Estava ao lado de minha cama
atormentado pelas imagens
do planalto ardendo em chamas
quando tive uma alucinação
senti os pés perderem o chão
e vi os deputados federais
que venderam a alma a satanás
para anistiar o crime do Caixa dois
se dirigindo à sala de um juiz
presos por algemas no inferno
com listras zebradas de presidiários
nos tailleurs importados e nos ternos.
Logo na porta principal da entrada
numa derradeira ação desesperada
a líder da quadrilha tentou comprar
o diabo com uma polpuda propina
mas o capeta cortou o papo da mina:
“Sei que vocês sabem subornar
Desviam a verba das ambulâncias,
roubam as merendas das crianças,
e, depois, numa operação patética
presidem a Comissão de ética
mas vocês venderam a alma para mim
cobrarei a dita cuja tim-tim por tim-tim
sei que vocês são mestres na arte de enganar
mas aqui é diferente, a chapa vai esquentar.
Não tem negociação e nem calma,
vendeu, terá que pagar com a alma
o fim do sofrimento está distante
o meu inferno não é um inferninho
é muito pior do que o inferno de Dante.
Os senhores deputados covardões
que ignoraram a vontade de milhões
e desfiguraram o projeto anticorrupção
dificultando o processo de desratização
serão enleados por mil cascavéis
ouvindo música breganeja e covers
o tempo todo a mais de 10 mil decibéis.
Se esconder atrás do anonimato,
mentindo, omitindo e compondo
é um ato imoral e a lista fechada
deveria ser logo sancionada
no capítulo do crime hediondo.
Mas a situação só vai melhorar
quando o povo se conscientizar
e exigir a lei do recall dos políticos
para sanear o espaço público
e fazer uma providencial faxina
em quem paga ou recebe propina.
É preciso fazer o retrato falado
dos ilustres senadores e deputados
que não achando bastante a verdade
dos que embolsaram a erva brava
em uma imagem que vale por mil palavras
criaram a jurisprudência da impunidade.
‘Roubei, mas foi em outro mandato”.
Não existe argumento mais cínico e caricato,
daqui a pouco, os maiores meliantes
chegarão ao juiz e confessarão: “Roubei,
menti, matei, desviei, sou traficante,
apliquei o 171 e pratiquei peculato,
mas tudo ocorreu em outro mandato”.
Desculpem-me se sou franco
mas é preciso separar o joio da farinha
e botar de uma vez por todas na cadeia
ladrões e ladras de colarinho branco.
Se vocês continuarem a me mandar
políticos dessa qualidade
vou encaminhar um ofício a Deus
pedindo taxa de insalubridade.
O inferno já está com superlotação
vê se vocês tomam vergonha na cara
e não votem mais em político ladrão
tenham misericórdia de um ente
que exerce seu ofício honestamente
também preciso de sua ajuda
não me mandem esses políticos
mais traiçoeiros do que Judas
no início, ao meio e ao cabo,
não passo de um pobre diabo”.
Quando despertei, logo percebi
que os deputados ainda não tinham
ido para o inferno e o inferno é aqui.
Crônica publicada, originalmente, em 14 de abril de 2017
Créditos: todas as xilogravuras são de José Pacheco, retiradas do livro Antologia do Cordel Brasileiro, do autor Marco Haurélio.
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