Severino Francisco
Fui ver a abertura do 12º Festival de Curtas. Fiquei feliz de ver o Cine Brasília lotado, uma semana depois do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. É muito triste ver uma sala de espetáculos vazia. No entanto, vamos ao filme que abriu o festival. Márcia Zarur filmou uma entrevista com Vladimir para um vídeo de quatro minutos de uma série do Sesc.
A gravação foi tão interessante que se estendeu pelo período de uma hora e meia. Vladimir está radiante com as notícias de viabilidade para o projeto que foi seu último desejo: a destinação de um espaço para o acervo do Cinememória, que ele concebia como ponto de partida para a criação da Cinemateca de Brasília.
Ficou tão alegre que, segundo amigos mais próximos que o acompanhavam, teve um infarto. Portanto, essa última entrevista se transformou em uma verdadeira preciosidade. Tanto assim que o vídeo de quatro minutos se alongou em documentário saboroso de 23 minutos. Vladimir estava bem humorado e feliz com a notícia sobre o Cinememória. Logo no início, deu uma pequena aula de enquadramento cinematográfico, indicando a melhor posição para captar o próprio rosto e a imagem de fundo.
Sem nenhuma pretensão, o documentário de Márcia Zarur aproveitou o melhor da entrevista da maneira mais adequada, com sagacidade e sensibilidade. Mostra como Vladimir pensava tudo com uma cabeça cinematográfica e com um compromisso com o Brasil. A memória de Vladimir era um Cinememória, uma cinemateca. Discorre, com muita agudeza, sobre como as revoluções tecnológicas afetaram o cinema.
Vladimir fez O país e são Saruê somente com o fotógrafo Manuel Clemente. Lembra que, antigamente, era preciso transportar os seus filmes longas em 10 latas, com um peso enorme, cada integrante das fitas levava um pedaço. Mas, agora, quase todas aquelas invenções foram sintetizadas no aparelho celular. E a própria produção de cinematográfica se desmaterializou, pode ser acessada em um link ou armazenada em uma nuvem virtual.
Vladimir mostra, cinematograficamente, os antigos projetores, a moviola em que Glauber Rocha montou Terra em Transe, fotos do cineasta baiano na piscina do Hotel Nacional falando para alunos atônitos do curso de cinema da Universidade de Brasília. Aos poucos, percebemos que, na verdade, o filme é uma apresentação do Cinememória e um testemunho da fé invencível que Vladimir tinha nas luzes do cinema.
Toda a aquela tralha que Vladimir guardou, pacientemente, durante mais de 60 anos de atividade, ganha sentido. Desejava que o acervo do Cinemória fosse o ponto de partida para a criação da Cinemateca de Brasília. O GDF destinou cinco lotes no Eixo Monumental Oeste, próximo à igreja Rainha da Paz, para instituições culturais. É preciso que sejam iniciadas as negociações no sentido de que um desses lotes seja reservado para a criação da Cinemateca de Brasília. O coletivo Maria Cobogó e o Iphan estão empenhados no projeto fundamental para Brasília na condição de capital do país.
É uma utopia levantada por Paulo Emílio Sales Gomes, o criador do curso de cinema da Universidade de Brasília e do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, mas levada adiante por Vladimir Carvalho. Com espírito de Dom Quixote paraibano, idealista mas pragmático, Vladimir constituiu a base para a Cinemateca de Brasília, ao formar o Cinemória, às próprias custas S.A., com dinheiro do próprio bolso. Ele tinha alma coletiva, o último desejo de Vladimir era um presente para Brasília e para o Brasil.
PS: Não entendi a promoção de um show musical de muitos decibéis antes da exibição dos filmes. Nada contra a boa música, mas me parece inadequado para aquele momento, pois elimina a possibilidade de encontro e conversa no foyer. Além disso, ver um filme é um ato que exige concentração.
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