Uma casa para Athos 5

Publicado em Crônicas

Severino Francisco

A Audiência Pública convocada pela Secretaria de Cultura e Economia Criativa do DF para concessão de um terreno visando a construção da sede definitiva da Fundação Athos Bulcão foi um belo momento de reencontro da cidade consigo mesma. A cidade abraçou Athos Bulcão com um auditório lotado e representativo de múltiplos segmentos da sociedade civil: artistas, professores, arte-educadores, procuradores, parlamentares, poetas, advogados, empresários, a filha de Lelé Filgueiras, o neto de Oscar Niemeyer, funcionários do Ministério da Cultura e do Itamaraty.

Athos é uma das poucas unanimidades inteligentes e desperta o apreço de todos os brasilienses por tudo que fez pela cidade. Não é preciso ir ao museu para apreciar a sua arte; basta ir ao Itamaraty, ao hospital Sarah Kubistchek, a Igrejinha da 308 Sul, ao Parque da Cidade, às escolas classe das superquadras, ao Congresso Nacional, ao Teatro Nacional e ao Aeroporto de Brasília.

Ele tornou a cidade mais arejada, lúdica, agradável e luminosa. Como bem disse o presidente do IAB-DF, Luiz Eduardo Sarmento, é muito fácil defender Athos Bulcão. A iniciativa da Audiência Pública deve ser aplaudida, mas, de fato, ela vem tardiamente, pois salta aos olhos a relevância do artista para a identidade de Brasília, como mostrou o video criado pela jornalista e presidente da Fundação Athos Bulcão, Márcia Zarur.

Certo dia, escrevi um verbete sobre Athos Bulcão para um livro e, para fazer um teste de audiência, submeti o texto a uma série de estagiários. Queria saber se eles conheciam a obra do artista e se a minha linguagem era entendida. Pois bem, para a minha estupefação, eles sabiam de quase tudo. Perguntei aonde tinham aprendido aquilo e eles me responderam que era nas escolas públicas do DF. Isso só ocorreu graças ao trabalho da Fundação Athos Bulcão.

A ausência de uma sede é uma das razões da grave crise de sustentabilidade econômica pela qual passa a instituição, a ponto de ameaçar a sua sobrevivência. Os aluguéis do Plano Piloto ascenderam a níveis estratosféricos. Uma das coisas que deixava Athos mais feliz era saber que a sua arte inspirava as novas gerações. E, com uma sede definitiva, a Fundathos poderá potencializar o trabalho que já realiza em condições precárias.

Ninguém merece mais ter uma casa digna na cidade que ajudou a criar do que Athos Bulcão, pontificou, com a veemência paraibana Vladimir Carvalho. Que as providências para a concessão do terreno e a construção do prédio desenhado por Lelé Filgueiras sejam tomadas com urgência, pois isso deveria ter acontecido há muito tempo.

E, como lembrou a deputada Erika Kokai, será imprescindível o apoio dos parlamentares com emendas para erguer a sede definitiva da Fundação Athos Bulcão. É uma causa que transcende ideologias. Os empresários, que se locupletaram tanto com a cidade, têm agora uma oportunidade de devolverem um pouco do que Brasília lhes propiciou. Caso fosse realizado um plebicisto sobre a questão, sou capaz de apostar que a maioria dos brasilienses apoiaria a proposta de conceder uma casa para Athos.

A iniciativa da Secretaria de Cultura de realizar a audiência pública tem de ser aplaudida. Não era mais possível esperar, infinitamente, até que a sede da Fundação Athos Bulcão fosse construída em Portugal ou que seu acervo fosse adquirido pelo Moma de Nova York, como ocorreu com os acervos de Lucio Costa, que está em Lisboa, ou com o de Reynaldo Jardim, que está no MoMa de Nova York. Foi bonito ver artistas, cidadãos comuns e instituições da cidade abraçarem Athos Bulcão. Em meio a tantas manifestações de anti-Brasília, foi um momento em que Brasília afirmou a dignidade de ser Brasília.

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