Numa democracia tradicional, a existência de uma ala política da situação, de apoio às teses do governo, é tão importante quanto a existência da oposição. É do embate entre esses grupos que se formam os consensos. Na melhor das hipóteses, a democracia é encontrada no caminho do meio, quando o equilíbrio entre as diversas forças políticas é atingido ou pelo menos buscado sem tréguas.
No caso do Brasil, onde uma miríade de legendas se forma ao sabor das oportunidades de momento e quase sempre com visão bem utilitarista, as dualidades ideológicas são desprezadas como firulas sem importância. Por aqui, criam-se partidos e sindicatos a granel, já que é excelente negócio.
Apoiar o governo, qualquer um, é sempre lucrativo. Sem identidade definida, nossas legendas e nosso sindicatos são, antes de tudo, típica firma de negócios, montada para sorver o dinheiro fácil e abundante do contribuinte. Não é por outra razão que, diante da maior crise de toda a história do Brasil, não se vê qualquer movimentação por parte dessas entidades no sentido de apontar soluções, nem mesmo emergenciais.
O que o público assiste é à choradeira de partidos e centrais sindicais com o esgotamento das fontes de recursos. Com instituições dessa qualidade, não chega a ser surpresa que o país prossiga, pelo terceiro ano consecutivo, em recessão e, pior, sem quaisquer horizontes de melhoria.
Nesse sentido, é mais fácil encontrar o personagem Wally, do inglês Martin Handford, do que a oposição ou críticos credenciados pelo eleitor para acender uma vela e clarear os caminhos. De positivo na crise fica a certeza de que o modelo de presidencialismo de coalizão, adotado até agora, tem servido apenas para abarrotar as cadeias do Paraná, com todos os tipos de aventureiros.
Numa democracia em que o apoio aos projetos de interesse do país fica condicionado ao pagamento de dinheiro ou de cargos, não tem como dar certo, nem hoje, nem nunca. Nossa democracia é arremedo dos modelos vigentes no Ocidente desenvolvido. O que se tem é pantomima que busca imitar o que é visto lá fora, mas sem conteúdo real. Vivemos, isso sim, uma república do faz de conta — desde o cumprimento da Constituição até o salário dos professores da Pátria Educadora. Absorta na tragédia, a população só desperta e se dá conta do engodo quando vai pagar os impostos ou chega à emergência de um hospital público.
A frase que não foi pronunciada
“Os gregos diziam tudo pela metade. O conhece-te a ti mesmo, por isso, é o segredo de sabedoria; mas o desconhece-te a ti mesmo é o segredo da felicidade.”
Heinrich Heine
Leitura
Recebi um livro do amigo Adirson Vasconcelos. É sempre um prazer relembrar os bons tempos da capital do Brasil. Poucos têm a autoridade de Adirson para tratar do assunto. Deixo aqui os meus agradecimentos.
Abuso de poder
Ação proposta pelo PSDB que pede a cassação da presidente Dilma e a diplomação de Aécio Neves foi estudada pelo juiz Sérgio Moro. Não são indícios. São comprovações de que recursos da Petrobras foram usados como propina para doações eleitorais.
Sem soberania
Escândalo prestes a explodir. Depois da Samarco, uma empresa chinesa está de olho na construção da usina de São Luiz do Tapajós. Belo Monte deveria ter, pelo menos, servido de exemplo para os nossos governantes. Licença ambiental que deixa dúvidas, custo estimado em R$ 23 bilhões há muita gente envolvida para proteger as famílias ribeirinhas, que, como em Belo Monte, vão ser esquecidas e ver direito e justiça correndo queda abaixo.
História de Brasília
O grande ausente na Câmara dos Deputados, ausente que não faz tanta falta, mas que devia estar no seu posto, tem sido o deputado Bonaparte Maia, do Ceará. Indiferente à hora dramática que vive o país, o representante nordestino dá as costas à realidade nacional, não tendo comparecido, até agora, a nenhuma reunião da Câmara, a não ser de seis em seis meses para não perder o mandato.(Publicado em 31/8/1961)