Horário de verão pode ser saída para a crise hídrica

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Uma das saídas para a escassez de água, proposta pelo economista Eduardo Amendola Camara, professor da Universidade Estácio de Sá, é o retorno do horário de verão, em 2021. “É uma prática recomendada pois, em primeiro lugar, aumenta a eficiência e a segurança do setor energético; em segundo lugar, não onera os cofres públicos; e, por fim, mas não menos importante, ainda incentiva o setor de turismo”, aponta

VERA BATISTA

FERNANDA STRICKLAND

A atual crise hídrica fez o Ministério de Minas e Energia aumentar a previsão de uso e gastos com usinas termelétricas de R$ 9 bilhões para R$ 13,1 bilhões. Os R$ 4,1 bilhões a mais vão bater direto no bolso do consumidor. “Essa alta no custo de térmicas já está onerando o cidadão. Se em junho os consumidores viram um aumento de cerca de R$ 10 nas contas de luz, em julho, o impacto subirá para cerca de R$ 16. E pode continuar havendo reajustes até o final do ano”, explica Larissa Rodrigues, gerente de Projetos e Produtos do Instituto Escolhas.

Ela diz que, além disso, o contribuinte está sem opção para equilibrar o orçamento, porque nos últimos anos pouco foi investido em equipamentos. “Para se ter uma ideia, as etiquetas de eficiência energética das geladeiras não são revisadas pelo Inmetro desde 2006. Se alguém quiser comprar uma realmente eficiente, não encontrará no mercado. Estudo do Escolhas comprova que, se as geladeiras brasileiras já seguissem os padrões internacionais, seria possível economizar R$ 100 bilhões em contas de luz até 2030”.

Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, destaca que o preço da energia vem subindo mais que a inflação desde 2013. “Agora, o reajuste tende a bater, em 2021, na bandeira tarifária, o que vai repercutir em aumento de 5% a 10% para o usuário, dependendo da região”, lembra Sanchez. O problema maior, talvez, alerta, seja em 2022. “Porque, além da bandeira tarifária, vamos ter os reajustes anuais das companhias. Muitas já tiveram esse ano”, analisa o economista.

Para a economista Heloise Fernandes Sanchez, da Terra Investimentos, o cenário é bastante preocupante, principalmente para as famílias de baixa renda. Ela avalia que, com a bandeira vermelha 2, os gastos com energia devem ficar entre 12,5% e 15% maiores. “A conta mais cara também acaba impactando na inflação do país, que já está bastante elevada e bem acima da meta de 3,75%, podendo variar entre 2,25% e 5,25%. Atualmente no acumulado 12 meses temos 8,35%. Quanto maior o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), mais caros ficam os produtos, assim como menor é o poder de compra da população”, reforça.

Horário de verão

Uma das saídas para a escassez de água, proposta pelo economista Eduardo Amendola Camara, professor da Universidade Estácio de Sá, é o retorno do horário de verão. “A retomada do horário de verão em 2021 é uma prática recomendada pois, em primeiro lugar, aumenta a eficiência e segurança do setor energético; em segundo lugar, não onera os cofres públicos; e, por fim, mas não menos importante, ainda incentiva o setor de turismo”, aponta.

Para aumentar a segurança sobre o sistema elétrico e atenuar o déficit das empresas geradoras, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou novos valores para as bandeiras tarifárias. A vermelha patamar 2, adotada em junho, a R$ 6,24 por 100kWh consumidos, vai custar R$ 9,49 em julho. “Na prática, para uma família de consumo residencial médio, o reajuste tarifário representará mais R$ 77,28 no ano, causando um efeito direto sobre a inflação”, calcula Camara.

A bandeira tem efeito indireto sobre o nível de preços nos setores de produção de bens industrializados, agrícolas e varejo, intensivos em energia. “Uma parcela deste aumento será repassada ao consumidor final”, reitera.  O horário de verão, desde 1931, melhora o aproveitamento da luz natural e reduz a necessidade de energia concentrada no período das 18 horas às 21 horas, lembra Camara. Mas no primeiro ano de governo, o presidente Jair Bolsonaro extinguiu o horário de verão por considerar que a medida perdeu a “razão de ser aplicada sob o ponto de vista do setor elétrico”.

Entretanto, em meio à crise hídrica e ao aumento das contas de luz no Brasil, o governo já pensa em uma nova medida de incentivo para as empresas deslocarem o consumo do horário de maior demanda de energia para o de menor demanda. Para a indústria ser motivada a mudar o horário de funcionamento, precisaria, além de benefícios na tarifa de energia, um incentivo fiscal – e custaria muito ao governo em um momento em que não há folga no orçamento. “Como alternativa, o retorno do horário de verão ao final de 2021 poderia produzir o efeito esperado, principalmente nas unidades federativas meridionais, coincidentemente os maiores consumidores de energia”, enfatiza Camara.

Allyssom Marques, especialista em construções sustentáveis e engenheiro da AMG Engenharia, concorda que a situação no país inteiro, hoje, é crítica. “Gestores municipais acabam ficando refém do sistema de captação. Na prática, quase não existe a possibilidade de ação instantânea por parte dos prefeitos. O que realmente deve, e pode ser trabalhado, são políticas de conscientização do recurso junto à população e adoções em proporções possíveis de sistema de água nas instalações municipais e em edificações particulares”.

O sistema, segundo Marques, é bastante simples, tem investimento inicial relativamente baixo e pode ser instalado em projetos de pequeno e grande portes. “Em uma residência unifamiliar, por exemplo, parte de cerca de R$ 7 mil, gerando uma economia de até 50%. Calcula-se também que o que o sistema se paga em cerca de seis anos, ou seja, além de ser um viável financeiramente, pode minorar a utilização mensal do município consideravelmente”, informa o engenheiro.

Para  Delberis Lima, diretor e professor do Departamento de Engenharia Elétrica do Centro Técnico Científico da PUC-Rio (CTC/PUC-Rio), em tempos de aumentos tarifários, tão importante quanto aplicar medidas simples, como aumentar o uso da luz natural em casa, desligar eletrodomésticos em stand-by, ou mesmo ajustar a temperatura de equipamentos com maior consumo de energia, como chuveiro elétrico, geladeira ou aparelhos de ar-condicionado, o consumidor também pode considerar ações mais elaboradas, com resultados mais expressivos no curto, médio e longo prazos.

“Limpar filtros de aparelhos de ar-condicionado e observar a manutenção da vedação da borracha da geladeira são medidas que podem exigir algum trabalho, ou custo adicional, mas poderão gerar um impacto maior na redução da conta e no aumento da vida útil destes equipamentos. Além disto, os consumidores também podem considerar a mudança tarifaria ou mesmo o uso de sistemas fotovoltaicos – que exigiriam investimento relativamente alto no curto prazo, mas que tende a se pagar em 3 a 4 anos”, informa Lima. “Como a vida útil destes equipamentos de sistemas fotovoltaicos pode chegar a 15 ou 20 anos, a vantagem é bastante expressiva”, reforça o professor.