Severino Francisco
Darcy Ribeiro dizia que só se faz sábios com sábios. E um dos sábios que vieram para a Universidade de Brasília é o arquiteto e fotógrafo Luis Humberto. Em Brasília, ele se afirmou na condição de um dos mais importantes nomes do fotojornalismo brasileiro. Ele cresceu com a cidade, viveu a utopia e a distopia.
Se alguém me pedisse à queima-roupa para que definisse Luis Humberto em uma palavra, eu responderia: dignidade. Todos os seus atos são animados por uma postura de radical altivez. Nas décadas de 1970 e 1980, ele inovou a cobertura política do poder ao fazer fotos com um olhar crítico tão irreverente que suas imagens se aproximam da caricatura e do cartoon. Enquanto os políticos faziam pose de estátua, ele flagrava o lance revelador da prepotência, do ridículo e da teatralidade bufônica.
Para tanto, fotografava antes ou depois dos momentos oficiais. Flagrou muitos instantes de ridicularia do poder com um olhar de artista. Em uma das fotos tiradas nos tempos do regime militar, os personagens de uma cerimônia pública aparecem com as cabeças cortadas: “A fotografia agora é mais maquiada, é uma coisa bonita, elaborada, mas fotografia não é só isso”, espeta Luis.
Mas a obra de Luis Humberto não se restringiu à cobertura política. Ele abriu as suas lentes para a vegetação do cerrado, as cenas da vida íntima e a relação harmônica dos brasilienses com a escala monumental e a escala residencial de Brasília.
A contribuição de Luis Humberto é enorme na formação de várias gerações de artistas. Ele não é apenas um brilhante fotógrafo; ensina com a sua vida. É um pensador da fotografia e um provocador sempre atilado. Em suas mãos, a câmera é um instrumento poderoso de exploração da poesia, do espaço e da luz. Inaugurou a Coleção Luz e Reflexão, da Funarte, com Fotografia: Universos & Arrabaldes, e inaugurou também a coleção Senac de Fotografia.
Recentemente, Luis Humberto passou a fotografar a partir de um novo ponto de vista: a cadeira de rodas. Com os movimentos limitados em razão do mal de Parkinson, ele resolveu explorar coisas que antes não despertam a sua atenção. O resultado é a exposição A reforma do (possível olhar), que teve a proposta recusada pelos avaliadores do FAC (Fundo de Apoio à Cultura).
Em razão da relevância de Luis Humberto, a recusa da proposta da exposição levantou dúvidas sobre o conhecimento e a competência dos avaliadores. E tanto que a própria Secretaria de Cultura se viu constrangida a montar a exposição no Museu da República com Luis Humberto na condição de artista convidado.
Parece que a intenção de impessoalizar a avaliação dos projetos com pareceristas de fora da cidade levou a uma alienação monstruosa em relação à efetiva relevância dos artistas. O lay out ou a formatação passaram a ser mais importantes do que a história ou o mérito.
Vladimir Carvalho, um dos maiores documentaristas brasileiros, não concorre a editais. Quase todos os filmes recentes foram produzidas, penosamente, às próprias custas S.A., com o salário de professor aposentado. Ele não quer se expor ao inferno da burocracia cultural. Que os processos de avaliação sejam aperfeiçoados para se evitar vexames como esse no FAC. As imagens de Luis Humberto dignificam Brasília. Só se faz sábios com sábios.
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