Sitiados pelo Aedes

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Severino Francisco

No condomínio onde moro, coloquei o lixo em saco plástico, mas o trabalhador responsável pelo serviço não apareceu. Imaginei que havia ocorrido algo grave, pois ele é uma das pessoas mais laboriosas que conheci. É incansável no cuidado com as manilhas para escoamento da chuva, a grama, os galhos de árvores no caminho e o recolhimento do lixo. A minha suspeição se confirmou: o funcionário não compareceu porque estava com dengue. Estamos sitiados pelo Aedes aegytpi.

Segundo o o último boletim epidemiológico, do dia 1º ao dia 27 deste mês, houve 29.500 casos prováveis notificados da doença. O número anterior indicava aumento de 646,5% ante o mesmo período do ano passado. O percentual de crescimento atualizado será anunciado hoje.

Em razão do acirramento da crise provocada pelo descontrole da contaminação pela dengue, o GDF resolveu decretar situação de emergência, instalou tendas, ampliou o horário de atendimento nas UPAs, adquiriu novos carros para espargir fumacê, contratou servidores temporários e cogita até acionar o Exército. São providências corretas, a esta altura dos acontecimentos, para proteger a população e reduzir os danos, mas fica evidente que falta planejamento e ação preventiva.

Mesmo com essas medidas, a demanda pelos serviços é muito alta e não é possível atender a todos os que procuram as tendas e os postos de saúde. E essa doença é perigosa, pode matar ou provocar sequelas. Tive dengue em 2014, lia ou assistia a reportagens com a informação de que o ciclo da doença era de, no máximo, 10 dias. No entanto, constatei que isso era uma meia-verdade.

Demorei quase um ano para recupera a plena forma física e mental. Claro que cada um reage de uma maneira e a experiência não pode ser generalizada. Além disso, é preciso lembrar que existem outras doenças associadas ao Aedes, também terríveis: a zika e a chikungunya.

Pesquisas revelaram que 75% dos casos de contaminação ocorreram em ambientes domésticos. Com certeza, é difícil controlar uma doença que prolifera nestas condições. No entanto, se é um problema de educação, ele só pode ser resolvido com campanhas intensas de conscientização. Não foi isso que vimos nesta e em outras temporadas.

A ameaça da dengue é cada vez mais perigosa e, no entanto, o GDF só se dá conta de que existe o problema quando o caos está instalado. E, neste ano, a infestação do mosquito certamente se agravou (e se agravará ainda mais) com os efeitos das mudanças climáticas, conforme alertaram os cientistas. Para quem quiser se informar mais sobre o tema, recomendo a leitura de Terra inabitável, de David Wallace-Wells, que faz uma ampla compilação das consequências dos fenômenos climáticos.

Além dos números assustadores, a prova inequívoca de que o governo local não planejou uma ação preventiva contra o surto da dengue é o fato de, mesmo com quase R$ 5 milhões para esta finalidade, só gastou R$ 887 mil, conforme noticiou o jornal Bom dia, DF, da Rede Globo. O problema não foi de falta de recursos, mas de competência, responsabilidade e compromisso. Parece que eles estão mais preocupados em construir viadutos questionáveis do que com a saúde pública.

Se o seu filho tiver de 10 a 14 anos, leve para vacinar. Se você pode pagar, vacine-se no sistema privado. Tome os cuidados necessários porque os epidemiologistas preveem que ainda não atingimos o pico da doença. Faça a coisa certa.

PS: Achei profundamente infeliz e inapropriado o post do Governo Federal sobre a dengue, fazendo uma gracinha com o Toc Toc da Polícia Federal.

Severino

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