O jabuti e as raposas no Carf

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“É bom registrar que o Carf decide e corre grande risco nesse momento com análise de autuações de grande interesse da sociedade, com são as oriundas de operações como a Lava Jato e outras. Na prática, serão as raposas (grandes empresas autuadas e com fortes bancas de advocacia tributária) tomando conta do galinheiro”

Vilson Antonio Romero*

Entre 2017 e 2020, cerca de R$ 110 bilhões em créditos tributários federais foram mantidos como devidos em razão de decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).

O Carf, criado pela Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009, é um tribunal administrativo, paritário, integrado por representantes da Fazenda Nacional e dos contribuintes, vinculado ao Ministério da Economia, sendo responsável pelo julgamento em grau recursal de irresignações de contribuintes relativas aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

É tamanha a importância dessa instância que, conforme dados de fevereiro de 2019, sob sua análise estavam 122.371 processos, correspondendo a R$ 603,77 bilhões em créditos tributários, quase metade de um ano de arrecadação federal.

O Carf, atualmente, é integrado por mais de uma centena de conselheiros, metade auditores fiscais da Receita Federal e outra metade por representantes de confederações empresariais e entidades de classe, representando os contribuintes. Em situações de empate no julgamento de demandas tributárias, o voto de qualidade cabia ao representante do governo.

Essa regra existia como forma de equalização do litígio tributário pois, em caso de derrota, os contribuintes sempre e ainda poderiam ir ao Poder Judiciário para contestar a exigência, possibilidade inexistente para a Fazenda Pública que, em caso de insucesso, não pode judicializar a questão.

Pois isto mudou com a sanção presidencial e publicação no Diário Oficial de 14 de abril da Lei nº 13.988/20. Contrariando posições inclusive de renomados advogados tributaristas e recomendações do ministro da Justiça e do procurador-geral da República, no texto resultante da conversão da Medida Provisória (MP) 899/2019, a caneta presidencial permitiu prosperar um “jabuti” (dispositivo alheio à matéria) que transfere o voto de qualidade dos representantes da Fazenda para os representantes dos contribuintes.

Com essa mudança, perde o Estado em inúmeras frentes, por exemplo, no seu poder julgador e na palavra final na interpretação da legislação.

É bom registrar que o Carf decide e corre grande risco nesse momento com análise de autuações de grande interesse da sociedade, com são as oriundas de operações como a Lava Jato e outras.

Na prática, serão as raposas (grandes empresas autuadas e com fortes bancas de advocacia tributária) tomando conta do galinheiro.

Há uma perplexidade e indignação generalizada entre todos os que se dedicam a defender a boa administração dos recursos públicos e a moralidade administrativa.

Se não houver medidas judiciais e legislativas urgentes corrigindo esse descalabro, teremos inequivocamente uma situação de enfraquecimento do combate à sonegação e à corrupção, bem como a inexorável possibilidade de gerar prejuízos bilionários ao erário público.

*Vilson Antonio Romero –  auditor fiscal aposentado e jornalista

Senado insiste no “jabuti” excluído pela Câmara no PL 2.999/2019 que prejudica perícias judiciais

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O artigo, reincluído no texto pela senadora Soraya Vieira Thronicke (PSL/MS), praticamente extingue a perícia médica independente e abre espaço para que peritos médicos federais (do INSS), que negam o benefício, sejam os mesmos a fazer a segunda avaliação de licenças por doença ou aposentadorias por invalidez. O objetivo é cortar custos

Após uma explosão de protestos nas redes sociais e de uma enxurrada de reclamações de especialistas, o deputado federal Eduardo Bismark (PDT/CE), relator na Câmara do PL 2.999/2019, no dia 9, amenizou o “jabuti” incluído no projeto de lei (PL 2.999/2019) e não permitiu que fosse extinta a perícia médica independente para contribuintes do INSS que tiveram benefícios negados ou cancelados pelo órgão. No Senado, no entanto, a senadora Soraya Vieira Thronicke decidiu mudar novamente o texto. Ela uma série de alterações, inclusive do Artigo 2º que ficou com o seguinte teor:

“Art. 2º Fica instituído o Serviço Integrado de Perícias Médicas para subsidiar as decisões nos processos administrativos e judiciais em que se busque a concessão, revisão ou restabelecimento de benefícios administrados pelo INSS.

§ 1º As atividades prestadas no âmbito do Serviço Integrado de Perícias Médicas serão executadas por integrantes da carreira de Perito Médico Federal de que trata o art. 30 da Lei nº 11.907, de 2 de fevereiro de 2009.”

Justificativa

A senadora, para justificar a medida, usou os mesmos argumentos do relator da Câmara, embora Bismark tenha admitido que não fazia sentido. No início do mês, ele explicou que o objetivo era, com o apoio do Ministério da Economia, reduzir custos. “Entretanto, por causa da polêmica, vou incluir um parágrafo explicando que a convocação da perícia independente é da deliberação do juiz (conforme é hoje). Se ele questionar qualquer resultado, pode vetar ou convocar outro especialista. Aí, acho que atendemos a todos: médicos, Justiça e equipe econômica”, disse o deputado.

Não adiantou muito. A senadora Soraya voltou a mencionar que o custo para uma única perícia judicial pode chegar, a R$ 1.850,00. Para 2019, o montante total seria de R$ 316 milhões e, em 2020, “se nenhuma providência for adotada, ultrapassa R$ 328 milhões”. “Nesse sentido, a instituição do Serviço Integrado de Perícias Médicos permitirá ao juízo competente o aproveitamento do corpo de peritos médicos federais (servidores públicos federais) com o objetivo de realização da perícia também na esfera judicial”. Os peritos judiciais afirmam que o valor de R$ 1,850 mil está incorreto. Recebem tabela fixa de R$ 300 brutos por perícia, garantem.

No início do mês, o juiz Guilherme Feliciano, do Departamento de Direito do Trabalho da Universidade de São Paulo (USP) e ex-presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), admitiu que, “de fato, há uma incoerência, quando o perito que realiza a prova judicial pertence ao mesmo corpo que originalmente recusou àquele cidadão o seu direito”. Não é adequado, afirmou, aproveitar os peritos federais, quando a própria União é a ré.

“O segundo ponto diz respeito à própria capacidade do perito. Poderíamos passar todas as avaliações para peritos que já integram o poder público? Acho que não. Porque eles, pela sua própria atribuição, já estão assoberbados. Há cerca de 15 anos, a Justiça do Trabalhou pediu que esses peritos nos auxiliasse. Ficou impossível. Apesar da boa vontade, não davam conta da demanda. Talvez, criar um corpo judicial de peritos, um novo quadro vinculado ao Poder Judiciário, a partir de concurso público, seja uma boa ideia. Aí não haveria peritos da confiança do juízo”, destacou Feliciano.

Plenário da Câmara vota hoje projeto sobre honorários de peritos judiciais, sem “jabuti”

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A previsão é de que a matéria seja analisada, hoje, às 18 horas.

O “jabuti” foi incluído pelo relator do PL 2.999/2019. Sob o argumento de economizar recursos públicos, ele sugeriu o “aproveitamento dos peritos médicos federais”, os mesmos que negam direitos ao beneficiário do INSS, para uma segunda avaliação. O jabuti foi derrubado na terça (02/207), depois de notas várias notas técnicas contrárias à iniciativa, inclusive as Associação Nacional dos Juízes Federais (Ajufe)

O deputado Eduardo Bismark (PDT-CE), a princípio, indicou que, uma única perícia judicial pode chegar, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), a R$ 1.850,00. “Estima-se que em 2019 o montante necessário ao custeio das perícias judiciais alcance o valor de R$ 316 milhões e, em 2020, se nenhuma providência for adotada, ultrapasse R$ 328 milhões”. Mas depois recuou e protocolou um novo relatório.

“O objetivo foi redução de custos e teve consenso do Ministério da Economia, dos peritos e do Judiciário. Tenho conversado muito com todas as partes. Por causa da polêmica, vou incluir um parágrafo explicando que a convocação da perícia independente é da deliberação do juiz. Se ele questionar qualquer resultado, pode vetar ou convocar outro especialista. Aí, acho que atendemos a todos: médicos, Justiça e equipe econômica”, contou Bismark.

 

Emenda à MP 870 que restringe atuação de auditores da Receita terá destaque

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Auditores-fiscais da Receita Federal (RF) fizeram ontem em várias cidades (Pelotas, Florianópolis, São Paulo, Rio de Janeiro, Vitória, Manaus e Brasília) o Dia Contra a Mordaça. Relator da matéria, senador Fernando Bezerra, declarou que o item que trata da “segurança jurídica e direito de sigilo do contribuinte” será votado em separado

Foram manifestação em repúdio à Medida Provisória 870/2019, que, afirmam, limita as competências do cargo e impede a cooperação, sem ordem judicial, com outras instituições no enfrentamento a crimes de colarinho branco. O Fisco ficou restrito à investigação de fraudes tributárias e aduaneiras e impedido de fiscalizar crimes de caixa dois, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e outros relacionados à corrupção. Em Brasília, os atos foram em frente ao Ministério da Economia, com a entrega de um manifesto ao secretário-executivo adjunto Miguel Ragone de Mattos.

No início de maio, até a direção da Receita foi contra a MP 870 – estabelece a reforma dos ministérios da atual gestão e deverá ser votada hoje pelo Congresso. No entanto, para analistas, essa é mais uma briga “do governo contra o governo”, uma vez que o item que incomodou o pessoal da RF foi apresentado pelo senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líder do governo no Senado. Após o protesto, ontem à tarde, o parlamentar informou que a parte do texto que se refere aos auditores terá destaque – será votada em separado. Ele declarou ainda que viu “a manifestação com naturalidade”.

“Até a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) confirmou a constitucionalidade da emenda”, disse Bezerra. Para ele, essa é uma matéria de interesse da estrutura do governo e não impõe restrição aos auditores. Eles continuarão com o direito de informar crimes, “como qualquer cidadão”. A intenção, complementou, foi dar segurança jurídica e direito de sigilo ao contribuinte. A emenda recebeu o repúdio de várias entidades e foi apelidada de “jabuti” pelos colegas de Bezerra.

O senador Major Olímpio (PSL-SP), presente ontem no ato em frente ao Ministério da Economia, reforçou que se a “emenda jabuti” passar da forma como está, as investigações em curso sobre corrupção serão atingidas porque a regra tem efeito retroativo. “Não podemos tirar a capacidade do Estado brasileiro de reagir em nome da sociedade brasileira”, disse. Os protesto, convocado pelo Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), teve a intenção de chamar a atenção da sociedade, do poder público e, principalmente, de deputados e senadores para os riscos de aprovar a MP.

A manifestação teve baixa adesão – em Brasília, cerca de 50 pessoas. Mas a justificativa para o fraco comparecimento foi o trabalho de bastidores que, nessa reta final, os auditores fazem no Congresso para esclarecer os vínculos entre corrupção e outras formas de delinquência, inclusive crime organizado, que comprometem recursos da União e ameaçam a estabilidade política.

Em paralelo, grupos de auditores aproveitam para recolher assinaturas às 10 emendas à reforma da Previdência (PEC 6/2019), apresentadas pelo Fórum Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), que precisa o apoio de, no mínimo, um terço dos deputados (171) para que sejam protocoladas na Secretaria da Comissão Especial.