Severino Francisco
Confesso que, em determinado momento, preferi as canções contundentes de Sérgio Sampaio do que as sutis de Chico Buarque. Mas essa fase passou e hoje eu reconheço a perfeição de certas canções do Chico. Com elegância e senso de humor, ele driblou a censura imposta pelo regime de exceção e passou recados que ajudaram a resistir. Mas, hoje, eu quero falar mesmo é da relação de Chico Buarque com o futebol.
Desde os tempos de criança quando jogava futebol de botão. Chico batizou o time do qual é fundador de Politheama, em homenagem ao esquadrão de futebol de mesa quando ele tinha aos 15 anos. É Fluminense doente, desde 40 mil antes do paraíso, diria Nelson Rodrigues. A paixão pelo tricolor carioca é um legado da mãe, Maria Amélia. Rorce e se retorce pelo time de coração.
Em 18 de julho de 1992, Chico trouxe o Politheama para jogar uma partida em Brasília contra o time dos jornalistas no Clube da Imprensa. A torcida para ele era grande e organizada, mas, apesar disso, não se distinguiu pela performance com a bola. Quem desequilibrou o jogo foi o meia Afonsinho, o craque rebelde ex-jogador do Flamengo, do Botafogo e do Fluminense.
Eu inventei uma versão de que Chico Buarque aplicou um drible tão desconcertante no repórter Irlam Rocha Lima, que esse se estabacou no chão. Sempre que conto a história, Irlam fica muito irritado e desmente com veemência. Mas, quase no fim da partida, Chico marcou um gol. O placar final foi a goleada de 5×0 para o Politheama.
Quando o juiz deu o apito final, Chico conduziu o troféu que lhe foi entregue pelo colunista político Carlos Castelllo Branco, deu a volta olímpica com os companheiros de time e caiu no samba animado pela bateria da escola Unidos do Cruzeiro.
Ao renovar o contrato com a gravadora Universal, Chico ganhou de presente um campinho no Recreio dos Bandeirantes. Seria a sede do Politheama e foi batizada de Centro Recreativo Vinicius de Moraes.
Chico compôs até um hino para o time: “Politheama, Politheama / O povo clama por você / Politheama, Politheama / Cultiva a fama de não perder…” Mas o segredo é que, nas peladas politheâmicas, Chico costuma puxar os craques para o seu time e deixar os pernas-de-pau para os adversários. No campinho do Polyteama já desfilaram Afonsinho, Fagner, Alceu Valença, Moraes Moreira, Tostão, Sócrates, Ronaldo Fenômeno, Ronaldinho, Carlinhos Vergueiro.
Bob Marley apareceu por lá em 1980 levado pelo craque Paulo César Caju, de quem era amigo. Chico pediu reforço e vieram Alceu Valença, Moraes Moreira, Toquinho e Evandro Mesquita. A pelada só durou 20 minutos, segundo um repórter presente, pela falta de condições físicas dos jogadores. Bob Marley era esforçado, mas não jogava nada.
Em 2017, quando Pelé foi convidado a visitar o campinho do Polyteama. Conversa vai, conversa vem e Pelé perguntou a Chico quantos gols o craque da música havia feito naquelas paragens. Com a maior desfaçatez do mundo, Chico respondeu: “Nem sei, depois que fiz mil, parei de contar”.
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