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AMB – Renata Gil assume o desafio de unir, dialogar e se aproximar da sociedade
Muito orgulhosa. Na representação das mulheres, no momento em que o Brasil discute a ascensão feminina, a voz da mulher na sociedade. Além dessa honrosa função de representar os 18 mi juízes brasileiros. Escuto muito que na iniciativa privada, ainda se nota muita diferença de salários. E no serviço público, nos cargos de maior relevância, as mulheres não ascendem ainda. Agora, as estruturas institucionais já estão discutindo os motivos desses entraves, alguns visualizados e outros invisíveis. O CNJ criou uma comissão para intensificar a Resolução 255, que trata exatamente da participação feminina no Poder Judiciário. Faço parte dessa comissão. Sou chamada há muito tempo a falar sobre aumento do feminicídio e do subregistro desse crime. Como sou juíza criminal, tenho acompanhado essas discussões também no âmbito carcerário.
Desde 2008, tenho atuado fortemente, tanto em relação ao movimento associativo, como no trabalho de combate à corrupção e à lavagem de dinheiro. Sou integrante da Estratégia Nacional de combate à corrupção e à lavagem de dinheiro. Fui a primeira juíza estadual a participar do movimento que criou a estratégia anticrime. O juiz Sergio Moro (atual ministro da Justiça) trabalhava conosco, além do juiz Fausto de Santis, com a Receita Federal, Coaf (que hoje é o IFI). Todos esses órgãos sempre em conjunto, construindo as políticas e o fortalecimento das instituições, de acordo com os tratados internacionais que o Brasil subscreveu, ou seja, com os seus compromissos internacionais. E agora, minha vida em Brasília vai ser muito mais ativa no parlamento, no Supremo Tribunal Federal (STF), no CNJ, em alguns órgãos da república que a magistratura tenha que ter essa interlocução. Tenho um trânsito muito bom em Brasília.
Vai ser firme e forte como ela tem sido. A AMB hoje é uma grande interlocutora da sociedade. Estamos produzindo documentos importantes para a história da nação brasileira. Uma pesquisa que acabamos de desenvolver, “Quem somos e a magistratura que queremos”, tem a apresentação de como o Judiciário pensa e como ele está estabelecido e consolidado hoje no país. Nós somos chamados em todas as audiências públicas, no Parlamento, no Supremo, para debater questões atinentes a magistratura. Como deve ser. Em determinados países, como Portugal, nenhum projeto de lei que toque em assunto relativo ao Judiciário pode ter seu andamento sem que a associação sindical seja ouvida antes. Esse papel hoje é exercido pela AMB de forma muito voluntária, é um reconhecimento do papel a AMB. E nossa ideia é que esse papel se fortaleça a cada dia
Pelo que ouvi nos jornais, parece que ela (a reforma) arrefeceu. O que se diz é que o governo teria reformulado o ânimo da reforma administrativa, muito em razão do que tem acontecido no Chile, e depois também dessa reforma da Previdência. Embora haja uma sinalização grande do presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), de intenção mais severa de aprofundar a reforma administrativa. Nos já estamos em interlocução com o governo e com o parlamento, para explicar que questões referentes à magistratura têm proteção constitucional. Qualquer medida que venha em um pacote desses de governo tem que ter uma interlocução com o Judiciário. Quando se mexe na estrutura do Poder Judiciário, alterando salários, forma de acesso, estabilidade, se mexe na proteção da sociedade. Se tem um juiz com instabilidade funcional, se ele perder aquelas garantias que foram pensadas como proteção, a sociedade fica exposta.
O governo tem essa sugestão. Só que tem uma situação que já é consolidada para 18 mil juízes. Não se pode mexer. E a gente também vai apresentar informações sobre a necessidade de uma remuneração condigna, por todas as limitações que a carreira tem e de não termos determinados benefícios sociais
Hoje o portal da transparência de qualquer tribunal pode ser acessado e aferido. Em determinadas situações, alguns magistrados tem verbas indenizatórias que recebem, as vezes, de uma só vez. Mas pelas decisões recentes do CNJ esses recebimentos não estão mais permitidos. Isso aconteceu no passado. Há verbas que estão consolidadas na Lei Orgânica da Magistratura (Loman), caso do auxílio-moradia que foi extinto. Há verbas que ainda não são universais. Nosso trabalho é de equalização, com relação aos federais e aos estaduais. Os federais também têm algumas verbas diferentes da dos estaduais: quando magistrados federais fazem mudança tem direito a essa verba de remoção, o que o estadual não tem. Algumas diferenças nas carreiras precisam ser equalizadas. A AMB tem feito esse trabalho junto ao conselho nacional.
Há PECs com essa proposição. Isso foi cogitado em tese na reforma administrativa. Se alguns magistrados não fazem uso dos 60 dias, isso é exceção. Em geral nós fazermos uso por necessidade. Nós da AMB sustentamos que a profissão do magistrado é de risco. Tanto assim que tivemos inúmeros casos de vítimas. É uma profissão absolutamente estressante. A sociedade precisa entender que, como a magistratura é teto remuneratório, está distante do piso, o salário mínimo. Isso gera incompreensão, em um país com milhões de desempregados, em que há uma enorme desigualdade social. Discussão que precisa ser enfrentada pelo governo brasileiro. Em todos os países, categorias têm remuneração diferenciada. Somos membros de poder e responsáveis por entregar a sociedade a resposta de uma última porta, de uma última via. É sempre o juiz que vai tratar da ação de improbidade, das grandes questões nacionais. Então, tem que ter uma diferenciação. E isso não foi invenção nossa. Está na Constituição.
O Poder Judiciário vai ser bem compreendido quando ele for bem conhecido pela sociedade. A gente nota até em determinados embates que os próprios parlamentares, principalmente os recentemente eleitos, não conhecem como funciona a estrutura interna. Outro dia mesmo no debate sobre a permuta de juízes, um parlamentar me perguntou por que a queremos por meio de PEC e não pedimos também para os servidores. É discriminatório, disse o parlamentar. Ai explicamos que os servidores já têm esse direito. E o nosso sistema está na Constituição, por isso, a gente precisa de PEC. Isso demonstra um completo desconhecimento. Esse distanciamento é o nosso grande desafio. E fui eleita por todos os estados brasileiros com recorde de votos. Conheço todos os estados. Sei detalhes de cada região. Temos juízes maravilhosos, histórias maravilhosas e funcionamento da Justiça de acordo com as diferentes realidades. É isso que a gente precisa mostrar.
A gente ainda não conseguiu apresentar para a sociedade esse trabalho, que é artesão. Tem números, tem produtividade, que o conselho nos cobra. É um trabalho muito intelectual e muito artesanal. Então o nosso desafio, como AMB, é diminuir esse distanciamento com uma forma de comunicação mais direta. Temos as dificuldades de linguagem, já detectamos, e vamos pelo menos apresentar à sociedade um trabalho mais efetivo. O tempo do processo ainda não é o que nós esperamos. Por quê? Grande número de recursos e o funcionamento burocrático da máquina. São desafios que, eu como presidente da AMB, quero trazer à discussão e apresentar para o Conselho Nacional e para os tribunais .
Meu discurso interno e externo é de unidade. Sou uma pessoa agregadora por natureza. O que eu puder fazer para diminuir essa belicosidade, vou fazer. Existem, de todos os lados, pessoas de bem, comprometidas com o nosso bem maior. Nós somes o Estado brasileiro. Somos Brasil. Queremos o fortalecimento da nossa soberania. E eu quero que o Judiciário brasileiro seja referência mundial. Já considero que temos os melhores juízes do mundo, pelo eu visito, pelo que eu conheço do sistema de justiça dos outros países. Então, minha ideia é agregar e unir.
Não teremos reajuste porque o Supremo não entregou o pedido, atendendo a regulamentação da limitação de gastos (a lei do teto). Há um percentual histórico a ser considerado, em torno de 16% – que não foram concedidos ao longo dos últimos anos. Teve um reajuste em 2016, mas não contemplou toda a defasagem. É importante dizer que esse não é um pedido que o Poder Judiciário faz porque quer. O nosso regime de teto remuneratório, estabelecido na Constituição, prevê uma correção anual conforme artigo 39.
Sim. Senão a Constituição faria essa ressalva. Mas não fez exceção. O governo, por questões financeiras, teve que aplicar uma redução e o Poder Judiciário obedeceu. Tanto que não enviou o pedido de reajuste. Mas há uma defasagem.
Exatamente. E está escrito. A recomposição do subsídio existe exatamente como proteção à independência do magistrado. Ele não pode ficam refém de pedir ao parlamento. Pela independência dos poderes, a Constituição previu que o Parlamento tem que fazer essa revisão. Lutaremos firmemente pela independência. Esse é o maior valor, o mais precioso, é a nossa joia rara.
Se você trabalhasse internamente na AMB, ia ficar assustada com o volume de leis e PECs que alteram todo funcionamento do Poder Judiciário. Desde questões de competência, voltando atrás questões estruturais, o que ocasionaria, inclusive, mais gastos para o Estado brasileiro, em razão das despesas que teria para implementar as medidas. Essas peças vêm de parlamentares de diversos partidos. Cada um enxerga a Justiça de uma determinada forma e não há uma concentração ou nenhuma interlocução racionalizada para apresentação dessas PECs.
Eu atribuo ao momento em que o Judiciário é vitrine. É protagonista de um processo anticorrupção no país. Isso me parece muito claro. E isso foi dito pelos senadores na aprovação da lei do abuso de autoridade, que a gente chama de lei da impunidade. Eles foram ao púlpito dizer que por questões de processos pessoais, deles, achavam que era a hora da aprovação da lei. A gente teve o incidente da busca e apreensão do gabinete do líder do governo que a acabou gerando a queda de todos os vetos que teriam sido apresentados pelo governo. Então, isso é muito sintomático na ação do Poder Judiciário.
É possível. Nos temos grandes homens na República. Eu acredito no estado brasileiro e na força das instituições, nos seus homens. As instituições são comandadas por homens. E esses homens são brasileiros imbuídos de espírito público, de manter o país nos trilhos, de manter o país no caminho certo. Com esses homens, nós queremos dialogar.
Renata Gil vence eleição e será a primeira mulher a assumir a AMB na história
A juíza Renata Gil, da chapa AMB+Forte, Uma só Magistratura, foi eleita presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para o triênio 2020-2022. O resultado das urnas foi divulgado na noite desta sexta-feira (8). Primeira mulher a ocupar o cargo desde a criação da Associação, há 70 anos, a juíza e sua chapa receberam 6.584 votos (80%) – maior número da história da Associação. O candidato Luiz Gomes da Rocha, da Magistratura Independente, contabilizou 951 votos, e José Carlos Kulzer, da chapa Unidade (da Carreira e (é) Independência (da Magistratura), 765 votos
“O pleito deste ano comprovou mais uma vez a tradição democrática da AMB. Com a vitória da Renata Gil, o presidente Jayme de Oliveira conseguiu fazer o seu sucessor, prova da sua liderança à frente da entidade e de seu empenho nas atividades associativas. O fato não ocorria desde 2010”, destaca a AMB.
Renata Gil fazia parte da Diretoria da AMB até 3 de setembro, como vice-presidente Institucional, quando teve que se licenciar para concorrer ao cargo, conforme estabelece o Estatuto da entidade.
A magistrada afirmou que sua principal bandeira de gestão será o fortalecimento da Magistratura. “A carreira é vitalícia, o que impõe tratamento igual a aposentados e ativos. Atuarei pela independência do Judiciário, pela autonomia dos tribunais e por condições de trabalho na primeira instância, que atende às metas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e dos tribunais sem meios suficientes para tanto”.
A nova diretoria da AMB tomará posse em 11 de dezembro, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília (DF).
Currículo
Juíza titular da 40ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), nascida no Rio de Janeiro (RJ), formou-se em Direito na Universidade Estadual do Rio de Janeiro, em 1994. Ingressou na Magistratura fluminense em janeiro de 1998, por concurso de provas e títulos, e atuou nas comarcas de Macabu, Silva Jardim, Rio Bonito e Rio de Janeiro.
Na Amaerj, tornou-se a primeira mulher a assumir a presidência em 2016-2017, sendo reeleita para o biênio 2018-2019. Na AMB, foi também vice-presidente de Direitos Humanos no triênio 2011-2013.
Atuou como coordenadora-adjunta da pesquisa “Quem somos. A Magistratura que queremos” realizada em conjunto pela AMB e Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). Integra grupo de trabalho, criado pela Presidência do CNJ, para tratar sobre o cumprimento da Resolução CNJ 255/2018, que institui a política nacional de incentivo a participação institucional feminina no Poder Judiciário.