A floresta pede socorro

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Severino Francisco

É incrível a leviandade e a irresponsabilidade de nossas excelências. Enquanto o país se mobiliza para defender a democracia, em votação simbólica, conseguida mediante acordo com a oposição, o Senado aprovou, em tempo recorde, sem ser analisada por nenhuma comissão, projeto de Lei que reduz em 40% a área da Floresta Nacional de Brasília, a chamada Flona.

O que está por trás da deliberação açodada é a intenção de regularizar os assentamentos 26 de Setembro e Maranata, onde vivem cerca de 40 mil pessoas, de maneira irregular. Na verdade, o projeto sequer constava da pauta. Entrou de carona na votação nos projetos destinados exclusivamente às mulheres, promovidos pela bancada feminina, para comemorar o 16 º aniversário da Lei Maria da Penha.

Mas, vejam só a lógica dos parlamentares. Sob o argumento de que a maioria dos moradores dos assentamentos a serem regularizados seriam de mulheres, eles contrabandearam a Lei de redução da floresta e a acomodaram no mesmo combo. Com certeza, é dramática a situação das 40 mil pessoas que moram no assentamento. No entanto, essa não é a solução mais lúcida, racional, eficiente e transparente.

A falta de política habitacional não pode ser resolvida com a grilagem de reservas florestais, precisamente no momento em que somos ameaçados pelo aquecimento climático. Esse ciclo levou a cidade a uma política atrasada de currais eleitorais do século 19. É um estímulo a novas invasões no momento em que estamos mergulhados em grave crise de mudança climática.

Em entrevista concedida a Ana Dubeux, recentemente, publicada no Correio, Mercedes Bustamante, professora da UnB, uma das maiores especialistas em mudanças climáticas, alerta que Brasília precisa se preparar o aumento de eventos extremos de precipitação e temperatura. A manutenção das áreas verdes e de cerrado, redução da impermeabilização dos solos, o cuidado com as populações mais vulneráveis são componentes importantes de um plano de adaptação.

Além disso, ela chama a atenção para o fato de que temos importantes unidades de conservação no DF que vêm enfrentando pressões de degradação, o que precisa ser revertido. “Tais unidades de conservação contribuem para a absorção de carbono, combatendo o aquecimento global, conservam água para as cidades e amenizam a temperatura e a baixa umidade relativa.”

Mercedes observa que, como o cerrado conta com menor extensão de unidades de conservação e está menos protegido nos marcos regulatórios, vivemos o recrudescimento do desmatamento e da degradação. Ela aponta três frentes de ação urgentes: ” parar o desmatamento, restaurar os passivos ambientais (áreas degradadas) e incentivar o planejamento territorial e práticas sustentáveis com o olhar para as demandas do futuro e não com a visão das décadas passadas que já não servem como exemplo dos desafios que vamos enfrentar.”

No mundo civilizado, não importa se de esquerda ou de direita, nenhum político se elege sem assumir um compromisso com o meio ambiente. Por aqui, estamos completamente atrasados, apesar dos sinais claros de desequilíbrio com enchentes que parecem cenas de guerra, com a crise hídrica e com aumento de temperaturas que só se viam em ficção científica distópica.

Essa decisão desastrosa de redução da Floresta Nacional não é um fato isolado. Vejam o Viaduto da Epig, na verdade, um rodoanel no Sudoeste, projeto que fere frontalmente as escalas residencial e bucólica de Brasília, sob a omissão do Iphan e da Câmara Legislativa do DF.

O Ministério Público, o Iphan, a Câmara Legislativa, a UnB, os representantes do DF na Câmara e no Senado precisam acordar e incluir a questão do meio ambiente na agenda de suas ações. Caso contrário, o DF sofrerá graves consequências em curto, médio e longo prazo.

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