Quo usque tandem abutere, Camara, patientia nostra?

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Por meio de manobra ladina e sub-reptícia, a Mesa Diretora da Câmara Legislativa conseguiu aprovar, em primeiro turno, alteração significativa na Lei Orgânica do Distrito Federal, abrindo a possibilidade de reeleição para os cargos de direção da Casa. O que à primeira vista pode ser interpretado como mudança sem maiores consequências para o Poder Legislativo local e para os cidadãos, de modo geral, esconde, de fato, estratégia capaz de provocar verdadeira reviravolta nas relações institucionais entre os Poderes e, de quebra, alijar o cidadão das principais decisões da CLDF.

Se, de um lado, a mudança aponta para aumento do poder de barganha do Legislativo frente ao Executivo, a mudança traz em si problema antigo e já experimentado por outras câmaras país afora: a formação de blocos monolíticos e fechados, capazes de tudo para permanecer indefinidamente no poder. Salienta-se, ainda, que a Presidência da CL está na linha direta de sucessão do governador.

De outro lado, o expediente de reeleição dos membros da Mesa não foi discutido nem com a comunidade, nem com as principais lideranças políticas da capital, limitando-se a debate interno, feito à meia-boca para não levantar muita poeira e suspeitas. O tema colocado na undécima hora para a apreciação logicamente não estava na pauta do dia, veio escondido na forma do tradicional jabuti, surgindo de supetão durante a votação de vetos.

Para alguns parlamentares presentes durante a votação, a medida representa golpe contra a democracia. Para uma Casa que tem sofrido críticas constantes da população, pelo modo de agir em dissonância com os eleitores e em proveito próprio, o instituto da reeleição só vai colocar mais lenha na ânsia de suas excelências por cargos, empurrando toda a Casa para permanente estado de pré-eleição, com cisões e manobras que não interessam à sociedade. Nesse jogo de xadrez, os primeiros para fora do tabuleiro político serão justamente os poucos que não concordam com as tramoias, incluídos aí todos os brasilienses. Até quando o Legislativo vai abusar da nossa paciência?

Massa de manobra

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Uma pena que o Sindicato dos Professores use a instituição para causas ideológicas. Certamente não representou toda a classe exibindo a opinião contra o impeachment da presidente. Quando um pai de aluno aceita a frase da campanha publicitária “Mexeu com professor, mexeu comigo”, significa que o professor deve ter o reconhecimento pela responsabilidade de educar.

Leis e salsichas

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Na busca por culpados pela qualidade de políticos que, bem ou mal, representam a sociedade brasileira nos parlamentos país afora, o dedo acusador do cidadão invariavelmente aponta para os eleitores e para o pragmatismo das escolhas, feitas sempre de olho em interesses imediatos e inconfessáveis. Acontece que, dentro das regras atuais em que prevalece a vontade dos caciques partidários, a apresentação dos nomes a serem submetidos ao processo eleitoral obedece sempre a interesses internos das legendas.

Interesses esses que, muitas vezes, conflitam com os da sociedade. Ao fim, o que se tem são genuínos representantes dos donos de partidos. Obviamente, a fórmula usada na esfera federal se reproduz nos estados, municípios e no Distrito Federal, ampliando o descompasso entre representante e representados.

Sem a adoção do voto distrital e da possibilidade de se lançar candidatos sem partidos, a representação da sociedade é feita pela metade. O desalento do eleitor aumenta ainda pelo fato de inexistir o mecanismo de recall, capaz deseleger o representante ineficiente e que não corresponde {as expectativas. Mesmo as regras contidas na Lei da Ficha Limpa, de iniciativa popular, saudada como marco histórico nesse processo, foram tolhidas em sua essência com a interposição de mecanismos que relegam para o tempo lento da Justiça a decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado.

A questão é: seriam os maus representantes decorrentes diretos de legislação capenga ou simplesmente espelhos de eleitores igualmente ruins e cúmplices. A fórmula que diz que cada sociedade tem os políticos que merece explica parte periférica e ínfima do problema, mas esconde o principal que pode ser resumido em uma questão: o que querem de fato os partidos e seus representantes e o que almeja a sociedade. Se há quem compre, é certo haver quem venda. A proliferação de legenda de aluguel; as eleições milionárias; o financiamento ilegal das campanhas, feito inclusive com dinheiro desviados dos cofres públicos; o voto obrigatório; o poder da marquetagem; e outras sujeiras próprias do nosso processo eleitoral, representam apenas uma face da moeda. O outro lado é simbolizado pelas consequências nefastas para a nação e para as futuras gerações. O imenso trabalho desenvolvido atualmente pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, para desbaratar o maior esquema de corrupção de todos os tempos, tem seu nascedouro justamente no processo eleitoral.

Todos aqueles que, de algum modo, são hoje alvos da Justiça nos escândalos de corrupção, foram direta ou indiretamente colocados lá por nossa vontade por meio do voto.