Autor: Circe Cunha
VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)
Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade
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Líderes e chanceleres de países que compõem o BRICS se reuniram no Rio de Janeiro, para discutir temas como a governança global, combate à pobreza, inteligência artificial e mudanças climáticas. O que, à primeira vista, pareceria mais uma reunião de trabalho desse grupo, acabou por se transformar num evento, que, embora esvaziado das principais lideranças do bloco (Rússia e China), trouxe repercussões concretas para o Brasil.
A tal da governança global, que em miúdos significa acabar com o predomínio do dólar nas transações internacionais, substituindo-o, talvez, pelo rublo ou pelo Yuan, serviu como uma espécie de gota d´água para entornar de vez as relações entre os Estados Unidos e o Brasil. Essa história de fortalecer a cooperação global para uma governança mais inclusiva e sustentável não esconde o desejo desse bloco de minar a influência econômica americana no mundo, uma estratégia levada muito a sério pelo eixo Moscou-Pequim. O Brasil entra nessa manobra como um país geograficamente situado no continente americano e que pode, num futuro próximo, servir de ponte para o avanço dessas lideranças do outro lado do mundo, rumo aos EUA. A questão é derrotar os EUA a partir do seu próprio quintal.
Para analistas isentos, o Brasil nada tem a aprender com esse bloco que reúne as maiores ditaduras do planeta. A ausência dos principais líderes de Rússia e China não esvaziou o simbolismo do encontro, tampouco seus desdobramentos concretos para o Brasil. Ao contrário, mesmo sem o protagonismo de Xi Jinping ou de Vladimir Putin, a pauta apresentada deixou claro que o bloco segue coeso em seu objetivo central: reformular a ordem internacional com menos influência do Ocidente — leia-se, especialmente, dos Estados Unidos. O discurso sobre “governança global inclusiva” soa, à primeira vista, como um apelo por justiça econômica e multilateralismo.
No entanto, essa retórica esconde uma estratégia de longo prazo de Moscou e Pequim para minar os pilares do sistema financeiro internacional liderado por Washington desde Bretton Woods. A proposta de comércio bilateral em moedas locais e o fortalecimento do Novo Banco de Desenvolvimento (o “banco do BRICS”) são peças fundamentais desse xadrez geopolítico. A participação brasileira nesse projeto é ambígua e delicada. Geograficamente situado no hemisfério ocidental e ainda fortemente dependente do comércio com os EUA e a União Europeia, o Brasil busca, nos BRICS, alternativas para diversificar suas relações comerciais e financeiras. No entanto, ao se aproximar de regimes autoritários com agendas antagônicas aos interesses americanos, o país se expõe a represálias econômicas e políticas — como ficou evidente com a resposta rápida do ex-presidente Donald Trump, que anunciou tarifas sobre produtos brasileiros em setores-chave, como o aço, o alumínio e produtos agrícolas. Trata-se de um gesto típico do trumpismo: unilateral, protecionista e de forte valor simbólico. A imposição de tarifas que, segundo fontes ligadas ao Departamento de Comércio dos EUA, foram justificadas por “práticas comerciais desleais” e “riscos à segurança nacional”, é, na verdade, uma retaliação política travestida de preocupação econômica. Mesmo tendo imposto taxas maiores a vários países, a medida acende um alerta vermelho sobre os custos geopolíticos de certas alianças ideológicas — especialmente quando estas desafiam o poder hegemônico dos EUA a partir de seu próprio continente.
O Brasil se vê, portanto, diante de um paradoxo: buscar protagonismo internacional por meio de uma coalizão revisionista (BRICS), enquanto tenta manter relações pragmáticas com o Ocidente, que ainda responde pela maior parte dos investimentos e acesso a tecnologias de ponta. Esse jogo duplo exige habilidade diplomática rara — algo que nem sempre está disponível em governos ideologicamente engajados. Não é por outra razão que se aponta que o Brasil não tem nada a aprender com regimes como o da Rússia, da China, do Irã ou da Etiópia no que diz respeito a democracia, liberdades civis ou transparência institucional. A aproximação excessiva com esses países pode corroer a imagem internacional do Brasil como uma democracia emergente e dificultar parcerias com países democráticos, sobretudo em temas sensíveis como direitos humanos, meio ambiente e cooperação tecnológica.
Portanto vale concluir que a reunião do BRICS no Rio escancarou a encruzilhada geopolítica em que o Brasil se encontra: ou atua como peça de manobra num tabuleiro desenhado por potências autoritárias, ou reafirma seu compromisso com uma ordem internacional baseada em regras, mesmo que desequilibradas. A retaliação americana é só o primeiro sinal de que o preço da ambiguidade estratégica pode ser alto e imediato. Geografia é destino, já ensinavam os antigos estrategistas. Ignorar essa realidade pode custar mais do que qualquer vantagem simbólica no cenário internacional. A atual imposição de tarifas pelo governo americano soa, assim, como uma espécie de primeiro aviso. O que pode vir a seguir, depende mais da expertise política e diplomática do que arroubos ideológicos e discursos ultrapassados e sem sentido atual.
A frase que foi pronunciada:
“Eu respeito a eleição do presidente Trump, que foi eleito pelo povo americano para governar os Estados Unidos”, mas “ele não foi eleito para governar o mundo”.
Lula
História de Brasília
Muito boa, a providência de faixas de travessia das pistas em toda a zona movimentada da cidade. É pareciso agora, que os pais em casa expliquem às crianças que só devem atravessar nessas faixas. (Publicada em 06.05.1962)
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Novo código eleitoral (PL112-2021) em análise na CCJ do Senado descarta a possibilidade do voto impresso e auditável. Pelo meno,s é o que consta no documento do relator do PL Marcelo Castro (MDB-PI). Além disso, o relatório reafirma a confiabilidade das urnas eletrônicas. Não fosse pouco, o novo código eleitoral ainda responsabiliza civil, penal e eleitoralmente todos aqueles que divulgarem notícias “falsas” sobre um modelo de pleito pra lá de polêmico e que só é usado no Brasil. Além disso o PL 112-2021 reforça a posição do TSE com relação às eleições, ao coibir críticas de eleitores e candidatos. Com isso, o projeto levanta sérias preocupações não apenas do ponto de vista eleitoral, mas, sobretudo, em relação à liberdade de expressão e ao direito constitucional à crítica política — elementos centrais de qualquer democracia sedimentada.
Um dos pontos mais polêmicos do texto é a reafirmação da confiança “absoluta” nas urnas eletrônicas e o descarte explícito do voto impresso e auditável. Ao vetar esse instrumento, que nada mais seria do que uma camada adicional de transparência e auditabilidade, o PL fecha as portas para qualquer forma de verificação física do voto, o que poderia acalmar suspeitas recorrentes — fundadas ou não — por parte de setores da sociedade, sobretudo da oposição.
É importante lembrar que o Brasil é o único país do mundo que utiliza urnas eletrônicas sem comprovante físico do voto em todo o território nacional. Países como a Alemanha, a França e os Estados Unidos mantêm mecanismos paralelos de auditoria, não necessariamente por desconfiança, mas por prudência democrática. Outro aspecto alarmante do projeto é a criminalização da divulgação de “notícias falsas” sobre o processo eleitoral. Embora o combate à desinformação seja uma pauta legítima, o texto é vago e abre margem para interpretações subjetivas, o que pode levar à perseguição de opiniões divergentes.
Há o receio de que a redação proposta permita o enquadramento de eleitores, jornalistas, comentaristas políticos e até candidatos que questionem — mesmo que com argumentos legítimos — o modelo eleitoral brasileiro. Isso obviamente reforça o temor de que se esteja consolidando uma espécie de “juristocracia eleitoral”, onde o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não apenas organiza o pleito, mas também se transforma no árbitro único da verdade sobre todo o processo, com poderes crescentes para silenciar dissensos.
O problema é que o custo pode ser a própria liberdade de expressão. O PL 112/2021 sugere que criticar o sistema eleitoral pode, em determinadas circunstâncias, equivaler a um crime. Isso é grave. O ambiente democrático pressupõe o direito de contestar, fiscalizar e propor mudanças, sobretudo quando se trata da maneira como se escolhem os representantes do povo. O novo Código Eleitoral, ao invés de promover maior transparência, estreita o debate, criminaliza a dissidência e fortalece o poder de um órgão administrativo — o TSE — que passa a atuar como legislador informal e censor em matéria eleitoral.
O discurso da confiança não pode ser usado como mordaça. Lembremos que a democracia não se sustenta apenas na confiança, mas na possibilidade de dúvida, verificação e livre expressão. O PL 112/2021, ao negar essas garantias, caminha perigosamente rumo a uma tecnocracia eleitoral blindada, onde discordar é crime e fiscalizar é heresia. O fato é que se o processo eleitoral é tão seguro quanto dizem, ele deve, necessariamente resistir às críticas venham de onde vierem e não sobreviver às custas de um silêncio forçado e intimidatório.
A frase que foi pronunciada:
“Não é o voto que garante a democracia. É a contagem dos votos.”
Tom Stoppard

Sempre assim
Retirada a faixa onde divulgavam a greve dos técnicos da UnB. O fato é conhecido e já é quase um ritual. A greve começa e, durante a semana de provas, o acordo é feito.

Geopsiquiatria
Professora da Faculdade de Medicina da UnB, Helena Moura tem artigo publicado, na seção de experts, da revista científica Lancet Regional Health, onde iniciou uma discussão sobre a necessidade de submeter os líderes mundiais a exames de saúde mental. O título do texto é Sleepy Joe.

História de Brasília
O Trânsito está retirando as placas que estão atrapalhando a sinalização da cidade. A campanha começou ontem, e deve ser estendida também à estrada parque do Aeroporto. Os cartazes desencontrados estão dando um feio aspecto a uma área que deve ser de “vegetação nativa”. (Publicada em 06.05.1962)
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A frase que foi pronunciada:
“Alternativas precisam ser apresentadas porque o governo não quer e não vai mudar a meta”.
Simone Tebet
História de Brasília
O panorama napolitano de roupas ao vento nas janelas e nos corredores, outrora privilégio das quadras 409-10 já se estendeu à Asa Norte. O Bloco 42 comanda o espetáculo. (Publicada em 06.05.1962)
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Para um país que não consegue, sequer, debelar o crime organizado, que cresce a cada ano se infiltrando na máquina do Estado, a liberação dos jogos de azar vem para complicar enormemente o problema da criminalidade, facilitando a lavagem de dinheiro e favorecendo a práticas delituosas. Como é de conhecimento da população brasileira, que está cada vez mais desprotegida e entregue à própria sorte. A expansão das organizações do crime dentro do Estado vai sendo revelada dia a dia, como é o caso da exploração de postos de combustível, transporte urbano e outras modalidades, todas voltadas para dar aparência legal ao dinheiro dessas organizações. Pior é que o crime organizado não se contenta apenas com esses negócios aparentes e já investem pesado no financiamento de candidatos a cargos eletivos por todo o país.
A ideia era revogar importantes trechos da Lei de 1946 para liberar bingos, cassinos, jogo do bicho e apostas em corridas. A votação do PL 2.234/2022, do ex-deputado Renato Vianna, que já passou pela Câmara e agora aguarda conclusão no Senado, já recebeu diversas emendas. Parece que a meta é tornar a população, já endividada refém da jogatina, apesar das falsas promessas de fiscalização dessas atividades. O fato é que o Brasil é um país vulnerável, em todos os sentidos, ao crime organizado e à violência dele decorrente.
Embora parte da população diz apoiar a legalização dos jogos de azar, iludida com a possibilidade na criação de mais empregos e sob as promessas de condições regulatórias eficazes, o temor é grande em relação ao uso dessas atividades para lavagem de dinheiro e expansão do crime organizado. Lembremos que, recentemente, foi revelado que, ao menos, 941 postos de combustíveis em 22 estados estão sob suspeita de controle por facções como o PCC, Comando Vermelho e Família do Norte, que operam esses nichos sob o olhar displicente das autoridades, movimentando milhões de reais por dia. A verdade é que o crime organizado tem lucrado mais com combustíveis (R$ 61,5 bi/ano) do que propriamente com tráfico de cocaína, que gira em torno de (R$ 15 bi/ano).
Em operações denominadas “Rei do Crime” e “Boyle”, descobriram-se esquemas sofisticados do PCC para lavagem de dinheiro via postos e distribuidoras de derivados de petróleo. A situação não é nova e desperta grande preocupação da sociedade. Por outro lado, há confirmações de que as redes criminosas têm se infiltrado em empresas de transporte, creches, asilos, lojas etc., criando uma fachada legal para lavagem, e movimentam milhões em eleições e financiamento de candidaturas. A Operação Lava Jato, iniciada pelo “Posto da Torre” em Brasília, mostrou como o crime se valeu do setor de combustíveis para lavar dinheiro e financiar campanhas, envolvendo corrupção em níveis altíssimos. A fórmula é simples: Crime organizado + negócios lícitos = poder institucional.
Estima-se que cerca de R$ 6 bilhões/ano são lavados formalmente no país, o que enfraquece a própria integridade do Estado. Vemos ainda que o financiamento de políticos e campanhas são cada vez mais comuns. A influência financeira no processo eleitoral é realidade: mafiosos financiam candidaturas, aproximam-se do poder e expandem seu alcance. Com isso, a população não tem a quem recorrer. Ao legalizar jogos de azar sem estrutura robusta de controle eficaz, o que se tem é o uso dos recursos do Bolsa Família direcionados para apostas, agravando o problema da pobreza. Nada menos do que R$ 3 bilhões em agosto de 2024 foram utilizados para esse fim, o que, por sua vez, estimula o crescimento de uso de cassinos clandestinos e sem lei.
Paralelamente, o SUS já enfrenta custos altíssimos com tratamento de dependência de jogos, sem nenhum preparo, nem recursos adequados para isso. A liberação irrefletida dos jogos de azar pode se transformar num acelerador da corrupção e da lavagem de dinheiro. Nenhuma arrecadação fiscal e geração de empregos serão suficientes para a empreitada dos jogos valer à pena.
A frase que foi pronunciada:
“Cuida de evitar os crimes, para que não sejas obrigado a puni-los.”

Viagem grátis
Mesa para dois. Brasília, nosso patrimônio, com Bárbara Lins. As entrevistas com Liliane Cardoso despertam, nos candanguinhos que aqui nasceram, uma saudade dos tempos em que a capital crescia ao mesmo tempo que aquelas crianças. Numa conversa descontraída, Liliane traz, aos internautas, memórias embrulhadas na história da cidade. É uma viagem no tempo, revigorante. Veja a seguir.
História de Brasília
O panorama napolitano de roupas ao vento nas janelas e nos corredores, outrora privilégio das quadras 409-10 já se estendeu à Asa Norte. O Bloco 42 comanda o espetáculo. (Publicada em 05.05.1962)
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No velho campo onde se reuniam as espécies, aproximava-se, mais uma vez, o tempo da escolha. Era um ritual conhecido: a cada estação certa, reuniam-se os bichos em assembleia, fingindo surpresa com os nomes apresentados, como se não os conhecessem desde os tempos em que aprenderam a farejar o perigo. O curioso é que, a cada nova escolha, falava-se em renovação. Mas bastava olhar com mais atenção para notar que os candidatos ao pasto principal eram quase sempre os mesmos. Alguns, impedidos de se apresentar no curral central por conta de antigos escândalos no galinheiro, enviavam representantes treinados: o sobrinho do jumento, a esposa do galo, o afilhado da raposa. Todos bem ensaiados, com discursos decorados e promessas renovadas. Chamavam isso de continuidade com outra roupagem. Os mais crédulos chamavam de mudança. Ninguém sabia ao certo quem havia inventado a prática, mas ela funcionava com precisão.
Os mesmos que haviam devorado os grãos do celeiro agora voltavam com novas penas, distribuindo sementes como se fossem dádivas. E os bichos, com fome ou com esperança, aceitavam. Afinal, quem recusa comida quando o inverno ameaça? O mais espantoso é que o ritual se repetia sem sobressaltos. Alguns animais até se indignavam, relinchavam, grasnavam em protesto, mas, no fim, cediam ao espetáculo. A promessa de feno fresco e sombra larga faziam com que muitos esquecessem os episódios de estiagem, os grãos desaparecidos, os ninhos abandonados.
As assembleias, cada vez mais barulhentas, pareciam ter virado feiras. Entre cartazes com desenhos de frutas e slogans sobre o futuro do brejo, os velhos macacos distribuíam bananas, as cobras ofereciam simpatia e os leões aposentados cochichavam no ouvido de seus substitutos. Tudo sob o olhar tolerante dos gansos, que fingiam não ver, ou não entender. Ao fim, o que se desenhava era sempre parecido com o começo. Mudava-se a voz, trocava-se o casaco, reformavam a cerca. Mas a trilha do curral era a mesma, e os caminhos levavam ao mesmo estábulo, onde só alguns tinham direito a ração especial.
Entre berrantes e promessas, entre milho e teatro, a escolha dos líderes seguia seu curso.
A cerimônia tinha ares de celebração, mas carregava também certo tédio repetitivo. Os tambores batiam forte, campanhas publicitárias prometiam horizontes, e os bichos, empolgados, balançavam a cauda. Havia até quem trocasse de penas. Era como se os bichos, embora inquietos, tivessem esquecido que a natureza não se altera com fantasia nova.
Quem era proibido de entrar no curral encontrava um jeito de manter-se no comando. O tempo passava e, com ele, a indignação se esvaía, como o rastro de uma lesma ao sol. Nas tocas mais escuras e nas clareiras mais discretas, comentavam com certo receio que era melhor guardar as opiniões nas gavetas. Opinião contrária era acinte.
Mas os mensageiros da floresta, aqueles que viviam de sussurrar ao pé dos cupinzeiros e retransmitir fake news no sopro do vento, logo tratavam de abafar o incômodo. Falavam em união, em cicatrização das feridas, em conciliação entre espécies. Repreendiam quem ousasse lembrar o que se passou. Afinal, insistiam, todos têm direito a uma segunda chance… terceira ou décima chance. Enquanto os mais atentos tentavam rememorar os desmandos da última temporada, aqueles que tomaram o silo e as serpentes foram nomeadas para vigiar os ovos. Os mais jovens, ou mais desatentos, deixavam-se encantar pela fluência dos novos discursos, que soavam como os antigos com a diferença de uma musiquinha patrocinada ao fundo.
E assim, a assembleia se formava com um som ruidoso, onde panfletos forravam o chão, as bandeiras com frutas coloridas tremulavam ao vento estampando frases de efeito sobre o futuro do brejo. Quem ousasse apontar erros ou questionar o ciclo vicioso era logo lembrado: em terra de sapo, mosca não dá rasante.
A frase que foi pronunciada:
“É um grande debate global o quanto aquele processo inflacionário correspondia a um choque de oferta pela desarticulação das cadeias produtivas e dificuldade de produzir, e o quanto correspondia a uma questão de demanda decorrente dos programas de transferência de renda e socorro por causa da pandemia. A minha posição, eu recorro sempre a uma frase do Churchill: a verdade é uma adúltera, nunca está com uma pessoa só.”
Gabriel Galípolo

História de Brasília
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Analistas do cenário econômico, das mais diversas tendências políticas, concordam que, em 2027, o Brasil poderá reviver uma crise financeira e fiscal sem precedentes, por causa do desequilíbrio nas contas do governo. Num cenário dessa magnitude, a posição do presidente do Banco Central, Galípolo, passa a ser o alvo da atenção geral. Nesse ponto, ele pode oscilar entre o que quer um governo, às vésperas das eleições de 2026, o que deseja o mercado e o que anseia a sociedade. Caso abandone a realidade em benefício da ficção, o estrago pode ser ainda maior.
Galípolo sabe disso. O nome dele está no jogo, é bom lembrar. Talvez, nada disso o abale e tire o seu sono. Galípolo, por inércia política, é a figura do xeque-mate de uma crise já precificada. É também um profissional que, com afinco, conhece a matemática financeira, uma ciência exata, onde os desaforos aos números não são permitidos. Na posição de presidente do BC, Galípolo sabe que escalou o topo da carreira nessa área. E como tal é o comandante em chefe dessa nau Brasil desgovernada. Temos assim o script completo de um país à deriva em sua governança econômica, mas que, no leme, está agora o presidente do Banco Central.
Muitos o veem como uma figura-chave diante dos riscos de um colapso fiscal e financeiro de grande monta. Oscilar entre o que deseja o governo, o que exige o mercado e o que espera a sociedade, não é novidade, mas adquire uma dimensão crítica em períodos de instabilidade. Nessa encruzilhada, torna-se ainda mais evidente a necessidade de um Banco Central plenamente independente, blindado contra pressões políticas de curto prazo, especialmente em anos eleitorais como o de 2026.
A Lei Complementar nº 179, de 2021, que conferiu, ao Banco Central do Brasil, autonomia formal, foi um passo importante na institucionalização dessa independência. Porém, como indica o texto, na prática, essa autonomia é sempre desafiada quando o presidente da instituição se vê entre as engrenagens de interesses contraditórios. Galípolo, com formação sólida em economia e perfil técnico, representa a racionalidade diante da política fiscal, muitas vezes guiada por conveniências eleitorais. O risco de “abandonar a realidade em benefício da ficção” é um aviso contundente: o populismo econômico, disfarçado de programa político, tende a produzir distorções que não resistem à matemática dos juros, da dívida e do déficit. E aqui reside o valor estratégico da independência do BC: proteger a política monetária de aventuras irresponsáveis, sustentando credibilidade, combatendo a inflação e defendendo o real.
Quando se diz que Galípolo “é o xeque-mate de uma crise já precificada”, é possível entender também que, diante da iminência de desequilíbrios fiscais, a autoridade monetária é o último bastião da confiança. Se essa barreira for rompida por interferências políticas, os danos não serão apenas econômicos, mas institucionais. O país voltaria a um ciclo vicioso de descrença, fuga de capitais e deterioração macroeconômica. Por isso torna-se crucial reafirmar e preservar a independência do Banco Central.
Num Brasil onde os ciclos políticos são voláteis e a tentação de manipular variáveis econômicas para fins eleitorais é permanente, manter essa instituição técnica blindada é uma salvaguarda da própria democracia e da estabilidade econômica futura. No Brasil, entre os anos 80 e início dos 90, a coisa era mais preocupante. Antes da autonomia formal do Banco Central, o Brasil enfrentava hiperinflação, com picos como 84% ao mês em 1990. Governos usavam emissão de moeda e manipulação de juros para cobrir déficits públicos, uma prática desastrosa que corroía os salários e a confiança institucional. A estabilização só começou com o Plano Real (1994), quando o Banco Central passou a adotar uma postura mais técnica e coordenada com metas de inflação.
Aprovada em fevereiro de 2021, a Lei Complementar nº 179 conferiu ao Banco Central do Brasil autonomia formal, com os seguintes pilares de mandato fixo e não coincidente com o presidente da República (4 anos, renovável uma vez). Blindagem contra demissão sem justa causa; estabelecimento legal de metas de inflação como principal objetivo da política monetária e autonomia operacional para tomar decisões sobre taxa de juros (Selic), controle de liquidez e supervisão do sistema financeiro. Desde a autonomia, o Brasil tem conseguido manter a inflação dentro da meta em 2023-2024 (mesmo com pressões externas), e a política monetária tem sido mais previsível aos olhos dos investidores.
A frase que foi pronunciada:
“A economia de mercado é mais eficiente na seleção natural dos indivíduos do que a política ou a natureza.”
Ludwig Von Mises

História de Brasília
O belo trabalho do sr. Geraldo Carneiro: o Banco do Brasil autorizou a instalação de uma agência em Taguatinga. (Publicada em 05.05.1962)
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Diz-se que certas plantações prosperam mesmo em solos áridos, desde que bem irrigadas — mas há de se observar quem recebe a água. Em tempos de escassez, enquanto lavouras inteiras secam sob o sol impiedoso, há sempre um espantalho no meio do campo, robusto e muito bem alimentado. Dizem que ele serve para proteger, mas há quem suspeite que sua fome é insaciável.
Setembro passou e, com ele, veio a notícia de mais um recorde de “colheita”. Os celeiros estatais encheram como nunca, e houve quem comemorasse o feito como uma epopeia fiscal. Foi dito que jamais se viu tanto grão arrecadado em tão curto tempo. Mas o agricultor comum, aquele que planta no braço e colhe no suor, não parece ter participado da festa.
Num campo onde a responsabilidade pela terra foi trocada por planos mirabolantes de fertilização ideológica, o que se planta hoje são ilusões e o que se colhe amanhã são déficits. A abundância nas mãos do espantalho não reflete, infelizmente, a fartura no prato do povo. E quando a balança pesa para um lado só, a própria terra geme.
O curioso é que, mesmo com as cestas cheias de tributos, os armazéns nacionais continuam no vermelho. A explicação, segundo os que tudo sabem e nada explicam, seria o custo inevitável de manter o campo em “progresso”. O detalhe incômodo é que o progresso insiste em não chegar. Pelo contrário: o vento sopra mais frio, os insumos encarecem, e o povo recorre a velhas técnicas de sobrevivência — como plantar em silêncio, negociar sem recibo, e manter distância dos fiscais do espantalho. Números bem projetados nunca mentem. Mas podem ser ignorados, distorcidos, ou simplesmente ridicularizados. Afinal, já se tornou moda ajustar a lógica às crenças, e não o contrário. Por isso, quando o relógio econômico atrasa, dizem que é o tempo que está errado.
Enquanto isso, milhões de pequenos lavradores estão em dívida com o mercado, com o banco, com o vizinho — e até com o próprio guarda-roupa. A inadimplência atinge patamares tão vastos que, se fosse terra, seria um país. Sem crédito e sem chão firme, o consumo mingua, a produção trava, e o país parece girar num moinho vazio.
Há rumores de que o próximo ciclo será ainda mais severo. Mas os homens da enxada, que há muito deixaram de acreditar em promessas de safra farta, já tratam de construir abrigo com o que têm. E cada vez mais gente prefere plantar fora do campo oficial, longe dos olhos sempre atentos e da mão sempre estendida do espantalho.
É verdade que todo sistema de cultivo precisa de regras. Mas quando o imposto sobre a semente é maior do que o valor da colheita, não é difícil entender por que tanta gente larga a terra. A competitividade evapora como orvalho ao meio-dia, e os frutos que sobram não encontram mercado que os valorize. O Brasil, um pomar de riquezas naturais, torna-se pálido diante da concorrência estrangeira — sufocado, não por pragas, mas por sua própria condução.
No fim dessa estrada poeirenta, a desigualdade brota como erva daninha. E onde há fome e desesperança, a violência cresce como mato entre os paralelepípedos. Não é magia, nem surpresa: é só a velha e previsível consequência do descuido com a terra, da ganância do espantalho e da crença cega de que números são ideológicos. A colheita foi farta — para alguns. Para os demais, restam as migalhas e o silêncio.
A frase que foi pronunciada:
“A política é a arte de procurar problemas, encontrá-los em todo lugar, diagnosticá-los incorretamente e aplicar os remédios errados.”
Groucho Marx

ID
Dessa vez, os parlamentares estavam discutindo a lei que estende, para todas as pessoas com deficiência, a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados incidente sobre a aquisição de automóveis. Autoria do senador Romário e relatoria do senador Esperidião Amin. Enquanto isso, o senador Marcos Rogério indagou a razão de seu voto não ter sido contabilizado. O senador Omar Aziz apontou que era a digital, o problema. Deve ter desgastado um pouco, disse o senador Marcos Rogério olhando para o dedo.

Delegados
Antes da leitura de uma PEC, a então senadora Simone Tebet prometeu não tocar mais a campainha que interrompia os oradores. Havia muita gente desrespeitosa na sessão. Prontamente, o senador Esperidião Amin apontou para o Major Olimpio e o Senador Alessandro. “Eles são delegados! Podem resolver!” O senador Alessandro buscou mais um. “Contarato também.” Delegado é o que não falta por aqui. Arrancaram risadas de um ambiente pesado.
História de Brasília
O DAC cortou uma frequência da saída para São Paulo. É a linha mais barata (45% de desconto), que passará a ter somente três voos por semana. A Real, entretanto, com o mesmo equipamento, tem sete voos semanais. (Publicada em 05.05.1962)
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Crise histórica e sem precedentes de saúde mental em vários países do mundo, com jovens na faixa de vinte anos ou menos se sentindo muito mais infelizes do que os jovens de décadas passadas. Há um achatamento na tradicional curva da felicidade ao longo da vida. Geralmente, essa curva resultava de divulgação de estudos que relatavam que jovens tendiam a se mostrar com altos níveis de bem-estar. Esses níveis caíam durante a meia-idade e voltavam a subir depois dos 50 anos.
Dados atuais sugerem que essa curva ou esse padrão está mudando para pior. Segundo o Global Flourishing Study (GFS), que é um dos maiores levantamentos sobre esse tema, que contou com cerca de 200 mil participantes de 22 países e durante 5 anos, essa curva tradicional está se achatando. Jovens na faixa de 18 a 24 anos têm apresentado os menores níveis de bem-estar em todos os indicadores. Enquanto isso, as pessoas mais velhas, especialmente acima de 60 anos, são aquelas que estão se tornando mais satisfeitas com a vida. Este contraste é uma confirmação daquilo que já previam os pesquisadores, ou seja, vivemos hoje uma crise sem precedentes de saúde mental entre os mais jovens.
Estudo dessa natureza e profundidade está sendo realizado com base na Teoria do Florescimento, criada pelo psicólogo Martin Seligman, que resume a felicidade não como ausência de problemas, mas sim provocada pela presença de aspectos que enriquecem a vida e que acabam por produzir um estado de bem-estar psicológico. Segundo Seligman, uma pessoa para florescer necessita experimentar emoções positivas, engajamento em atividades também positivas, com relacionamentos interpessoais satisfatórios, um sendo de propósito e realização pessoal. Desses elementos, resulta o bem-estar psicológico. Com isso, a felicidade não é confundida com mera satisfação com a vida, mas mais ligada ao crescimento pessoal e propósitos.
Pesquisas em várias culturas pelo mundo afora mostram que, através de milênios, os povos sempre deram atenção a uma lista de assim chamadas virtudes advindas do caráter, a sabedoria e o conhecimento, a coragem, a humanidade, a justiça, a temperança, na qual se incluem o perdão, a humildade, a prudência e a autorregulação. Por último, nessa lista de virtudes voltadas ao bem-estar e a felicidade, vem a transcendência, conceito filosófico capaz de situar o indivíduo para além do mundo material e das aparências ou experiências humanas comuns. A transcendência, como fenômeno metafísico, é fundamental para dar o sentido de existência da vida humana, forçando o indivíduo a ir além dos limites, graças a um estado superior de consciência.
Metade de nossas vidas, consumimos em pensar e devagar, analisando o passado e modelando projetos para o futuro. Nesses pontos complexos, entra ainda a chamada mindfulness, que é a atenção plena ajudada pela meditação, focada em exercitar a parte de nosso cérebro responsável pela mente, promovendo um melhor gerenciamento da vida. Por isso se diz que quem medita é mais feliz e resiliente.
Existem Especialistas em felicidade, inclusive há, em alguns países, um ministério da felicidade, como nos Emirados Árabes Unidos (EAU). O atual panorama que mostra porque os jovens se mostram cada vez mais envoltos por uma pesada nuvem de infelicidade aponta o ambiente de alta comparação social como um dos fatores, sobretudo, aquele promovido pelas redes sociais. Essa geração também enfrenta um cenário, para dizer o mínimo no caso brasileiro, instável. Os jovens se deparam com a insegurança no emprego, um aumento assustador no custo de vida, tudo isso embrulhado no papel reciclado de uma crise climática global. Observar o planeta nesses dias de alto poder de intercomunicação acende sentimentos como a ansiedade e a desesperança.
Talvez, por isso, os consultórios de psiquiatria e de psicólogos estão cada vez mais cheios de pacientes jovens. Nunca se vendeu, também, tantos medicamentos para transtornos da mente. A continuar nesse achatamento da curva de felicidade humana, o futuro pode ser ainda mais sombrio. Gerações emocionalmente fragilizadas são um perigo para o futuro. Governos, como em nosso caso, sabe-se, não se interessam por questões futuras a não ser que esse futuro não avance além das próximas eleições. Sendo assim…
A frase que foi pronunciada:
“Os adolescentes que passam mais tempo em redes sociais são consistentemente menos felizes. Aqueles que passam mais tempo com pessoas ou dormindo, são mais felizes.”
Jean Twenge, autora de iGen

História de Brasília
O senhor Magalhães foi demitido do DCT de Brasília. Durante tôda a sua gestão, o departamento nada apresentou de novo ou de justo para o público. Seus funcionários dormiram ao relento, ou em depósito de sucatas. Os contratados não receberam um tostão. Termina assim, essa gestão. (Publicado em 05.05.1962)
VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)
Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade
jornalistacircecunha@gmail.com
instagram.com/vistolidoeouvido

Há tempos em que o vento sopra contra a bússola. Quando a arte de planejar é abandonada, ou substituída por caprichos momentâneos, até o mais sólido dos alicerces começa a ceder. Essa verdade se aplica com ainda mais força ao organismo complexo político. Uma gestão sem planejamento é como um corpo sem esqueleto: sobrevive, mas vergado, adoecido, desfigurado.
Nosso centro administrativo na capital do país — tão meticulosamente desenhado em papel e sonho — foi, um dia, símbolo de uma promessa racional. Com traços modernos e espírito de vanguarda, pretendia-se erguer não apenas uma cidade, mas um novo modo de habitar o poder. Os eixos da capital não brotaram do acaso: vieram da mente de quem ousou imaginar o depois de amanhã.
Hoje, no entanto, a racionalidade daquele gesto inaugural não condiz com a política nacional abrigada na cidade. O improviso se tornou método. A pressa eleitoral substituiu o traçado técnico. As necessidades de poucos se sobrepuseram ao bem de muitos. Por conveniência ou por cálculo, decidiu-se ajustar a Esplanada dos Ministérios à vontade dos passageiros do turno. O resultado? Um amontoado de desculpas que fazem a gestão envelhecer antes da hora, medidas provisórias, soluções improvisadas e interesses que não aparecem nos diários oficiais.
Há setores da cidade onde o solo treme diante de novas informações. Outros são engolidos por estruturas parasitárias que avançam sem freios sobre cidadãos comuns, em nome de uma lógica que muitos fingem não ver. Não faltam elefantes brancos, erguidos a preços de ouro, cujas sombras cobrem o erário e sufocam o contribuinte. E tudo isso sob o silêncio ou a cumplicidade de quem deveria zelar.
Curiosamente, no seio da capital onde deveriam pulsar centros de estudo e reflexão urbana, impera a ausência. Onde estão os levantamentos técnicos? Onde está o diagnóstico dos pontos frágeis? Não se ouve a voz das academias, tampouco se vê sinal da caneta dos planejadores. A cidade parece agora viver à mercê da política mal calculada como se bastasse sempre “dar um jeito”.
Mas há limites para o improviso. Quando tudo é exceção, a regra desaparece. Quando tudo é urgente, o essencial se perde. E assim seguimos, a passos curtos e apressados, na contramão daquilo que um dia poderia ter sido.
A cidade que foi pensada numa política de futuro é quase um ato de resistência. Talvez, ainda haja tempo. Mas esse tempo exige coragem: de voltar à prancheta, de dizer não ao provisório, de confrontar os interesses rotativos e, sobretudo, de devolver, ao povo brasileiro, o direito de ser pensada com os olhos do amanhã.
Não é por acaso que, pelo mundo, o investimento em inteligência é o que predomina. Essa é a diferença. Fazer política não é remendar buracos ou inaugurar estruturas com placas reluzentes. É preciso visão. E, para isso, é necessário permitir que a técnica fale mais alto do que o aplauso fácil.
O que temos visto, porém, é o triunfo do improviso sobre o critério. Em nome de conveniências passageiras, áreas públicas são loteadas, normas são flexibilizadas e o interesse coletivo é empurrado para um futuro sempre adiado. Cada puxadinho interesseiro tolerado, cada invasão das regras ignorada, cada estrutura faraônica, que serve mais à vaidade do que à função pública, representa uma escolha — e não escolher também é uma escolha. A cidade é espelho disso tudo: reflete não só os traços do tempo, mas também as omissões de quem paga a conta.
Ao fim, resta a pergunta incômoda: o que deixaremos para aqueles que ainda não nasceram? Será que estaremos apenas perpetuando um modelo de política que desaprendeu a pensar? E quando uma cidade, um país, para de pensar, o que sobra é a repetição automática do erro. Não é esse o legado que uma capital, ainda chamada patrimônio, deveria desejar carregar.
A frase que foi pronunciada:
“É preciso tanta energia para desejar quanto para planejar.”
Eleanor Roosevelt

Terra sem lei
Se existe uma Lei Geral de Proteção de Dados, não faz o menor sentido um cliente de operadora de celular receber mais de 20 telefonemas de robôs por dia. Pior do que isso é a ouvidoria das operadoras deixarem um som irritante para o consumidor ouvir por mais de 40 minutos sem atendimento. E ainda há o pior: a Anatel só aceita a reclamação se houver registro na ouvidoria da operadora.

História de Brasília
O auditório da Universidade de Brasília se chama 2 Candangos, como homenagem ao Reitor aos 2 anônimos que morreram na construção da instituição. Em homenagem, diremos seus nomes: Gildemar Marques, de Bom Jesus, Piauí, 19 anos e Expedito Xavier Gomes, de Ipu, Ceará, 27 anos.
VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)
Hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade
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Num mundo globalizado como o que temos atualmente, é tolice acreditar que conflitos e guerras que ocorrem a milhares de quilômetros do nosso país, não tragam consequências negativas também para todos nós. E não só economicamente, mas sobretudo consequências deletérias e nefastas à própria segurança nacional. Há tempos, os especialistas em inteligência vêm alertando para a possibilidade da Tríplice Fronteira – formada nas divisas entre o Brasil, Argentina e Paraguai –, vir a se constituir num ninho ou incubadora de grupos terroristas vindos do Oriente Médio, muitos deles fugindo dos conflitos naquela região, onde passaram a ser caçados sem trégua pelas Forças de Defesa de Israel. A maioria desses terroristas dos grupos Hezbollah, Hamas, Fatah, Jihad Islâmica e outros vêm para essa região remota do Sul do nosso continente, com mala, cuia, família e tudo mais, em busca não de uma nova vida para si e seus familiares, mas para dar prosseguimento à sanha terrorista que os move.
Na Tríplice Fronteira hoje estão, sem nenhum exagero, sendo chocados os mais perigosos ovos de serpente que se tem notícia, pois essa é uma região há muito abandonada pelo poder público, onde proliferam e se cruzam todos os tipos de crimes, que vão da prostituição, lavagem de dinheiro, contrabando de armas e drogas, até a falsificação de documentos e de dólares. Ou seja: um ambiente mais do que adequado para a fixação e desenvolvimento de grupos terroristas internacionais. Enquanto o governo brasileiro faz, para dizer o mínimo, cara de paisagem sobre esse problema, os EUA têm feito o que pode para, ao menos, monitorar de perto esses grupos e suas atividades. Para a inteligência americana, a Tríplice Fronteira já é de fato um importante celeiro a abrigar e dar continuidade às ações de grupos terroristas. Além de ser um ambiente propício para abrigar esses fanáticos, os terroristas que por lá vivem encontraram, na boa vontade de governos que os apoiam, todas as facilidades, como é o caso da obtenção de passaportes falsos confeccionados na Nicarágua, Bolívia, Venezuela, Cuba e outros países simpáticos às ações de terror que eles submetem os judeus residentes em Israel.
Com a guerra entre Israel e Irã, a fuga desses criminosos rumo à Tríplice Fronteira aumentou significativamente. Ninguém nega que esses grupos vêm há anos representando uma ameaça contínua a Israel e seu povo. Também o Irã, como é por demais sabido, é o país que vem financiando esses grupos, armando-os e treinando-os para destruir ou como eles afirmam: “varrer Israel do mapa”. Trata-se nesse caso da chamada “doutrina do polvo”, na qual esses grupos representam os braços armados do regime dos aiatolás e a cabeça é o próprio Irã.
Também os chamados voos humanitários que trazem populações expostas à guerra, servem como transporte para esses terroristas virem se esconder no sul de nosso continente. Notícias levantadas pela inteligência americana dão conta que aproximadamente um grupo formado por quase meia centena de integrantes e comandantes de campo do Hezbollah e suas famílias, vieram para a Tríplice Fronteira sob as bençãos dos governos locais, aumentando ainda mais o risco para a segurança interna do Brasil. A Tríplice Fronteira é hoje um polo de financiamento e logística do Hezbollah e outros grupos. A região é usada há décadas por redes ligadas ao Hezbollah e Irã para financiar operações via tráfico de drogas, armas, lavagem de dinheiro e falsificação de passaportes e documentos, aproveitando o controle estatal fraco.
O “Barakat Clan”, grupo libanês-operacional no local, já teve contas congeladas e membros sancionados por ligação com o Hezbollah e por usar cassinos na fronteira para lavar dinheiro. Há ainda evidência de atividades operacionais e planos de ataques. Investigações recentes (como a Operação Trapiche) revelaram prisões no Brasil com suspeitas de preparação de atentados a sinagogas e embaixadas, com apoio de inteligência israelense. A própria Argentina de Milei instalou um Centro de Inteligência na fronteira em janeiro de 2024 para monitorar, justamente, atividades suspeitas e ligações com a infraestrutura terrorista iraniana no triângulo fronteiriço. A transferência de quadros e famílias de militantes é conhecida na região, onde o medo impõe o silêncio.
De acordo com fontes argentinas e americanas, cerca de 400 comandantes do Hezbollah e suas famílias teriam se transferido para a América do Sul — incluindo o Brasil — após um cessar-fogo no Oriente Médio, intensificando as preocupações com o aumento repentino de pessoal ativo na região. Inserção silenciosa desses grupos com agendas potencialmente hostis: pois não se trata de refugiados comuns, mas sim de operacionais com vínculos diretos a grupos que pregam “varrer Israel do mapa” – o que sugere planos ofensivos e não apenas reagrupamentos. Se nossa fronteira é porosa, imagina então um lugar como é essa Tríplice Fronteira, um ambiente permissivo, repleto de redes de tráfico, corrupção, onde vasta comunidade árabe local facilita o disfarce, recrutamento e movimentação desse agentes. Lembrando que essa região foi palco de planejamento operacional dos atentados na AMIA e na embaixada de Israel em Buenos Aires (1992, 1994), que conseguiram atravessar incontáveis milhares de mortos. A ação dos EUA, vigiando ativamente a região, com alertas, sanções e cooperação na revelação de redes financeiras ligadas ao Irã e Hezbollah, tem sido, sistematicamente, ignorada. A reação da Argentina e Paraguai, instalando centros de inteligência, reforçaram patrulhas e congelaram bens ligados a redes terroristas – mostra que há preocupação séria, embora o Brasil ainda esteja aquém, segundo especialistas. É necessário um alinhamento do Brasil, a começar por declarar o Hezbollah como organização terrorista, reduzindo lacunas legais e investindo mais em inteligência e cooperação internacional. Ou o Brasil põe fim a esse espaço estratégico onde proliferam células terroristas ou chegará o momento em que nosso país irá sofrer as consequências desse tipo de amizade peçonhenta.
A frase que foi pronunciada:
“Por trás dos slogans havia um vácuo intelectual.”
Henry Kissinger

História de Brasília
Para os arquivos do automobilismo, aqui estão os números das chapas do desastre do Eixo Monumental:25-94 e 9-9890. (Publicada em 05.05.1962)


