Severino Francisco
Uma das coisas que mais deixava Athos Bulcão feliz era ver que a sua arte era inspiradora para as novas gerações. E, de fato, ele tem máscaras que parecem uma pizza escorrida e poderiam figurar na capa de um álbum de grupo heavy metal ou de DJ de música eletrônica. Athos é referência não apenas da integração arte-arquitetura. Está presente na moda, nos acessórios, no design de móveis e no carnaval.
Tudo em que tocava se transformava em arte: painéis, treliças, fachadas, paredes, biombos ou relevos. As suas cores e formas sempre nos atingem com algo da vibração, do esplendor e da alegria de uma festa popular brasileira. Mas com um requinte de quem domina os fundamentos de sua arte. Ela fez intervenções precisas para cada ambiente.
Athos falava em voz baixa, quase sussurrada, parecia aquele gato de Alice no país das maravilhas, que desaparecia e deixava apenas o sorriso no ar. Enquanto Oscar Niemeyer impõe a sua genialidade de maneira quase imperial, Athos quer que a gente se sinta bem na cidade como se fosse a nossa casa. Sempre insere um detalhe para favorecer a iluminação, o arejamento e a sensação de leveza.
Ele está presente na escala monumental, mas também na escala cotidiana da cidade. Nas escolas, nos hospitais, no aeroporto, nas paredes dos banheiros do Parque da Cidade, na entrada de alguns blocos ou na visão do Teatro Nacional flagrado na passagem de carro. É uma obra em parceria com Oscar Niemeyer, mas também com as apropriações dos habitantes da cidade, as luzes e o sol. Ela muda de aspecto de acordo com a hora do dia ou da noite.
O arquiteto e parceiro Lelé Filgueiras ressalta que Athos Bulcão é uma figura exemplar nas artes plásticas, não só no Brasil, mas no mundo. Nenhum artista integrou de forma tão profunda a sua arte na arquitetura. Apesar das propostas de Fernand Léger e de Mondrian nesse sentido, depois do advento da arquitetura moderna, isso só aconteceu com abrangência pelas mãos de Athos Bulcão: “Athos não é somente um artista de Brasília; é um artista universal”.
Nos últimos tempos, Athos foi humilhado e ofendido pela ignorância e pelo descaso das excelências. A fundação que leva seu nome e herdou parte relevante do seu acervo se viu quase na condição de sem-teto. Ela desenvolve projetos importantes de educação pela arte, vela pela obra de Athos, divulga a sua obra em uma lojinha frequentada por visitantes de diversos estados e de vários países. É um vexame para Brasília. Essa é uma das razões pelas quais a nossa cidade tem uma péssima imagem para o restante do país.
E, agora, em razão desse desleixo, a instituição responsável pelo legado do mais importante artista da cidade vive uma situação dramática na luta pela sobrevivência. O preço dos aluguéis no Plano Piloto se tornou extratosférico. Por isso, a Fundação Athos Bulcão lançou uma campanha desesperada pela sobrevivência. Não adianta fazer declarações de amor à cidade no aniversário. Quem puder, ajude a Fundação a continuar realizando o trabalho essencial para Brasília. Consulte o site da instituição para saber como você pode colaborar. Quem ama, cuida, quem ama, preserva. É preciso respeitar e conferir dignidade ao mais importante artista da cidade.
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