Reajuste dos subsídios dos ministros do STF deve ser já para impedir expansão de corrosão inflacionária, diz Frentas

Publicado em Deixe um comentárioServidor

A correção dos subsídios dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), além de impacto financeiro da ordem de R$ 6 bilhões anuais, tem também efeito-cascata, para outros poderes e esferas. No entanto, apesar da crise econômica que assola o país e da necessidade de ajuste fiscal, o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e coordenador da Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas), Guilherme Guimarães Feliciano, afirma que, diante da corrosão inflacionária de 41% nas remunerações, as duas carreiras já deram sua cota de sacrifício. “ Se diz que agora não é o momento. Quando será? No final das contas, a magistratura parece estar condenada a nunca ter revisão”, criticou.

Ele admitiu que alguns benefícios da magistratura precisam ser rediscutidos. O que se chama de penduricalhos, a exemplo do auxílio-moradia. “Reconheço que a população tem ojeriza disso. Nós não pretendemos, falando pela Anamatra, sustentar que isso se perenize”, disse. Por outro lado, não adianta apenas extinguir essa ajuda de custo apenas para uma parcela dos magistrados e deixar a benesse livre em outras esferas. “Se cai por exemplo a liminar do ministro Fux (do STF, que garante o auxílio-moradia para todos), o que acontece? Na União, não vai ter mais. Mas em estados, sim. Então, é preciso discutir isso de uma maneira definitiva e universal”.

Como se explica esse aumento de 16,38% diante da crise econômica do país? Magistrados e procuradores dizem que estão sem aumento desde 2015, mas em 1º de janeiro de 2016 tiveram de 7,6% – foi abaixo do proposto, de 16,32%.

A magistratura teve algumas parcelas de lá para cá. A questão é que a garantia constitucional é de revisão anual, que não houve, nem para os membros da magistratura, nem para os do Ministério Público. A garantia constitucional da correção dos subsídios é do cidadão. Exatamente para que, na prática, o juiz, quanto toma decisões que não agradam o Poder Executivo ou Legislativo, não possa pode ser punido. Segurar aumentos e permitir que a inflação corroa os subsídios é uma maneira de puní-los. A garantia do cidadão acaba comprometida. Desde que se fixou o subsídio em parcela única, em 2006, até hoje, a perda para a inflação é de 41%.

Como se chegou a essa conta, se os reajustes acontecem com certa regularidade, a exemplo dos 7,6%?

A conta é essa. Eu lhe asseguro. A última revisão geral anual, realmente, foi na época de Fernando Henrique Cardoso, depois de uma decisão do Supremo. E foi quase uma piada. Quando ele se viu obrigado, deu cerca de 1% de reajuste. De lá para cá, nunca mais. Conseguimos o aumento depois de muito tempo. Quase quatro anos trabalhando. Vieram os 16,38%. Aí se diz que agora não é o momento. Quando será? No final das contas, a magistratura parece estar condenada a nunca ter revisão, a não ser no momento em que o salário mínimo chegue ao valor do subsídio.

Durante a crise, o trabalhador também não teve correção de salário à altura da correção inflacionária. E toda a população, como disse a ex-presidente do STF, ministra Carmem Lúcia, tem que dar a sua cota de sacrifício. Quando a magistratura e MP deram sua contribuição?

São 41% de sacrifício. Em 2006, um juiz federal substituto era, no início de carreira, o maior subsídio. Hoje, de baixo para cima, é o terceiro menor das principais carreiras de Estado. A ministra Cármem Lúcia tem toda a razão. Mas, como se fez esses 16,38%? Com remanejamento dentro do Orçamento do Judiciário. Não vai deixar de ter dinheiro para a educação, para a segurança pública. O Judiciário já estava no limite da Emenda 95 (lei do teto dos gastos). Seria até impossível que fizesse mais gasto.

Há críticas contundentes a esse remanejamento. Especialistas dizem que, nas universidades, por exemplo, se privilegiou o pagamento dos servidores. No entanto, em seguida, os reitores reclamaram da falta de dinheiro para investimentos em segurança ou em pesquisa. Ou seja, o corte prejudicou a população e os cofres públicos, já que foi necessário novo aporte de recursos para cobrir áreas importantes. No Judiciário, essa troca não vai afetar o atendimento à população?

O nosso orçamento não aumentou. Não vai prejudicar o serviço. Pela Emenda 95, em 2020, o orçamento será reajustado pela inflação medida pelo IPCA-E. O subsídio não, porque infelizmente nunca foi usado o IPCA-E para esse fim. Então, o orçamento vai crescer e o valor que os juízes recebem ficará no mesmo. O reajuste vai ter menos impacto lá na frente.

A correção dos subsídios, além de aumento de gastos da ordem de R$ 6 bilhões anuais, tem também o efeito-cascata.

Pelo arranjo que se fez lá atrás, nós carregamos o funcionalismo nas costas. Quando do reajuste do subsídio dos ministros do STF, aqueles que estão no limite do teto, nos Estados, têm aumento indireto. Problema que tem que ser resolvido, mas não é culpa nossa. Em muitos Estados, politicamente, se aceita ganhos acima do teto. Mas o governante sabe que não vai poder pagar. Aí, não quer que suba o subsídio do ministro do Supremo. Desse jeito, a magistratura nunca vai ter aumento.

Outra discussão que tem recebido críticas é a troca do auxílio-moradia (R$ 4,1 mensais além dos salários) pelo Adicional por Tempo de Srviço (ATS). Isso também seria um aumento disfarçado, não é?

Essas discussões não estão conectadas. Quanto ao auxílio-moradia, vou te dar razão. Alguns benefícios na magistratura precisam ser rediscutidos. O que se chama de penduricalhos, principalmente nos Estados. E a ajuda de custo para moradia é um penduricalho. Você sempre diz que o penduricalho é legal, é constitucional, mas não é fofo. E não é mesmo. Reconheço que a população tem ojeriza disso. Nós não pretendemos, falando pela Anamatra, sustentar que isso se perenize. Mas não adianta falar: então acaba a ajuda de custo, ponto final. E as outras distorções que por acaso existam? Se cai por exemplo a liminar do ministro Fux (do STF, que garante o auxílio-moradia para todos), o que acontece? Na União, não vai ter mais. Mas em estados, sim. Então, é preciso discutir isso de uma maneira definitiva e universal.

Hoje, a Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas)vai falar sobre a revisão de 16,38% do subsídio. O sr. acha que convencerá a população com o argumento de que é legal e constitucional?

O que precisamos fazer, por honestidade, é esclarecer, com toda a transparência. Eu, como cidadão, pensaria o seguinte: os juízes decidem questões ligadas à minha vida, ao meu patrimônio, à minha liberdade, à minha família, às minhas relações contratuais. O que se espera é que o juiz que seja bem preparado e a carreira atraente. O que estamos vendo é que a carreira foi ficando cada para trás. Em 2014, 200 juízes desistiram, em todo o país. Ou não tomaram posse, ou se aposentaram precocemente ou se exoneraram. Porque temos uma perda acumulada de 41%. Daqui há três anos vamos ter o quê, 70%? E o argumento vai ser sempre: não, não é o momento. Conselheiros de estatais, por exemplo, ganham muito mais que nós.