Severino Francisco
Na época de estudante do Ensino Fundamental, Francisco Celso Leitão percebia que a linguagem artística lhe tocava muito mais do que os discursos eloquentes. Em 1995, uma professora de geografia dava aula sobre desigualdade social nos países periféricos. Estava com dificuldade de que os alunos prestassem atenção. Ela perguntou se alguém conhecia o Rap da felicidade, que, na verdade, é um funk dos MCs cariocas Cidinho e Doca: “Eu só quero é ser feliz/Andar tranquilamente na favela onde eu nasci”.
A música estava estourada na época. Daniel, um colega de turma, conhecia a canção inteira, e a turma toda acompanhou. A partir dali, a professor conquistou a atenção dos alunos e conseguiu fazer a discussão do tema da desigualdade. Essa experiência foi a inspiração para a pedagogia desenvolvida, mais tarde, pelo professor de história Francisco no projeto Rap (Ressocialização, Autonomia e Protagonismo) de Santa Maria, que acaba de ser escolhido como um dos 10 finalistas do World’s Best School Prize (Prêmio de Melhores Escolas do Mundo).
Ou, em outras palavras, o Núcleo de Ensino da Unidade de Internação de Santa Maria está no topo 10 das Melhores Escolas do Mundo na categoria Superando Adversidades. A escola foi selecionada entre milhares de inscrições de 100 países do mundo.
Quando se tornou professor, Francisco se lembrou da experiência de estudante do Ensino Fundamental e passou a utilizar múltiplas linguagens artísticas em sala de aula. No entanto, ao se tornar professor de uma escola do jovens internos do sistema socioeducativo, Francisco percebeu que os alunos não se viam representados nas histórias contadas pelos livros didáticos. Eles se reconheciam nas letras do rap. De certa maneira, foram os próprios socioeducandos que lhe mostraram o caminho a ser
trilhado.
Francisco potencializou esses saberes por meio de aulas em conexão com os três temas do currículo escolar no DF: direitos humanos, diversidade e sustentabilidade. Por exemplo, para discutir a violência contra as mulheres, ele utiliza a letra de Rosas, do grupo Atitude Feminina. Depois do debate, provoca os alunos para que alunos se expressem em forma de desenho, redação, poesia ou letra de rap. Promoveu uma intensa agenda cultural, publicou livros, gravou letras de rap e ensinou aos alunos a concorrem a editais.
Quando chegou à Unidade de Internação de Santa Maria, Francisco percebeu que os alunos haviam perdido completamente a capacidade de sonhar. Não podia fazer mais do mesmo. A escola regular não tinha dado conta deles. Precisou ter a humildade de ouvi-los. O principal fator para que a experiência educativa se tornasse bem-sucedida é que ela não veio de cima ou de fora; veio dos próprios socioeducandos, no planejamento, na execução e na avaliação.
Uma aluna de Francisco deixou de ir à escola porque foi proibido o uso de boné e ela tinha vergonha do cabelo crespo. Isso não é evasão, é expulsão, de forma indireta, entende Francisco. Combater a evasão escolar é assumir um pacto entre professores, alunos, servidores, pais e poder público para que a escola seja um ambiente acolhedor.
O projeto RAP não é assistencialista; é de emancipação, é de impactar, positivamente, a trajetória de vida. Já ganhou 22 prêmios de educação e cultura. Mas, para o professor Francisco Celso, o maior prêmio é o de ensinar jovens marginalizados a sonharem novamente. É ver que uma adolescente volta ao projeto, não mais na condição de interna, mas na de cantora.
PS: A escolha da experiência de educação vencedora será escolhida por meio do voto. Vote no Núcleo de Ensino da Unidade de Internação de Santa Maria até 28 de junho pelo link: https://bit.ly/NúcleoDeEnsinoDaUnidadeDeInternaçãoDeSantaMaria