Polêmica sem fim na terceirização

Publicado em Deixe um comentárioServidor

Especialistas divergem sobre os efeitos que a nova lei sobre mão de obra terceirizada terá na atividade econômica. Para muitos, impacto mais imediato na geração de empregos virá das alterações nas normas de contratação temporária

SIMONE KAFRUNI

MIRELLE BERNARDINO *

A terceirização é uma prática comum há anos no Brasil. Porém, não tinha regulamentação e era julgada com base na Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que permitia a terceirização apenas das atividades-fim, o que gerava insegurança jurídica para os empregadores e incerteza sobre a garantia de direitos para os trabalhadores. A Lei 13.429/2017, que trata dos trabalhos terceirizado e temporário, sancionada pelo presidente Michel Temer em 31 de março, pretende dar um fim à polêmica ao possibilitar a terceirização em todas as áreas. Além disso, em meio à crise, ela tem o objetivo de gerar efeitos econômicos positivos, como a criação de empregos e o aumento da competitividade e produtividade nas empresas.

A repercussão na economia, no entanto, deve ser mais imediata por conta das alterações nas regras do trabalho temporário, também tratadas na lei, do que, efetivamente, pela tentativa de regulamentar a prestação de serviços terceirizados, apostam especialistas. Sobre a terceirização, especificamente, muitos a consideram vaga, o que pode ensejar uma multiplicidade de interpretações. Por isso, ela ainda não traria a segurança jurídica necessária para impulsionar investimentos e gerar emprego.

O próprio presidente Michel Temer, logo após a sanção, admitiu que, se necessário, o governo criaria “salvaguardas” para proteger direitos trabalhistas. “Aliás, ela não trata exatamente da terceirização Em primeiro lugar, trata do trabalho temporário”, disse o presidente.

Nos Congresso, a falta de especificidades da lei provocou a ressurreição do Projeto de Lei Complementar 30/2015. Originariamente Projeto de Lei 4.330/2004, da Câmara dos Deputados, o PLC, que trata exclusivamente da terceirização, em pormenores, estava parado no Senado. Relatada pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que elaborou um substitutivo, a proposta ganhou celeridade após a sanção da Lei 13.429 e deu entrada, em 3 de abril, na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) da Casa. Não sem gerar mais controvérsia.

Apesar de a polêmica sobre terceirização persistir, as mudanças no trabalho temporário promovidas pela Lei 13.429 são positivas e devem surtir efeito quase imediato no mercado de trabalho, na opinião de Ermínio Lima Neto, vice-presidente da Central Brasileira do Setor de Serviços (Cebrasse). “Legislação perfeita é impossível. Agora, o trabalho temporário é a melhor opção para gerar vagas imediatamente, sobretudo em tempos de crise”, avalia.

Para o especialista, a extensão do prazo de contratos temporários de 180 para 270 dias atende necessidades urgentes, como a substituição de trabalhadores que estão em gozo do auxílio-maternidade ou do auxílio-doença, que são períodos longos. “Além do mais, permite ao empreendedor uma avaliação melhor do investimento. Ele pode contratar e, se o negócio não der certo, dispensar os temporários. Isso porque 180 dias é pouco tempo para uma empresa saber se vai ter sucesso. Se tiver, a efetivação, nesses casos, é de quase 100%”, explica.

Émerson Casali, diretor da CBPI Produtividade Institucional e especialista em relações de trabalho, avalia que a lei reduz a insegurança na contratação de trabalhadores temporários. “Antes, a utilização dessa mão de obra estava muito limitada à substituição de pessoal ou ao acréscimo extraordinário do serviço”, assinala. Em um cenário de incerteza sobre os rumos da economia, é uma opção para o empresário ter tempo para entender se a demanda adicional se consolida e justifica contratações. “Ela evita a informalidade. Além disso, os índices de aproveitamento são de mais de 50%”, diz.

Lacuna

No caso da terceirização, porém, a Lei 13.429 deixa uma lacuna sobre atividade-meio ou fim e empurra novamente a decisão para a Justiça do Trabalho, no entender de Welton Guerra, advogado trabalhista do escritório Miguel Neto Advogados. “Há décadas, a Justiça entende que só é possível a terceirização na atividade-meio. Esse é o grande ponto controverso. Como advogado, interpreto que ela não possibilita a terceirização irrestrita”, diz.

Guerra afirma que não houve mudanças bruscas. “A lei traz um pouco mais de segurança para o trabalhador porque a empresa prestadora de serviços tem que ter capital social compatível com o número de empregados, e a tomadora passa a ser responsável pelo ambiente de trabalho”, exemplifica.

A grande vantagem da lei está em tirar algumas empresas de uma zona cinzenta, pondera o advogado Fábio Chong, do escritório L.O. Baptista. “Mas a ideia de que a lei vai gerar emprego é equivocada. O que cria postos é o crescimento econômico. Na minha opinião, a legislação define que todas as atividades podem ser terceirizadas. Mas nem todas serão. Cabe ao empresário decidir em quais áreas a terceirização vai garantir maior produtividade”, diz. Na administração pública, afirma Chong, o modelo implica um desafio maior pela força do funcionalismo. “Há menor vontade política de terceirizar no setor público”, afirma.

Relação comercial

O fato de ser enxuta, até demais para alguns, é a maior qualidade da lei, no entender de Ermínio Lima Neto, da Cebrasse. “Ela joga para o objeto do contrato a definição de qual atividade será terceirizada, quando fala de serviços determinados específicos. Ou seja, quem tem que definir o que pode ou não ser terceirizado passa a ser o contratante. É o empresário, não é a Justiça. Passa a ser uma relação comercial, e não trabalhista”, destaca. Para ele, as empresas do setor de serviços vão se sentir mais confortáveis para investir e crescer. “Além disso, o tomador vai se preocupar mais com a escolha do parceiro — e não só pelo menor preço”, acrescenta.

*Estagiária sob supervisão de Odail Figueiredo

Pressa com a terceirização

Publicado em 1 ComentárioServidor

Senado quer aprovar nova proposta sobre o tema em 15 dias para que o Planalto o analise em conjunto com projeto ratificado pela Câmara que libera a prática em atividades-fim. Assunto é polêmico. Para o Sebrae, micro e pequenas empresas serão beneficiadas

RODOLFO COSTA

Após a aprovação, pela Câmara, de projeto de lei que regulamenta a terceirização de mão de obra, o Senado corre contra o tempo para aprovar outra proposta que também trata do assunto. O presidente Michel Temer tem pressa para examinar as duas propostas, encaradas pelo governo como importantes para desburocratizar as relações de trabalho e estimular a geração de empregos. Temer pretende usar o poder de veto para publicar uma espécie de consolidado das duas matérias, preservando os pontos que julgar mais viáveis.

Pela Constituição, o presidente tem 15 dias para sancionar o Projeto de Lei nº 4.302/98, aprovado pelos deputados na última quarta-feira. Esse, portanto é o período em que o Senado terá para ratificar aprovar o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 30/15 para que Temer faça a análise conjunta das duas propostas. O problema do governo é que a matéria está sob relatoria do senador Paulo Paim (PT-RS), que tem pronto relatório que altera o texto que veio da Câmara. Um dos pontos prevê limite de 30% para a terceirização de atividades-fim da empresa contratante.

Caso o substitutivo de Paim seja aprovado no Senado, o texto voltará para a Câmara, o que inviabilizará a costura dos dois projetos na sanção presidencial em tempo hábil. Temer diz que não vai esperar muito tempo para consolidar as duas matérias, o que, segundo fontes palacianas, é uma maneira de pressionar os senadores para que rejeitem o relatório do senador petista e encaminhem o PLC 30/15 sem mudanças à Presidência. O governo não é favorável ao limite da terceirização em atividades-fim.

Acordos políticos ainda devem ser fechados até a próxima semana. Paim espera levar o relatório para votação até quinta-feira na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Os senadores Romero Jucá (PMDB-RR), Renan Calheiros (PMDB-AL), além do presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE), tentam convencê-lo a preservar o texto da Câmara sem alterações. Paim, no entanto, não dá mostras de que vá recuar. “O povo brasileiro não quer terceirização irresponsável. Agora, debater e construir alternativas é natural e faz parte do jogo democrático. E estou aberto a isso, como sempre fui”, declarou.

Se o texto voltar para a Câmara, haveria também desgaste para os deputados da base governista, que não fazem boa avaliação da proposta. Para alguns parlamentares, o projeto beneficia mais as grandes empresas do que as pequenas, por prever dispositivos como o q ue obriga a contratante a fiscalizar o cumprimento das obrigações trabalhistas.

Nos bastidores do Congresso, comenta-se que Eunício Oliveira trabalha pela aprovação sem alterações do PLC 30/15, a tempo de encaminhá-lo ao Planalto, para sanção, dentro do prazo de 15 dias. Por ser dono de empresas terceirizadas, ele seria um dos principais interessados pelos pontos mais rigorosos do texto que está no Senado. O senador, no entanto, descarta qualquer interesse específico no projeto e garante que apenas o colocará em votação no plenário quando for apresentado. “É preciso que a comissão (CCJ) aprove ou rejeite. Chegando ao plenário, tenho o compromisso de pautá-lo de imediato”, afirmou.

Prós e contras

O PL 4.302/98 é polêmico. Para os contrários, ele significa a precarização do trabalho. O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), diz que ele é positivo. Um estudo da entidade aponta que 41% dos pequenos empreendedores acreditam que poderão aumentar o faturamento com o fornecimento de serviços terceirizados. E, contrariando os argumentos de que as os empreendedores poderão substituir os trabalhadores por terceirizados, a pesquisa aponta que menos da metade dos empresários pensa em terceirizar a própria mão de obra.

Esse é o exemplo da empresária Bianca Luz, 37 anos, que administra uma empresa de organização de festas. Hoje, ela terceiriza a produção de balões, e, mesmo acreditando que a medida pode ser benéfica, não cogita ampliá-la a todas as atividades do negócio. “Para alguns serviços, pode ser válida a contratação mão de obra externa, mas eu não terceirizaria tudo”, afirmou. (Colaboraram Paulo de Tarso Lyra e Mirelle Bernardino)

Efeito na Previdência

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, minimizou o resultado da votação do projeto de terceirização na Câmara, que, por conta do placar apertado (231 votos a favor e 188 contra), mostrou encolhimento da base aliada. Meirelles diz não acreditar que isso poderá atrapalhar a aprovação da reforma da Previdência. “São coisas distintas. O fato concreto é que a terceirização é um projeto importante, que foi votado e decidido em função dos benefícios para a economia brasileira. A Previdência Social é outro projeto, que é fundamental para o país”, afirmou. “Estamos tomando as medidas certas”, emendou.

Empresas

A aprovação do projeto que regulamenta a terceirização no Brasil deve equiparar as regras nacionais às de outros países, mostra um estudo da Deloitte e da Confederação Nacional da Indústria (CNI) que avaliou 17 mercados no mundo. Tema polêmico no Brasil, a definição entre o que pode ser transferido a terceiros não é feita por mercados como Alemanha, Bélgica, Japão, China e Austrália. A avaliação do setor privado é que a distinção entre o que pode e não pode ser terceirizado só gera insegurança jurídica, abrindo margens para variadas interpretações. “A decisão do que terceirizar deve ser da empresa”, diz a gerente executiva de Relações do Trabalho da CNI, Sylvia Lorena.