Severino Francisco
A compra de vacinas para as crianças é adiada por manobras do próprio ministro da Saúde, as campanhas negacionistas circulam nas redes sociais impunemente, a imunização das crianças avança a passos de tartaruga, a demora abre espaço para o surgimento iminente de novas variantes, os bares estão lotados como se não existisse pandemia e quase todos fazem pressão para que as escolas voltem a funcionar com todos presencialmente. Esse é um retrato da loucura brasileira neste momento da crise sanitária.
Não, as instituições não estão funcionando. Se estivessem, os que cometem tais desatinos seriam responsabilizados. Mas eles permanecem impunes e impávidos, espalhando mentiras que ameaçam a vida de milhões de brasileiros. Imagino que as excelências pensam assim: ah, depois das eleições, a gente resolve isso.
É deplorável o silêncio ensurdecedor do nosso parlamento, principalmente da Câmara dos Deputados. Parece que as preocupações daquela Casa se resumem ao orçamento secreto, ao fundão e aos atos de legislar em causa própria, neste momento dramático.
A volta às aulas em massa foi decidida antes do atual cenário criado pela escalada de transmissão da variante ômicron. É claro que as crianças, os pais e a maioria dos professores querem retornar ao ensino presencial. Sem dúvida, as perdas pedagógicas, cognitivas e afetivas das crianças e dos adolescentes são enormes.
Mas se a educação é mesmo uma atividade essencial, a comunidade escolar precisa ter prioridade na vacinação, como tiveram os profissionais da saúde e da segurança. A imunização das crianças em Brasília ocupa o segundo lugar no país, perdendo apenas para São Paulo. Ainda assim, não leva em conta a urgência da situação e é insuficiente.
Uma nota técnica assinada por pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal de São João Del-Rei (UFSJ), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a Universidade do Estado da Bahia (UNEB), entre outras, alerta para a necessidade de adiar a volta às aulas, ante a escalada crescente de contaminação. Nenhuma excelência pode alegar que não sabia o que poderia acontecer.
Em Belo Horizonte, mesmo sob pressão do Ministério Público, o prefeito Alexandre Kalil decidiu só retomar as atividades presenciais nas escolas com todas as crianças vacinadas. Você adia ainda um pouco, mas volta com mais segurança. É essa atitude responsável que se espera de um homem público, não importa se seja de direita ou esquerda. A exigência de passaporte vacinal nas escolas deveria ser uma das medidas obrigatórias para preservar a vida de todos, além de estimular a imunização.
Quem garante que o ambiente de todas as instituições de ensino é seguro nunca visitou uma escola da periferia do DF ou imagina que o Brasil é a Noruega ou a Suécia. Infelizmente, algumas têm mais alunos do que o ideal, são insalubres, não têm janelas, não têm arejamento.
A UnB retomou as atividades, mas com sensatez, só permitindo 15% das aulas presenciais. Reiniciar o período letivo das escolas públicas do DF de maneira irrestrita, com 100% de atividades presenciais, quando nem todas as crianças estarão vacinadas, é uma temeridade. As UTIs estão com 100% de lotação. E se uma criança fica doente, vai se tratar onde?
Como bem disse o epidemiologista Miguel Nicolelis, se os governantes não pautam as suas estratégias e ações pela ciência, o vírus assume o comando. Ainda bem que, aos trancos e barrancos, muitos se vacinaram e se salvaram. Faço um apelo: mesmo que você seja negacionista, vacine-se, pois estará protegendo a sua vida e a das outras pessoas.
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