Respeitem Brasília

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Severino Francisco

Amigos do Rio de Janeiro, de São Paulo, de Salvador e do Recife me perguntam, ao assistir manifestações antidemocráticas na Esplanada dos Ministérios, o que está acontecendo e se essas pessoas representam Brasília. Disse a eles que Brasília é, profundamente Brasil, nas grandezas e nas misérias. Mas, na verdade, confesso que fico indignado quando vejo pessoas enroladas na bandeira do Brasil clamando por intervenção militar, fechamento do STF ou do Congresso Nacional. Isso tudo entra na conta de Brasília.

Cada um tem o sagrado direito de se manifestar como quiser, desde que não ultrapasse a linha dos limites democráticos. Mas sair à rua para apoiar o golpe de estado, a derrubada do STF ou do Congresso Nacional é algo que atenta contra a democracia. Em suma: é um crime. Não importa se os que o cometem venham embrulhados na bandeira do Brasil.

Enquanto se aglomeravam, sem máscaras e sem respeitar os protocolos de distanciamento físico, na Esplanada dos Ministérios, sindicalistas celebravam o Dia do Trabalhador, em várias cidades do país, com atos de solidariedade, distribuindo toneladas de alimentos para as vítimas da desestruturação provocada pela pandemia e pela inépcia do governo que eles apoiam.

Alguns cartazes propagavam a mensagem: “Eu autorizo, presidente”. Quer dizer, eles autorizavam a intervenção militar nos estados que adotaram medidas de restrição social. São graças a elas que a curva de contaminados e de mortos caiu, significativamente, nos últimos dias, em todo o país. Falam em nome do povo, mas constituem uma minoria da minoria.

Prometeram colocar 1 milhão de pessoas na Esplanada dos Ministérios. Mas, segundo a estimativa superestimada dos próprios organizadores, só conseguiram mobilizar 5 mil pessoas. Não, eu não autorizo o ataque à democracia. Eu nem a maioria dos 3 milhões de brasilienses. Essas manifestações envergonham a maioria dos brasilienses e dos brasileiros.

É preciso lembrar que Brasília tem uma tradição de protestos de rua. Em 1976, uma multidão desafiou as ordens do regime militar e invadiu as avenidas de Brasília para reverenciar o ex-presidente Juscelino Kubistchek, morto em um estranho acidente de carro. Na virada final da década de 1980, uma legião urbana de brasilienses ocupou a Esplanada dos Ministérios para apoiar o movimento das Diretas Já. E, recentemente, ocorreram carreatas com mais de 100 mil pessoas para protestar contra os cortes no orçamento para educação.

Muitas ilusões históricas se desvaneceram. Mas Brasília permanece um símbolo, uma promessa de modernidade brasileira. Os manifestantes antidemocráticos são contra a vacina, contra o voto eletrônico, contra a educação, contra o meio ambiente, contra a democracia, contra a cultura e contra a vida. São a favor das armas, da ignorância, da impunidade, do voto impresso e da morte. Eles são a vanguarda do atraso.

Não representam Brasília. Quem representa Brasília é Athos Bulcão, a Legião Urbana, Vladimir Carvalho, Hugo Rodas, Wagner Hermusche, Sérgio Moriconi, Francisco Alvim, Frederico Holanda, Maria Lúcia Verdi, o Clube do Choro, o Coletivo Maria Cobogó, Nicolas Behr, Cássia Éller e tantos outros.

Tocaram até Tempo perdido, da Legião Urbana, num ato em Limeira, São Paulo. Renato Russo e a turma da Legião Urbana participaram de manifestações pela democracia em frente ao Congresso Nacional nos anos 1980. Por favor, mais respeito a Brasília.

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