Severino Francisco
As excelências governamentais que depõem na CPI partilham algumas características e tendências: o desalinhamento com a ciência e as instituições, o desapreço à realidade, a propensão à mentira e, quando são pilhadas, ao realismo fantástico. Mas uma coisa não é possível negar: são, antes de tudo, muito corajosos. Basta que sejam convocados para que entrem com um pedido de habeas corpus no STF.
E isso depois de ter participado na semana anterior de uma manifestação para pedir intervenção militar e fechamento do STF. É urgente que a CPI da Covid mantenha em regime de plantão permanente uma checagem de mentiras, um epidemiologista, um linguista e um ironista. Porque as mentiras, as meia-verdades, os eufemismos e as informações defasadas pululam.
Vejam o caso do depoimento de Mayra Pinheiro, a chamada “Capitã Cloroquina”, na CPI da Covid. Ela é médica há 30 anos, tem experiência, mestrado e doutorado. No entanto, quando confrontada com a responsabilidade pelo uso de um medicamento de eficácia não comprovada pela ciência, tergiversa ou apresenta pesquisas desfasadas ou de instituições sem credibilidade.
O discurso dela é mais sofisticado, mas tão negacionista quanto o de outras autoridades ignaras. Questionada sobre o impacto da recomendação de um medicamento de eficácia não comprovada pela ciência, ela desconversa e afirma que o ministério da Saúde não “recomendou”, mas, sim, “orientou” a administrar dosagens corretas do remédio para tratar da covid na fase inicial.
O senador-médico baiano Otto Alencar faz intervenções agudas, bem-humoradas e pertinentes na CPI. Ele indagou a Mayra, se existe algum remédio para evitar o sarampo, a paralisia infantil e a varíola? Com a vacina, respondeu a depoente. E Otto perguntou: como é que vocês inventaram essa história de que pode combater a infecção do coronavírus com cloroquina? Segundo Mayra, não cura, mas pode evitar a internação.
É preciso lembrar que Mayra é secretária de Educação e Trabalho. Liderou uma política pública de saúde que extrapola a sua função e a sua formação. Ela não é infectologista. E fez tudo isso porque entende que o ministério da Saúde não precisa trabalhar alinhado com a OMS, com as instituições internacionais de credibilidade, com a Fiocruz ou com o Instituto Butantan.
É o mesmo que fizeram e fazem os ministros do Meio Ambiente e das Relações Exteriores. Mayra lembra os erros da OMS para rechaçar o alinhamento. No entanto, a diferença é que a OMS cometeu erros e os retificou, enquanto Mayra insiste por fanatismo ideológico. Ela viu na logo da Fiocruz, inspirada nas torres da instituição, um símbolo fálico.
O problema é que a soma de negligência, omissão, fanatismo ideológico e incompetência produziu a tragédia de mais de 450 mil mortes, sendo que grande parte delas poderia ser evitada. Em vez de vacina, o governo investiu em cloroquina. É essa realidade trágica que implode com os sofismas, as mentiras e as meias-verdades dos que pretendem defender o indefensável.
Mas houve também uma cena tragicômica na CPI. Depois de Mayra negar que o aplicativo Tratecov tivesse sido hackeado e que o conteúdo tivesse sido modificado, o senador Omar Aziz indagou por que, então, a interrupção, pois poderia salvar vidas?
Um senador governista não entendeu porque Aziz criticava e agora era favorável ao Tratecov. A que ponto chegamos. Seria preciso colocar o Paulo Francis de plantão na CPI para explicar: “Atenção, massas, riam, isso é uma ironia”.
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