Uma casa para Athos 3

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Severino Francisco

Quem quer conhecer a arte de Athos não precisa ir ao museu. Basta circular de carro em frente à pirâmide do Teatro Nacional, embarcar no Aeroporto de Brasília, levar o filho às escolas das superquadras, passar pela fachada de um dos hospitais da rede Sarah ou passear pelo Parque da Cidade. Na verdade, não precisa conhecer; basta reconhecer a beleza que ele misturou ao cotidiano da cidade com as obras de integração arte-arquitetura que realizou em parceria com Oscar Niemeyer e com Lelé Filgueiras.

Certa vez, perguntaram como é que se entendia com Oscar Niemeyer na integração arte-arquitetura, pois o arquiteto era ateu, e Athos, religioso. Athos respondeu que nem ele era tão religioso assim nem Oscar era tão ateu. E, ademais, não estavam ali para discutir religião, mas, sim, para fazer o que sabiam: estabelecer a integração entre arquitetura e arte.

Athos foi forjado a partir da experiência de Brasília; era auxiliar de Portinari nos painéis de azulejos da Pampulha. Mas, com as colaborações nos projetos de Oscar Niemeyer e Lelé Filgueiras em Brasília, ele superou Portinari neste aspecto, inventou uma nova linguagem para o azulejo e se distinguiu na condição de um dos nomes mais importantes na integração arte-arquitetura na história da arte moderna.

Com Lelé merecem destaque as magníficas intervenções realizadas no Sarah em Brasília, com o objetivo de atenuar o peso do ambiente, inserir vibrações de cor, sugerir uma relação mais saudável com o espaço. Em uma ala de quartos, criou painéis constituídos por módulos coloridos, com pequenas aberturas, que entram em comunicação direta com os jardins. Na sala de espera da radiologia, usou as cores amarela e laranja, para provocar a sensação de alegria.

Um dos trabalhos que provocou maior prazer foi a série de bichos coloridos que Athos concebeu pensando nas crianças. O artista ficava muito contente com a reação positiva das crianças internadas no Sarah. Quando passam para tomar sol, são envolvidas por formas leves e vibrantes. Estabelecem uma relação afetiva com o local. Sem essa intervenção, aquele espaço seria tão cinzento quanto uma garagem de prédio.

Athos é amado pelos cidadãos brasilienses. Mas, apesar da beleza que espalhou pela cidade e da relevância nacional e internacional do seu trabalho, ele ainda não teve o reconhecimento oficial que merece e se viu relegado à condição quase de sem-teto na cidade na qual foi um dos mais ilustres fundadores. Athos é o único dos criadores principais de Brasília que escolheu a cidade para morar e também o único que não tem sede própria ou dotação orçamentária para funcionar.

Juscelino, Oscar Niemeyer e Lucio Costa têm o Memorial JK, a Fundação Oscar Niemeyer e a Fundação Lucio Costa. Athos doou 700 obras para a fundação que leva seu nome. No entanto, a Fundathos está mergulhada em grave crise financeira porque ocupa um espaço na 510 Sul, mas os aluguéis subiram de maneira estratosférica e ameaçam a sobrevivência da instituição.

Além de zelar pelo acervo de Athos, a Fundação faz um importante trabalho de educação artística das crianças sobre o patrimônio cultural de Brasília. Na sexta-feira, às 11h, no Museu da República, será realizada uma audiência pública sobre a doação de um terreno no Setor de Difusão Cultural do Eixo Monumental para a construção da sede definitiva da Fundação Athos Bulcão, em projeto magnífico de Lelé Filgueiras.

Quando estava vivo, Athos sempre dependeu da iniciativa dos amigos, pois era muito tímido. Depois de morto, o seu legado permanece dependente da ação dos que o admiram e amam Brasília. Vamos à audiência pública para reparar essa injustiça e conceder uma casa digna para Athos. Ele é um dos artistas que conferem dignidade a Brasília.

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