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Para economizar, Ministério do Planejamento edita portaria que permite o remanejamento compulsório de servidores do Executivo Federal para suprir cargos vagos em órgãos diferentes dos de lotação. Especialistas temem que medida leve a contestações judiciais
Tão logo foi publicada, causou polêmica entre servidores e especialistas a Portaria 193, do Ministério do Planejamento, que muda as normas para transferências e remoções de servidores entre os órgãos do Executivo Federal. Para alguns, a medida foi um ato impensado do governo que vai provocar uma enxurrada de ações judiciais. Com isso, ao invés de economia para os cofres públicos, o resultado será mais custos para a União, caso o Judiciário acolha as demandas dos trabalhadores. Para outros, se trata de estratégia disfarçada de reforma administrativa para tapar os buracos causados pela falta de pessoal e burlar a necessidade de concurso público. A portaria flexibilizou as regras de forma a impor alterações que, aparentemente, não podem ser contestadas e devem ser obrigatoriamente obedecidas pelo funcionalismo e pelos gestores.
Rudi Cassel, especialista em causas de servidores, do escritório Cassel, Ruzzarin, Santos, Rodrigues Advogados, afirmou que o texto não traz novidades. Essas normas já estão regulamentadas pelo Decreto 4.050/2001, substituído pelo Decreto 9.144/2017. “A previsão de movimentação – de duvidosa constitucionalidade quando aplicada na escala agora pretendida – está no artigo 93 da Lei 8.112/90. Mas deve gerar muitas impugnações judiciais se usada sem a concordância do servidor”, alertou, ao destacar que as remoções seguem rígidas normas técnicas e não acontecem “apenas porque o governo quer”. “A extensão do desgaste que isso pode suscitar dependerá de como será aplicada a portaria, publicada hoje”, reiterou.
No entender do economista Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, do ponto de vista da racionalidade da mão de obra, os remanejamentos são bem-vistos. “Meu receio é que as possíveis alegações de desvios de funções sejam recepcionadas pelo Judiciário. Se já há a caracterização de desvios quando o servidor é deslocado dentro do próprio órgão em que está lotado, para ocupações semelhantes, que dirá com a movimentação ampla prevista na portaria. Espero que esses remanejamentos não gerem uma enxurrada de decisões judiciais contrárias com ônus para a União”, disse.
Importante lembrar que o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), por exemplo, recentemente perdeu uma causa no Tribunal Superior do Trabalho (TST) e vai pagar quase R$ 270 milhões a empregados, por desvio de função na Receita Federal. E a Petrobras desembolsará R$ 15 bilhões – com aumento de R$ 2 bilhões anuais na folha de pagamento – para funcionários que questionaram a política de remuneração da estatal. Não foi à toa que os servidores, principalmente os do “carreirão”, que representam 80% do funcionalismo federal, reagiram imediatamente à medida.
Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), lembrou que, há anos, as lideranças sindicais tentam discutir a estrutura da administração com o Planejamento, sem sucesso. Agora, repentinamente, foram surpreendidas com “uma ordem de ofício”. “Em uma leitura rápida, já constatamos sérios problemas. O primeiro deles é obrigar, de forma unilateral, o trabalhador a mudar a vida repentinamente, sem considerar suas especificidades”, apontou. O mais grave para ele, no entanto, é “intenção clara de burlar a necessidade de fazer concurso”.
Silva recordou que o Planejamento já divulgou que há mais de 200 mil cargos vagos no serviço público federal. “Essa medida vai aprofundar o problema que já é grande. Com um detalhe: em fevereiro de 2019, quando for concluída a última parcela da incorporação das gratificações, mais de 120 mil profissionais vão se aposentar. Consultamos nossos advogados e, até sexta-feira, apresentarem uma proposta ao Planejamento e nos colocaremos à disposição para discutir o assunto”, detalhou. O próprio ministro do Planejamento substituto, Gleisson Rubin, admitiu que as seleções públicas serão postergadas.
Na avaliação de Rubin, ao suprir déficits de efetivo com profissionais que já pertencem ao quadro, a nova regra “vai reduzir a necessidade de novos concursos públicos, resultando em economia para o governo”. De acordo com o ministério, as movimentações seguiam normas bem mais rígidas, que limitavam as mudanças e geravam gastos com cargos comissionados. “A partir de agora são ampliadas as possibilidades de migração, sem despesas para o Tesouro Nacional e sem qualquer perda para o funcionário”, destacou, em nota, a assessoria de imprensa.
Decisão
A Portaria 193 determina que “a alteração da lotação ou exercício de empregado ou servidor para compor força de trabalho é ‘irrecusável’ e não depende da anuência prévia do órgão ou entidade ao qual ele está vinculado”, quando feita em caso de necessidade ou interesse públicos ou por motivos de ordem técnica ou operacional. Apenas para os empregados de empresa pública ou sociedade de economia mista, que não dependem de recursos do Tesouro, será admitida a “anuência prévia” da companhia.
O ato de lotação será publicado no DOU após análise pelo Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal (Sipec), do Planejamento. Os órgão terão que dar justificativa clara e objetiva de que a transferência contribui para o desenvolvimento das suas atividades e demonstrar a adequação do perfil profissional por suas características e qualificações. O Planejamento se dá o direito de não analisar processos que não atendam os requisitos da portaria e a solicitar quaisquer outros documentos.
Concluída a movimentação, “o retorno do servidor ou empregado movimentado ao órgão ou entidade de origem poderá ocorrer a qualquer tempo, por decisão do Planejamento”, assinala a portaria. “Há órgãos que lidam com certo excedente de pessoal, porque tiveram parte de suas funções suprimidas, e outros órgãos que, ao contrário, absorveram novas funções e têm necessidade de reforço das suas equipes”, explicou Gleisson Rubin.