Severino Francisco
Nos tempos de adolescente, eu tinha horror à rotina. Para mim, era sinônimo de burocracia, repetição, chatice e tédio. Fugia dela como o diabo da cruz. Quem relativizou e retemperou a minha convicção extremista foi o mestre Gilberto Freyre. Para ele, a aventura e a rotina, temas de um dos seus livros, não devem ser colocadas como termos opostos e inconciliáveis.
Precisamos de rotina para sermos produtivos; e de aventura para descortinarmos horizontes. A rotina propicia o aprofundamento; e a aventura, novas possibilidades. Sempre me espanto com o foto de sair jornal todos os dias por mais que saiba em que condições ele é produzido. É o milagre da rotina jornalística.
Rubem Braga dizia que, se não fosse a obrigação de preencher o espaço da coluna todos os dias, sob a pressão do relógio, em dramática contagem regressiva, ele não escreveria nada. Constituiu uma obra, despretensiosamente, na cozinha dos jornais, ralando para pagar a conta do aluguel ou do uísque.
O tema da aventura e da rotina me veio à mente ao evocar o isolamento social imposto pela pandemia. Bem sei que nem todos puderam se dar ao luxo de permanecer recolhidos nas suas casas em condições minimamente dignas.
Mas, para que pode, foi uma oportunidade de fazer uma profunda imersão na leitura. De minha parte, liguei a minha internet espiritual em Machado de Assis, Eça de Queiroz, Alexandre Dumas, Flaubert, entre outros.
A pandemia impôs terríveis restrições, mas, em uma situação semelhante a de uma guerra, tivemos de aprender a melhor maneira de sobreviver e de viver a nossa vida. Talvez fosse equivocado pensar assim: “depois da pandemia, volto a viver”. A vida é, urgentemente, aqui e agora. E, neste sentido, os livros nos ajudaram muito na travessia para manter um mínimo de sanidade.
Logo depois que Juçara (a minha companheira de todas as horas) aprendeu a ler, quanto tinha sete anos, ela ficou encantada com os livros. Praticamente, morava dentro deles. Leu toda a coleção do Sítio do Picapau Amarelo, de Monteiro Lobato, Julio Verne, os contos de fadas de Grimm, as Mil e uma noites e os contos de fadas russos. Quando pegava um livro, a casa podia desabar, pois ela permaneceria com os olhos grudados nas páginas.
As amigas achavam estranho e espicaçavam: “Vamos brincar, você não vive, vegeta”. Ela gostava de brincar, mas, naquele momento, preferia os livros, e pensava: “É engraçado. Leio Monteiro Lobato e viajo pela Grécia, pela Itália, pela França, pela Sibéria, pelo fundo do mar e por outros planetas. E as pessoas me vem dizer que vegeto”.
Os livros são tapetes voadores. Quem lê não sabe o que é tédio. De fato, a leitura e o cultivo das plantas conciliam, harmonicamente, aventura e rotina. Percebo com clareza que, aparentemente, só não enlouqueci na pandemia, por causa dos livros e das plantas.
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