Alguns duvidam, outros botam a mão no fogo pela unidade. O difícil, argumentam os críticos, é brotar harmonia entre categorias tão distintas e de interesses divergentes. Nesta segunda-feira (16), acontecerá, às 16h30, a segunda reunião na Comissão de Legislação Participativa da Câmara (CLP), contra a reforma da Previdência (PEC 287/2016). Na primeira, na semana passada (11/01), a casa estava lotada com mais de 80 lideranças do funcionalismo estadual, municipal e federal. Todos aparentemente irmanados por um movimento orquestrado e contundente para conscientizar a sociedade da “inexistência” dos déficits de R$ 1,243 trilhão e R$ 181,2 bilhões, nas aposentadorias de servidores e trabalhadores privados. Um trabalho que “deve” acontecer de forma coordenada, harmônica e profissional, idêntico ao da equipe econômica. De grande sucesso, aliás.
Mas o serviço público, em geral, é “um saco de gatos”, ironizam os analistas de mercado. Dentro de um mesmo órgão, dependendo da classe, eles se engalfinham. Há sérios casos de denúncia de assédio moral, negligência, arbitrariedades, discriminação, racismo, abusos de autoridade, além de arraigado corporativismo, guerra por poder, benefícios e atribuições. Em alguns órgãos, confessou uma funcionária, “o chefe não dá nem bom-dia, trata os subalternos como lixo e vive aos berros”. Se já é praticamente impossível a convivência dentro de um único ministério, não parece inviável agregar os Três Poderes, nas três esferas, onde não raro a disputa por salários parte sempre da premissa de que “mereço mais, porque sou mais importante” – ou mais capacitado para encher os cofres do Tesouro. Como então conciliar? Não é uma resposta fácil.
O que chama a atenção é que antes mesmo de iniciar as tratativas do casamento, o divórcio já parece certo. No mesmo dia em que as 80 lideranças faziam seu desabafo na CLP contra a reforma do governo, “todas as entidades representativas da magistratura, do Ministério Público e as demais relacionadas ao sistema de Justiça do país estiveram reunidas”, em outro lugar de Brasília, com o mesmo objetivo, conforme divulgou a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB): criação de comissões temáticas para estudos sobre a PEC. O presidente da AMB, Jayme de Oliveira, avaliou que o encontro foi produtivo e muito importante para a convergência de propósitos entre as entidades e a sociedade como um todo. “Foram definidas ações nas áreas jurídica, política e de comunicação”, reiterou a nota da AMB.
Os policiais – por outra ótica, que fique claro – também se articulam para estratégias específicas. No dia 12, as 28 entidades que formam a União dos Policiais do Brasil (UPB) decidiram por um “Dia Nacional em Defesa da Aposentadoria dos Profissionais de Segurança Pública”, em 8 de fevereiro, em frente ao Ministério da Justiça e ao Congresso Nacional, às 13h30. Especificamente para retirar a pedra de seus sapatos: protesto contra o artigo da PEC que retira da Constituição o reconhecimento da atividade de risco nos critérios de concessão de suas aposentadorias. Esperam reunir mais de 5 mil profissionais na capital federal – de Goiânia, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo e Rio de Janeiro. Os demais Estados que não puderem comparecer ao movimento em Brasília farão ações nos aeroportos das capitais.
O tempo é curto. Até o fim de março o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM/RJ), quer concluir a votação da reforma da Previdência. Resta torcer para que a deputada Erika Kokai (PT/DF) esteja coberta de razão, quando declarou que “nunca houve uma compreensão tão aguerrida da perversidade” do Executivo como agora. Caso se concretize a conclusão de um manifesto e de uma campanha publicitária única, apontando as contradições da PEC, já vai ser um avanço. “Mesmo assim, nada garante que a harmonia passe a reinar. Afinal, tirar dinheiro daqui ou dali para bancar uma propaganda na mídia não é assim tão complicado. Dinheiro não falta. O nó que não se desata nessa aparente adesão é o do respeito ao outro, da serenidade, do equilíbrio, da sabedoria e da tolerância”, enfatizou um servidor federal.
Como não temos bola de cristal e adivinhar não é nossa especialidade, é esperar para ver.