O perigo da dengue

Publicado em Crônicas

Os números do crescimento de infectados pela dengue neste ano são assustadores: 7.614 casos prováveis entre 31 de dezembro de 2023 e 13 de janeiro de 2024. Se comparado ao mesmo período do ano passado, que registrou 1.370 casos, houve um aumento de 435%. E isso sem considerar que ainda estamos em pleno período chuvoso, quando costuma acontecer o ápice da doença.

Em 2014, durante a Copa do Mundo de Futebol no Brasil, peguei dengue. Não tenho certeza, mas desconfio que fui picado pelo mosquito em minhas investidas por um terreno baldio para catar mangas. Sempre gostei de apanhar frutas nas árvores. Cresci em uma casa que era quase uma chácara, com uma infinidade de fruteiras: mangueiras, jambeiros, cajueiros, pitangueiras, abacateiros e romanzeiras.

De repente, acordei com a cabeça pesada, as articulações doloridas, as pernas com toneladas de peso e um gosto de chumbo na boca. Resisti a fazer um teste, mas, como os sintomas minaram a minha saúde, dei o braço a torcer. Era dengue. Lia ou assistia a reportagens com a informação de que o ciclo da doença era de, no máximo, 10 dias. No entanto, constatei que isso era uma meia-verdade.

Demorei quase um ano para recupera a plena forma física e mental. Claro que cada um reage de uma maneira e a experiência não pode ser generalizada. Além disso, é preciso lembrar que existem outras doenças associadas ao Aedes, também terríveis: a zika e a chikungunya. Não podemos permitir que todos nós estejamos expostos a perigos perfeitamente solúveis e sanáveis.

Cobrados, os governantes alegam que tomam todos os cuidados possíveis, mas não depende só deles. A explicação não convence totalmente. É claro que o governo não pode resolver o problema sozinho. De uma maneira semelhante ao que ocorre com a covid-19, a dengue é uma doença coletiva, só pode ser vencida com a adesão e a participação comunitária.

Mas como isso pode acontecer se não existe nenhuma campanha publicitária para informar, educar e sensibilizar as pessoas a não jogar lixo na rua, a cuidar da água da piscina e a não criar um ambiente favorável à procriação do Aedes aegytpi? É o governo que tem de liderar esse combate. Não é culpa dos funcionários, recebi em casa a visita de um técnico muito educado, que fez uma vistoria e forneceu dicas.

Todavia, a questão é mais complexa. A dengue não é a covid, uma doença ainda não mapeada inteiramente pela ciência. Deveria figurar no calendário de problemas a serem combatidos pelo governo, com campanhas, provimento de equipes capacitadas e equipamentos para o enfrentamento da doença.

Não vemos nada disso. É impressionante a quantidade de lixo nas ruas, mesmo em bairros de classe média. Nas cidades da periferia, a situação é ainda mais grave, associada à precariedade do saneamento, favorecendo a proliferação do Aedes. Tudo é agravado pelas mudanças climáticas, como previam os cientistas.

O fracasso no aumento de mais de 435% em relação ao ano passado é revelador do descaso e da improvisação no combate da dengue. É uma doença perigosa, pode matar e, mesmo quando não mata, deixa sequelas.

Todo ano ocorre a mesma coisa: de repente, o governo descobre que existe a dengue. Não existe nenhuma ação preventiva, parece que a única preocupação é construir viadutos. Em termos proporcionais, o DF ocupa o primeiro lugar, com 2.644 casos por milhão de habitantes na primeira quinzena de janeiro. É inaceitável que a capital do país ocupe o topo do ranking da doença. Esses números evidenciam a falta de uma política pública de combate à dengue.

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