Inflação abaixo da meta aumenta a pressão sobre o BC

Publicado em Economia

ANTONIO TEMÓTEO

Enquanto os brasileiros acompanham um entediante debate no Congresso Nacional sobre a reforma da Previdência e aguardam, ansiosamente, o primeiro encontro entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o juiz federal Sérgio Moro, o monstro inflacionário continua a dar sinais de que permanecerá adormecido. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou hoje o resultado de abril do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). A taxa de 0,14% é a menor para o mês desde 1994. Em 12 meses, o indicador cravou 4,08%, ficando abaixo do centro da meta, de 4,5%, pela primeira vez desde agosto de 2010.

 

A expectativa de que a inflação permaneça em queda tem levado parte dos analistas a questionar a postura conservadora do Banco Central (BC) em reduzir a taxa básica de juros (Selic). Mesmo com um corte de três pontos percentuais nos juros nas últimas cinco reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) e com o IPCA controlado, os consumidores continuam a pagar preços abusivos nas operações de crédito e as empresas sofrem para manter as contas em dia. As perspectivas de que o crescimento econômico em 2017 será pífio, avaliam executivos de diversas instituições financeiras, deveriam encorajar a autoridade monetária a ser mais audaciosa.

 

Nas contas do economista-chefe do Banco Haitong, Jankiel Santos, o IPCA de abril ficaria em 0,17%, ou seja, acima do resultado oficial, o que é um ótimo sinal. Santos ressalta que os núcleos de inflação se mantêm comportados, o que reforça a percepção de haver espaço para uma flexibilização monetária adicional. Para ele, outro elemento que deverá dar sustentação à continuidade da redução da taxa básica de juros diz respeito ao comportamento da atividade econômica.

 

Ainda que o país registre tímido crescimento no primeiro trimestre do ano, explica Santos, a tendência de crescimento parece ser de recuperação bastante gradual ao longo do ano, sem nenhuma evidência de que a atividade econômica exercerá pressão inflacionária a curto prazo. “Assim sendo, não haveria mudança no quadro de convergência dos índices de preços. Consequentemente, o espaço para mais cortes de juros estaria garantido tanto do ponto de vista da dinâmica inflacionária quanto do ponto de vista do ritmo de atividade econômica”, diz. Diante desses fatores, o economista estima que a Selic encerrará 2017 em 9% ao ano, com cortes sequenciais de um, 0,75 e 0,5 pontos percentuais.

 

Reformas

 

No mercado, ainda há forte divisão quanto aos rumos dos juros. O economista-chefe do Bradesco, Fernando Honorato Barbosa, avalia que os cortes serão mais expressivos. A confiança em uma postura mais agressiva da autoridade monetária leva em conta as surpresas positivas do IPCA e a expectativa de que o comportamento do índice permanecerá benigno. “Além disso, a velocidade de saída da recessão parece ser gradual, com moderação da atividade econômica neste segundo trimestre do ano, ainda que as ações de política econômica e a agenda de reformas sinalizem para retomada sustentável adiante”, destaca.

 

Diante desses elementos e levando em conta que o avanço da tramitação da reforma da Previdência na Câmara dos Deputados acontecerá dentro do esperado, Honorato ajustou as perspectivas para os próximos passos da política monetária. “Nosso novo cenário de juros conta, agora, com quedas de 1,25 ponto percentual no fim de maio e de um ponto percentual nas duas reuniões seguintes, e mais dois cortes de 0,5 ponto percentual, levando a Selic para 8% em 2017, patamar que será mantido em 2018”, projeta.

 

O cenário macroeconômico de Honorato ainda leva em conta que o dólar permanecerá no patamar atual, com viés de alta. “Isso refletiria os fundamentos e o encaminhamento favorável da reforma da Previdência. Também entendemos que a retomada da economia será gradual, mas persistente e sustentável, em resposta a uma política econômica organizada, e que o cenário de inflação será extremamente benigno nos próximos 18 meses”, reforça. Para ele, esse novo balanço de riscos permitirá que o BC antecipe a queda de juros no curto prazo e atinja o ponto terminal do ciclo em patamar mais baixo, projetado em 8% em 2017 e 2018. Resumindo: a melhora do ambiente permite ao BC ousar na condução da política monetária para ajudar o país a sair do atoleiro.

 

Brasília, 09h30min