília
O comércio de Brasília está atormentado com o numero de publicações clandestinas que vem circulando nesta capital. Como não poderia deixar de ser, a imprensa marrom está nestes casos, extorquinto dinheiro e impondo-se através de chantagens. (Publicado em 06.05.1962)
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Líderes e chanceleres de países que compõem o BRICS se reuniram no Rio de Janeiro, para discutir temas como a governança global, combate à pobreza, inteligência artificial e mudanças climáticas. O que, à primeira vista, pareceria mais uma reunião de trabalho desse grupo, acabou por se transformar num evento, que, embora esvaziado das principais lideranças do bloco (Rússia e China), trouxe repercussões concretas para o Brasil.
A tal da governança global, que em miúdos significa acabar com o predomínio do dólar nas transações internacionais, substituindo-o, talvez, pelo rublo ou pelo Yuan, serviu como uma espécie de gota d´água para entornar de vez as relações entre os Estados Unidos e o Brasil. Essa história de fortalecer a cooperação global para uma governança mais inclusiva e sustentável não esconde o desejo desse bloco de minar a influência econômica americana no mundo, uma estratégia levada muito a sério pelo eixo Moscou-Pequim. O Brasil entra nessa manobra como um país geograficamente situado no continente americano e que pode, num futuro próximo, servir de ponte para o avanço dessas lideranças do outro lado do mundo, rumo aos EUA. A questão é derrotar os EUA a partir do seu próprio quintal.
Para analistas isentos, o Brasil nada tem a aprender com esse bloco que reúne as maiores ditaduras do planeta. A ausência dos principais líderes de Rússia e China não esvaziou o simbolismo do encontro, tampouco seus desdobramentos concretos para o Brasil. Ao contrário, mesmo sem o protagonismo de Xi Jinping ou de Vladimir Putin, a pauta apresentada deixou claro que o bloco segue coeso em seu objetivo central: reformular a ordem internacional com menos influência do Ocidente — leia-se, especialmente, dos Estados Unidos. O discurso sobre “governança global inclusiva” soa, à primeira vista, como um apelo por justiça econômica e multilateralismo.
No entanto, essa retórica esconde uma estratégia de longo prazo de Moscou e Pequim para minar os pilares do sistema financeiro internacional liderado por Washington desde Bretton Woods. A proposta de comércio bilateral em moedas locais e o fortalecimento do Novo Banco de Desenvolvimento (o “banco do BRICS”) são peças fundamentais desse xadrez geopolítico. A participação brasileira nesse projeto é ambígua e delicada. Geograficamente situado no hemisfério ocidental e ainda fortemente dependente do comércio com os EUA e a União Europeia, o Brasil busca, nos BRICS, alternativas para diversificar suas relações comerciais e financeiras. No entanto, ao se aproximar de regimes autoritários com agendas antagônicas aos interesses americanos, o país se expõe a represálias econômicas e políticas — como ficou evidente com a resposta rápida do ex-presidente Donald Trump, que anunciou tarifas sobre produtos brasileiros em setores-chave, como o aço, o alumínio e produtos agrícolas. Trata-se de um gesto típico do trumpismo: unilateral, protecionista e de forte valor simbólico. A imposição de tarifas que, segundo fontes ligadas ao Departamento de Comércio dos EUA, foram justificadas por “práticas comerciais desleais” e “riscos à segurança nacional”, é, na verdade, uma retaliação política travestida de preocupação econômica. Mesmo tendo imposto taxas maiores a vários países, a medida acende um alerta vermelho sobre os custos geopolíticos de certas alianças ideológicas — especialmente quando estas desafiam o poder hegemônico dos EUA a partir de seu próprio continente.
O Brasil se vê, portanto, diante de um paradoxo: buscar protagonismo internacional por meio de uma coalizão revisionista (BRICS), enquanto tenta manter relações pragmáticas com o Ocidente, que ainda responde pela maior parte dos investimentos e acesso a tecnologias de ponta. Esse jogo duplo exige habilidade diplomática rara — algo que nem sempre está disponível em governos ideologicamente engajados. Não é por outra razão que se aponta que o Brasil não tem nada a aprender com regimes como o da Rússia, da China, do Irã ou da Etiópia no que diz respeito a democracia, liberdades civis ou transparência institucional. A aproximação excessiva com esses países pode corroer a imagem internacional do Brasil como uma democracia emergente e dificultar parcerias com países democráticos, sobretudo em temas sensíveis como direitos humanos, meio ambiente e cooperação tecnológica.
Portanto vale concluir que a reunião do BRICS no Rio escancarou a encruzilhada geopolítica em que o Brasil se encontra: ou atua como peça de manobra num tabuleiro desenhado por potências autoritárias, ou reafirma seu compromisso com uma ordem internacional baseada em regras, mesmo que desequilibradas. A retaliação americana é só o primeiro sinal de que o preço da ambiguidade estratégica pode ser alto e imediato. Geografia é destino, já ensinavam os antigos estrategistas. Ignorar essa realidade pode custar mais do que qualquer vantagem simbólica no cenário internacional. A atual imposição de tarifas pelo governo americano soa, assim, como uma espécie de primeiro aviso. O que pode vir a seguir, depende mais da expertise política e diplomática do que arroubos ideológicos e discursos ultrapassados e sem sentido atual.
A frase que foi pronunciada:
“Eu respeito a eleição do presidente Trump, que foi eleito pelo povo americano para governar os Estados Unidos”, mas “ele não foi eleito para governar o mundo”.
Lula
História de Brasília
Muito boa, a providência de faixas de travessia das pistas em toda a zona movimentada da cidade. É pareciso agora, que os pais em casa expliquem às crianças que só devem atravessar nessas faixas. (Publicada em 06.05.1962)
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Diz-se que certas plantações prosperam mesmo em solos áridos, desde que bem irrigadas — mas há de se observar quem recebe a água. Em tempos de escassez, enquanto lavouras inteiras secam sob o sol impiedoso, há sempre um espantalho no meio do campo, robusto e muito bem alimentado. Dizem que ele serve para proteger, mas há quem suspeite que sua fome é insaciável.
Setembro passou e, com ele, veio a notícia de mais um recorde de “colheita”. Os celeiros estatais encheram como nunca, e houve quem comemorasse o feito como uma epopeia fiscal. Foi dito que jamais se viu tanto grão arrecadado em tão curto tempo. Mas o agricultor comum, aquele que planta no braço e colhe no suor, não parece ter participado da festa.
Num campo onde a responsabilidade pela terra foi trocada por planos mirabolantes de fertilização ideológica, o que se planta hoje são ilusões e o que se colhe amanhã são déficits. A abundância nas mãos do espantalho não reflete, infelizmente, a fartura no prato do povo. E quando a balança pesa para um lado só, a própria terra geme.
O curioso é que, mesmo com as cestas cheias de tributos, os armazéns nacionais continuam no vermelho. A explicação, segundo os que tudo sabem e nada explicam, seria o custo inevitável de manter o campo em “progresso”. O detalhe incômodo é que o progresso insiste em não chegar. Pelo contrário: o vento sopra mais frio, os insumos encarecem, e o povo recorre a velhas técnicas de sobrevivência — como plantar em silêncio, negociar sem recibo, e manter distância dos fiscais do espantalho. Números bem projetados nunca mentem. Mas podem ser ignorados, distorcidos, ou simplesmente ridicularizados. Afinal, já se tornou moda ajustar a lógica às crenças, e não o contrário. Por isso, quando o relógio econômico atrasa, dizem que é o tempo que está errado.
Enquanto isso, milhões de pequenos lavradores estão em dívida com o mercado, com o banco, com o vizinho — e até com o próprio guarda-roupa. A inadimplência atinge patamares tão vastos que, se fosse terra, seria um país. Sem crédito e sem chão firme, o consumo mingua, a produção trava, e o país parece girar num moinho vazio.
Há rumores de que o próximo ciclo será ainda mais severo. Mas os homens da enxada, que há muito deixaram de acreditar em promessas de safra farta, já tratam de construir abrigo com o que têm. E cada vez mais gente prefere plantar fora do campo oficial, longe dos olhos sempre atentos e da mão sempre estendida do espantalho.
É verdade que todo sistema de cultivo precisa de regras. Mas quando o imposto sobre a semente é maior do que o valor da colheita, não é difícil entender por que tanta gente larga a terra. A competitividade evapora como orvalho ao meio-dia, e os frutos que sobram não encontram mercado que os valorize. O Brasil, um pomar de riquezas naturais, torna-se pálido diante da concorrência estrangeira — sufocado, não por pragas, mas por sua própria condução.
No fim dessa estrada poeirenta, a desigualdade brota como erva daninha. E onde há fome e desesperança, a violência cresce como mato entre os paralelepípedos. Não é magia, nem surpresa: é só a velha e previsível consequência do descuido com a terra, da ganância do espantalho e da crença cega de que números são ideológicos. A colheita foi farta — para alguns. Para os demais, restam as migalhas e o silêncio.
A frase que foi pronunciada:
“A política é a arte de procurar problemas, encontrá-los em todo lugar, diagnosticá-los incorretamente e aplicar os remédios errados.”
Groucho Marx

ID
Dessa vez, os parlamentares estavam discutindo a lei que estende, para todas as pessoas com deficiência, a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados incidente sobre a aquisição de automóveis. Autoria do senador Romário e relatoria do senador Esperidião Amin. Enquanto isso, o senador Marcos Rogério indagou a razão de seu voto não ter sido contabilizado. O senador Omar Aziz apontou que era a digital, o problema. Deve ter desgastado um pouco, disse o senador Marcos Rogério olhando para o dedo.

Delegados
Antes da leitura de uma PEC, a então senadora Simone Tebet prometeu não tocar mais a campainha que interrompia os oradores. Havia muita gente desrespeitosa na sessão. Prontamente, o senador Esperidião Amin apontou para o Major Olimpio e o Senador Alessandro. “Eles são delegados! Podem resolver!” O senador Alessandro buscou mais um. “Contarato também.” Delegado é o que não falta por aqui. Arrancaram risadas de um ambiente pesado.
História de Brasília
O DAC cortou uma frequência da saída para São Paulo. É a linha mais barata (45% de desconto), que passará a ter somente três voos por semana. A Real, entretanto, com o mesmo equipamento, tem sete voos semanais. (Publicada em 05.05.1962)


