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CPI acertou ao não criar tipificações penais, avaliam especialistas
Por sete votos a quatro, a CPI da covid no Senado aprovou, ontem (26), o seu relatório final. No total, o documento pede 80 indiciamentos. O presidente Jair Bolsonaro é acusado de nove infrações. Na análise de advogados criminalistas, a Comissão acertou ao não criar tipificações ou ampliar demais o escopo das investigações
O próximo passo é enviar o parecer a cada órgão público competente para analisar as acusações, como Câmara dos Deputados, Polícia Federal, Superior Tribunal de Justiça (STJ), Tribunal de Contas da União (TCU), Ministério Público Federal (MPF), Procuradoria-Geral da República (PGR), dentre outros.
“Embora tenha concluído pela ocorrência de uma verdadeira ‘política de desinformação’ no âmbito do governo federal em relação ao combate à covid-19, o relatório da CPI acabou reconhecendo a ausência de tipificação penal específica para punir de forma satisfatória as pessoas que ativamente contribuíram para a divulgação de informações falsas”, opina André Galvão, advogado criminalista e sócio do Bidino & Tórtima Advogados.
Galvão entende que a saída encontrada pela CPI para se responsabilizar criminalmente o gestor público por essa “política de desinformação” foi por meio da verificação de prática de crime omissivo. “A CPI imputou especificamente ao ex-titular da Secom (Fábio Wajngarten) o crime de prevaricação, entendendo que ele, para satisfazer interesse pessoal, teria indevidamente deixado de praticar ato de ofício consistente em realizar campanha para promover as medidas preventivas então disponíveis à época”, explica.
Portanto, ainda segundo o advogado, mesmo diante do fato de não ser crime a simples conduta de divulgar informações falsas, “a comissão não se limitou a preconizar a criação de leis para criminalizar condutas comissivas relacionadas a criação, disseminação e impulsionamento de notícias falsas, mas também buscou combater a ‘política de desinformação’ mediante punição da conduta omissiva de quem, segundo sua ótica, teria o dever de informar corretamente a população”.
Já o também criminalista André Damiani, especialista em Direito Penal Econômico e sócio fundador de Damiani Sociedade de Advogados, avalia que o grande mérito do relatório final da CPI da Covid foi “não cair na tentação de inflar a tipificação penal das condutas investigadas”. “Genocídio contra indígenas e homicídio contra a população em geral jamais se consumaram, o que não afasta a inédita gravidade dos fatos revelados. O relatório trilhou caminho seguro na sustentação de futura denúncia penal. Afinal, em processo penal, quem tudo quer nada alcança”, comenta.
Conrado Gontijo, criminalista, doutor em Direito Penal e Econômico pela USP, concorda com o indiciamento de Bolsonaro pelo crime doloso de epidemia com resultado morte, sob a acusação de ter agravado os efeitos da pandemia mediante atraso deliberado na compra de vacinas. “A atitude que o presidente tomou, seja de forma ativa, incentivando aglomerações, e desincentivando o uso da máscara, agravou o cenário. Existem elementos suficientes para caracterização do crime”, diz. “Existem elementos técnicos para que se inicie um processo penal e denúncia”, completa.
Ilustração: Observatório da Imprensa
O PL inova ao estabelecer que o controle deverá apontar “as condições para que a regularização do serviço ocorra”. Isto significa responsabilizar o culpado sem privar o cidadão da prestação do serviço. Muitos servidores públicos competentes e honestos recusam cargos de chefia, devido ao risco de serem responsabilizados civil, administrativa e até penalmente por decisões tomadas de boa-fé. Isso gera comodismo, paralisa ações governamentais e ceifa a busca por inovação e melhoria de processos
Alex Canuto*
O recém-aprovado PL 7448 dá segurança jurídica a gestores públicos na tomada de decisões e racionaliza o combate à corrupção. Não enfraquece órgãos de controle, não revoga nenhum dispositivo legal punitivo, nem gera anistias. Tampouco toca em institutos importantíssimos como delação premiada ou prisão em 2ª instância, e ainda enfatiza que o agente público continuará sendo responsabilizado por “dolo ou erro grosseiro”.
O PL pretende canalizar melhor as energias empregadas na política anticorrupção, onde há uma grande alocação de pessoal e recursos, mas com resultados limitados. Esta é certamente a política pública mais importante hoje no Brasil, e é preciso geri-la de forma mais eficaz, eficiente e efetiva.
Uma política pública é eficaz se produz algum resultado, é eficiente se faz muito com poucos recursos, e só é efetiva se o resultado contribui para melhorar a vida das pessoas. Exemplo: um gestor que conclui a construção de um viaduto é eficaz, é eficiente se o fizer a baixo custo, e só é efetivo se o viaduto realmente servir para melhorar o trânsito.
Aplicando-se esta análise dos “3 efes” às políticas anticorrupção, vemos nas últimas décadas um ganho de eficácia, com mais corruptos presos, e de escalões cada vez mais altos. Palmas! Mas a que custo logramos esse êxito? Estamos efetivamente reduzindo a corrupção? Ora, se estamos sendo apenas eficazes, mas não conseguimos ser eficientes e efetivos, cabe analisar causas e buscar melhorar processos e procedimentos.
A não prestação de serviços públicos, ou prestação inadequada, representa um grande custo a ser suportado pelo cidadão, e que normalmente não é precificado nas ações de controle. Como quando, diante de mera suspeita de mal uso de recursos, considera-se necessário a total paralisação de uma política pública para apuração de prejuízos e culpados. O PL inova ao estabelecer que o controle deverá apontar “as condições para que a regularização do serviço ocorra”. Isto significa responsabilizar o culpado sem privar o cidadão da prestação do serviço.
Ou seja, ao dizer que uma política pública não pode ser executada de determinada forma, o controle terá que dizer COMO deverá ser executada. Atualmente, controladores simplesmente bloqueiam a ação estatal sem apontar alternativas, pois a analisam apenas juridicamente, sem observar impactos práticos de tal decisão. Acreditam que isto é um problema somente do gestor, e essa descoordenação é o que mais vem causando prejuízos à população.
Ademais, a grande flexibilidade interpretativa de normas, com variações no tempo e no espaço, faz com que praticamente todas as decisões de gestão relevantes estejam sujeitas a uma posterior mudança de interpretação pelo controle, quase sempre desfavorável ao gestor, pois a tendência é de enrijecimento interpretativo com o legítimo objetivo de cercear a ação de corruptos.
Contudo, há efeitos colaterais nisso. Muitos servidores públicos competentes e honestos recusam cargos de chefia, devido ao risco de serem responsabilizados civil, administrativa e até penalmente por decisões tomadas de boa-fé. Isso gera comodismo, paralisa ações governamentais e ceifa a busca por inovação e melhoria de processos.
Na ânsia de perseguir os que agem de má-fé, vulgo corruptos, enrijece-se a exegese para todos, reduzindo o campo de ação de bons gestores. É como tomar um remédio que cura o fígado, só que também destrói coração, pulmão e estômago. Mas o fígado está curado!
Para corrigir isso, a nova lei garante a aplicação do entendimento vigente quando da tomada da decisão, e considera as alternativas que o gestor (não) teria para decidir de modo diferente.
Por tudo isso, o PL 7448 nada mais é do que a aplicação de modernos conceitos de gestão às políticas anticorrupção, para que mantenham sua alta eficácia, identificando e punindo corruptos; melhorem sua eficiência, reduzindo os custos com paralisias do Estado que podem ser evitadas; e para que efetivamente consigam reduzir a corrupção no Brasil.
Alex Canuto – presidente da Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental (Anesp).
Febre amarela – Justiça poderá obrigar o governo a fornecer vacina
O aumento da incidência de febre amarela e a consequente corrida aos postos de saúde e clínicas particulares em busca da dose da vacina pode acarretar o fim dos estoques. Se isso ocorrer, o Poder Judiciário poderá ser acionado para que o Executivo cumpra sua obrigação de garantir aos cidadãos o direito à saúde e, portanto, à vacina
De acordo com o advogado Renato de Mello Almada, especialista em direito civil e sócio do Chiarottino e Nicoletti Advogados, a falta de efetiva prestação de saúde pelo Estado pode se traduzir em uma ameaça à vida. O advogado lembra que a Constituição Federal prevê no artigo 129, inciso II, que a saúde é “direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Para o advogado a prevenção de doenças está inserida entre as obrigações do Estado.
“Assim, se a campanha de vacinação contra a febre amarela se mostrar inoperante em razão da não distribuição de vacinas, o Poder Executivo pode, por meio de ação judicial, ser obrigado a suprir essa falta de vacinas. Por se tratar de um direito coletivo, o mais eficiente é que a tutela jurídica seja buscada por meio de Ação Civil Pública. Certamente o Ministério Público e demais instituições legitimadas para esse tipo de ação estão atentos a essa situação e agirão tão logo se faça necessário”, afirma Almada. Ele não descarta a possibilidade de qualquer cidadão que não consiga se vacinar nos postos de saúde entrar individualmente com um mandado de segurança na Justiça para exigir a vacina.
Amauri Saad, coordenador do curso de Direito Administrativo do IDP-São Paulo, concorda que o Estado tem o dever, previsto na Constituição, de fornecer a vacina e, caso não o faça, o Ministério Público ou o próprio indivíduo pode exigir por meio do Judiciário esse fornecimento. Saad levanta ainda outra questão que pode parar nos tribunais: a da responsabilização do Estado pelas mortes decorrentes de febre amarela em regiões que deveriam ter tido vacinação em massa.
Diante da decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de abrir uma Tomada de Contas Especial (TCE) contra técnicos, executivos e ex‑dirigentes do BNDES relativa à operação do Banco com o frigorífico Independência, a Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES) vem a público esclarecer:
“O apoio do BNDES ao Plano de Negócios do Frigorífico Independência obedeceu à Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) instituída pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. O processo de análise e aprovação para o investimento seguiu todos os normativos de Gestão de Governança do Sistema BNDES. A análise econômico-financeira baseou-se em demonstrativos auditados pela BDO Trevisan Auditores Independentes, uma das maiores empresas de auditoria do Brasil. Esses balanços, utilizados por toda a comunidade financeira, não continham ressalvas.
A BNDESPAR adquiriu 21,8% do capital da holding Independência Participações S.A. com aporte de R$ 250 milhões em novembro de 2008. Importante destacar que outras instituições financeiras apoiaram a empresa por meio de bonds em emissão no mercado internacional, para investidores qualificados, no valor de US$ 300 milhões no mesmo ano. Além disso, dentre os credores financeiros da companhia constavam bancos internacionais e nacionais de primeira linha com créditos da ordem de US$ 700 milhões.
De modo surpreendente para todo o mercado bancário e de capitais, em 2009, a empresa ajuizou pedido de recuperação judicial baseado em demonstrativos que informavam ajustes retroativos negativos, o que é um forte indício de fraude por parte da holding. Esse dado e diversas ressalvas apresentadas implicaram uma diminuição no patrimônio líquido da companhia de R$ 1 bilhão – informações essas que não constavam nos balanços apresentados à BNDESPAR e aos demais Bancos que apoiavam a empresa à época do aporte e sequer foram apontadas em auditoria.
Diante desse cenário em que as informações enganosas afetaram negativamente não apenas o BNDES, mas também toda a comunidade financeira, pecuaristas, fornecedores e funcionários da empresa, não se pode responsabilizar os técnicos da BNDESPAR pela tomada de decisão, visto que cumpriram com as normas vigentes para conceder o aporte. O próprio TCU tem enunciado (Acórdão 6544/2010), no sentido de que não se pode responsabilizar o administrador por dano ao erário, se não era de seu conhecimento a existência de fraude.
Tampouco pode o BNDES ser acusado de negligência, visto que após o pedido de recuperação judicial, a BNDESPAR tentou de todos os modos reaver o investimento realizado. Inicialmente exigiu, conforme cláusula contratual, a recompra de suas ações pelos controladores do Grupo Independência no valor de R$ 250 milhões mais correção monetária e multa.
A BNDESPAR, nos termos do Acordo de Acionistas, também moveu um processo arbitral contra o Frigorifico Independência. Na ação, buscou-se o parecer de um especialista externo que concluiu que os ajustes realizados foram muito elevados para serem atribuídos a alterações nos padrões contábeis e não foram devidamente explicados pela empresa.
No entanto, a Câmara de Arbitragem do Mercado não acolheu as razões da BNDESPAR e tampouco a orientação do especialista externo. Inconformada com a decisão, a BNDESPAR interpôs um pedido de esclarecimento à Câmara por entender que as questões contábeis não foram avaliadas com a devida profundidade.
Desse modo, tendo buscado todos os caminhos legais de forma ágil e transparente, a AFBNDES espera que a decisão do TCU seja revista no âmbito do processo de defesa dos empregados, amparados nas razões apresentadas pelo próprio BNDES a diversas autoridades de controle externo ao longo dos últimos anos.”