Severino Francisco
A selva selvagem de mentiras da internet, manipulada por extremistas, produziu a anomalia de professores contra a educação, advogados contra o Estado de Direito, parlamentares contra o parlamento, jornalistas contra os fatos, povo contra a democracia, magistrados contra a lei e médicos contra a vacina. É inacreditável, mas sob o pretexto de entender a percepção dos médicos brasileiros sobre a obrigatoriedade da vacinação contra a covid-19 em crianças de seis meses a 4 anos e 11 meses, determinada pelo Ministério da Saúde, o Conselho Federal de Medicina promove uma pesquisa em cima de falsas questões que lançam dúvida na cabeça dos pais sobre a imunização.
A pesquisa que o CFM propõe é inteiramente fake. Com todo o respeito que tenho aos médicos, a eficácia da vacina não pode ser aferida por uma sondagem de opinião com os profissionais da área. Em nome da autonomia médica, é forjada uma farsa de credibilidade. Não cabe aos médicos atestar a eficiência das vacinas.
Essa é uma atribuição, em primeiro lugar, da ciência, e, em seguida, do Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde. Lá, existem pessoas altamente qualificadas, que seguem um protocolo internacional, consultando todos os dados disponíveis e avaliando se uma vacina pode ou não ser utilizada com segurança. Graças a esse trabalho, o Brasil se tornou uma referência internacional em imunização. Foram erradicadas doenças terríveis que assombraram várias gerações: poliomelite, rubéola e varíola.
Mas, ao menos em parte, a confiança nesse trabalho foi minada por campanhas sórdidas de desinformação sobre as vacinas durante a pandemia da covid. Com isso, os pais começaram a ficar em dúvida se vacinariam os filhos. O resultado é a ameaça da volta de doenças que, praticamente, estavam erradicadas, algumas graves, como é o caso da poliomelite.
O então presidente da República sabotou as regras sanitárias, disse que a covid “era uma gripezinha”, fez campanha sistemática contra os imunizantes, demorou a comprar vacina, passeou de jet sky enquanto muitos brasileiros padeciam nos hospitais e zombou dos que agonizavam com falta de ar.
Em meio à maior tragédia sanitária do país, o então ministro da Saúde do referido presidente recomendava: “Vacinem seu filhos, mas não é obrigatório”. Já imaginaram se o ministro dos Transportes declarasse: “Respeitem o semáforo, mas não é obrigatório. O mais importante é a liberdade de cada um”.
Durante a pandemia, o CFM exerceu o lamentável papel de alimentar o negacionismo, ao atacar as vacinas e ao defender a cloroquina, colocando em risco a vida de milhares de pessoas. Não é mero acaso o fato de que o Brasil ficou em segundo lugar no ranking dos países com mais mortes e pior gestão da pandemia.
Todos nós tivemos a chance de ver o que aconteceu no decorrer da crise sanitária da covid. A partir da vacinação, os índices de doenças e de mortes caíram vertiginosamente. No caso, cada pessoa que se imuniza protege a coletividade. Se um médico recusa vacinas que podem livrar as crianças de doenças e até salvá-las nega toda a sua formação.
Só o fanatismo ideológico e as teorias de conspiração podem fazer com que pessoas e instituições prefiram a doença à saúde, as fake news à ciência, o coronavírus à vacina e a morte à vida. A infração sanitária ainda é um crime sem castigo. Não ouça os negacionistas, leve seus filhos para vacinar. A vacina salva.
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