Taxação mínima de multinacionais dependerá de adequações no país, alertam tributaristas

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“Não há no horizonte qualquer perspectiva de simplificação ou redução da carga tributária no Brasil”, lamenta Douglas Guilherme Filho, advogado no Diamantino Advogados Associados

O Brasil defende uma taxação mínima global acima de 15% sobre as multinacionais. Pela primeira vez, a Receita Federal, em resposta a um requerimento de informações da Câmara dos Deputados, apresentou entendimento claramente favorável a essa negociação.

A proposta foi aprovada inicialmente pelo G-20, em julho, quando os líderes endossaram a reestruturação das taxas que foi negociada por 131 países na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Para advogados tributaristas, a iniciativa, ainda que bem-intencionada, apresenta várias lacunas e pode se chocar com a legislação já existente no país.

O tributarista Douglas Guidini Odorizzi, sócio do Dias de Souza Advogados, destaca que a proposta de tributação global de multinacionais mínima em 15% dos lucros obtidos simultaneamente, com o dever de alocação de ao menos 20% do resultado nos locais em que atuam, deve ter pouco efeito imediato na arrecadação nacional e na formação dos resultados das corporações brasileiras que atuam no exterior, bem como das estrangeiras com operações por aqui.

“Isso porque a legislação local já prevê o dever de consolidação do resultado de investidas no exterior por investidoras nacionais mediante a adoção das alíquotas locais no patamar de 34%, bem superior ao que se pretende definir multilateralmente (e considerando ainda que a proposta da OCDE não se resume ao mero uso de alíquota mínima)”, afirma o tributarista.

“De outro lado”, acrescenta Odorizzi, “aqueles que atuam localmente em regra estabelecem sociedade ou unidade de negócios no Brasil, o que impõe a sua sujeição às regras de tributação corporativa local, de modo que a carga efetiva acaba sendo superior ao padrão proposto multilateralmente”. “Mesmo nos casos de atuação sem estabelecimento, as incidências de fonte acabam superando os 15% em discussão. As exceções podem ficar por conta de empresas que tenham algum incentivo regional ou a sua remessa ao exterior tenha alíquotas reduzidas. O número, no entanto, tende a ser marginal”, complementa.

Ainda de acordo com Odorizzi, a evolução na proposta da OCDE pode motivar o Brasil a rever as suas regras de tributação de lucros de empresas no exterior. “A legislação nacional é complexa, o que gera litígios, além de fixar obrigações não verificadas em outros países, o que acaba por dificultar a expansão internacional das companhias brasileiras”, conclui.

Douglas Guilherme Filho, advogado no Diamantino Advogados Associados, considera que esse projeto revela “falta de foco do governo federal”. E explica: “Atualmente temos uma Emenda Constitucional para unificar tributos federais, um projeto de lei para substituir PIS e Cofins e um outro para tributar dividendos. São todos temas sensíveis e de extrema relevância tributária. Agora, vem um projeto de tributação mínima de bases universais, nova discussão que tomará tempo do Congresso. Não há no horizonte qualquer perspectiva de simplificação ou redução da carga tributária no Brasil”, lamenta.

João Vítor Stüssi Velloso de Andrade, especialista em Direito Tributário e macroeconomia, sócio do Chenut Oliveira Santiago Advogados, entende que, apesar de o G-20 buscar uma arquitetura tributária internacional, em tese, mais justa, ainda faltam algumas informações. “Principalmente relacionadas à composição da base de cálculo do imposto que será rateado entre os países, e que tem diferentes metodologias em determinados sistemas tributários”, diz.

O advogado afirma que a Receita Federal, apesar de apoiar a proposta, avalia como limitado o rol de empresas que seriam tributadas, segundo os parâmetros da OCDE. “Além disso, no entender da autoridade tributária brasileira, a fatia de imposto que seria destinada aos países geradores do lucro é pequena”, complementa.

Uniformização da tributação internacional deverá alavancar globalização econômica

Andrade lembra ainda que já existe norma no Direito brasileiro para tributação de controladas, de forma que já atinge inclusive controladoras que tenham subsidiárias ou controladas no exterior, independentemente de cortes de faturamento, margem de lucro ou ramo de atividade. “Nesse sentido, não se espera um ganho arrecadatório importante. Os impactos arrecadatórios ainda são abstratos e especulativos. Decerto, a proposta de uniformização da tributação mundial adiciona uma dose de equidade e previsibilidade no sistema tributário internacional, e acabará sendo um movimento importante no progresso da globalização econômica”, finaliza.

Para Richard Edward Dotoli, sócio da área tributária do escritório Costa Tavares Paes Advogados, o engajamento do Brasil no projeto, por meio da Receita Federal, deve ser destacado. “Ainda que existam alguns pontos de discordância com a proposta inicial, não há dúvidas que a implementação de uma tributação internacional mínima cria um ambiente de negócios mais equilibrado e previsível, tanto em termos de arrecadação quanto em termos de competição entre empresas”, comenta.

Dotoli entende que algumas divergências precisam ser verificadas e quantificadas para que haja um alinhamento de propostas. “Talvez a discussão acerca da alíquota mínima (Pilar 2) tenha uma importância menor, diante dos desafios que envolvem os critérios de repartição da receita tributária (Pilar 1), especialmente porque o Brasil instituiu algumas regras simplificadoras, como por exemplo, em termos de preço de transferência”.

Tributaristas reagem à proposta de “criar cabide de emprego para fiscalizar advogados”

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A  Associação Paulista de Estudos Tributários (Apet) divulgou nota contra a tentativa de inserir jabuti na reforma de imposto de renda (EMP 60 à Lei 2.337/21), que tramita no Congresso Nacional. A manobra de da deputada Tabata do Amaral, de acordo com os associados da Apet, intenciona fiscalizar profissionais para impedir o que exercem por força de lei, com a criação de órgão que vai funcionar como uma espécie de “Receita Federal do B”, empregando uma quantidade incerta de pessoas, o que é considerado “mais um cabide de empregos”

A direção da Apet aponta “as sandices da proposta, os riscos que impõe à liberdade de organização (garantia constitucional)” e, de forma contida, sugere que a congressista foque atenção na litigância excessiva praticada pelo Fisco.

Para a Apet é desnecessária a criação de mais um órgão, ainda que auxiliar do Poder Legislativo, cuja incumbência seja o de avaliação prévia de planejamentos tributários e com poder de polícia sobre os profissionais envolvidos na sua elaboração e execução

Veja a íntegra da nota enviada aos associados, compartilhada com outras entidades e em transmissão para todos os integrantes do Congresso Nacional

“NOTA DA APET SOBRE PROPOSTA LEGISLATIVA FEDERAL PARA CRIAR ÓRGÃO FISCALIZADOR DE PLANEJADOR TRIBUTÁRIO

A APET – Associação Paulista de Estudos Tributários, por seu Presidente, vem se pronunciar a respeito da Emenda Modificativa (EMP 60) apresentada pela Sra. Deputada Federal Tabata do Amaral ao Projeto de Lei n. 2.337/2021 (Reforma do IR), nos seguintes termos.

Na Emenda apresentada pela i. parlamentar, se sugere a criação de órgão dotado de competência para regulamentar e fiscalizar a atividade de “planejador tributário”, chamado de “Agência de Proteção do Público”. O objetivo desse órgão auxiliar do Legislativo Federal, aliás, sem nenhuma informação quanto à sua composição, seria o de fiscalizar a atuação de profissionais (habilitados ou não) responsáveis pela elaboração de planejamentos tributários que visem elidir à tributação do imposto de renda, “inclusive a tributação decorrente de revogação de isenção ou alteração de alíquota”.

Segundo a justificativa que acompanhada a Emenda: “(…) legisladores e servidores dos fiscos competem com uma gama de especialistas cujo trabalho – bem-remunerado – é encontrar formas de manipular riquezas para que paguem menos impostos”. Em vista desse panorama: “(…) se propõe a criação (…) de Agência de Proteção do Público (…) como uma forma de defender o conjunto da sociedade das perdas provocadas pelo planejamento tributário dos ultra-ricos”. Para então concluir que o: (…) Estado não pode assistir passivamente às suas iniciativas de dar um caráter mais progressivo à tributação serem minimizadas por um corpo qualificado de técnicos que atuam no sentido contrário à legislação”.

Em que pese o irrefutável perfil regressivo do sistema tributário, resultado da exagerada concentração da tributação sobre o consumo e de distorções na tributação sobre a renda e patrimônio, a criação de órgãos de Estado com a finalidade de regular exercício de atividade profissional, ou para a realizar a análise previa de planejamentos tributários não parece ser a saída adequada para resolver ou minimizar os problemas derivados de eventuais condutas contrárias à lei e em evidente prejuízo ao erário.

É importante lembrar que o verdadeiro planejamento tributário é sempre lícito e deriva do direito fundamental de auto-organização. É decorrência da liberdade atribuída aos particulares de estruturar sua vida e seus negócios de forma mais econômica e eficiente, desde que respeitados os limites legais. Não se confunde com atos simulados ou fraudulentos praticados com intenção dolosa de prejudicar o fisco. O desenvolvimento e a estruturação desses planejamentos é feita por profissionais que dedicam décadas de sua vida ao estudo da complexa e intrincada legislação tributária, e que já se submetem aos rigores dos seus respectivos órgãos de fiscalização do exercício de profissão regulamentada (e.g. OAB, CRC, CREA), isso se a atuação por eles exercida ultrapassar os limites éticos impostos pela lei.

Por isso, a APET entende pela desnecessidade da criação de mais um órgão, ainda que auxiliar do Poder Legislativo, cuja incumbência seja o de avaliação prévia de planejamentos tributários e com poder de polícia sobre os profissionais envolvidos na sua elaboração e execução.

Conforme dito, não se nega que o atual sistema tributário favorece a concentração de renda e perpetua a desigualdade. Aliás, quanto a isso, rende homenagens àqueles parlamentares que realmente se preocupam com essa questão. Por isso, a solução a ser adotada demanda profundas reformas na legislação tributária e atenção cada vez maior com a práticas sonegatórias que prejudicam toda a sociedade. Entretanto, combater o ilícito não se confunde com criar restrições ao dever fundamental da auto-organização, muito menos com submissão prévia dos trabalhos de profissionais altamente capacitados, que de forma séria e técnica, dedicam seus esforços a tornar o setor produtivo mais ágil e competitivo.

É essa a opinião da nossa Associação.

APET – ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS”

Tributaristas divergem sobre aumento da alíquota de IR sobre dividendos

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Alguns consideram positiva a tese de Paulo Guedes, de reduzir o Imposto de Renda pago pelas empresas. A maioria é contra e defende ampla reforma tributária

A ideia lançada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, de aumentar para 20% a alíquota de Imposto de Renda (IR) incidente sobre lucros, dividendos e juros sobre capital próprio (JCP) das empresas, para compensar a diminuição — de 34% para 15% do IR das pessoas jurídicas — foi alvo de duras críticas de alguns especialistas em Direito Tributário. Tiago Conde Teixeira, sócio do Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados e presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB-DF, afirma que a medida, se for implementada de forma abrupta, provocará “severos e nocivos impactos” à economia, uma vez que afastará o nível de investimentos estrangeiros no país e aumentará o risco Brasil, já que fere os princípios constitucionais da segurança jurídica e da proteção da confiança. No entender de Conde, qualquer tentativa de mudanças na tributação deve ser pensada “no âmbito de uma ampla discussão de reforma tributária”, e não com um mero aumento da carga tributária, que já é muito alta.

Marcello Covelli Cristalino, advogado do escritório Márcio Casado & Advogados, tem ponto de vista semelhante. Para ele, o ideal seria reduzir a tributação das empresas sem a necessidade de buscar outras formas de receita, uma vez que a carga tributária no Brasil já é muito elevada. “Caso o governo consiga promover essa alteração do IR, sem a adequação do sistema tributário e das formas de arrecadação como um todo, haverá efeitos nefastos. Por exemplo, os grandes conglomerados têm sofisticados planejamentos tributários e, com isso, conseguem dosar seus investimentos e cursos de ação de acordo com estratégias pré-definidas. Isto não acontece, por exemplo, com as micro e pequenas empresas participantes do Simples, muitas delas já na faixa das alíquotas mais elevadas de tributação. Ou seja, os microempresários acabarão tendo parte significativa de sua renda subtraída na equação geral entre tributação da pessoa jurídica e da pessoa física, o que pode tirar do mercado recursos importantes da circulação interna de riquezas”, afirma. Além disso, complementa, “o desempenho dos grandes e eficientes grupos econômicos também poderá ser desestimulado e prejudicado, uma vez que pagam muitos dividendos em comparação com empresas ineficientes e de baixa lucratividade, que distribuem menos dividendos”.

Rodrigo Rigo Pinheiro, advogado tributarista e sócio do Leite, Tosto e Barros Advogados, lembra por sua vez que a “reforma da tributação sobre dividendos pelo IR não pode desprezar uma revisão geral da tributação sobre os lucros das empresas”. Pinheiro destaca que as comparações com outros países devem levar em conta “toda a sistemática de tributação sobre o lucro das empresas, em especial, o tratamento dos prejuízos pretéritos, à realidade inflacionária, além dos efeitos econômicos e arrecadatórios que se pretende atingir com este redimensionamento da carga tributária”.

Grandes fortunas

Já a advogada Suzana Barroso, tributarista do Rocha, Marinho e Sales Advogados, afirma que a redução do IR sobre o lucro das empresas “é, sim, uma forma de incentivo ao desenvolvimento econômico do país. As empresas certamente virão instalar suas sedes no Brasil. Entretanto, qualquer mudança a ser feita no setor tributário, sobretudo quando se trata de redução de arrecadação, necessita de uma contrapartida, que é a justificativa orçamentária desta quantia que deixará de ser recolhida. A redução da arrecadação não poderá ser realizada sem justificativa orçamentária, conforme comando da Lei de Responsabilidade Fiscal”. Por outro lado, Suzana observa que ainda que o governo proponha a instituição de um novo tributo para compensar a arrecadação, não crê que tributar os ativos financeiros seja o caminho, “pois ao meu ver, não são lucro, constituem espécie de investimento empresarial”. “O melhor caminho seria tributar as grandes fortunas, que tanto compensaria arrecadação como agiria no campo da distribuição da renda do país, que está cada vez mais concentrada nos últimos anos.

Também Ricardo Maitto, sócio da área tributária do Rayes & Fagundes Advogados, considera que a proposta de redução do Imposto de Renda das empresas é muito bem-vinda. “Não apenas por uma questão de aumento ou diminuição de carga tributária, mas porque reflete o potencial alinhamento do Brasil a uma tendência da maioria dos países desenvolvidos. Entre os países membros da OCDE, por exemplo, a alíquota média já é inferior a 25%, com destaque para o Reino Unido (19%) e os EUA (21%)”. Ainda segundo Maitto, para um governo que pretende implementar uma política voltada à atração de investimentos, essa mudança é “fundamental para preservar a nossa competitividade”.

Atualmente, segundo ele, toda a tributação da renda empresarial se dá no momento da apuração dos lucros, enquanto que a distribuição de dividendos é isenta. Com a metodologia pretendida pelo Ministério da Economia, parte da tributação ocorreria no momento da distribuição dos resultados aos acionistas, “o que significa mais sobra de caixa para aquelas empresas que pretendam reinvestir seus lucros”. Além disso, ele entende que a redução da alíquota do IR corporativo “desestimulará as chamadas ‘operações de inversão’, em que grupos empresariais de capital nacional transferem suas sedes para países com alíquota inferior à brasileira”.

Otávio Loureiro da Luz, sócio coordenador do Departamento de Direito Tributário do Braga Nascimento e Zilio Advogados, diz que a proposta de redução do IR das empresas de 34% para 15% será um grande avanço para o país. “Essa redução gerará mais investimentos estrangeiros, bem como incentivará o empresariado brasileiro em voltar a investir nos seus negócios, gerando, inclusive, mais empregos. De outro lado, a tributação em 20% sobre os dividendos como forma de compensação dessa redução, representaria uma nova tributação sobre o lucro, posto que num primeiro momento, antes da distribuição desse lucro, as empresas já sofrem essa tributação. Não vejo com bons olhos essa possibilidade de compensar essa redução mediante a tributação dos dividendos”.