Daddy Yankee e Luis Fonsi no clipe de Despacito.
Joseana Paganine
Acabou. O mundo acabou. Pelo menos certo mundo. Tive certeza disso depois de ver que quase 2 bilhões de pessoas acessaram Despacito no Youtube. Dois bilhões de pessoas são um terço da população mundial. Junte três pessoas, e uma já acessou o hit no Youtube. Isso significa que as outras duas já ouviram ou pelo menos ouviram alguém falar dessa música. Eu tinha ouvido falar, mais de uma vez, e fui lá para conferir por curiosidade e me deparei com o desastre. O desastre não é iminente. Ele já aconteceu.
O que vivemos hoje são os últimos sinais emitidos por um mundo que não existe mais, como os raios das estrelas que chegam à Terra muito depois de elas terem explodido. Alguns perceberam e denunciaram essa explosão: Baudelaire, Dostoiévski, Nietzsche, Fernando Pessoa, Walter Benjamin, Adorno, George Orwell, Aldous Huxley, Heidegger. Foram acusados de catastróficos. Eu os chamo de visionários.
A cultura humanista acabou, seja ela alta cultura ou cultura popular. Filhos das classes baixa, média e alta ouvem a mesma coisa, Despacito. No Brasil, nos Estados Unidos, na África do Sul, na Índia. Pergunte ao seu filho adolescente se ele sabe cantar alguma música do Luiz Gonzaga ou do Chico Buarque (olhe que nem citei Schubert). Se ele souber, sinto te dizer: seu filho é um freak, uma aberração.
A arte não é feita mais por homens e mulheres em diálogo, na maior parte das vezes sofrido, com a natureza e a cultura, mas por executivos em seus escritórios, no caso da música, manipulando fórmulas muito simples, fórmulas rítmicas, melódicas e poéticas capazes de dominar corações, mentes e corpos. Que transformam tudo em entretenimento, um jeito de esquecer que o tempo passa e que a gente morre. Há exceções? Claro que há. Mas elas são “só para raros”, como anteviu Hermann Hesse, em o Lobo da estepe, de 1927. Raros cada vez mais raros. A internet e as redes sociais foram a cereja que faltava ao bolo da indústria cultural. O que faltava para que a indústria distribuísse seus produtos a qualquer hora, em qualquer lugar, em qualquer meio.
Há uma vantagem em saber disso. Posso agora caminhar pelas ruas sabendo que estou caminhando sobre as ruínas de um mundo, ainda que essas ruínas não sejam visíveis, tendo o prazer de assistir ao que talvez seja o último ato, trágico, do que chamamos de “cultura ocidental”. O que virá depois? Gostaria muito de saber, mas infelizmente não estarei viva para ver.
Joseana Paganine é jornalista e mestre em Teoria Literária.
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